A herança maldita de fhc – Sérgio Miranda o fmi foi co-gestor da economia do país no último mandato de fhc, que deixou o país quebrado, a inflação alta e o futuro comprometido pela ruína da infra-estrutura, como estradas e energia elétrica


Estado mínimo para o povo e máximo para o grande capital



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Estado mínimo para o povo e máximo para o grande capital

O Estado brasileiro foi desestruturado e reduzido com as privatizações, o aumento do endividamento e a diminuição nos gastos sociais. Já as despesas com juros e serviços da dívida foram ampliadas.

Os orçamentos são excelentes instrumentos para mostrar a natureza do Estado. Neles pode-se ver de onde vem e para onde vai o dinheiro; quem paga a conta e quem se beneficia dos recursos públicos; quais são as prioridades e quais são os interesses das forças que dominam a ação política.

Como são elaboradas e como são controladas as contas de um Estado diz muito também sobre a natureza do processo democrático de um país. Antes, as contas estatais eram tarefa do monarca. Com as revoluções burguesas, com a derrota total ou parcial dos regimes monárquicos e o estabelecimento dos regimes republicanos ou das monarquias constitucionais, parlamentos eleitos passaram a votar as contas de governo, estabelecer os tributos e limitar as despesas.

As revoluções socialistas do século 20 procuraram criar Estados de natureza diferente, que controlassem também o planejamento e os principais ramos da geração de riqueza de um país, com as empresas públicas. E com parlamentos diferentes – não de políticos profissionais, mas formados por trabalhadores comuns, convocados periodicamente para a tarefa de legislar e aprovar o orçamento. É o caso, ainda hoje, por exemplo, de Cuba ou da China. A Assembléia Nacional Popular da China, que se reúne no próximo mês de março, por exemplo, discute um orçamento público que inclui não apenas as despesas e receitas dos ministérios tradicionais como da Educação, Saúde e outros; mas também o controle de algumas dezenas de milhares de empresas estatais federais – a China tem, além dessas, mais algumas dezenas de milhares de empresas estatais estaduais e municipais.

Nas economias dependentes do Terceiro Mundo, depois da grande crise capitalista dos anos 30, surgiram Estados burgueses com grande presença na economia, com um número expressivo de empresas estatais no setor produtivo. Carlos Sobral, coordenador do estudo do IBGE sobre as estatais brasileiras divulgado no final do ano passado, relembrou, na ocasião, que o país já teve cerca de 800 estatais, que eram responsáveis por mais ou menos 50% do investimento no país.

O Orçamento Geral da União (OGU) compõe-se de três orçamentos e reflete, ainda hoje, essa característica de nosso Estado: um dos orçamentos é o dos investimentos das estatais. Os outros dois são o da Seguridade Social, em que estão as despesas da previdência, saúde e da assistência social; e o orçamento fiscal, que trata das demais despesas do Executivo (em que estão outros ministérios), do Legislativo e do Judiciário.

Fernando Henrique, no seu propósito de destruir aspectos essenciais da chamada Era Vargas –, dos governos iniciados com a Revolução de 30 e que, a despeito de interrupções, determinaram a natureza do sistema econômico brasileiro até recentemente – empenhou-se, explicitamente, em acabar com as empresas estatais do setor produtivo. Mesmo assim, o país ainda tem 320 empresas estatais, nos três níveis da federação. O orçamento de investimentos das estatais federais brasileiras de 2003 é de cerca de 27 bilhões de reais, muito maior do que o investimento previsto nos orçamentos fiscal e da seguridade. Isso, porque nele ainda estão, por exemplo, duas gigantes da economia do país: a Petrobrás, a maior empresa brasileira, e a Eletrobrás, a holding que agrupa as grandes geradoras de eletricidade, que são ainda, em sua maioria, públicas. No auge da crise de energia brasileira, Fernando Henrique, a despeito de toda sua aversão às estatais, criou mais uma: a CBCE – Companhia Brasileira de Comercialização de Energia. Estado novo

