Silvia Maria de Araújo · Maria Aparecida Bridi · Benilde Lenzi Motim


Partidos políticos e o quadro partidário no Brasil



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Partidos políticos e o quadro partidário no Brasil

Os partidos políticos são agrupamentos sociais em que se organizam as diferentes correntes ideológicas, cada qual com a sua concepção de forma de governo, de exercício do poder, de participação na política e de solução para os problemas do país.

Ainda que suas ideologias e propostas apresentem muitas semelhanças entre si, a multiplicidade de partidos políticos tem sido uma das características da política brasileira neste início de século. Em 2016, mais de trinta agremiações políticas de diferentes tamanhos compunham o quadro partidário, mas apenas as bancadas de cinco partidos concentravam metade dos deputados do Congresso: Partido do Movimento Democrático Brasileiro (PMDB), Partido Popular (PP), Partido Social Democrático (PSD), Partido da Social Democracia Brasileira (PSDB) e Partido dos Trabalhadores (PT).

Os partidos políticos são importantes instrumentos da democracia, pois é por meio deles que os cidadãos também podem participar de um coletivo, discutir propostas, pensar soluções para problemas sociais, escolher seus representantes para se candidatar nas eleições de todos os níveis. No século XX, os partidos concentraram as aspirações políticas dos cidadãos, ao propiciarem condições de participação e de militância muitas vezes ligadas a movimentos sociais.

O papel social dos partidos na formação política vem se alterando pelas mudanças das ideologias e pela fragmentação das classes sociais, entre outros fatores. Ainda assim, é difícil imaginar uma democracia sem partidos.

Fim do complemento.



Pesquisa

Entre nos sites dos partidos e procure conhecer as propostas de cada um deles. Anote as principais características, quais grupos procuram representar e quais suas principais bandeiras.



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Boxe complementar:



Intelectuais leem o mundo social

Neste trecho de uma obra clássica sobre o século XX, Era dos extremos, o historiador inglês Eric Hobsbawm (1917-2012) refere-se aos países democráticos da Europa:



No fim do século, um grande número de cidadãos se retirava da política, deixando as questões do Estado à "classe política" [...]. Poder-se-ia supor que a despolitização deixaria as autoridades mais livres para tomar decisões. Na verdade, teve o efeito oposto. As minorias que saíam em campanha, às vezes por questões específicas de interesse público, com mais frequência por algum interesse seccional, podiam interferir nos tranquilos processos de governo tão efetivamente, e às vezes até mais, do que partidos políticos de propósitos abrangentes, pois, ao contrário destes, cada grupo de pressão podia concentrar sua energia na busca de um objetivo único. Além disso, a tendência cada vez mais sistemática de governos contornarem o processo eleitoral ampliou a função política dos meios de comunicação, que agora chegavam a todas as casas, proporcionando de longe o mais poderoso meio de comunicação da esfera pública para homens, mulheres e crianças privados. Sua capacidade de descobrir e publicar o que as autoridades desejavam manter na sombra, e de dar expressão a sentimentos públicos que não eram, nem podiam ser, articulados pelos mecanismos formais da democracia, transformavam esses meios de comunicação nos grandes atores do cenário público. Os políticos os usavam e temiam.

HOBSBAWM, Eric. Era dos extremos: o breve século XX - 1914-1991. 2ª ed. São Paulo: Companhia das Letras, 1995. p. 558-559.

· Reunidos em equipes, releiam a análise de Hobsbawm. Depois, pesquisem edições recentes de jornais e revistas, além de notícias em blogs e sites. Juntos, avaliem a influência dos meios de comunicação na vida política brasileira.

Fim do complemento.

Duas visões sobre o Estado capitalista

As mudanças no Estado e no seu papel têm relação com os grupos políticos no exercício do poder ou que exercem influência sobre a esfera política. No último século, em países capitalistas democráticos, duas formas de atuação do Estado se sobressaíram, conforme a ação mais ou menos interventora do Estado: o Estado Social (ou Estado do Bem -Estar Social) e o Estado neoliberal. O Estado do Bem-Estar Social (Welfare State), que se estabeleceu em determinados países da Europa, atua no sentido de garantir seguridade social e proteção ao indivíduo contra adversidades na economia e excessos do mercado. O Estado neoliberal, por sua vez, propõe a intervenção mínima na economia e nas relações de trabalho.

A intervenção maior do Estado apresentou-se como solução à crise pela qual o sistema capitalista passou na década de 1930. Segundo o sociólogo alemão Jürgen Habermas (1929-), essa e as outras crises que se sucederam no processo de acumulação mundial representavam uma ameaça muito direta à integração social.

FONTE: Bettmann/CORBIS/Latinstock

FONTE: Timothy A. Clary/AFP

LEGENDA: Dois momentos de crise econômica global: acima, especulador da Bolsa de Valores de Nova York, Estados Unidos, tenta vender seu carro em 1929 após ir à falência. O cartaz diz: "Cem dólares compram este carro. Preciso do dinheiro. Perdi tudo no mercado de ações". Ao lado, executivos desempregados se apresentam em rua da mesma cidade, em 2008. O cartaz pede socorro financeiro.



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Até então, os Estados capitalistas pautavam-se pela doutrina liberal do laissez-faire, pela qual a livre-iniciativa, a livre-concorrência e a regulamentação do mercado seriam princípios para o desenvolvimento econômico e social. No entanto, a especulação financeira gerou uma grave crise que levou milhões de pessoas na Europa e nos Estados Unidos ao desemprego, no início do século XX. Os reflexos da chamada Grande Depressão se fizeram sentir também no Brasil, ocasionando, por exemplo, a retração da venda de café brasileiro, um dos principais produtos de exportação na época. Isso levou o governo a tomar medidas como a queima de estoques de café com vistas a sustentar o preço no mercado.

A formação plena do Estado de Bem-Estar Social ocorreu após a Segunda Guerra Mundial, em alguns países europeus, e sua inspiração foi o New Deal, criado pelo governo dos Estados Unidos, nos anos 1930, para salvar a economia estadunidense da Grande Depressão. Nessa configuração, ampliaram-se as funções do Estado, dentre as quais se incluíram: regular a economia, evitando práticas abusivas das grandes companhias; buscar conter as crises econômicas e evitar o desemprego por meio de subsídios a empresas e investimentos diretos em obras de infraestrutura; e ampliar a oferta de serviços de saúde, educação, transporte, habitação e outros, assegurando condições mínimas de cidadania e de renda para a população. Com a adoção de medidas keynesianas, nas quais se propõe a intervenção do Estado em situações de crise no sistema capitalista, inaugurou-se uma nova fase do capitalismo, definido por alguns autores como Capitalismo de Estado. O liberalismo entrou em declínio, uma vez que o mercado se viu incapaz de encontrar e propor soluções viáveis socialmente para a crise.

Glossário:



laissez-faire: termo derivado da expressão francesa "Laissez-faire, laissez-passer", que significa 'Deixe fazer, deixe passar', sintetizando a ideia de que o Estado deve interferir o mínimo possível na economia.

New Deal: série de programas do governo dos Estados Unidos, entre 1933 e 1937, com o objetivo de minimizar os efeitos da crise econômica. O programa focou em investimento maciço em obras públicas, destruição dos estoques de gêneros agrícolas, controle sobre os preços e a produção, e diminuição da jornada de trabalho.

Fim do glossário.

