Esses estranhos Homens deveriam ficar muito satisfeitos por serem julgados mais maldosos dó que realmente são



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“Eu repito minha pergunta, Doutor”, reafirmou Elphaba. “Esse é um filhote muito jovem. Onde está a sua mãe? Por que foi tirado de sua mãe em idade tão tenra? Como ele poderá se alimentar?”

“Essas são perguntas impertinentes para a questão acadêmica ora abordada”, disse o Doutor. “Contudo, o coração dos jovens sangra facilmente. A mãe, devemos dizer, morreu numa explosão tristemente marcada. Vamos presumir, em consideração ao argumento, que não havia meio de discernir se a mãe era uma Leoa ou uma leoa. Afinal, tal como vocês devem ter sabido, alguns Animais estão voltando à vida selvagem para escapar às implicações das leis em vigor.”

Elphaba sentou-se, perplexa. “Isso não me parece justo”, ela disse a Boq e Avaric. “Em consideração à ciência, arrastar um filhote para cá sem a sua mãe. Olhem como ele parece aterrorizado. Ele está tremendo. E não é de frio.”

Outros estudantes começaram a arriscar opiniões, mas o Doutor as descartava uma por uma. O ponto em questão era que, aparentemente, sem a linguagem e chaves contextuais, em suas etapas infantis uma besta não era claramente Animal ou animal.

“Isso tem uma implicação política”, disse Elphaba ruidosamente. “Eu pensei que a matéria era ciências da vida, não acontecimentos da atualidade.”

Boq e Avaric fizeram com que se calasse. Ela estava ganhando uma terrível reputação como gritalhona.

O Doutor não voltou a citar o episódio depois que todos haviam digerido o ponto em questão. Mas, finalmente, ele se virou e disse: “Agora, vocês pensam que, se pudéssemos cauterizar aquela parte do cérebro que desenvolve a linguagem, poderíamos eliminar a idéia de dor e, portanto, a sua existência? Testes iniciais nesse filhote de leão mostram resultados interessantes”. Ele tinha apanhado um pequeno martelo com uma cabeça de borracha e uma seringa. O animal se ergueu e silvou, e depois recuou e caiu no chão, e correu como um raio em direção à porta, que havia sido fechada e trancada deste lado tal como na semana anterior.

Mas não foi apenas Elphaba que se levantou para gritar. Quase uma dúzia de estudantes estavam gritando com o Doutor. “Dor? Eliminar a dor? Olhe para a coisa, está aterrorizada! Ela já sente dor! Não faça isso, o que você é, louco?”

O Doutor parou, apertando de forma visível o fecho de sua pasta. “Eu não vou presidir uma tão chocante recusa ao aprendizado!”, ele disse, afrontado. “Vocês estão regredindo a conclusões descuidadas baseadas em sentimentos e não em observação. Tragam a besta aqui. Tragam-na de volta. Jovem senhora, eu insisto. Eu ficarei completamente contrariado.”

Mas duas garotas de Briscoe Hall desobedeceram e fugiram da sala de aula carregando o leão enfurecido num avental. A sala degenerou em tumulto e o Doutor Nikidik escapuliu do palco. Elphaba virou-se para Boq e disse: “Bem, acho que não vou fazer a boa pergunta de Glinda sobre a diferença entre a ciência e a magia, vou? Descemos a uma escala bem diferente hoje”. Mas sua voz estava trêmula.

“Você sentiu por aquele animal, não foi?”. Boq estava comovido. “Elfinha, você está tremendo. Não digo isso de uma maneira insultuosa, mas você quase ficou branca de paixão. Venha, vamos nos esconder e pegar um chá no café da Praça da Ferrovia, em comemoração aos velhos tempos.”


4
Talvez qualquer aproximação acidental de pessoas tenha um curto período de graça, que vai da timidez e do preconceito no início a uma eventual repugnância e traição no fim. Para Boq, parecia que sua obsessão de verão com a então Galinda fazia sentido apenas como introdução para essa subseqüente e mais madura acomodação que encontrou num círculo de amigos que começou a se sentir inevitável e permanentemente unido.