FHC prometeu fazer uma revolução no Estado brasileiro. Condenou, não só sua intervenção direta na produção, como também o seu papel de planejamento. A ação direta do Estado na economia e o dirigismo estatal, dizia ele, eram entraves ao desenvolvimento do Brasil. Os mercados seriam mais ágeis e por meio deles o país teria novas tecnologias, mais investimentos e menos corrupção. Melhor ainda, estaria livre das funções de produzir ou planejar a ação econômica, concentrado no que seriam seus serviços essenciais: educação, saúde, assistência social – o Estado seria mais eficiente e o povo estaria mais bem atendido. É essencial, portanto, fazer um balanço do que ele fez e que tipo de Estado, transformado, ele deixou. Cinco observações podem ser feitas:

1) A primeira já foi apresentada: FHC reduziu bastante a ação econômica do Estado. No seu governo, segundo o IBGE, entre 1995 e 2000, foram privatizadas 134 empresas – 52 financeiras e 82 não-financeiras. Em 1995, ao votar o orçamento de investimento das empresas estatais, o Congresso decidia sobre 10,7% do total de investimentos da economia brasileira. Em 2000, esse valor era mais ou menos a metade disso, 5,8%, segundo os dados de dezembro do IBGE (veja box na próxima página).

2) A segunda grande mudança pode-se ver pela parte financeira do orçamento, não a que trata dos impostos e contribuições e nem das despesas mais visíveis, como os gastos com pessoal, investimentos e custeio dos ministérios; mas a que trata da dívida do Estado, de sua amortização e do pagamento de seus juros. Essa parte agora é muito maior: o país paga e arrecada muito mais com a emissão de títulos públicos do que antes. Não porque a arrecadação de impostos e contribuições tenha sido pequena no governo FHC. Ao contrário: ele promoveu uma verdadeira derrama federal. Depois de deduzidas as transferências constitucionais, o governo central ficará com cerca de 20% do produto nacional nas previsões do orçamento de 2003. Em valores, um crescimento de cerca de 50% em relação a 1995. Mas essa sangria não foi suficiente para cobrir nem mesmo os juros da dívida, que, em termos absolutos e valores relativos, disparou no período FHC.

3) Na parte do orçamento que trata dos serviços públicos, Fernando Henrique deixa para Lula um orçamento desigual – bem maior do que o que encontrou em 1995 em algumas áreas, menor em outras e, no geral, com gastos bem inferiores àqueles que se esperaria em decorrência do grande aumento da arrecadação. A receita de impostos e contribuições, entre o realizado em 1995 e o estimado para 2003, irá aumentar 82%; mas as despesas com saúde, por exemplo, cujos gastos são protegidos constitucionalmente, crescerá apenas 70%, ficando em 28 bilhões de reais. As verbas para a educação crescerão menos da metade do incremento das receitas, em 39%, chegando a 14,6 bilhões de reais. As verbas para a defesa e segurança variaram menos ainda, 34%. As verbas para o trabalho, que inclui geração de emprego e renda, ao contrário, decresceram 4% em 2003, comparado a 1995.

4) Um outro item do orçamento que se deve destacar é o das despesas previdenciárias, que ficam no Orçamento da Seguridade Social e cresceram expressivamente no orçamento deixado para Lula. Para 2003, estão programados 131,8 bilhões de reais nessas despesas. O crescimento dos gastos com a previdência é freqüentemente atribuído por FHC à chamada rede de proteção social – que inclui diversos tipos de programas para as pessoas de baixa renda, ver matéria nas páginas de 12 a 17 – que seu governo teria criado e cujas verbas teriam aumentado muito. De fato, os gastos com a previdência são a grande fatia dessa rede e os principais responsáveis por seu efetivo crescimento entre 1995 e 2003. Mas não é verdade que FHC tenha criado, nem aumentado os gastos previdenciários. A sua parte mais expressiva é de obrigações estabelecidas na época do Regime Militar e na Constituição redemocratizadora de 1988, como o direito a um salário mínimo para os trabalhadores que se aposentam no campo, por exemplo. FHC, ao contrário, ao longo de seu governo, lutou muito para reduzir os gastos com a previdência, conseguindo, em duas reformas no Estado brasileiro, diminuir o valor das aposentadorias dos setores público e privado. Além disso, pretendeu deixar escrito na agenda do próximo governo a necessidade de mais uma reforma previdenciária. Recentemente, o diretor gerente do FMI esteve em visita ao Brasil e, em conversas com banqueiros em São Paulo, disse que a meta para o Brasil deve ser a de redução do chamado déficit previdenciário, que estaria em aproximadamente 5% do PIB, e que isso, para o novo governo, seria mais importante do que aumentar o superávit primário que será cobrado do governo Lula neste seu primeiro ano de mandato, 3,75% do PIB.