LEGENDA: Operários reconstroem o edifício do centro cultural Titaina Palace, o maior de Berlim (Alemanha Ocidental) em 1950. A obra fazia parte de um conjunto de medidas que utilizava recursos públicos para a reconstrução do país após a Segunda Guerra Mundial, gerando milhares de empregos.

FONTE: Bettmann/CORBIS/Latinstock



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O Estado de Bem-Estar Social constitui-se, então, como um provedor de serviços à população (daí ser chamado Estado-Providência) e como uma rede de proteção social contra os excessos do sistema capitalista, sem, no entanto, se opor a ele. Ao contrário: suas políticas de estímulo à economia também visavam garantir que as empresas mantivessem sua produção e seu lucro. Desse modo, propiciou (pelo menos na Europa ocidental e, em certa medida, nos EUA) uma relativa conciliação de interesses no âmbito da luta entre capital e trabalho.

Nos anos 1970, diante de outra crise mundial financeira e petrolífera, economistas propuseram que o Estado diminuísse seus gastos e seu papel na condução da economia. Defendiam o Estado neoliberal, no qual os investimentos em infraestrutura deveriam ser conduzidos pela iniciativa privada e os serviços sociais públicos reduzidos, deixando aos indivíduos o gasto com os serviços que utilizassem. Propunha-se que a economia fosse menos regulamentada, de modo que as empresas atuassem com mais liberdade, o que garantiria o crescimento econômico.

Esses preceitos, implementados primeiramente na Inglaterra e nos Estados Unidos, disseminaram-se para outros países, especialmente após a queda do socialismo no Leste Europeu. Ao mesmo tempo que conglomerados industriais e financeiros tiveram condições de se expandir e aumentar seus lucros, milhares de pessoas viram-se desempregadas, devido às inovações tecnológicas e à flexibilização do trabalho, além do pouco amparo social.

As críticas ao Estado neoliberal intensificaram-se a partir de 2008, quando se instaurou uma nova crise econômica no mundo. Para alguns estudiosos, a desregulamentação financeira promovida nas últimas décadas foi uma das principais causas dessa crise. Mesmo com crescentes taxas de desemprego e aumento da pobreza, os defensores do Estado mínimo propõem que se reduzam, ainda mais, os gastos públicos para que a economia volte a crescer.

LEGENDA: Charge do artista Iotti, publicada no jornal Zero Hora, em 23 de setembro de 2008.

FONTE: Iotti/Acervo do artista

Pausa para refletir

De fato não vemos no Estado apenas governantes, ministros, funcionários, homens e mulheres que falam em nome do Estado e o representam [...]. O Estado não é nem mesmo uma organização de organizações, a soma das instituições que o compõem. Pode-se entrar e sair de uma organização [...], mas não há como sair do Estado. Precede-nos, nascemos nele, somos por ele ministeriáveis ao longo de toda a existência. Aliás, as duas pontas, nascimento e óbito, começam e terminam no Ministério da Justiça. Lá vão bater os nossos registros de nascimento e óbito. Da Justiça, passamos ao Ministério da Saúde, ao tomar vacinas. Em seguida ao da Educação, ao ingressar na escola e, depois, ao do Trabalho, ao obter emprego.

BETTO, Frei. A mosca azul. Rio de Janeiro: Rocco, 2006. p. 190-191.



1. Como o autor analisa a relação entre o Estado e a população?

2. Na sua opinião, qual é o papel social do Estado?

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Autoritarismos e totalitarismos: ameaças à cidadania

A História nos mostra que o Estado assumiu diversas formas, muitas delas autoritárias - sendo os casos mais extremos definidos como totalitários. Nesse tipo de regime político, o governo é dominado por um grupo que impõe a ideologia de que o Estado está acima da sociedade e, por isso, tem direito de intervir como bem entender na vida dos indivíduos. Inverte-se, assim, a lógica da democracia de que o Estado deve servir ao povo.

Os totalitarismos ganham espaço em momentos de grave crise, como nos anos 1930, em que o capitalismo liberal caiu em descrédito. Nas experiências históricas desse tipo de regime, além de uma ideologia oficial, se constituía uma forte polícia política de controle social, visando garantir a existência de um partido único e a censura e repressão de qualquer forma de opinião que contrariasse a dos governantes. Partido e Estado, portanto, se confundiam com o objetivo de controlar as massas pelos meios de comunicação e de propaganda político-doutrinária. O fascismo italiano (1922-1944) e o nazismo alemão (nacional-socialismo, 1933-1945) são exemplos de regimes políticos totalitários.

LEGENDA: Pôster de 1933, peça de propaganda do regime nazista, representando o trabalho, a liberdade e o "pão" como a base para a construção da Alemanha.

FONTE: The Bridgeman Art Library/Keystone Brasil/Coleção Peter Newark

Os Estados em que a democracia não vigora são geralmente denominados autoritários. Exemplo disso foram as ditaduras militares latino-americanas, na segunda metade do século XX. Assim como ocorreu no Brasil, países como Chile e Argentina viveram períodos de repressão e autoritarismo. No contexto da Guerra Fria (1945-1989), as ditaduras foram estabelecidas sob o pretexto de barrar a "ameaça comunista". Diferentemente dos regimes totalitários, que conclamavam as massas a apoiá-los, elas se assentavam no apoio de uma parte da população, mas contavam com a apatia e o conformismo de outra parte dela. No Brasil, o regime militar (1964-1985) teve a participação de civis em cargos estratégicos do governo, mas a participação do povo na política foi restrita. Parte da sociedade civil ficou sob vigilância, os sindicatos foram controlados, os meios de comunicação perseguidos, e centenas de brasileiros que buscavam outro tipo de regime político foram torturados ou mortos.

Nesses regimes políticos, totalitários ou autoritários, o direito do exercício da política é retirado da população. Portanto, a própria cidadania também é posta em xeque, na medida em que os direitos civis (como a liberdade de ir e vir e a igualdade de direitos), políticos (como a liberdade de expressão e de voto) e até mesmo sociais são restritos.

LEGENDA: Ato público do movimento pela anistia dos presos e exilados políticos vítimas do regime militar. São Paulo (SP), 1979.

FONTE: Juca Martins/Olhar Imagem

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LEGENDA: Cena do filme No, dirigido por Pablo Larraín e lançado em 2012. O drama, com base em fatos reais, se passa durante o regime militar chileno e retrata os esforços civis pela vitória do "Não" no plebiscito realizado em 1988, que significava a abertura democrática do país e o fim do governo ditatorial de Pinochet.



FONTE: Canana Films/Fabula/Imovision

Diálogos interdisciplinares

Reúnam-se em equipes e realizem uma pesquisa sobre a democracia e a cidadania no Brasil, conforme as seguintes especificações:

1. Consultem bibliografias de Sociologia, Ciência Política, História, Filosofia e Geografia que abordem conceitos e teorias sobre democracia e cidadania. Com base nessa visão multidisciplinar, expliquem as relações entre esses fenômenos.

2. Leiam tópicos da Constituição brasileira de 1988, denominada "Constituição Cidadã", e identifiquem como ela contribuiu para ampliar e consolidar a cidadania no contexto da redemocratização do país.

3. Considerando as esferas municipal, estadual e federal do Poder Executivo no Brasil, suas respectivas instituições e formas de ação, procurem saber sobre as diferentes possibilidades de participar politicamente:

- na reivindicação de direitos;

- no acompanhamento e controle da ação dos agentes públicos;

- no combate à corrupção.

· Para este exercício, cada equipe deverá escolher apenas uma das três esferas.

