Fédon (a imortalidade da alma)


partir do m om ento em que nascem os com o hom ens



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Platao-Fedon


partir do m om ento em que nascem os com o hom ens.
Não, decerto.
Então é antes?
Sim .
Logo, Sím ias, as alm as existem antes de assum irem a form a hum ana,
separadas dos corpos, e possuírem entendim ento.
A m enos, Sócrates, que adquiram os tal conhecim ento ao nascer, pois ainda
falta considerar esse tem po.
Que sej a, com panheiro! Mas então, em que tem po perdem os esse
conhecim ento? Ao nascerm os não dispom os dele, com o acabam os de adm itir.
Ou será que o perdem os no m om ento exato em que o adquirim os? Poderás


indicar outro tem po?
Não há j eito, Sócrates, sem o querer, disse um a tolice.
XXII - Nossa situação, Sím ias, não será a seguinte? Se existe, realm ente, tudo
isso com que vivem os a encher a boca: o belo e o bom e todas as essências desse
tipo, e se a elas referim os tudo o que nos chega por interm édio dos sentidos,
com o a algo preexistente, que encontram os em nós m esm os e com que o
com param os: será forçoso que, assim com o elas, exista nossa alm a antes de
nascerm os, e que sem aquelas estas não existiriam ?
Mais que exata, falou Sím ias, m e parece, Sócrates, a m esm a necessidade; é
m uito segura a posição a que se acolhe o argum ento, no que entende com a
afinidade entre as essências a que te referiste, e nossa alm a, antes de nascerm os.
Não sei de nada tão claro com o dizer que todos esses conceitos existem na m ais
elevada acepção do term o: o belo, o bem e tudo o m ais que enum eraste há
pouco. Essa dem onstração m e satisfaz plenam ente.
E a Cebete? Perguntou; precisas tam bém convencer Cebete.
A ele tam bém satisfaz, respondeu Sím ias, segundo penso, m uito em bora sej a
o hom em m ais difícil de aceitar a opinião dos outros. Mas creio que j á esse
encontra convencido de que nossa alm a existe antes de nascerm os.
XXIII - Porém Sócrates, que ela continue a existir depois de nossa m orte é o
que não m e parece suficientem ente dem onstrado, pois ainda está de pé a opinião
do vulgo a que Cebete se referiu há pouco: Quem sabe se no instante preciso em
que o hom em m orre, a alm a se dispersa, sendo esse, j ustam ente, o seu fim ? Que
im pede, de fato que ela nasça algures e se constitua de outros elem entos e exista
antes de alcançar o corpo hum ano, m as depois de entrar no corpo, quando tiver
de separar-se dele, tam bém acabe de um a vez e venha a destruir-se?
Falaste bem , Sím ias, observou Cebete. Parece que só foi dem onstrado
m etade do que era de m ister, a saber: que nossa alm a existe antes de nascerm os;
ainda falta provar, por conseguinte, que depois de m orrerm os ela não existirá
m enos do que antes do nascim ento. Só assim ficará com pleta a dem onstração.
Foi com pletada agora m esm o, Sím ias e Cebete, observou Sócrates; bastará
j untardes o presente argum ento ao que adm itim os antes, de que tudo o que vive
só nasce do que é m orto. Porque se as alm as existem antes do nascim ento e se,
necessariam ente, para com eçarem a vida e existirem , não poderão provir de
outra parte a não ser da m orte do que está m orto, não será forçoso que
continuem a existir depois da m orte, para renascerem ? Com o disse, essa parte j á
foi dem onstrada.
XXIV - Porém verifico, Sím ias e Cebete, que am bos vós folgaríeis de
exam inar m ais a fundo essa questão, pois, com o as crianças, tem eis, de fato, que
o vento arraste a alm a e a disperse no m om ento em que ela deixa o corpo,
m áxim e se na hora em que m orre alguém o céu não estiver sereno e soprar
vento forte.