5) O quinto aspecto a destacar nas contas do Estado recriado por FHC não está no Orçamento, mas na chamada Conta Única do Tesouro Nacional. Em 1997, o Tesouro Nacional iniciou o ano com 17 bilhões de reais em caixa, um dinheiro que por força da Constituição fica depositado no Banco Central. Ao final de 2002, esse saldo ultrapassava a casa de 99 bilhões de reais, quase 6 vezes mais.

Por que o governo insiste em cortar gastos na saúde, educação e segurança com tantos bilhões em caixa? Por que continua se endividando mais e mais e pagando juros ao mesmo tempo que mantém tanto dinheiro parado? Por que não salda pelo menos uma parcela da sua colossal dívida? Esse dinheiro, em parte, decorre de recursos de impostos e contribuições que não foram gastos. Outra parte significativa veio do lançamento de títulos da dívida em quantidades muito acima das necessidades do governo – mesmo se considerarmos os enormes gastos com rolagem e juros de dívida. Na verdade, o Banco Central utilizou esse excesso de endividamento (lançamentos extras) para retirar dinheiro de circulação, manter os juros muito altos, cortar o crédito e as atividades produtivas, congelando o país numa política recessiva. Fez isso pela necessidade de atrair dólares para o país, em função da dependência externa, que marcou a economia brasileira ao longo de todo seu governo. O custo dessa política, herança de FHC para Lula, é muito alto.

FHC deixa para Lula uma montanha de juros e amortizações a pagar. O pagamento de juros registrado no orçamento crescerá 266%, de 25,5 bilhões de reais, em 1995, para 93,6 bilhões, para 2003. As amortizações da dívida externa subirão 609%, de 5 bilhões de reais para 35 bilhões de reais; e as da dívida interna vão de 155 bilhões de reais para 546 bilhões de reais, mais 252%. É preciso ressaltar que as despesas com a dívida serão ainda maiores, pois o orçamento para 2003 foi construído em meados de 2002, prevendo, em dezembro de 2002, dólar a 2,73 reais e juros de 18,3% ao ano. Longe, portanto, da realidade de um dólar a 3,5 reais e de juros a 25% ao ano.

Estado máximo

Lula também terá de produzir um grande superávit primário, o conceito chave nos acordos do Brasil com o FMI. Para entender esse conceito deve-se fazer uma conta. A arrecadação de impostos e contribuições, aproximadamente 350 bilhões de reais, é insuficiente para amortizar 500 bilhões de reais de dívida interna e pagar mais 100 bilhões de reais de juros – só daria para cerca de metade da dívida, sem contar as despesas do ano. Para pagar quase tudo o que deve, mostra o orçamento de 2003, o governo Lula emitirá títulos da dívida pública. O governo amortizará os 500 bilhões da dívida interna realizando o que se chama de rolagem da dívida: vai emitir novos títulos para pagar os que forem vencendo. E vai rolar também grande parte dos juros, com a emissão de títulos. Mas vai pagar uma parte da dívida, para impedir que a dívida cresça demais. Para isso é que existe o superávit primário, uma parte de impostos e contribuições que ficam reservados para as despesas financeiras.

O governo FHC sempre defendeu e pôs em prática uma política de gerar superávits primários. Mas houve uma mudança essencial no seu segundo mandato. Entre 1995 e 1998, os superávits primários do governo ficaram em menos de 0,5% do PIB, quantias equivalentes a um quinto ou um sexto dos orçamentos da saúde. A partir de 1999, em função dos acordos com o FMI feitos por Fernando Henrique e legados ao governo Lula, os superávits passaram a ser de mais de 2,5% do PIB, e cada vez maiores, sempre maiores que o orçamento da saúde, por exemplo. No último semestre de 2002, o governo federal acertou com o FMI – e cumpriu – um superávit de 3,88% do PIB. Para 2003, Lula deve garantir um superávit de 33,7 bilhões de reais (o orçamento da saúde é de 28 bilhões de reais).