FONTE: Filipe Rocha/Arquivo da editora



Conceitos-chave:

Cidadania, direitos, direitos civis, direitos políticos, direitos sociais, salário, políticas públicas, poder político, poder econômico, política, políticas sociais, clientelismo, participação política, democracia representativa, poder, esfera pública, esfera privada, sociedade civil, Estado, governo, totalitarismo, democracia, Ciência Política, partidos políticos, Estado de Bem-Estar Social, Estado neoliberal.



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Revisar e sistematizar

1. Por que a Sociologia considera a cidadania fruto de uma conquista social?

2. Como se deu, na História, o reconhecimento dos direitos do indivíduo? Destaque concepções e documentos relacionados a esse processo.

3. Justifique a relação estabelecida entre a cidadania e a condição de trabalhador assalariado.

4. Discorra sobre a construção da cidadania na sociedade brasileira.

5. Explique por que a política não se restringe às disputas pelo poder, no âmbito do Estado.

6. O que é poder? Como ele é conquistado e como seu uso se manifesta? Exemplifique.

7. Conceitue, em suas palavras, o que é Estado, diferenciando-o do conceito de governo.

8. De que modo o Estado, na atualidade, se relaciona com as esferas pública e privada?

9. De que modo o totalitarismo e o autoritarismo ameaçam as conquistas da cidadania?

Teste seus conhecimentos e habilidades

1. A charge abaixo faz referência a uma lei apresentada no Chile, em 2013, que propunha restringir algumas formas de manifestação política. Assinale a alternativa que contém a melhor interpretação a respeito da situação:

LEGENDA: Charge de Latuff, 2013.

FONTE: Latuff/Acervo do artista

a) A charge representa uma cena de tortura promovida pelo governo chileno, pois o país até hoje vive uma ditadura militar.

b) A charge representa uma situação que está de acordo com a normalidade democrática, pois a polícia tem direito irrestrito de reprimir aqueles que atrapalham a ordem.

c) O perigo da dominação ideológica continua presente por toda a América Latina, como se pode ver na imagem. Por isso, medidas emergenciais são necessárias para garantir a neutralidade.

d) Assim como em outros países da América Latina, o regime democrático chileno permite a expressão de todas as correntes políticas, exceto as que pregam regimes ditatoriais, como o comunismo e o socialismo.

e) A imagem do policial militar reprimindo o manifestante remete a um histórico de opressões e de restrições à liberdade de expressão nos países da América Latina, entre os quais o Chile e o Brasil.



2. Analise os textos (trechos de músicas) e assinale a alternativa correta:

- I -

Meu carro é vermelho,

não uso espelho pra me pentear.

Botinha sem meia

É só na areia eu sei trabalhar...

(ARAÚJO, Eduardo. O bom. O bom, 1966. Odeon.)



- II -

Hoje você é quem manda

falou, tá falado, não tem discussão

a minha gente hoje anda falando de lado

e olhando pro chão

(BUARQUE, Chico. Apesar de você. Chico Buarque, 1978. Universal Music.)



- III -

... A gente vai contra a corrente

até não poder resistir

na volta do barco é que sente

o quanto deixou de cumprir...

(BUARQUE, Chico. Roda Viva. Chico Buarque de Hollanda - Volume 3, 1967. Som Livre.)



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a) Os textos I, II e III referem-se ao engajamento, ao protesto e às mais diversas manifestações contra a realidade vivida pelos brasileiros nas décadas de 1960 e 1970.

b) Os três textos trazem uma temática política e social, profundamente comprometida com mudanças.

c) Os textos II e III refletem o contexto político vivido pelos brasileiros no período da ditadura civil-militar.

d) Os textos II e III fazem parte da "jovem guarda", nos anos 1960.

e) O texto I era cantado pela juventude politizada e engajada na construção de uma sociedade mais fraterna, na década de 1960, e o seu teor conclamava à luta.



3.

Texto 1

A educação é um direito humano fundamental e é essencial para o exercício de todos os direitos. Mesmo assim, ainda existem 781 milhões de analfabetos no mundo, cerca de 58 milhões de crianças se encontram fora da escola primária e muitos jovens e mulheres e homens adultos continuam sem aprender o que precisam saber para dirigir suas vidas com saúde e dignidade.

UNESCO. Disponível em: . Acesso em: 8 jul. 2015.



Texto 2

Analfabetismo no Brasil

FONTE: Extraído de: http://educacao.uol.com.br/noticias/2013/09/27/analfabetismo-volta-a-crescer-no-brasil-apos-mais-de-15-anos-de-queda.htm. Acesso em: 8 jul. 2015.

As mudanças em relação às taxas de analfabetismo se devem em grande medida às políticas públicas adotadas. A análise do texto 1, sobre os números do analfabetismo no mundo, e do texto 2, sobre as taxas de analfabetismo no Brasil, permite afirmar que o país:

a) não conseguiu reduzir as taxas de analfabetismo devido à não universalização do Ensino Fundamental.

b) não reduziu o analfabetismo devido à expansão de outros níveis de ensino.

c) praticamente eliminou o analfabetismo devido às políticas de austeridade no país.

d) reduziu o analfabetismo com políticas sociais e educacionais implementadas e o aumento do finaciamento da educação.

e) não conseguiu reduzir as taxas de analfabetismo, pois a Constituição de 1988 manteve princípios de não universalização da educação.



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Descubra mais

As Ciências Sociais na biblioteca

DALLARI, Dalmo. O que são direitos da pessoa. São Paulo: Brasiliense, 1981.

Este livro analisa as dificuldades e contradições na definição e aplicação dos direitos individuais e os desafios na busca por garantir a dignidade a todos os seres humanos.

LEGENDA: Capa do livro O que são direitos da pessoa, de Dalmo Dallari (ed. Brasiliense).

FONTE: Reprodução/Editora Brasiliense

DALLARI, Dalmo. O que é participação política. São Paulo: Brasiliense, 1983.

Para o autor desse livro, a conquista da cidadania passa pela participação na política - um direito e um dever de todos.

GRUPPI, Luciano. Tudo começou com Maquiavel: as concepções de Estado em Marx, Engels, Lênin e Gramsci. Porto Alegre: L&PM, 1980.

A perspectiva de autores clássicos das Ciências Sociais sobre o surgimento e a constituição do Estado moderno é analisada nesse livro.

IVO, Anete Brito Leal. Viver por um fio: pobreza e política social. São Paulo: Annablume; Salvador: CRH/ UFBA, 2008.

Analisa a construção do social como um problema público, olhando para a pobreza, o trabalho, a cidadania e as políticas públicas sociais no Brasil.

RANCIÈRE, Jacques. O ódio à democracia. São Paulo: Boitempo, 2014.

Aborda a democracia, a partir das realidades social e política na conjuntura de crise da década de 2010.

As Ciências Sociais no cinema

A corporação, 2003, Estados Unidos, direção de Mark Achbar e Jennifer Abbott.

Documentário, com roteiro do jurista Joel Bakan, tece críticas à origem e à dinâmica das empresas transnacionais, comparando-as com pessoas.

LEGENDA: Cena do documentário A corporação, lançado em 2003.

FONTE: Photos 12 - Cinema/Diomedia



Desaparecido, um grande mistério, 1982, Estados Unidos, direção de Costa-Gavras.

O filme narra a luta de um norte-americano à procura de seu filho desaparecido durante a ditadura de Pinochet, no Chile.



O ano em que meus pais saíram de férias, 2006, Brasil, direção de Cao Hamburger.