E Cebete, desatando a rir, Faze de conta, Sócrates, observou, que estam os
com m edo, e procura convencer-nos. Ou m elhor: será preferível adm itires, não


que tem os m edo, m as que talvez haj a dentro de nós um a criança que se assusta
com essas cosias. Trata, por conseguinte, de convencê-la a não ter m edo da
m orte com o do bicho-papão.
Para tanto, lhes falou Sócrates, será preciso exorcizá-la diariam ente, até
passar o m edo.
E onde, Sócrates, perguntou, encontrarem os um bom exorcizador, um a vez
que nos abandonas?
A Hélade é grande, Cebete, replicou, e nela há m uitos hom ens de
m erecim ento. Grandes tam bém sãos as gerações bárbaras, que precisareis
esquadrinhar para encontrar um m ágico nessas condições, sem olhar despesas
nem fadiga, pois em nada m ais poderíeis aplicar o vosso dinheiro. Mas convém
prom overdes essa busca tam bém entre vós outros, pois talvez não sej a fácil
encontrar quem se desincum ba disso m elhor do que vós m esm os.
É o que farem os, falou Cebete. Porém se levares gosto nisso, voltem os para o
ponto em que ficam os antes.
Agrada-m e a proposta, com o não?
XXV - Agora o de que precisam os, falou Sócrates, é perguntar a nós m esm o
m ais ou m enos o seguinte: Com que coisas é natural sem elhante processo de
dispersão, com quais devem os ter m edo de que isso aconteça, e com quais não
devem os? De seguida, terem os de exam inar a qual das classes pertence a alm a,
para daí concluirm os se precisam os alegrar- nos ou tem er do que venha a
acontecer com a nossa.
É m uito certo, disse.
E não é verdade que as coisas, artificial ou naturalm ente com postas é que
devem acabar por dispersar-se nos elem entos originais? E o inverso: não será o
que não for com posto, antes de tudo, a única coisa que não convém passar por
esse processo de dissociação?
Acho que é assim m esm o, observou Cebete.
E tam bém não é certo que há m uita probalidade de não serem com postas as
coisas que sem pre se m antêm no m esm o estado e nunca se alteram , com o serão
com postas as que ora se apresentam de um a form a, ora de outra, e m udam a
cada instante?
É tam bém o que eu penso.
Então, prosseguiu, retom em os o tem a de nossa discussão anterior. Aquela
idéia ou essência a que em nossas perguntas e respostas atribuím os a verdadeira
existência, conserva-se sem pre a m esm a e de igual m odo, ou ora é de um a
form a, ora de outra? O igual em si, o belo em sim , todas as coisas em si m esm as,
o ser, adm item qualquer alteração? Ou cada um a dessas realidades, uniform es e
existentes por si m esm as, não se com portará sem pre da m esm a form a, sem
j am ais adm itir de nenhum j eito a m enor alteração?
Forçosam ente, Sócrates, falou Cebete, sem pre perm anecerá a m esm a e do
m esm o j eito.
E com relação à m ultiplicidade das coisas belas: hom ens, cavalos, vestes e


tudo o m ais da m esm a natureza, que ou são iguais ou belas e recebem a própria
designação daquelas realidades: conservam -se sem pre idênticas ou,
diferentem ente das essências, não são j am ais idênticas, nem com relação às
outras nem , por assim dizer, consigo m esm as?
Isso, j ustam ente, Sócrates, é o que se observa, respondeu Cebete, nunca se
conservam as m esm as.
E não é certo tam bém que todas essas coisas se podem ver e tocar ou
perceber por interm édio de qualquer outro sentido, ao passo que as essências, que
se conservam sem pre iguais a si m esm as, só podem ser apreendidas pelo
raciocínio, por serem todas elas invisíveis e estarem fora do alcance da visão?
O que dizes, observou, é a pura verdade.
XXVI - Achas, então, perguntou, que podem os adm itir duas espécies de
coisas: um as visíveis e outras invisíveis?
Podem os, respondeu.
Sendo que as invisíveis são sem pre idênticas a si m esm as, e as visíveis, o
contrário disso?