A evolução da dívida pública é uma expressão viva do compromisso do Estado brasileiro, sob os mandatos de FHC, com os interesses do grande capital. FHC sempre afirmou que a dívida cresce porque o Estado gasta muito mais do que arrecada. Mas a dívida pública tem muitas outras finalidades, a menor delas é custear as despesas da administração, os gastos não-financeiros.

Com o real mantido em torno de um dólar, os altos juros internos levaram as empresas com crédito lá fora a tomar dinheiro no exterior. O gráfico ao lado mostra esse fato. Ele apresenta a dívida externa do país dividida em duas partes, a do Estado e a das empresas particulares. E mostra também a dívida interna pública. Pelo gráfico, se percebe a relação entre esses três endividamentos. Na fase entre 1994 e começo de 1998, os particulares foram ao exterior e tomaram cerca de 150 bilhões de dólares. A dívida interna cresceu porque grande parte desses dólares foram comprados pelo Estado, que acumulou grandes reservas para garantir o Plano Real. A partir de maio de 1998, o Brasil começa a quebrar e o crédito para os particulares passa a ser mais difícil. Eles começam apenas a rolar suas dívidas lá fora, sem aumentá-las, chegando mesmo a amortizá-las. Mas a dívida continuou aumentando porque, então, é o Estado brasileiro que saiu para tomar dólares – foram mais de 80 bilhões de dólares nos três empréstimos desse período com o FMI e outras agências internacionais.

Além dos juros, outro aspecto que levou ao incremento da dívida interna pública é a proteção do Estado aos grandes capitalistas que estavam endividados no exterior. A proteção de quem devia em dólares está em títulos da dívida pública interna que, além de pagar juros, são indexados à moeda dos EUA. Ou seja, quem tem um título desses, além de ganhar juros, mantém o seu valor em dólar qualquer que seja a desvalorização da moeda americana. Em janeiro de 1999, às vésperas da desvalorização do real – que chegou a valer mais de um dólar e passou a valer cerca de meio dólar –, o governo federal tinha 113 bilhões de reais nesses títulos cambiais, 30% de sua dívida mobiliária interna. Apenas um mês antes, esse percentual era de 21%. Fato similar ocorreu a partir de maio de 2002, quando novamente o dólar se valorizou, indo desta vez da casa de 2,5 reais para perto de 4 reais. Títulos federais e contratos do BC, ao final de agosto, protegiam então 217 bilhões de reais.

Em conseqüência dessa política de proteção do grande capital, a dívida pública líquida explodiu. De 1994 a 1998, como pode-se ver no gráfico, a dívida interna bruta vinha crescendo. Mas o governo tinha dólares de reservas que compensavam esse crescimento. Em maio de 1997, a dívida pública líquida atingiu o mais baixo patamar dos anos noventa, ficou em 27% do PIB. Mas, a partir de então cresce espetacularmente. O efeito dos altos juros e a queda das reservas internacionais fizeram aparecer um problema que FHC pretendia manter longe dos olhares do povo, que se preparava para ir às urnas. Já em dezembro daquele ano, a dívida líquida do setor público chegou a 33,2%, e cresceu ano a ano para em setembro de 2002 estourar a casa de 63% de todas as riquezas produzidas pelo país.

O problema da dívida não se resume ao seu tamanho. Diversos países têm um grau de endividamento muito maior. Mas poucos têm uma dívida tão cara e com vencimento tão concentrado. Para se ter noção do custo dessa política de proteção do grande capital basta verificar o relatório com o Resultado do Tesouro Nacional. Ele aponta que o custo médio da dívida mobiliária federal (juros, desvalorização e outros encargos) em 2002 foi de 49% para o período janeiro-novembro.