Ainda não fora permitido o acesso de rapazes ao Crage Hall, nem as garotas tinham acesso às escolas masculinas, mas a área urbana central de Shiz se tornara uma extensão das salas de aula e palestra nas quais eles estavam autorizados a se misturar. Numa tarde de meio de semana, numa manhã de fim de semana, encontravam-se às margens do canal com uma garrafa de vinho, ou num café ou num boteco de estudantes, ou caminhavam e discutiam pontos da arquitetura de Shiz, ou riam dos excessos de seus professores. Boq e Avaric, Elphaba e Nessarose (com a Babá), Glinda, e às vezes Pfannee e Shenshen e Milla, e às vezes Crope e Tibbett. E Crope trouxe Fiyero consigo e apresentou-o, o que gelou Tibbett por mais ou menos uma semana até a noite em que Fiyero disse, a seu modo tímido e cerimonioso: “É claro ― eu fui casado por uns tempos. Nós nos casamos bem jovens lá em Vinkus”. Os outros ficaram espantados com a notícia, e se sentiram ainda mais jovens.

Para sermos exatos, Elphaba e Avaric alfinetavam-se um ao outro implacavelmente. Nessarose abusava da paciência de todos com suas arengas religiosas. A torrente de observações picantes de Crope e Tibbett fez com que fossem atirados no canal mais que uma vez. Mas Boq estava aliviado por descobrir que sua paixonite por Glinda estava se dissipando um pouco. Ela se sentava junto a uma toalha de piquenique com um ar de autoconfiança, e desviava as conversas de si mesma. Ele amara a garota que amava o seu próprio glamour, e essa garota parecia haver desaparecido. Mas ele estava feliz por ter Glinda como uma amiga. Bem, em resumo: ele amara Galinda e essa agora era Glinda. Alguém que ele não podia mais entender completamente. Caso encerrado.

Era um círculo influente.

Todas as jovens evitavam Madame Morrible quando podiam. Numa certa noite fria, contudo, Grommetik foi à procura das irmãs Thropp. A Babá se zangou e enrolou os cordões de um avental novo na cintura, e empurrou Nessarose e Elphaba escada abaixo em direção à sala da Direto-ra. “Eu odeio esse Grommetik”, disse Nessarose. “Como é que ele funciona mesmo? É mecânica ou magia, ou alguma combinação dos dois?”

“Eu sempre imaginei uma porção de absurdos ― que havia um anão ali dentro, ou uma família de elfos acrobatas, cada um comandando um membro”, disse Elphaba. “Toda vez que Grommetik se aproxima, minha mão sente uma estranha ânsia de pegar um martelo.”

“Eu não consigo imaginar”, disse Nessarose. “Que uma mão possua ânsias, quero dizer.”

“Silêncio, vocês duas, a coisa tem ouvidos”, disse a Babá.

Madame Morrible lançava um olhar sobre os jornais de negócios, fazendo algumas anotações laterais, antes de se dignar a prestar atenção às suas estudantes. “Isso não me tomará senão um momentinho”, ela disse. “Eu tenho uma carta de seu querido pai, e um pacote para vocês. Achei que era mais amável dar as notícias pessoalmente.”

“Notícias?”, disse Nessarose, ficando pálida.

“Ele podia ter escrito tanto a nós quanto à senhora”, disse Elphaba.

Madame Morrible a ignorou. “Ele escreve para perguntar da saúde e do progresso de Nessarose, e para dizer a vocês duas que entrará em jejum e penitência pelo retorno de Ozma Tippetarius.”

“Oh, a garotinha abençoada”, disse a Babá, se entusiasmando ao ver surgir um de seus assuntos favoritos. “Quando o Mágico tomou o Palácio de assalto há tantos anos e prendeu o Regente Ozma, nós todos pensamos que a santa filha de Ozma revidaria com um raio na cabeça do Mágico. Mas, dizem que ela se evadiu e congelou numa caverna, como Lurline. Será que Frexpar foi capaz de derretê-la ― será que soou a hora de ela retornar?”

“Por favor”, disse Madame Morrible às irmãs, depois de dar um olhar azedo de relance para a Babá: “Eu não as chamei aqui para que sua Babá se pusesse a discutir essa apocrifia contemporânea, nem para caluniar nosso glorioso Mágico. A transição de poder foi pacífica. Que a saúde do Regente Ozma tenha sido afetada quando ocorreu a tomada da casa foi uma me-ra coincidência, nada mais. Quanto ao poder de seu pai para despertar a desaparecida criança real de algum insubstancial estado de sonolência ― bem, vocês mais ou menos admitiram para mim que seu pai é excêntrico, se não louco. Posso apenas desejar a ele que tenha saúde em suas atividades. Mas sinto que é meu dever dizer a vocês, garotas, que nós não acolhemos atitudes indisciplinadas em Crage Hall. Espero que vocês não tenham importado os anseios monárquicos de seu pai para os dormitórios daqui”.

