História Universal da Destruição dos Livros Das Tábuas Sumérias à Guerra do Iraque Fernando Báez



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CAPÍTULO 8

Roma
Censura e perseguição no Império
O formato dos livros se manteve em Roma, isto é, continuaram o rolo de papiro e o pergaminho, mas a tenaz atividade destrutiva também continuou. Os livros do legislador Numa, 12 escritos hierofânticos e 12 filosóficos, foram colocados em duas caixas sepultadas com seu criador. Em 181 a.C., uma inundação fez saírem as caixas à luz e os textos foram lidos, com temor reverenciai, pelo pretor Quinto Petílio, que as levou à junta pública, "onde foram queimados". Tito Lívio explicou que o Senado podia chamar os magistrados e pedir que "recolhessem livros para ser queimados" fato que ocorria por volta de 186 a.C.

O templo de Júpiter, construído na época de Tarquínio, o Soberbo, último dos reis etruscos, guardava no interior os Livros sibilinos, que eram estudados por sacerdotes chamados "flâmines". A história dos livros não deixa nada a desejar. Ao que parece, a sibila de Cumas trouxe ao rei Tarquínio Prisco nove livros e pediu por eles trezentas peças de ouro. O rei riu e se negou terminantemente a pagar. A sibila queimou alguns livros e perguntou quanto daria por eles, e dessa vez o rei se surpreendeu e começou a sentir medo, porque presumiu que nesses livros estivesse escrito o futuro de Roma. A sibila voltou a queimar mais livros e, finalmente, o rei acabou pagando as trezentas peças de ouro. Em 83 a.C., um incêndio destruiu essas obras, mas se preservaram alguns exemplares, queimados em duas oportunidades posteriores: em 69 d.C. e 80 d.C. Conta-se que Augusto salvou alguns dos livros sibilinos e os colocou no templo de Apoio no Palatino, onde também arderam anos depois. Dias antes de morrer, um tal de Estilico, em 408, destruiu o resto dos livros sibilinos.

O protetor de Virgílio, Augusto, destruiu milhares de obras, mas não sem alegar razões de Estado. Foi Augusto quem proibiu no ano 8 a circulação da Ars amatoria, de Ovídio (livro queimado de novo em Florença por Savonarola em 1497, e em 1599 na Inglaterra, na versão do espião e dramaturgo Christopher Marlowe, por ordem dos arcebispos de Cantuária e de Londres). Augusto, segundo Tácito, ordenou a queima de todos os escritos de Cássio Severo. Desterrado, passou seus últimos dias (falo de 35 d.C.) sentado diante de uma pedra onde escreveu uma crônica do mundo nunca lida por seus opositores nem por seus amigos. A História, de Timágenes de Alexandria, foi queimada publicamente por ordem de Augusto, que achou que o autor não havia escrito seu livro com o devido respeito por ele. Augusto também queimou mais de dois mil livros gregos e romanos de que não gostava. Era, ao que parece, um leitor radical.

Alguém, tudo indica que ressentido, acusou um poeta de injuriar em sua obra o mítico Agamenon. Outra acusação perigosa atribuiu a um historiador ter escrito elogios a Bruto e Cássio. Tibério, ofuscado, condenou à morte estes e outros escritores, destruindo seus livros com verdadeira fúria. Esqueceu que os mesmos poetas justiçados leram suas criações a Augusto, que as elogiou.

Queimaram os livros do senador Cremúcio Cordo, na época de Tibério, e o intimaram a se suicidar. Calígula, sucessor de Tibério, recomendou anos mais tarde que os livros de Cremúcio fossem tirados de circulação, o que prova que a censura não pôde acabar com suas obras. Domiciano procurou atenuar os incêndios das bibliotecas provocados pelas incursões bárbaras enviando mensageiros a Alexandria em busca de cópias fiéis dos clássicos. Esse trabalho foi acompanhado de uma insana tendência a destruir em incineradores públicos todos os livros suspeitos de ofendê-lo. Os poetas eram castigados e os editores crucificados ou empalados.

Pelo menos três mil tabletas de bronze foram queimadas no incêndio da época de Nero. As tabletas se achavam na colina Capitolina e "eram o registro mais belo e antigo do Império que compreendia decretos e decisões da população e do senado romanos e que remontava quase à fundação de Roma [...]".

Durante o reinado de Justiniano, João Malalas, cronista de Antioquia, escreveu uma Cronografia, ou história do mundo, em que comentou a destruição de livros em Roma: "Em junho [...] alguns gregos foram presos de casa em casa, e seus livros, imagens e estátuas de seus miseráveis deuses foram queimados no Kinegião."

Um mundo de bibliotecas perdidas

Apesar de registros de poesia popular em tempos remotos, a literatura latina pode ser datada, com toda segurança, no século III a.C., época em que, já adotado o formato do livro como rolo de papiro, um autor como Lívio Andrônico, escravo grego, traduziu a Odisséia e promoveu a representação de peças teatrais. Não por mero paradoxo, foi um grego quem fundou a literatura do que seria um dos impérios mais importantes do mundo antigo. Convém lembrar que o impulso literário foi acompanhado de uma gradual circulação de livros. Havia vendas na rua destinadas a abastecer as coleções particulares, e é um fato que a primeira biblioteca pública romana, planejada por Júlio César, tornou-se realidade quando ele foi assassinado em 15 de março de 44 a.C.