Relato de uma família que sofre o drama da separação por motivo político durante o período da ditadura militar no Brasil.

LEGENDA: Cartaz do filme O ano em que meus pais saíram de férias, lançado em 2006.

FONTE: Reprodução/Editora Brasiliense



O grande ditador, 1940, Estados Unidos, direção e atuação de Charles Chaplin.

Nesta sátira, Chaplin interpreta papéis antagônicos: o de um barbeiro e o do ditador que persegue o povo judeu. O discurso final é uma apologia da razão sobre o militarismo.



O que é isso, companheiro?, 1997, Brasil/Estados Unidos, direção de Bruno Barreto.

Inspirado na história real de estudantes que integraram o MR8, grupo que combateu o regime militar no Brasil da década de 1960 com ações armadas.

As Ciências Sociais na rede

Ação da Cidadania Contra a Fome, a Miséria e pela Vida. Disponível em: www.acaodacidadania.com.br. Acesso em: 8 jul. 2015.

Página da organização fundada pelo sociólogo Herbert de Souza.



Fome Zero. Disponível em: www.fomezero.gov.br. Acesso em: 8 jul. 2015.

Site do programa de combate à fome do governo brasileiro, com ações assistenciais de distribuição de alimentos e investimentos na produção agrícola de famílias de baixa renda.

Direitos Humanos. Disponível em: www.dhnet.org.br. Acesso em: 8 jul. 2015.

Site articulado com redes globais para educação em direitos humanos e cibercidadania.

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Bibliografia

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BAUMAN, Zygmunt. Em busca da política. Rio de Janeiro: Zahar, 2000.

BETTO, Frei. A mosca azul. Rio de Janeiro: Rocco, 2006.

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LEGENDA: Capa do livro As metamorfoses da questão social, de Robert Castel (ed. Vozes).

FONTE: Reprodução/Editora Vozes

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DALLARI, Dalmo. O que é participação política. São Paulo: Brasiliense, 1983.

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VIEIRA, Liszt. Notas sobre o conceito de cidadania. BIB, São Paulo, n. 51, 1. sem. 2011. p. 35-47.

WEBER, Max. Economia y sociedad: esbozo de sociologia comprensiva. Bogotá: Fondo de Cultura Econômica, 1977. v. I.

WEBER, Max. Classe, status, partido. In: VELHO, O. G.; PALMEIRA, M.; BERTELLI, A. (Org.). Estrutura de classes e estratificação social. 5ª ed. Rio de Janeiro: Zahar, 1974. p. 61-83.

WEBER, Max. O político e o cientista. 3ª ed. Lisboa: Editorial Presença, 1979.

FONTE: Reprodução/Editora Brasiliense

263

CAPÍTULO 9 - Movimentos sociais

LEGENDA: Manifestantes durante protesto contra o aumento de tarifas do transporte público, em São Paulo (SP), em 2013.

FONTE: Eduardo Knapp/Folhapress



ESTUDAREMOS NESTE CAPÍTULO:

Como os indivíduos buscam transformar as condições sociais, econômicas, políticas e culturais por meio dos movimentos sociais, o porquê do surgimento de tais movimentos na sociedade e o que os distingue como ação coletiva. Veremos que os movimentos sociais transformam-se nos diferentes momentos e lugares. Assim, tiveram um papel importante, tanto contestando os Estados autoritários em diversas partes do mundo como reagindo às formas de exclusão social no contexto da globalização. Com base na discussão sobre classes sociais, analisaremos como elas dão origem aos movimentos sociais contemporâneos, que buscam propor alternativas para uma sociedade mais igualitária.

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Movimentos sociais na pauta das Ciências Sociais

O que são movimentos sociais? Neste capítulo, vamos explorar um mundo em erupção. Isso porque, assim como vulcões ativos, os movimentos sociais podem agir e interferir a qualquer momento. Essa comparação é ilustrativa, pois esses movimentos são fenômenos que envolvem forças sociais e se formam no interior da estrutura social.

As Ciências Sociais se preocupam com a participação dos indivíduos na sociedade - e, consequentemente, com uma das bases para o exercício da cidadania, conforme vimos no Capítulo 8. Essa participação ocorre, entre outras vias, por meio dos movimentos sociais, os quais possibilitam a transformação da realidade.

Os movimentos sociais foram inicialmente explicados pelos comportamentos coletivos, ou seja, pelo conjunto de ações espontâneas de muitos indivíduos e grupos. Estudos sociológicos mais recentes, no entanto, reconheceram nesses movimentos uma forma de luta política organizada para construir os direitos dos cidadãos. Distinguem-se, nesse sentido, os movimentos sociais duradouros daqueles que se apresentam apenas como uma revolta ou uma reação passageira a uma situação ou fato. Um movimento social pode começar de modo espontâneo, mas à medida que vai se instituindo e se consolidando com pautas de reivindicação que levam a avanços sociais ele se constitui como movimento social no sentido dado pelas Ciências Sociais. Eles precisam de certa institucionalização e reconhecimento social. Além disso, muitas vezes estão ligados às classes subalternas, aos grupos menos favorecidos, em situação de desvantagem social.

FONTE: Filipe Rocha/Arquivo da editora

Um movimento social afirma-se por mobilizar grupos ou uma coletividade em uma luta contra um adversário e pelo controle da mudança, explica o sociólogo francês Alain Touraine (1925-). Essas mobilizações são provocadas por uma grande variedade de motivos sociais.

Vale perguntar o que faz com que movimentos de natureza variada e com interesses tão distintos sejam classificados como "sociais". Será que toda ação coletiva é um movimento social? Qualquer ação de um grupo - como os lobistas que atuam junto ao Parlamento, defendendo interesses de grupos como fazendeiros, industriais ou banqueiros - constitui um movimento social? A ação desenvolvida pela torcida organizada de um time de futebol, por ser coletiva, pode ser considerada um movimento social? Gangues de rua, por agirem coletivamente, podem ser consideradas movimentos sociais? A resposta a essas questões é não.

Movimentos sociais se formam quando as pessoas se organizam e lutam contra diferentes tipos de opressão, intervindo para que haja uma mudança social.

LEGENDA: Charge do cartunista Henfil, da década de 1980.

FONTE: Henfil/Acervo do artista

Glossário:

lobista: aquele que, no Poder Legislativo, faz lobby, ou seja, ocupa-se de influenciar a aprovação das leis conforme interesses de grupos específicos.

Fim do glossário.



265

LEGENDA: Armandinho, tirinha de Alexandre Beck, publicada em 2013. A tirinha aborda a importância dos pequenos atos e da organização e união das pessoas em torno de ideais coletivos.

FONTE: Alexandre Beck/Acervo do artista

Nem toda ação coletiva se transforma em movimento social. Uma ação coletiva caracteriza-se, sim, por um conjunto de ações empreendidas por grupos ou categorias sociais em circunstâncias adversas ou não. Porém, para que uma ação coletiva seja considerada um movimento social é indispensável outro elemento: o objetivo de alcançar um fim específico com intenção de transformar a realidade social. Não basta, portanto, a ação de um conjunto de pessoas para que exista um movimento social. É preciso que essa ação seja organizada por indivíduos ou grupos que visem a uma finalidade especificamente social, como, por exemplo, combater as desigualdades e a discriminação relacionadas às diferenças de renda, gênero, etnia ou país de origem. Dessa forma, a consciência dos problemas sociais adquirida coletivamente e em contínua difusão entre os indivíduos é uma das principais características de um movimento social.