Estado mínimo

Outro dado que demonstra que a dívida cresce para proteger o grande capital é o saldo da conta única do Tesouro Nacional. Como já foi citado, esse saldo cresceu quase 6 vezes entre o início de 1997 e o final de 2002. Isso significa, como mostramos, que o governo emitiu muito mais títulos do que o necessário para pagar todas as suas contas, mesmo incluindo as colossais despesas com a dívida. Os títulos correspondentes aos reais não utilizados são usados pelo Banco Central para executar sua política monetária e cambial. A partir de 1998, além de proteger os grandes capitalistas que tinham tomado empréstimos no exterior – entre os quais muitas multinacionais que usaram o dinheiro para a compra de estatais – as políticas monetária e cambial foram usadas para conter o consumo interno e gerar um saldo comercial alto para obter dólares e pagar os grandes credores externos.

Mas nem todo dinheiro do superávit pode ser utilizado para pagamentos da dívida. O primeiro, por uma questão legal. Uma parcela significativa dos superávits vem sendo produzida com recursos que a Constituição só permite que sejam gastos com outras despesas. Em 2001, por exemplo, o superávit foi de 21,9 bilhões reais. Dois bilhões correspondiam no orçamento a recursos do Fundo da Pobreza, que gastou menos de 300 milhões ao longo do ano; outro bilhão pertencia à CPMF; 1,2 bilhão à educação; mais 1 bilhão à universalização das telecomunicações, para computadores e Internet que nunca chegaram às escolas e aos postos de saúde. O orçamento preparado para Lula, nesse sentido, vai além. Do superávit de 33 bilhões para 2003, quase 15 bilhões de reais, 44%, são de recursos vinculados. São verbas que não podem ser simplesmente alocadas em pagamentos da dívida.

A questão legal nunca foi um impedimento para FHC. De tempos em tempos, o governo editava medidas provisórias para desvincular os recursos de suas destinações legais e vinculá-las à dívida ou outra despesa financeira (a última foi em agosto de 2002).

O maior constrangimento para o pagamento da dívida é mesmo econômico. Num cenário recessivo, toda a ação da política monetária tem sido para diminuir a moeda em circulação, um efeito contrário ao que ocorre quando o Tesouro libera recursos para gastos sociais ou para liquidação da sua dívida. Sob a ótica monetarista, que dirige os rumos do país, pagar a dívida exigiria crescimento econômico – crescimento que o Real não permite.

Os sucessivos prejuízos do Banco Central, em sua política de defesa do grande capital, tornaram-se tão significativos que, em 1997, por medida provisória, FHC resolveu que, a partir de então, eles seriam assumidos integralmente pelo Tesouro. E, naturalmente, deveriam ser corrigidos antes de serem pagos. Em 30 de dezembro de 1998, o Tesouro arcou com 51,5 bilhões reais, a preços de dezembro de 2002. No período posterior, na gestão Armínio Fraga, de 1999 até novembro de 2002, eles já custaram outros 42,4 bilhões de reais ao Tesouro (em reais de dezembro de 2002).

Segundo o relatório que o BC apresentou ao Congresso, no segundo semestre de 2002, a dívida do setor público foi de 41,7% do PIB, em dezembro de 1998, para 58,1%, em junho de 2002. O pagamento de juros reais e a variação cambial são responsáveis por 86% desse crescimento.