Pelo que se sabe, Marco Terêncio Varrão foi escolhido por Júlio César para abrir essa biblioteca pública. Autores como Quintiliano consideravam Varrão "o mais erudito dos romanos". Escreveu 74 livros em 620 rolos de papiro, sobre diferentes temas. Quase nada restou. Um dos textos perdidos se intitulava Sobre as bibliotecas e é um dos precedentes mais antigos em torno do tema. Lamentavelmente, o assassinato de Júlio César não permitiu a criação da biblioteca e quando Varrão morreu, em 43 a.C., todos seus livros foram saqueados e alguns destruídos.

O historiador Asínio Polião (crítico de Júlio César) foi ironicamente quem criou essa biblioteca: "[...] Polião foi o primeiro a abrir em Roma uma biblioteca pública, constituída por livros gregos e latinos; as imagens de muitos escritores apareciam expostas no átrio, adornado com a maior magnificência com obras procedentes dos botins [...].

O imperador Otávio Augusto fundou duas bibliotecas, que também foram alimento das chamas. Uma estava junto ao templo de Apoio e se chamou Palatina. Foi organizada por Pompeu Macro (a quem coube a desonrosa tarefa de eliminar Ovídio dos arquivos e determinar o grau de acesso a certos textos de Júlio César) e esteve depois nas mãos de Caio Júlio Higino. Tudo indica que essa biblioteca tinha duas câmaras, com textos gregos de um lado e romanos do outro, com nichos para os armários e uma decoração realçada pelas estátuas. Esse centro foi destruído por incêndios em 64, em 200 e o restante em 363. A outra biblioteca foi a do pórtico de Otávia, que, durante o reinado de Tito, acabou arrasada pelas chamas. Um comentário sobre o historiador Malco de Bizâncio diz que ele se referiu com tristeza à queima da biblioteca pública e da galeria de Augusto.

Sabe-se que Marcos Úlpio Trajano (53-117), primeiro imperador de origem hispânica, passou muitos anos em companhia de Dião Crisóstomo. Dessa relação nasceu em seu espírito o desejo de construir um gigantesco foro onde se instalou a biblioteca Úlpia em 114. Essa biblioteca bilíngüe foi elogiada por seus quase vinte mil volumes, desaparecidos num devastador incêndio por volta da metade do século V.

A referência que temos da biblioteca Capitolina se limita a falar de sua destruição, e pouco podemos conjeturar sobre o Athenaeum, onde houve uma biblioteca. Uma admirável biblioteca pública, normalmente depreciada, foi a do Panteão, que esteve a cargo de Sexto Júlio Africano, no século III.

A biblioteca do templo da Paz, fundada por Vespasiano, foi destruída por um incêndio em 191. Nesse incidente desapareceram vários manuscritos das obras do médico Galeno de Pérgamo, que as depositou ali, como outrora havia feito o filósofo Heráclito de Éfeso, por julgá-lo o único lugar seguro. A simples sorte nos permite ler ainda uns vinte volumes de Galeno.

Segundo o minucioso levantamento de Constantino, de 350, existiam 28 bibliotecas em Roma; nenhuma sobreviveu.

Construíram-se bibliotecas nos banhos públicos das cidades. Trajano promoveu a construção de uma, terminada antes de 109, com as duas seções habituais. Caracala ordenou a construção de um complexo de banhos com capacidade para 1.500 pessoas. Em busca de popularidade, permitiu que todos os romanos, incluindo os escravos, pudessem usar suas instalações, que dispunham de água quente, morna e fria. Também tinha dois ginásios e uma biblioteca com as duas seções de costume, em grego e latim.

Quanto aos colecionadores, o mais conhecido talvez seja Sereno Sammonico, proprietário de uma biblioteca de 62 mil livros, que se perderam depois de seu assassinato durante uma ceia. Epafrodito de Queronea, escravo educado pelo gramático Arquias de Alexandria, adquiriu uma biblioteca particular de trinta mil volumes, utilizada em seus escritos, e que, por infelicidade, desapareceu totalmente. E. Lünzner falou extensamente da biblioteca de Epafrodito e ressaltou seus gigantescos depósitos, em grego e latim.

Muitos administradores de teatro também possuíam suas coleções particulares de comédias e tragédias. Quando se propunha um espetáculo teatral, o primeiro que se considerava era pegar a idéia de um comediógrafo ou trágico grego, já conhecido e respeitado pelo público, e se convidava um autor romano para adaptá-lo ou retomá-lo, como freqüentemente fazia Plauto, por exemplo. Nada restou dessas coleções.

Nas vilas militares como Sila e Lucullus, celebradas pelas elites da época, havia muitos manuscritos capturados nas guerras de conquista; quase nada sobreviveu. Sila tinha os manuscritos acroamáticos do filósofo Aristóteles, roubados em Atenas. C. Sulpício Galo, astrônomo e leitor voraz, possuía uma biblioteca de autores gregos de epístolas elogiada por Cícero, mas que não conseguiu escapar de um fim desconhecido. Em Dartona existiu uma vila com uma biblioteca como a de Civitavecchia.