Os movimentos sociais podem se transformar de acordo com componentes culturais, ambientais, econômicos e políticos. Podemos identificar entre suas causas mais comuns a organização contra a exploração e a discriminação resultantes das desigualdades sociais geradas ao longo da história - muitas delas decorrentes da má distribuição da renda, da desigualdade nas relações de gênero, da xenofobia, do racismo para com grupos de diferentes etnias. Para exemplificar, citamos alguns movimentos sociais contemporâneos: o Movimento dos Trabalhadores Sem Teto, o Movimento de Trabalhadores Sem Terra, o Movimento Estudantil, o Movimento Feminista.

Movimentos sociais, classes e pobreza

Um dos autores que mais influenciaram os movimentos sociais na história contemporânea foi Karl Marx (1818-1883). Sua teoria social, de base econômica, centra-se nas relações de produção - aquelas estabelecidas no processo produtivo entre os donos dos meios de produção (fábricas, bancos, terras, entre outros) e os trabalhadores. Para Marx, essas relações são marcadas por uma tensão latente em decorrência de interesses distintos das diferentes classes sociais, seja em relação aos privilégios, seja em relação à participação no poder. A teoria marxista considera a luta de classes como ação coletiva, uma vez que a consciência de pertencer a uma classe social aparece quando os antagonismos da sociedade são percebidos, o que pode levar ao conflito. A luta de classes é considerada a própria práxis coletiva capaz de levar a transformações. Desse modo, as grandes mudanças não dependem exclusivamente da vontade dos indivíduos; há a força do social, além de fatores políticos, culturais, econômicos que envolvem toda a sociedade.

Glossário:

práxis: palavra de origem grega que significa 'ação prática'. Para Marx, significa o próprio movimento da história, as ações reais dos indivíduos que procuram vencer as contradições da sociedade capitalista.

Fim do glossário.



266

As classes sociais são tema recorrente de discussão nas teorias sociológicas, que destacam diversos conceitos de classes, como estudado no Capítulo 2. Classes sociais são agrupamentos que se relacionam cotidianamente, produzindo e reproduzindo a estrutura social. As classes referem-se a grupos sociais que se diferenciam conforme: a posição econômica que ocupam na produção; a posse de riquezas; a escolha da profissão; os estilos de vida; o acesso ao consumo. Vale ressaltar que as classes sociais são complementares, no sentido de que uma não existe sem a outra. No âmbito de cada uma das classes existe a noção de pertencimento, a defesa de interesses comuns na sociedade. Mas, como analisa o historiador britânico Edward Thompson (1924-1993), a classe não se define apenas em termos econômicos. Ela é construída na experiência entre homens e mulheres, ou seja, na História. É uma formação social e cultural que não pode ser definida de modo abstrato, mas em termos das relações entre as classes. Só na sociedade capitalista as diferenciações sociais assumem a "forma" de classe, pelo fato de que o pertencimento a uma classe é determinado pela propriedade (ou controle) dos meios de produção ou pela exclusão dessa propriedade ou controle. Essa condição concreta e subjetiva, ao mesmo tempo, de estar e perceber a sua posição na estrutura social gera o fenômeno da consciência de classe, quando há identidade e defesa dos interesses comuns.

FONTE: Filipe Rocha/Arquivo da editora

Desse modo, congregando interesses na forma de reivindicações, os movimentos se estruturam para enfrentar os problemas comuns a determinadas classes sociais e promover a ação política. Contextos de vulnerabilidade reúnem os ingredientes básicos para a eclosão de movimentos que visam à transformação social. Um dos problemas mais graves e comumente abordados pelos diversos movimentos sociais, no Brasil e no mundo, é o da pobreza, como vimos em outros capítulos, que assume configurações distintas de acordo com a época e a sociedade, conforme o grau de desigualdade socioeconômica e a escassez ou não de recursos.

LEGENDA: Litografia produzida em 1919 pelo artista gráfico El Lissitzky para os bolcheviques, que instalariam, no lugar do antigo Império Russo, um governo de inspiração marxista: a União das Repúblicas Socialistas Soviéticas (URSS). Com elementos visuais, o cartaz de propaganda mostra a união popular (representada pela cunha vermelha) rompendo a resistência da elite russa (círculo branco).

FONTE: Michael Nicholson/Corbis/Latinstock



267

Nos anos 1990, no Brasil, como vimos no Capítulo 8, o sociólogo Betinho liderou um movimento que desembocou em uma grande campanha nacional denominada Ação da Cidadania contra a Fome, a Miséria e pela Vida, com o intuito de combater a fome no país. A campanha resultou de um movimento em prol da cidadania e pelo direito ao alimento em uma época de grande arrocho salarial, de desemprego e carência de políticas sociais.

Os movimentos sociais não apenas combatem insuficiências e problemas que atingem amplos segmentos populacionais, como a falta de condições para garantir a subsistência ou a discriminação. Eles também se voltam às novas questões que se apresentam: a precarização do trabalho e a perda de direitos conquistados, a redução de amparo social do Estado, a falta de moradia digna, entre outros fatores que conduzem a diversas formas de exclusão social, provocada pelas disparidades presentes na sociedade capitalista.

LEGENDA: Morador atravessa ponte improvisada sobre um córrego poluído em área do Complexo da Maré, no Rio de Janeiro (RJ), em 2014.

FONTE: Mario Tama/Getty Images

LEGENDA: Área de moradias precárias, à margem de canal poluído, em Antananarivo, capital de Madagascar, em 2013.

FONTE: Thomas Mukoya/Reuters/Latinstock

Por essa razão, a pobreza deve ser compreendida como um fenômeno complexo, relacionado à falta de bens e de oportunidades sociais. A exclusão social não se refere mais somente à dificuldade de sobrevivência alimentar, mas também à falta de condições para ter uma "vida digna", com acesso à educação, à moradia, ao trabalho, à renda, à comunicação, ao transporte, à informação. A satisfação dessas e outras condições permite às pessoas participarem e usufruírem de bens e serviços oferecidos pela sociedade e serem reconhecidas como portadoras de direitos.

Pobreza e exclusão social são resultados concretos das desigualdades que fazem surgir os movimentos sociais.

268

Pausa para refletir

Ao depararmos com os dados da exclusão social, vemos o paradoxo da persistência da pobreza e das condições precárias de vida, apesar dos avanços da ciência e da tecnologia.

Rendimento e acesso ao saneamento básico são indicadores a serem levados em conta ao se estudar a exclusão social. Podemos destacar também a escolaridade, a desigualdade social, o índice de emprego formal, os indicadores de violência, entre outros.

O mapa abaixo e o da página ao lado trazem informações sobre dois indicadores de exclusão social: rendimento per capita abaixo da linha da pobreza (R$ 70, em 2010) e domicílios sem banheiro ou sanitário de uso exclusivo. É possível observar uma extensa faixa, especialmente nas regiões Norte e Nordeste, que contrasta com as áreas em que esses indicadores apresentam melhores resultados, o que realça as disparidades existentes entre as regiões brasileiras.



1. Diante desse quadro de desigualdade, pobreza e exclusão, qual é a importância dos movimentos sociais? O que eles podem mudar na realidade de falta de moradia digna e de rendimentos adequados, por exemplo?

2. Você conhece organizações não governamentais (ONGs), movimentos sociais e grupos organizados que buscam resolver ao menos um dos problemas listados acima (não apenas os do mapa) que compõem a exclusão social no Brasil? Quais? O que sabe sobre eles?