Adm itam os tam bém esse ponto, respondeu.
Então, prossigam os, um a parte de nós m esm os não é corpo, e a outra não é
alm a?
Sem dúvida, falou.
E com qual daquelas classes direm os que o corpo é m ais conform e e tem
m ais afinidade?
Para todo o m undo é evidente que é com a das coisas visíveis.
E com relação à alm a? É visível, ou será invisível?
Pelo m enos para o hom em , não o será, Sócrates, respondeu.
Mas, quando falam os do que é ou não é visível, é sem pre com vista à
natureza hum ana. Ou achas que sej a com relação a outra?
Não; é com a natureza hum ana, m esm o.
E a alm a? Que direm os dela: poderem os vê-la ou não?
Não podem os.
Logo, é invisível.
Certo.
Sendo assim , a alm a é m ais conform e à espécie invisível do que o corpo, e
este m ais à visível.
De toda a necessidade, Sócrates.
XXVII - Mas tam bém dissem os há alguns instantes, que quando a alm a se
serve do corpo para considerar algum a coisa por interm édio da vista ou do
ouvido, ou por qualquer outro sentido - pois considerar sej a o que for por m eio
dos sentidos é fazê-lo por interm édio do corpo - é arrastada por ele para o que
nunca se conserva no m esm o estado, passando a divagar e a perturbar-se, e
ficando tom ada de vertigens, com o se estivesse em briagada, pelo fato de entrar


em contato com tais coisas?
Sim , dissem os isso m esm o.
E o contrário disso: quando ela exam ina sozinha algum a coisa, volta-se para o
que é puro, sem piterno, e que sem pre se com porta do m esm o m odo, e por lhe ter
afinidade, vive com ele enquanto perm anecer consigo m esm a e lhe for
perm itido, deixando, assim , de divagar e pondo-se com o relação com o que é
sem pre igual e im utável, por esta em contato com ele. A esse estado, j ustam ente,
é que dam os o nom e de pensam ento.
Tudo isso, Sócrates, é verdadeiro e foi m uito bem enunciado.
E agora, de acordo com o presente argum ento e o anterior, com qual dessas
duas espécies a alm a se m ostra sem elhante e revela m aior afinidade?
No m eu m odo de pensar, Sócrates, respondeu, não há quem deixe de
concordar, por m ais obtuso que sej a, se te acom panhar o raciocínio, que em tudo
e por tudo a alm a tem m ais sem elhança com o que sem pre se conserva o
m esm o do que com o que varia.
E o corpo?
Com a outra espécie.
XXVIII - Exam ina agora a questão da seguinte m aneira: enquanto se
m antêm j untos o corpo e a alm a, im põe a natureza a um dele obedecer e servir e
ao outro com andar e dom inar. Sob esse aspecto, qual deles se assem elha ao
divino e qual ao m ortal? Não te parece que o divino é naturalm ente feito para
com andar e dirigir, e o m ortal para obedecer e servir?
Acho que sim .
E com qual deles a alm a se parece?
Evidentem ente, Sócrates, a alm a se assem elha ao divino, e o corpo ao m ortal
.
Considera agora, Cebete, continuou, se de tudo o que dissem os não se conclui
que ao que for divino, im ortal, inteligível, de um a só form a, indissolúvel, sem pre
no m esm o estado e sem elhante a si próprio é com o que alm a m ais se parece; e
o contrário: ao hum ano, m ortal e ininteligível, m ultiform e, dissolúvel e j am ais
igual a si m esm o, com isso é que o corpo se parece? Poderem os, am igo Cebete,
argum entar de outro m odo e dizer que não é dessa m aneira?
Não é possível.
XXIX - E então? Se for assim , não ficará o corpo suj eito a dissolver-se
depressa, conservando-se a alm a indissolúvel ou num estado que m uito disso se
aproxim a?
Sem dúvida.