Como vimos, no orçamento para 2003, os gastos com a dívida estão visivelmente subestimados. Dificilmente o dólar cairá ao nível fixado e os juros acompanharão a queda sugerida na lei orçamentária. Se o governo Lula for proteger os devedores em dólar e manter a política de forjar o superávit primário a qualquer custo, como FHC, o que terá de fazer? Deverá fazer o mesmo que FHC praticou no fim do ano que passou. Um balanço realizado em meados de dezembro mostra que grande parte dos programas previstos no orçamento de 2002 não havia saído do papel. De um total de 26 bilhões de reais autorizados para a saúde, apenas 22 bilhões foram liberados. Na educação, em que a proteção constitucional é menor, os cortes foram mais significativos: um quarto dos recursos programados ficou retido. O governo é obrigado a gastar 4 bilhões de reais por ano do Fundo da Pobreza, que recebe 21% da CPMF arrecadada. No final de 2000, essas receitas somavam 4,2 bilhões reais e apenas 2,1 bilhões haviam sido liberados. Nem mesmo o crescimento da violência comoveu o governo: os programas de segurança pública somente utilizaram 63% do previsto. O desemprego também não mudou a política de cortes. Geração de emprego e renda, erradicação do trabalho escravo e formação profissional receberam 69% do total imaginado. Programas sem proteção constitucional foram literalmente desconsiderados por FHC. Os de saneamento liberaram apenas 2,26% das verbas previstas; os de infra-estrutura urbana, só 6,71%. Dessa forma, o Tesouro acabou por apresentar um resultado recorde. O superávit primário acumulado até novembro foi de 34,6 bilhões de reais.

Mas algumas despesas não podem ser simplesmente cortadas. O governo não pode deixar de pagar uma aposentadoria já concedida, nem se esquecer de fazer um repasse obrigatório a um município. Essas despesas precisam ser controladas antes de se formarem esses direitos. Entram em cena leis e medidas provisórias para diminuir direitos, restringir acessos... e gastar menos. Nas universidades públicas, a falta de substituição dos professores que aposentaram e o corte sistemático de verbas, criaram uma situação de penúria. Baixos salários levaram pessoas com grande qualificação para os inúmeros cursos particulares que o governo licenciou sem a menor preocupação com a qualidade. No ensino fundamental, parte dos recursos vem do Fundo de Valorização do Magistério, de dinheiro público rateado entre estados e municípios de acordo com o número de alunos matriculados no ensino fundamental. Graças a uma manipulação no cálculo do valor mínimo por aluno, que deve ser complementado pela União, o governo reduziu sua contribuição a menos de 1,4% do total de recursos.

Na saúde, a aprovação da Emenda Constitucional nº 29, que determina o mínimo de recursos mínimos a serem aplicados no setor, não solucionou o problema. Antes de a Emenda surtir efeito, FHC referendou um parecer da Advocacia Geral da União que diminuiu os recursos para o setor em cerca de 2 bilhões de reais em 2003 e mais de 5 bilhões acumulados desde 2000.

As deficiências na saúde pública serviram para favorecer os serviços e os planos de saúde privada. Na previdência, ocorreu o mesmo. Na reforma da previdência, por exemplo, o governo FHC inseriu no texto constitucional um teto para os benefícios previdenciários, com um valor fixado em reais, na época, 10 salários mínimos. Decorridos apenas 4 anos, esse valor representa pouco mais de 7 salários mínimos. As limitações a direitos e a certeza de que esse valor vai se deteriorar ainda mais fizeram florescer os planos privados de previdência. São ações dirigidas com o nítido propósito de criar público cativo, refém dos interesses privados.

Hoje quase 50 milhões de brasileiros trabalham sem registro, são autônomos, cooperativados ou desempregados. Estão excluídos da cobertura previdenciária e não têm como prover o próprio sustento quando forem obrigados pela velhice ou pelo desemprego a pararem de trabalhar.



Reformas neoliberais

No caso da previdência social, grande parte do enorme déficit de hoje deve-se ao elevado e crescente desemprego e a um número cada vez menor de contribuintes para os fundos públicos de previdência – nítida expressão do fracasso na política de desenvolvimento econômico prometida por FHC. No seu governo, o país registrou as menores taxas de crescimento econômico e as maiores taxas de desemprego de sua história.

O grande contrato social prometido por FHC em seu discurso de 14 de dezembro de 1994 no Senado – menos Estado, mais liberdade para o capital, mais desenvolvimento, tecnologia e melhores condições sociais – fracassou.

O “príncipe dos sociólogos” fez sua escolha sobre quais contratos deveriam ser cumpridos integralmente. Enquanto insiste na completa manutenção dos contratos das dívidas interna e externa, defende alteração nos contratos anteriores ao seu governo que garantem aos trabalhadores direito a aposentadorias e pensões dignas, garantidas pelo Estado. A opção de FHC foi pelo grande capital.



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