“Nós devemos reverência ao Deus Inominável, não ao Mágico nem a algum possível remanescente da Família Real”, Nessarose disse orgulhosa-mente.

“Não tenho nenhuma posição quanto a esse assunto”, murmurou Elphaba, “exceto que papai adora causas perdidas.”

“Muito bem”, disse a Diretora. “É assim que deve ser. Agora, recebi um pacote para vocês.” Ela o passou para Elphaba, mas acrescentou: “É para Nessarose, eu acho”.

“Abra, Elfinha, por favor”, disse Nessarose. A Babá se encostou para ver.

Elphaba desfez o cordão e abriu uma caixa de madeira. De uma pilha de fitas de madeira, ela tirou um sapato, e depois outro. Eram prateados? ― ou azuis? ― ou então vermelhos? ― laqueados com um brilho de casca de confeito no polimento? Era difícil de perceber e não importava; o efeito era deslumbrante. Até Madame Morrible perdeu o fôlego ante o seu esplendor. A superfície dos sapatos parecia pulsar com centenas de reflexos e refrações. À luz do fogo, era como olhar para corpúsculos ferventes de sangue colocados sob uma lente de aumento.

“Ele escreve que os comprou para você de alguma vendedora ambulante desdentada no subúrbio de Ovvels”, disse Madame Morrible, “e que ele os revestiu com contas de vidro prateado feitas por ele mesmo ― ou que alguém o ensinou a fazer...”

“Coração de Tartaruga”, disse a Babá, soturna.

“― e” ― Madame Morrible deu uma pancadinha na carta, olhando furtivamente ― “ele diz que quis dar alguma coisa especial antes que você partisse para a universidade, mas nas súbitas circunstâncias da doença de Ama Clutch... blablablá... ele ficou desprevenido. Assim, ele os envia para a sua Nessarose para que mantenha seus belos pés aquecidos e enxutos e belos, e os manda com todo o amor.”

Elphaba enfiou seus dedos através dos arabescos formados pelas fitas de madeira. Não havia nada mais na caixa, nada para ela.

“Não são maravilhosos?”, Nessarose exclamou. “Elfinha, coloque-os nos meus pés, me faria esse favor? Oh, como eles reluzem!”

Elphaba ficou de joelhos diante de sua irmã. Nessarose sentou-se, fazendo uma pose tão regia quanto uma Ozma, a espinha ereta e o rosto brilhando. Elphaba ergueu os pés de sua irmã e tirou-lhe os chinelos domésticos comuns, e substituiu-os pelos sapatos deslumbrantes.

“Quanta consideração ele tem por mim!”, disse Nessarose.

“Boa coisa você poder se apoiar nos seus dois pés”, disse a Babá a Elphaba, e pôs sua velha mão indulgente sobre as suas omoplatas, mas Elphaba a repeliu.

“Eles são pra lá de maravilhosos”, disse Elphaba, exagerando. “Nessarose, eles foram feitos para você. Servem como um sonho.”

“Oh, Elfinha, não fique contrariada”, Nessarose disse, olhando para seus pés. “Não arruíne minha felicidade com ressentimento, está bem? Ele sabe que você não precisa desse tipo de coisa...”

“Claro que não”, disse Elphaba. “É claro que eu não preciso.”

Naquela noite os amigos correram o risco de ultrapassar o toque de recolher pedindo mais uma garrafa de vinho. A Babá desaprovou e reclamou, mas como entornou sua porção tão bem quanto os outros, foi controlada. Fiyero contou a história de como havia se casado aos sete anos com uma garota de uma tribo vizinha. Todos ficaram boquiabertos com sua aparente falta de vergonha. Ele vira sua noiva apenas uma vez, por acaso, quando os dois tinham perto de nove anos. “Eu não vou me unir fisicamente a ela até que tenha vinte anos, e eu estou só com dezoito”, acrescentou. Com o alívio de imaginar que ele podia ser ainda tão virgem quanto o resto da turma, eles pediram mais outra garrafa.