Observa ainda, continuou, com o depois que o hom em m orre, sua porção
visível, o corpo, a que dam os o nom e de cadáver, colocado tam bém num lugar
visível, em bora o suj eito a dissolver-se, a desagregar-se, de im ediato não revela
nenhum a dessas alterações, conservando-se intacto por tem po relativam ente
longo; e se, no m om ento da m orte, o corpo estiver em boas condições, sendo boa,


igualm ente, a estação do ano, então conserva-se m uito m ais tem po. Quando o
corpo é descarnado e em balsam ado, tal com o se faz no Egito, ele perm anece
quase inteiro por tem po incalculável. Aliás, até m esm o no corpo em
decom posição, algum a de suas partes: ossos, tendões; e tudo m ais do gênero, são,
por assim dizer, im ortais. Não é isso m esm o?
Certo.
Ao passo que a alm a, a porção invisível, que vai para um lugar sem elhante a
ela, nobre, puro e invisível, o verdadeiro Hades, ou sej a, o Invisível, para j unto de
um deus sábio e bom , para onde tam bém , se Deus quiser, dentro de pouco irá
m inha alm a: essa alm a dizia, com sem elhante origem e constituição. Ao separar-
se do corpo, no m esm o instante se dissiparia e viria a destruir, conform e crê a
m aioria dos hom ens: Nunca, m eus caros Sím ias e Cebete! Pelo contrário; o que
se dá é o seguinte: se ela é pura no m om ento de sua libertação e não arrastar
consigo nada corpóreo, por isso m esm o que durante a vida nunca m antivera
com ércio voluntário com o corpo, porém sem pre evitara, recolhida em si
m esm a e tendo sem pre isso com o preocupação exclusiva, que outra coisa não é
senão filosofar, no rigoroso sentido da expressão, e preparar-se para m orrer
facilm ente... Pois tudo isso não será um exercício para a m orte?
Sem dúvida nenhum a.
Assim constituída, dirigi-se para o que lhe assem elha, para o invisível, divino,
im ortal e inteligível, onde, ao chegar, vive feliz, liberta do erro, da ignorância, do
m edo, dos am ores selvagens e dos outros m ales da condição hum ana, passando
tal com o se diz dos iniciados, a viver o resto do tem po na com panhia dos deuses.
Falarem os desse j eito, Cebete, ou de outra form a?
XXX - Assim m esm o, por Zeus, respondeu Cebete.
No caso, porém , conform e penso, de estar m anchada e im pura ao separar-se
do corpo, por ter convivido sem pre com ele, cuidado dele e o ter am ado e estar
fascinada por ele e por seus apetites e deleites, a ponto de só aceitar com o
verdadeiro o que tivesse form a corpórea, que se pode ver, tocar, beber, com er,
ou servir para o am or; e se ela, que se habituou a odiar, tem er e evitar o que é
obscuro e invisível para os olhos, porém inteligível e apreensível com à filosofia:
acreditas que um a alm a nessas condições estej a recolhida em si m esm a e sem
m istura no m om ento em que deixar o corpo?
De form a algum a, respondeu.
Porém segundo penso, de todo em todo saturada de elem entos corpóreos que
com ela cresceram com o resultado de sua fam iliaridade e contínua
com unicação com o corpo, de que nunca se separou e de que sem pre cuidara.
Sem dúvida.
Então, m eu caro, terás de adm itir que tudo isso é espesso, terreno e visível. A
alm a, com essa sobrecarga, torna-se pesada e é de novo arrastada para a região
visível, de m edo do Invisível - o Hades, com o e diz - e rola por entre os
m onum entos e túm ulos, na proxim idade dos quais têm sido vistos fantasm as
tenebrosos, sem elhantes aos espectros dessas alm as que não se libertaram puras


de corpo e que se tornaram visível.
É m uito possível, Sócrates, que sej a assim m esm o.
Sim , é m uito possível, Cebete, e tam bém que essas alm as não sej am dos
bons, porém dos m aus, que se vêem obrigadas a vagar por esse lugares, com o
castigo de sua conduta durante a vida, que fora péssim a. E assim ficam a vagar,
até que o apetite do elem ento corporal a que sem pre estão ligadas volte a prendê-
las noutros corpos.