FONTE: IBGE/Censo 2010. Créditos: Banco de imagens/Arquivo da editora



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FONTE: IBGE/Censo 2010. Créditos: Banco de imagens/Arquivo da editora



Características dos movimentos sociais

Como vimos, as manifestações coletivas podem ou não se transformar em movimentos sociais. Retomemos um exemplo dado no Capítulo 8: no ano de 2005, nos subúrbios de Paris (capital da França), jovens pobres e filhos ou netos de imigrantes muçulmanos, moradores da periferia, organizaram uma série de protestos. Eles mostravam-se revoltados com as dificuldades que enfrentavam: desemprego, condições de vida precárias, discriminação e exclusão social. Reivindicavam a inclusão digital, isto é, o acesso universal às tecnologias da informação. Esses episódios, no entanto, não constituíram movimentos sociais organizados, pois se resumiram a protestos passageiros.

Outro exemplo foram as manifestações em junho de 2013 no Brasil. Inicialmente, foram promovidas por um grupo organizado (o Movimento Passe Livre) em razão do aumento das tarifas de transporte coletivo em diversas cidades brasileiras. No entanto, conforme cresceram, foram-se incorporando diversas outras reivindicações e deixaram de seguir apenas a pauta do MPL. Após o aumento de tarifa ser revogado, em pouco tempo as manifestações relacionadas especificamente ao acesso ao transporte público diminuíram.

Os movimentos sociais também não podem ser confundidos com movimentos messiânicos, religiosos ou político-partidários, embora esses formulem e apresentem publicamente reivindicações de mudanças políticas e sociais.

FONTE: Filipe Rocha/Arquivo da editora

Glossário:



messiânico: diz-se do movimento fundamentado na ideia de que um indivíduo ou grupo está destinado a salvar a humanidade dos males e problemas.

Fim do glossário.



270

Isso não significa que os participantes de um determinado movimento social não professem uma fé ou não estejam ligados a um partido político. De modo geral, os movimentos sociais se definem como não partidários ou não religiosos e buscam somar forças com aqueles que vivenciam uma mesma condição, independentemente das suas filiações partidárias ou religiosas. Para se atribuir um caráter "social" a movimentos surgidos no interior das sociedades, algumas características devem ser identificadas.

Boxe complementar:

Principais características dos movimentos sociais

· Voltam-se para as transformações das condições econômicas, sociais e políticas da sociedade, visando principalmente situações de necessidade social.

· São capazes de ação coletiva, ou seja, desencadeiam grandes mobilizações por necessidades sociais comuns, como moradias, escolas, centros hospitalares, postos de saúde, estradas, saneamento, entre outras coisas.

· Dispõem de componentes ideológicos, visões de mundo que os inspiram e se desenvolvem por meio deles. Baseiam-se em valores, na consciência social sobre determinadas situações e na crença de ser possível modificá-las.

· São capazes de somar forças sociais, como a opinião pública, os meios de comunicação, instituições locais e internacionais.

· Dependem de uma organização para sua formação e desenvolvimento.

· Embora não pretendam conquistar o poder do Estado, procuram tornar públicas suas reivindicações em manifestações. Esse aspecto político pode levar a um confronto com as autoridades de Estado e também com forças de segurança privada, dependendo dos objetivos e métodos de manifestação.

· Em geral, declaram-se apartidários e laicos, evitando sua utilização para fins político-partidários ou religiosos.

· Muitas vezes, dão destaque à figura de suas lideranças. Um exemplo é o movimento negro nos Estados Unidos durante a década de 1960, sob a liderança de Martin Luther King (1929-1968), responsável por mobilizar comunidades negras no sul do país na luta pelos direitos civis.

· Agem por meio de redes de movimentos. Essas redes articulam vários atores sociais e podem se caracterizar: pelo pluralismo organizacional e ideológico, como no caso dos movimentos pacificistas; por componentes de transnacionalidade, como os de defesa dos direitos humanos e do meio ambiente; pela atuação em diferentes campos, como os movimentos de combate à síndrome da imunodeficiência adquirida (Aids), que acionam as dimensões de saúde pública, cultural e política da sociedade.

· Estabelecem novos canais de comunicação dos indivíduos com a sociedade e o Estado.

· São históricos e sujeitos a mudanças; por isso, as mudanças sociais também os transformam.

· Implicam a formação de uma identidade cultural, ou seja, de algo comum a todos os seus integrantes.

Fim do complemento.

A questão da identidade

Os estudos sociológicos vêm encontrando nos movimentos sociais o papel de formar identidades dos atores na sociedade. Quando falamos em identidade, nesse contexto, nos referimos ao processo no qual um ator social se reconhece e constrói uma referência de ação com base em algum atributo cultural ou conjunto de valores. Identidades resultam de situações de confronto e comparações com o outro, pois, na maioria das vezes, não é possível integrar ou articular visando à ação sem antes diferenciar e distinguir. Nós também, enquanto indivíduos, firmamos nossa identidade em comparação com o(s) outro(s).



271

Portanto, a construção da identidade no interior de um movimento social se deve tanto à identificação de seus participantes com uma mesma causa como à sua resistência à lógica da dominação, com o objetivo de redefinir sua posição na sociedade. Um exemplo é o caso do movimento feminista e pelos direitos da mulher, que combateu e combate o machismo, o patriarcalismo e suas estruturas de produção e reprodução sociais.

Autores da Sociologia, da Antropologia e da Ciência Política caracterizaram os movimentos sociais como sujeitos coletivos por sua capacidade de elaborar uma identidade com a causa que defendem, criando interesse por parte dos indivíduos que a ela se dedicam. Na luta e confronto constantes, eles organizam práticas coletivas. Atualmente, os movimentos sociais valem-se muitas vezes das tecnologias da informação e agem em rede, aproximando suas reivindicações e fortalecendo-as. Cada vez mais as redes sociais têm sido utilizadas como forma de comunicação rápida para informar e chamar os indivíduos para participar.

É comum que os movimentos sociais vivenciem situações de conflito, caracterizadas pelo enfrentamento decorrente de posições, ideias, interesses que divergem da ordem estabelecida. Na sociedade contemporânea esses enfrentamentos ocorrem, sobretudo, em áreas marcadas pela segregação com base na identidade, como nos conflitos que envolvem migrantes ou relacionados a povos sem território.

O sociólogo francês Alain Touraine explica os movimentos sociais como uma combinação de princípios de identidade, oposição e totalidade em relação à luta que desencadeiam. Vejamos sua explanação no quadro a seguir, usando como exemplo o movimento argentino das mães e avós da Praça de Maio e os movimentos operários do início do século XX.

LEGENDA: Marcha Mundial das Mulheres realizada na cidade de Bruxelas, na Bélgica, em 2016.

FONTE: Virginie Lefour/Agência France-Presse

Glossário:



patriarcalismo: designa o domínio do homem proprietário de terras ou dos bens de produção e, consequentemente, o de seus valores, que são impostos ao restante da sociedade, como vimos no Capítulo 3.

Fim do glossário.



Princípios inspiradores dos movimentos sociais

Princípios

Razões

Exemplos

Identidade

Lutamos em nome de quem?

a) no caso das mães e avós da Praça de Maio, a luta é pelos filhos e netos desaparecidos durante o último regime militar ditatorial argentino (1976-1983);
b) no caso dos movimentos operários do início do século XX, todos os que se vissem trabalhando em condições indignas.