Cícero também possuiu uma biblioteca única em seu século, perdida posteriormente. Em suas cartas se encontram com freqüência alusões a livros e escravos copistas ou bibliotecários. Um dos que pôs em ordem sua biblioteca foi um tal de Dionísio, que logo fugiu.251 Tiranião classificou a coleção de uma maneira tal que ele ficou satisfeito. Sabe-se, além disso, que Ático, rico erudito romano, foi dono de plurimi librarü (muitos copistas) e de uma respeitável série de volumes que décadas depois já não existiam.

As vendas de livros, que recebiam o nome de libraria tabernaf eram abundantes. Um dos primeiros a chamá-las assim num livro, e talvez a ele se deva sua consagração, foi Aulo Gélio, que disse: "In libraria, ego et Julius Pauluspoeta consederamus Não é impossível que a influência desse autor impusesse a palavra na Europa a partir do século XIV. A decadência e as repetidas crises, naturalmente, condenaram esse comércio e, depois da queda do Império, não restou nenhuma dessas vendas.

Em outras regiões do Império também se edificaram bibliotecas pequenas e limitadas (uma única seção para autores latinos, em vez de duas). Destruída Cartago, junto com sua biblioteca, em 146 a.C., Augusto julgou apropriado levantar outra cidade sobre as ruínas, que, certamente, contou com uma biblioteca. Na cidade de Timgad, fundada pelo próprio Trajano em torno do ano 100, existiu uma biblioteca posteriormente reduzida a ruínas.

Diversas inscrições atestam a existência de uma biblioteca em Como, doada por Plínio, o Jovem, outra em Suesa Aurunca, na Campânia, construída por Matídia, parente de Adriano, e houve coleções de livros em Volsini e em Tibur. Em Pérgamo, Adriano contemplou a região com uma biblioteca, e pelo que sabemos uma mulher chamada Flávia Melitine doou uma biblioteca ao santuário de Asclépio (equivalente ao Esculápio romano), destinada a entreter os doentes. Na Espanha romana, as cidades mais importantes foram Tarraco, Emérita e Hispalis, onde se supõe que havia duas bibliotecas, mas não há documentação sobre a existência de bibliotecas públicas ou mesmo particulares de algum nobre, militar ou estudioso.

Em Atenas se encontram os restos de uma biblioteca criada em homenagem a Trajano por um homem chamado Tito Flávio Pantaino, que doou, "de seu próprio bolso, o átrio, a biblioteca com seus livros e todos os móveis" (segundo informa uma inscrição do ano 100). Há outra inscrição em que está o regulamento de uso da biblioteca (antecedente que pode ser o primeiro encontrado desse tipo): "Nenhum livro pode ser levado, de acordo com o que juramos. [...] A biblioteca está aberta desde a primeira até a hora sexta [...]." O horário se referia às manhãs, por motivo de comodidade visual. Pensa-se que umas esculturas, encontradas nas redondezas, em que se personificavam a Ilíada e a Odisséia, faziam parte da estrutura dessa antiga biblioteca.

O imperador Adriano, por sua vez, mandou construir uma biblioteca em Atenas, por volta de 132, que tinha uma piscina e um complexo retangular de pelo menos 82 x 60m. Em 267, o prédio foi destruído.

Uma inscrição, feita por volta de 135, precisou: "Para Tibério Júlio Áquila Polemeano, cônsul, procônsul da Ásia, Tibério Júlio Áquila Polemeano, cônsul, seu filho, construiu a biblioteca de Celso do seu próprio bolso, com sua decoração, santuário e livros [...]." Essa biblioteca, que hoje está avista de todos nas ruínas que permanecem no que foi a antiga cidade de Éfeso (agora na Turquia), foi iniciada em 110, num esforço para seguir o estilo do arquiteto Vitruoya. Constava de um sarcófago monumental em mármore e uma fachada de dois níveis enfeitados com colunas. Nos nichos havia estátuas representando diferentes virtudes como a Sabedoria, o Conhecimento, a Inteligência e a Excelência. Ao que parece, o interior da biblioteca media 10,90 x 16,72 m. A invasão do ano 262 acabou com ela, mas sua fachada permaneceu intacta. Nessa triste ocasião se perderam pelo menos 12 mil volumes.

A queda do Império Romano do Ocidente piorou o paciente trabalho de conservação. Alarico tomou Roma com suas hordas bárbaras em 410. De 24 de agosto, dia do acontecimento, até uma semana depois, a cidade foi saqueada sem piedade. Os papiros serviram como tochas iluminando as orgias. Um dos chefes militares dos godos, quando suas tropas incendiaram as bibliotecas, levantou a voz e propôs deixá-las aos inimigos como distração adequada para afastá-los dos exercícios militares e entregá-los a ocupações sedentárias e ociosas. Montaigne, fonte dessa anedota, relatou-a como se se tratasse de um modelo absolutamente contrário aos fatos aqui expostos.



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