XXXI - Com o é natural, voltam a ser aprisionadas em naturezas de costum es
iguais aos que elas praticaram em vida.
A que a naturezas te referes, Sócrates?
É o seguinte: as que eram dadas à glutonaria, ao orgulho ou à em briaguez
desbragada, entram naturalm ente nos corpos de asnos e de anim ais congêneres.
Não te parece?
Falas com m uita propriedade.
As que com eteram inj ustiças, a tirania ou a rapina, passam para a geração
dos lobos, dos açores e dos abutres. Para onde m ais podem os dizer que vão as
alm as dessa natureza?
Não há dúvida, respondeu Cebete; é para esses corpos que elas vão.
E não é evidente, continuou, que o m esm o se passa com os dem ais, por se
orientarem todas elas no sentido de suas próprias tendências?
É claro, observou; nem poderia ser de outra m aneira.
Logo, disse, os m ais felizes e que vão para os m elhores lugares são os que
praticam a virtude cívica e social que dom inam os tem perança e j ustiça, por
força apenas do hábito e da disposição própria, sem a participação da filosofia e
da inteligência.
Por que serão esses os m ais felizes?
Por ser natural que passem para um a raça sociável e m ansa, de abelhas,
vespas ou form igas, ou até para a m esm a raça, a hum ana, a fim de gerarem
hom ens m oderados.
Sem dúvida.
XXXII - Para a raça dos deuses não é perm itido passar os que não
praticaram a Filosofia nem partiram inteiram ente puros, m as apenas os am igos
da Sabedoria. É por isso, m eus caros Sím ias e Cebete, que os verdadeiros
filósofos se acautelam contra os apetites do corpo, resistem -lhes e não se deixam
dom inar por eles; não têm m edo da pobreza nem da ruína de sua própria casa,
com o a m aioria dos hom ens, am igos das riquezas, nem tem em a falta de
honrarias e a vida inglória, com o se dá com os am antes do poder e das distinções.
Não é essa a razão de se absterem de tudo?
De fato, Sócrates; nada disso lhes ficaria bem , falou Cebete.
Não, por Zeus, retorquiu. Por isso m esm o, Cebete, todos os que cuidam da
alm a e não vivem sim plesm ente para o culto do corpo, dizem adeus a tudo isso e
não seguem o cam inho dos que não sabem para onde vão. Convencidos de que


não devem os fazer nada em contrário à Filosofia nem ao que ela prescreve para
libertar-nos e purificar-nos, voltam - se para esse lado, seguindo na direção por
ela aconselhada.
XXXIII - De que m odo, Sócrates?
Vou dizer-te, respondeu. Estão perfeitam ente cientes os am igos da Sabedoria,
que quando a Filosofia passa a dirigir-lhes a alm a, esta se encontra com o que
ligada e aglutinada ao corpo, por interm édio do qual é forçada a ver a realidade
com o através das grades de um cárcere, em lugar de o fazer sozinha e por si
m esm a, porém atolada na m ais absoluta ignorância. O que há de terrível nesse
liam es, reconhece-o a Filosofia, é consistirem nos prazeres e ser próprio
prisioneiro quem m ais coopera para m anietar-se. Com o disse, os am igos da
Sabedoria estão cientes de que, ao tom ar conta de sua alm a em tal estado, a
Filosofia lhe fala com doçura e procura libertá-la, m ostrando-lhe quão cheio de
ilusões é o conhecim ento adquirido por m eio dos olhos, quão enganador o dos
ouvidos e dos m ais sentidos, aconselhando-a a abandoná-los e a não fazer uso
deles se não só o necessário, e a recolher-se e concentrar-se em si m esm a e só a
acreditar em si própria e no que ela em si m esm a aprender da realidade em si, e
o inverso: a não aceitar com o verdadeiro tudo o que ela considerar por m eios que
em cada caso se m odificam , pois as coisas desses gênero são sensíveis e visíveis,
ao passo que é inteligível e invisível o que ela vê por si m esm a. Convencida de
que não deve opor-se a sem elhante libertação, a alm a do verdadeiro filósofo
abstém dos prazeres, das paixões e dos tem ores, tanto quanto possível, certa de
que sem pre que alguém se alegra em extrem o, ou tem e, ou desej a, ou sofre, o
m al daí resultante não é o que se poderia im aginar, com o seria o caso, por
exem plo, de adoecer ou vir a arruinar-se por causa das paixões: o m aior e o pior
dos m ales é o que não se deixa perceber.