Oposição

Lutamos contra quem?

a) luta contra os dirigentes e cúmplices dos regimes ditatoriais argentinos;
b) luta contra os proprietários e altos gerentes das indústrias, de modo geral, e os detentores do poder do Estado, no caso de movimentos socialistas ou anarquistas.

Totalidade

Lutamos por quê?

a) a busca por informações sobre o paradeiro dos desaparecidos e a luta pela condenação dos responsáveis pelos crimes e violações de direitos;
b) a melhoria da remuneração e das condições de trabalho, em todos os casos, e a deposição da classe dominante do controle do Estado e dos meios de produção, no caso de movimentos socialistas ou anarquistas.

272

Pausa para refletir

Observe a charge abaixo:

LEGENDA: Charge de Lucas Fier, 2012.

FONTE: Lucas Fier/Acervo do cartunista



1. A charge faz uma crítica a quem e a que tipo de atitude? Por quê?

2. Qual é sua opinião com relação às reivindicações e à forma de ação dos movimentos sociais? Discuta com seus colegas e explique em sala de aula.

Breve história dos movimentos sociais

Os movimentos operários

Entre os movimentos sociais que tiveram origem na luta de classes, o movimento operário foi o que obteve maior reconhecimento como tal. Ele formou-se a partir do século XVIII, época em que aumentava a concentração de trabalhadores nas fábricas europeias. Submetidos a extensas jornadas de trabalho, à falta de direitos trabalhistas e ao despotismo de seus patrões, os operários organizaram-se para reivindicar mudanças nas condições de trabalho.

Movimento pioneiro na esfera operária, o luddismo, no início do século XIX, posicionava-se contra as máquinas na Inglaterra, sabotando-as como uma de suas formas de ação. Somava-se às reivindicações por melhores condições de trabalho outra preocupação: o aumento do desemprego em razão da mecanização da indústria. A dura repressão ao luddismo foi acompanhada pela acusação aos trabalhadores de que estariam dificultando a modernização da produção. Ainda assim, novas formas de luta emergiram ao longo do século XIX, mediadas pelos sindicatos.

FONTE: Filipe Rocha/Arquivo da editora

273

Existem muitos movimentos operários, com singularidades em cada país, mas, de modo geral, todos buscam a melhoria das condições de trabalho por meio de uma ação política. Um dos instrumentos mais recorrentemente utilizados pelos movimentos operários em todo o mundo é a greve. Desde os primeiros tempos da industrialização, as paralisações dos trabalhadores constituíram uma forma de exigir condições mais dignas de trabalho, remuneração e assistência social. Com a consolidação da organização da classe operária no início do século XX, as greves passaram a criticar as próprias condições da sociedade, reivindicando transformações para além do ambiente de trabalho.

Desde o século XIX, o socialismo - sistema político que visa a uma sociedade igualitária e cooperativa - destacou-se por favorecer ações coletivas de indivíduos e grupos organizados. No entanto, após o fim da União Soviética e a queda de muitos regimes ligados a ela, o socialismo declinou como utopia social. Somado ao enfraquecimento de teorias como o anarquismo e o mutualismo, em fins do século passado, esse declínio trouxe o desafio de construir novas formas de contestação das desigualdades próprias do sistema capitalista.

LEGENDA: Greve , óleo sobre tela do pintor russo Boris Mihajlovitch Kustodiev (1878-1927).

FONTE: The Bridgeman Art Library/Keystone Brasil/Museu Estatal Russo, São Petersburgo, Rússia

Glossário:



utopia social: ideal de sociedade justa e igualitária na qual o bem-estar coletivo se realiza plenamente.

Fim do glossário.

Boxe complementar:

O Estado em xeque

Muitos movimentos operários exigiram - e muitas vezes obtiveram - garantias de proteção social e regulamentação do trabalho por parte do Estado. Outros, no entanto, se opuseram à própria existência dessa instituição.

O anarquismo é o mais conhecido conjunto de ideias a afirmar a emancipação do indivíduo em relação ao Estado. Para além do fim da estrutura hierarquizada de administração das propriedades privada e estatal dos meios de produção, os anarquistas almejavam acabar com qualquer forma de repressão, o que incluía leis e normas sociais então vigentes.

As várias correntes em que o anarquismo moderno se cindiu apresentam diferentes alternativas para uma sociedade sem Estado. O francês Pierre-Joseph Proudhon (1809-1865) propôs o mutualismo, um sistema social em que os trabalhadores, organizados individualmente ou em associações, realizariam a troca igualitária e o apoio mútuo e obteriam crédito livre por meio do Banco do Povo.

Já o coletivismo, fundado no pensamento do russo Mikhail Bakunin (1814-1876), propunha que todos os meios de produção fossem administrados por associações de trabalhadores. Algumas formas posteriores, como o anarcossindicalismo, acreditam na união em sindicatos como meio para que as classes trabalhadoras se organizem e reestruturem o modo de produção e a sociedade.

LEGENDA: Joseph Proudhon, em tela de Gustave Coubert, de 1865.

FONTE: The Bridgeman Art Library/Keystone Brasil/Museu d'Orsay, Paris, França

LEGENDA: O teórico anarquista Mikhail Bakunin, retratado pelo pintor Nikolai Ge em 1871.

FONTE: FineArtImages/Leemage/Agência France-Presse

Fim do complemento.



274

Temas e protagonistas dos movimentos sociais contemporâneos

Transformações na produção agropecuária e industrial, mobilizações populares de proporções cada vez maiores, concentração da população nas cidades, alcance e variedade maiores dos meios e formas de comunicação (jornais, revistas, reuniões políticas como comícios e passeatas, internet e outros meios) impulsionaram a criação ou o reaparecimento de outros tipos de movimentos sociais.

Estudantes, mulheres, grupos étnicos, religiosos, pacifistas e ecológicos, entre outros, protagonizam, nas décadas mais recentes, movimentos sociais que buscam respostas a determinadas perguntas: quais são as formas institucionais que causam desigualdades e conflitos na sociedade? Quais são os principais valores e interesses da ação coletiva?

LEGENDA: Marcha das Mulheres Negras contra a violência de gênero, o racismo, o machismo e o genocídio de mulheres negras. Brasília, (DF), 2015.

FONTE: Evaristo Sa/AFP

Conforme podemos observar no quadro a seguir, o cientista político alemão Claus Offe (1940-) compara a forma predominantemente assumida pelos movimentos sociais em duas diferentes épocas para sintetizar as razões e valores que os inspiram à ação coletiva.

Os movimentos sociais nos séculos XIX e XX




Séculos XIX e XX

A partir da 2ª metade do século XX

Principais motivos

Crescimento econômico e distribuição mais igualitária da renda; segurança militar e social; controle social (participação do cidadão na gestão pública).

Preservação da paz e do meio ambiente; respeito aos direitos humanos; formas de trabalho não alienadas.

Principais valores

Liberdade e garantia do consumo privado e do progresso material.

Autonomia individual e respeito à identidade, em oposição ao controle do Estado e das instituições sociais.

Formas de ação

Movimentos organizados em torno de associações, que mediam as relações de maneira corporativista. Há competição política entre elas.

Movimentos pautados pela informalidade e espontaneidade. Protestos políticos orientados por demandas específicas.

FONTE: OFFE, Claus. New social movements: challenging the boundaries of institutional politics. Social Research, v. 52, n. 4, 1985. p. 817-868.

275

Boxe complementar:



Encontro com cientistas sociais

No texto abaixo, o sociólogo português Boaventura de Sousa Santos (1940-) leva-nos a indagar sobre os "excessos" vividos na sociedade contemporânea, na qual ainda há concentração de riqueza, populações inteiras que se refugiam para sobreviver e povos que morrem à míngua.