As velas tremulavam, uma leve chuva outonal caía. Embora o aposento fosse seco, Elphaba se cobrira com o seu manto como se antecipasse a caminhada que faria para casa. Ela fora afetada pela indiferença de Frex. Ela e Nessarose começaram a contar histórias engraçadas sobre o pai, como se para provar a si mesmas e a todo mundo que não havia nada fora do lugar. Nessarose, que bebia pouco, até se permitiu dar umas risadas. “Apesar de minha aparência, ou talvez por causa dela, ele sempre me chamou de seu bichinho bonito”, ela disse, aludindo à sua falta de braços pela primeira vez em público. “Ele dizia: ‘Vem cá, meu bichinho, e deixa eu te dar um pedaço de maçã’. E eu ia andando da melhor maneira que podia, tombando e vacilando se a Babá ou Elfinha ou a Mamãe não estavam ali para me ajudar, e caía no colo de meu pai, e me apoiava nele sorrindo, e ele punha pedacinhos da fruta na minha boca.”

“De que ele te chamava, Elfinha?”, perguntou Glinda.

“Ele a chamava de Fabala”, interrompeu Nessarose.

“Em casa, em casa apenas”, Elphaba disse.

“É verdade, você é a pequena Fabala de seu pai”, murmurou a Babá, quase que falando só consigo mesma, fora do círculo das faces sorridentes. “Pequena Fabala, pequena Elphaba, Elfinha.”

“Ele nunca me chamou de bichinho”, disse Elphaba, erguendo seu copo para a irmã. “Mas todos sabemos que ele disse a verdade, já que Nessarose é a mascote da família. Por isso, ganhou aqueles sapatos esplêndidos.”

Nessarose corou e aceitou uma torrada. “Ah, mas enquanto eu obtinha essa atenção devido à minha condição, você cativava o coração dele quando cantava”, ela disse.

“Cativava seu coração? Hah. Você quer dizer que eu desempenhava uma função necessária.”

Mas os outros disseram a Elphaba: “Oh, então você sabe cantar? Ora essa! Cante, cante, você vai ter de cantar! Mais uma garrafa, mais um copo, recuem as cadeiras, e antes de irmos embora, você vai ter de cantar! Vamos lá!”

“Só se todos cantarem juntos”, disse Elphaba, bancando a mandona. “Boq? Alguma ciranda de Munchkin? Avaric, uma balada gillikinesa? Glinda? Babá, um acalanto?”

“Sabemos um monte de porcarias, se você for, vamos atrás”, disseram Crope e Tibbett.

“E eu cantarei um canto de caça de Vinkus” disse Fiyero. Todos riram com prazer e bateram em suas costas. Então, Elphaba teve de ficar em pé, pôr sua cadeira de lado, limpar a sua garganta e fazer um som na mão fechada, e começar. Como se estivesse cantando outra vez para seu pai, depois de tanto tempo.

A dona do bar bateu com um trapo em alguns velhos barulhentos para que ficassem quietos, e os jogadores de dardos baixaram os braços. O ambiente todo silenciou. Elphaba cantou uma cançoneta ali onde estava, de saudade e de estranhamento, de dias remotos e futuros. Os desconhecidos fecharam os olhos para ouvir.

Boq também. Elphaba tinha uma voz aceitável. Ele viu o lugar imaginário que ela invocava, uma terra onde a injustiça e a crueldade coletiva e a ordem despótica e a mão empobrecedora da seca não se uniam para pegar todos pelos colarinhos. Não, ele não estava lhe dando crédito: Elphaba tinha uma boa voz. Era controlada e sensível e não histriônica. Ele ouviu até o fim, e a canção se apagou no silêncio de um boteco respeitoso. Mais tarde, pensou: A melodia se apagou como um arco-íris depois de uma tempestade, ou como ventos finalmente apaziguados; e o que restou foi calma e promessa e consolo.

“Você canta agora, você prometeu”, gritou Elphaba, apontando Fiyero, mas ninguém queria cantar novamente, porque ela o fizera tão bem. Nessarose pediu a Babá que enxugasse uma lágrima que aparecera no canto de seu olho.

“Elphaba diz que não é religiosa, mas vejam com que sentimento ela canta sobre a vida após a morte”, disse Nessarose, e dessa vez ninguém se sentiu disposto a objetar.

5
Numa certa manhã bem cedo, quando o mundo parecia ter ficado grisalho de tanta geada, Grommetik chegou com um bilhete para Glinda. Ama Clutch, ao que parecia, estava nas últimas. Glinda e suas colegas de quarto correram para a enfermaria.

A Diretora encontrou-as lá, e levou-as para uma alcova sem janelas. Ama Clutch estava se debatendo na cama e conversando com a fronha. “Não me provoque”, ela dizia raivosamente, “pois o que posso fazer por você? Vou abusar de sua boa vontade, patinha, e colocar meus cachos oleosos sobre seu fino tecido e cravarei meus dentes nas suas bordas de laçarotes aplicados! Você será uma estúpida se permitir isso, eu garanto! Eu não me importo com questões de serviço! É tudo tapeação, te juro, tapeação!”