Qual é, Sócrates? perguntou Cebete.
É que toda alm a hum ana, nos casos de prazer ou de sofrim ento intensos, é
forçosam ente levada a crer que o obj eto causador de sem elhante em oção é o
que há de m ais claro e verdadeiro, quando, de fato, não é assim . De regra, trata-
se de coisas visíveis, não é isso m esm o?
Perfeitam ente.
E não é quando passa por tudo isso que a alm a se encontra m ais intim am ente
presa ao corpo?
Com o assim ?
Porque os prazeres e os sofrim entos são com o que dotados de um cravo com
o qual transfixam a alm a e a prendem ao corpo, deixando-a corpórea e levando-
o a acreditar que tudo o que o corpo diz é verdadeiro. Ora, pelo fato de ser da
m esm a opinião que o corpo e de se com prazer com ele, é obrigada, segundo
penso, a adotar seus costum es e alim entos, sem j am ais poder chegar ao Hades
em estado de pureza, pois é sem pre saturada do corpo que ela o deixa. Resultado:
logo depois, volta a cair noutro corpo, onde cria raízes com o se tivesse sido
sem eada nele, ficando de todo alheia da com panhia do divino, do que é puro e de
um a só form a.


É m uito certo o que disseste, observou Cebete.
XXXIV - Essa é a razão, Cebete, de serem tem perantes e coraj osos os
verdadeiros am igos do saber, não pelo que im agina o povo. Ou achas que sim ?
Eu? De form a algum a.
Não, de fato; a alm a do filósofo não raciocina desse j eito nem pensa que a
filosofia deva libertá-la, para, depois de livre, entregar-se de novo aos prazeres e
às dores e voltar a acorrentar-se, deixando írrito seu esforço anterior e com o que
em penhada em fazer o inverso do trabalho de Penélope em sua teia. Ao
contrário: alcançando a calm aria das paixões e guiando-se pela razão, sem nunca
a abandonar, contem pla o que é verdadeiro e divino e que paira acim a das
opiniões, certa de que precisará viver assim a vida toda, para depois da m orte,
unir-se ao que lhe for aparentado e da m esm a natureza, liberta das m isérias
hum anas. Não é de adm irar, Sím ias e Cebete, que um a alm a alim entada desse
j eito e com sem elhante ocupação não tenha m edo de desm em brar-se quando se
retirar do corpo, e de ser dispersada pelos ventos, dissipando-se do todo, sem vir a
ficar em parte algum a.
XXXV - A essas palavras de Sócrates, seguiu-se prolongado silêncio. Com o
se poderia observar, o próprio Sócrates m editava no tem a desenvolvido na
conversação, o que, aliás, acontecia com quase todos os presentes. Cebete e
Sím ias falaram de socapa algum a coisa, o que foi percebido por Sócrates, que
lhes disse:
E então? Perguntou: quem sabe se sois de parecer que ainda falta dizer algo?
Em verdade, m uitas dúvidas. E obj eções poderiam ser levantadas por quem se
dispusesse a aprofundar o tem a. Se tratais agora de outro assunto, não digo nada;
porém se o nosso m esm o é que vos atrapalha, expõem sem acanham ento o que
vos parecer indicado para m elhor esclarecim ento da questão, ou perm iti que eu
tam bém tom e parte no diálogo, no caso de j ulgardes que com a m inha
cooperação podeis vencer m ais facilm ente as dificuldades.