Ao identificar novas formas de opressão que extravasam das relações de produção e nem sequer são específicas delas, como sejam a guerra, a poluição, o machismo, o racismo ou o produtivismo, e ao advogar um novo paradigma social menos assente na riqueza e no bem-estar material do que na cultura e na qualidade de vida, os novos movimentos sociais (NMSs) denunciam, com uma radicalidade sem precedentes, os excessos de regulação da modernidade. Tais excessos atingem não só o modo como se trabalha e produz, mas também o modo como se descansa e vive; a pobreza e as assimetrias das relações sociais são a outra face da alienação e do desequilíbrio interior dos indivíduos; e, finalmente, essas formas de opressão não atingem especificamente uma classe social, e sim grupos sociais transclassistas ou mesmo a sociedade como um todo.

SOUSA SANTOS, Boaventura de. Pela mão de Alice: o social e o político na pós-modernidade. 2ª ed. São Paulo: Cortez, 1997. p. 258.

Glossário:

produtivismo: orientação ideológica do processo capitalista de procurar aumentar sempre a produção e o consumo de bens e serviços, a despeito de possíveis consequências negativas.

Fim do glossário.

· Para o autor, que tendência pode ser observada na atuação dos novos movimentos sociais que os diferencia de seus predecessores? Desenvolva a ideia demonstrando-a com exemplos de sua comunidade.

Fim do complemento.



Movimentos sociais na América Latina

Na América Latina dos anos 1960 a 1980 emergiram movimentos sociais no campo e na cidade, questionando os regimes políticos e as políticas econômicas em vigor. Naquele período, vários países latino-americanos estavam submetidos a ditaduras militares, tendo como pano de fundo a polarização das relações mundiais entre a então União Soviética e os Estados Unidos, no confronto político, militar, econômico e ideológico da Guerra Fria (1945-1989).

As políticas de Estado adotadas na maior parte dos países latino-americanos respondiam aos interesses norte-americanos: reprimiam internamente os movimentos de oposição (especialmente os de orientação socialista ou comunista); seguiam um modelo econômico fundamentado na concentração da renda e na relação de subordinação aos interesses de corporações e de países capitalistas desenvolvidos. No caso do Brasil, a política econômica desenvolvimentista no governo do presidente Juscelino Kubitschek (1956-1961) focava na indústria de base, transporte, energia, alimentação, sustentada no endividamento externo e na dependência econômica em relação àqueles países.

No Brasil, em 1964, um golpe de Estado iniciou uma sequência de governos militares que se estendeu até 1985. Durante esse período, o Estado seguia uma ordem política, econômica e social autoritária, que privava o povo de escolher livremente seus representantes, proibia ou reprimia manifestações populares e impedia as organizações sociais de reivindicarem livremente.

O regime militar mantinha-se mediante forte aparato policial, que aplicava a repressão e as punições para aqueles que o desafiavam. As resistências e o contexto social desfavorável fizeram surgir movimentos sociais de diversos tipos, que acabaram por abalar a base dos regimes militares. Por isso, a antropóloga brasileira Ruth Cardoso (1930-2008) os definia como movimentos anti-Estado.

FONTE: Filipe Rocha/Arquivo da editora



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Apesar do cerceamento à liberdade de expressão e de associação, ações coletivas organizadas questionaram o Estado como instrumento político de uma minoria privilegiada e trouxeram alternativas para transformar as estruturas de dominação. Muitos desses movimentos, mesmo sendo dissolvidos pelos governos militares quando seus membros foram exilados, mortos ou aprisionados, conseguiram deixar suas mensagens contrárias à ditadura.

Na década de 1970, constituíram-se movimentos sociais ligados a sindicatos, entre os quais o mais conhecido foi o dos metalúrgicos, no qual despontou a liderança de Luiz Inácio Lula da Silva, eleito presidente da República em 2002. Outro tipo de movimento formou-se dentro das próprias empresas: nas comissões de fábrica, os trabalhadores agiam e se reuniam no local de trabalho de forma independente em relação aos sindicatos, visto que estes estavam sob intervenção ou corriam risco de sofrê-la.

Organizaram-se também movimentos pela saúde, moradia, creches, transporte coletivo, entre outras reivindicações. Dessa maneira, formou-se uma identidade política autônoma em relação ao sistema político, expressando os anseios das camadas sociais de renda mais baixa. Esses movimentos, chamados de "populares" e inseridos na luta de classes, se caracterizaram por cobrar ações estatais.

LEGENDA: Soldados do Exército em 1968, quatro dias depois do decreto do Ato Institucional nº 5 (AI-5), durante operação que prendeu cerca de 800 estudantes. Uma das intenções do AI-5 era o controle sobre a sociedade.

FONTE: Arquivo do jornal Folha de S.Paulo/Folhapress

LEGENDA: Ato grevista de metalúrgicos em São Bernardo do Campos (SP), ocorrido em 1979.

FONTE: Juca Martins/Olhar Imagem

O processo de urbanização no Brasil, intensificado nos anos 1970, ocorreu sem que o Estado garantisse o atendimento das necessidades básicas da população. Assim, com as grandes migrações do campo, as cidades concentraram população sem oferecer a todos serviços como segurança pública, energia elétrica, saúde, saneamento básico, educação, transporte, moradia, cultura. A falta de bens coletivos levou à eclosão de movimentos nos grandes centros urbanos. Além da movimentação nas fábricas, outras organizações populares, como Associações de Moradores, Comunidades Eclesiais de Base (CEBs) - atuantes também no campo - e movimentos de desempregados somaram esforços no questionamento da estrutura política e econômica vigente.

Os movimentos sociais incitam a transformação da sociedade na medida em que pressionam o Estado a atender às necessidades da população.



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No meio rural brasileiro, a histórica concentração das terras nas mãos de grandes proprietários e o desenvolvimento do capitalismo levaram à reação dos que se viram à margem disso. A partir dos anos 1980, houve ações organizadas como a luta pela reforma agrária e o Movimento dos Atingidos por Barragens (MAB), em defesa das populações que tiveram suas terras inundadas após a construção de hidrelétricas e represas. A terra, aliás, foi e continua sendo a bandeira de vários movimentos sociais. O mais conhecido deles é o Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST), que pressiona o Estado a realizar a reforma agrária e chama a atenção da sociedade para a dificuldade de acesso à terra e meios para tirar dela seu sustento. O MST utiliza diversas formas de luta: ocupações e acampamentos coletivos, marchas pelas rodovias, greves de fome, ocupação de prédios públicos, vigílias, entre outras ações.

LEGENDA: Acampamento de integrantes do Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST), entre Dourados e Campo Grande (MS). Foto de 2015.

FONTE: Cassandra Cury/Pulsar Imagens

A articulação dos movimentos sociais e a sua experiência de luta colaboraram decisivamente, por exemplo, para a restauração da democracia e do Estado de Direito no país após as duas décadas de ditadura militar. Esse processo ocorreu por meio de uma transição gradual que, entre outras coisas, restabeleceu o pluripartidarismo, concedeu anistia aos perseguidos por motivos políticos e garantiu a volta de eleições diretas para presidente da República. A redemocratização, no entanto, só se completou com a promulgação da Constituição de 1988.

Os movimentos sociais, na conjuntura das ditaduras latino -americanas, foram fundamentais para que parte da população rural e dos grandes centros chegasse à


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