“Ama Clutch, Ama Clutch, sou eu”, disse Glinda. “Ouça, querida, sou eu! É sua pequena Galinda.”

Ama Clutch virou a sua cabeça de um lado para outro. “Seu protesto é insultante para seus antepassados!”, ela continuou, dirigindo seus olhos para a fronha outra vez. “Aquelas plantações de algodão nas margens do Água Mansa não se deixaram colher para que você pudesse se estender aqui como uma esteira e deixasse qualquer pessoa imunda babar sobre você com papo-furado de noite! Não faz um pingo de sentido!”

“Ama!”, Glinda chorava. “Por favor! Você está delirando!”

“Aha, você vê que eu não tenho nada a dizer sobre isso”, disse Ama Clutch com satisfação.

“Volte a si, Ama, volte a si, uma vez mais antes de ir embora!”

“Oh, doce Lurline, isso é horrível”, a Babá dizia. “Queridinhas, se eu ficar desse jeito, vocês façam o favor de me envenenar, está bem?”

“Ela está indo embora, eu bem vejo”, Elphaba disse. “Eu vi o bastante disso no Estado de Quadling, eu conheço os sinais. Glinda, diga o que você precisa dizer, rapidamente.”

“Madame Morrible, posso ter um pouco de privacidade?”, Glinda disse.

“Eu ficarei ao seu lado e lhe darei apoio. É meu dever para com minhas garotas”, disse a Diretora, pousando as mãos roliças com decisão em sua cintura. Mas Elphaba e a Babá levantaram-se e foram levando-a para fora da alcova, em direção à sala, atravessando a porta, fechando-a e trancando-a. A Babá foi cacarejando o tempo todo, dizendo: “Que delicadeza da sua parte, Madame Diretora, mas não é preciso. Não é preciso mesmo”.

Glinda agarrou a mão de Ama Clutch. Gotas de suor branco estavam se formando como água de tomate na testa da empregada. Ela lutou por afastar a mão de Glinda, mas sua força estava se esvaindo. “Ama Clutch, você está morrendo”, Glinda disse, “e isso é culpa minha.”

“Oh, pare com isso”, Elphaba disse.

“É sim”, Glinda disse com fúria. “É sim”.

“Não quero discutir isso”, disse Elphaba, “quero dizer que deve tirar você mesma dessa conversa; esta é a morte dela, não a sua entrevista com o Deus Inominável. Vamos lá. Faça alguma coisa!”

Glinda agarrou as mãos, as duas mãos, com mais força ainda. “Eu vou fazer uma mágica para trazer você de volta”, ela disse, entre os dentes que rangiam. “Ama Clutch, você faça como eu digo! Ainda sou a sua patroa e é melhor que você me obedeça! Agora, ouça este feitiço e comporte-se!”

Os dentes de Ama rangeram, os olhos viraram, e o queixo se transformou numa ponta, como se tentasse empalar algum demônio invisível que estivesse no ar acima de sua cama. Os olhos de Glinda se fecharam e seus maxilares se agitaram, e uma fieira de sons, sílabas incoerentes até para ela mesma, foi se desenrolando de seus lábios lívidos.

“Espero que você não vá explodi-la como fez com o sanduíche”, resmungou Elphaba.

Glinda ignorou isso. Ela zumbia e atuava, ela se agitava e arquejava. As pálpebras de Ama Clutch se moveram tão freneticamente sobre os olhos fechados que parecia que suas órbitas estavam mascando seus próprios olhos. “Magicordium senssus ovinda clenx”, Glinda concluiu bem alto, “e se isso não funcionar, desisto; mesmo os cheiros e sinos de um equipamento completo não ajudariam, eu acho.”

Em seu leito de palha Ama Clutch caiu de costas. Um pouco de sangue escorreu do canto de cada olho. Mas o frenético movimento giratório do foco havia cessado. “Oh, minha querida”, ela murmurou, “então, você está bem, ou eu estou morta agora?”

“Ainda não”, disse Glinda. “Sim, querida Ama, sim, estou bem. Mas, meu amor, eu acho que você está partindo.”

“Claro que estou, o Vento está aqui, você não ouve?”, Ama Clutch disse. “Não importa. Oh, lá está a Elfinha também. Adeus, minhas filhotas. Fiquem longe do Vento até que o tempo melhore ou serão sopradas na direção errada.”