Sím ias, então, falou: Sendo assim , Sócrates, vou dizer-te a verdade. Já faz
tem po que estam os em dúvida e procuram os anim ar-nos reciprocam ente a
dirigir-te perguntas, pelo desej o de ouvir-te falar, porém tem os m edo de
incom odar-te por causa do presente infortúnio.
Ouvindo-o expressar-se desse m odo, respondeu Sócrates, esboçando um
sorriso: Ora, Sím ias! Dificilm ente chegarei a convencer os outros hom ens que
não considero nenhum a desgraça m inha situação neste m om ento, se nem a vós
m esm os consigo persuadir, por terdes receio de eu estar agora com ânim o
diferente. Pelo que vej o, considerais- m e inferior aos cisnes, pois quando estes
percebem que estão perto de m orrer, por terem cantado a vida toda, m ais vezes
e m elhor põem se a cantar, contentes de partirem para j unto do deus de que são
os servidores. Porém com seu m edo característico da m orte, os hom ens
caluniam os cisnes, com afirm arem que eles cantam por chorarem a m orte, de
tristeza, sem refletirem que nenhum ave canta quando tem fom e ou frio, ou
quando presa de outra angústia, nem m esm o o rouxinol, a andorinha ou a poupa,
cuj o canto, segundo dizem , serve de alim entar a dor. Porém não creio que


nenhum deles cante por estarem tristes, m uito m enos os cisnes. Ao contrário: por
pertencerem a Apolo, segundo penso, têm o Dom da profecia, e por preverem as
delícias do Hades, cantam e se alegram nesse dia m uito m ais do que antes. Eu,
de m inha parte, tam bém m e considero servidor igual da divindade, com o os
cisnes, e a ela consagrado, e por ser dotado pelo m eu senhor de não m enor Dom
de profecia, não deixarei a vida com m enos coragem do que eles. Por isso,
podeis falar à vontade e form ular as perguntas que entenderdes todo o tem po que
o perm itirem os onze cidadãos de Atenas.
Perfeito, falou Sím ias, pois então vou dizer-te quais são as m inhas dúvidas,
para depois indicar este aqui os pontos de tua exposição com que ele não
concorda. Sobre esses assunto, Sócrates, creio estar de acordo contigo, que se
nesta vida não for im possível saber a essa respeito algo definitivo, é
extrem am ente difícil. Mas tam bém será prova de fraqueza deixar de analisar por
todos os m odos o que foi dito, e não abandonar o assunto enquanto não sentirm os
cansaço. Neste passo vem o-nos ante o dilem a: aprender e descobrir o de que se
trata, ou, no caso de não ser isso possível, adotar a m elhor opinião e a m ais difícil
de contestar, e nela instalando- nos à guisa de j angada, procurar fazer a travessia
da vida, na hipótese de não conseguir isso m esm o com m aior facilidade e m enos
perigo num a em barcação m ais firm e, ou sej a, com algum a palavra divina.
Assim , não ficarei acanhado agora de interrogar-te, j á que tu próprio m o
aconselhas, nem precisarei censurar-m e de futuro por não te haver dito hoj e o
que pensava. O fato, Sócrates, é que quando reflito no que disseste, ou sej a
com igo m esm o ou na com panhia deste aqui, tenho a im pressão de que nem tudo
ficou bem fundam entado.
XXXVI - Sócrates respondeu: Talvez, com panheiro, lhe falou, estej as com a
razão; porém explica o que não te parece bem fundam entado.
É que seria possível alegar a m esm a coisa, continuou, a respeito da harm onia
e da lira com suas cordas, a saber: que a harm onia é algo invisível, incorpóreo e
sum am ente belo num a lira bem afinada, e que esta, por sua vez, é corpo, com
tam bém o são as cordas, coisas m ateriais, com postas, terrenas e de natureza
m orta. Ora, no caso de alguém quebrar a lira e cortar ou arrebentar as cordas,
alguém poderia argum entar com o o fizeste: forçosam ente aquela harm onia
ainda vive, pois não foi destruída; pois não é possível subsistir a lira depois de se
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