Glinda disse: “Ama Clutch, eu tenho uma coisa para lhe dizer ― eu tenho de lhe pedir desculpas...”.

Mas Elphaba avançou, tirando Glinda da linha de visão de Ama Clutch, e disse: “Ama Clutch, antes que você vá, conte-nos quem matou o Doutor Dillamond”.

“Claro que vocês sabem”, Ama Clurch disse.

“Dê-nos certeza”, Elphaba disse.

“Bem, eu vi, quero dizer, quase vi. Tinha acabado de acontecer e a faca ainda estava lá” ― Ama Clutch lutava penosamente por fôlego ― “manchada com o sangue que não tivera tempo de secar.”

“O que você viu? Isso é importante.”

“Eu vi a faca no ar, eu vi o Vento chegar para levar o Doutor Dillamond embora, eu vi a coisa mecânica se virar e o tempo do Bode se findou.”

“Foi Grommetik, não foi?”, Elphaba murmurou, tentando fazer com que a idosa dissesse as palavras esperadas.

“Bem, é o que eu estou dizendo, patinha”, disse Ama Clutch.

“E ele viu a senhora, ele se virou na sota direção?”, gritou Glinda. “Foi isso que a adoeceu, Ama Clutch?”

“Era minha hora de ficar doente”, disse Ama Clutch gentilmente, “então, eu não podia me queixar. E agora é minha hora de morrer, por isso me deixe. Só aperte a minha mão, querida.”

“Mas a culpa é minha...” começou Glinda.

“Seria melhor para mim que você se calasse, doce Galinda, minha filhotinha”, disse Ama Clutch docemente, e afagou a mão de Glinda. Depois, fechou seus olhos e aspirou e expirou algumas vezes. Elas ficaram no quarto numa espécie de silêncio que parecia um pouco o da classe operária de Gillikin, embora fosse difícil, mais tarde, explicar por quê. Lá fora, Madame Morrible subia e descia as tábuas do assoalho, contando os passos. Então, elas imaginaram ouvir um Vento, ou o eco de um Vento, e Ama Clutch se foi, e a ultra-submissa fronha soltou um pequeno derramamento de sumo humano da beira de sua boca afrouxada.

6
O funeral foi modesto, o cumprimento da louvação e sepultamento de praxe. As amigas íntimas de Glinda compareceram, preenchendo dois bancos, e na segunda fileira da capela um bando de Amas compunham um cortejo profissional. O resto da capela estava vazio.

Depois que o cadáver em seu lençol dobrado deslizou pelo escorrega-douro lubrificado em direção ao forno crematório, carpideiras e confrades se recolheram à sala particular de Madame Morrible, onde ela provou que não autorizara gastos com os refrescos. O chá era de um estoque antigo, mofado como serragem, os biscoitos eram duros, e não havia creme de açafrão nem geléia de tamorna. Glinda disse, reprovadora, à Diretora: “Nem mesmo uma tigelinha de creme?”. E Madame Morrible respondeu: “Minha jovem, eu tento poupar minhas protegidas do pior em matéria de carências alimentares fazendo compras criteriosas e me abstendo pessoalmente, mas não sou inteiramente responsável pela sua ignorância. Se as pessoas obedecessem o Mágico em caráter absoluto, haveria abundância. Você não percebe que as condições estão se tornando escassas e as vacas estão morrendo de inanição a duzentas milhas daqui? Isso torna o creme de açafrão muito caro no mercado”. Glinda começou a se afastar, mas Madame Morrible alcançou-a com um lance dos dedos acolchoados, bulbosos e enfeitados de jóias. O toque fez o sangue de Glinda esfriar. “Eu gostaria de conversar com você, e com a Senhorita Nessarose e a Senhorita Elphaba”, disse a Diretora. “Depois que os convidados se retirarem. Por favor, aguarde.”

“Fomos intimadas a uma conversa”, sussurrou Glinda às irmãs Thropp. “Temos de soltar o berro.”

“Nem uma palavra sobre o que Ama Clutch disse ― ou que ela ficou lúcida”, disse Elphaba ansiosamente. “Entenderam isso, Nessa? Bá?”

Todas concordaram. Boq e Avaric, dizendo adeusinhos, disseram que o grupo voltaria a se reunir no boteco da Parada do Regente. As garotas aceitaram se encontrar com eles lá depois da conversa com a Diretora. Elas pretendiam fazer um memorial mais honesto para Ama Clutch no Pêssego e Rins.


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