Fédon (a imortalidade da alma)



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Platao-Fedon






Versão eletrõnica do diálogo platõnico "Fedão"
Tradução: Carlos Alberto Nunes
Créditos da digitalização: Mem bros do grupo de discussão Acrópolis (Filosofia)
Hom epage do grupo: http://br.egroups.com /group/acropolis/
A distribuição desse arquivo (e de outros baseados nele) é livre, desde que se dê
os créditos da digitalização aos m em bros do grupo Acrópolis e se cite o endereço
da hom epage do grupo no corpo do texto do arquivo em questão, tal com o esta
acim a.
FEDÃO
1 - Estiveste tu m esm o, Fedão, j unto de Sócrates no dia em que ele tom ou
veneno na prisão, ou ouviste de alguém ?
Fedão - Não, eu m esm o, Equécrates.
Equécrates - Então, que disse o hom em antes de m orrer? E com o foi a sua
m orte? Gostaria de saber tudo o que se passou. Recentem ente, nenhum cidadão
de Fliunte tem ido a Atenas, e há m uito não nos vêm de lá forasteiros capazes de
dar-nos inform ações seguras, salvo dizerem que m orreu depois de tom ar o
veneno. Quanto ao m ais, nada inform am de particular.
Fedão - E tam bém não ouviste contar com o foi o j ulgam ento?
Equécrates - Ouvim os, sim ; alguém nos falou nisso. Surpreendeu- nos,
j ustam ente, ter sido bem antes o j ulgam ento e ele só vir a m orrer m uito depois.
Que aconteceu, Fedão?
Fedão - Foi tudo obra do acaso, Equécrates, o que se passou com ele.
Precisam ente na véspera do j ulgam ento coroaram a popa do navio que os
Atenienses enviam a Delo.
Equécrates - Que é isso?
Fedão - Segundo os Atenienses, é o navio em que outrora Teseu levou para
Creta as duas septenas de j ovens, m oços e m oças, que ele salvou, salvando-se
tam bém . Nessa ocasião, segundo contam , prom eteram a Apolo enviar
anualm ente um a deputação a Delo, no caso de se salvarem , e até hoj e todos os
anos vão em rom aria à divindade. Desde o início dos preparativos da viagem ,
determ ina a lei que se proceda à purificação do burgo, não sendo perm itido
executar ninguém por crim e público antes de chegar a Delo o navio e retornar de
lá. Por vezes esse prazo fica m uito dilatado, quando os ventos são adversos. O
início da peregrinação é contado a partir do m om ento em que o sacerdote de
Apolo coroa a popa do navio, o que se deu, conform e disse, na véspera do
j ulgam ento. Esse o m otivo de ter estado Sócrates tanto tem po na prisão, desde o
j ulgam ento até à m orte.
II - Equécrates - E as condições em que m orreu, Fedão? Quais foram suas
palavras? Com o se houve em tudo? Quais dos seus fam iliares se encontravam ao
seu lado? Ou as autoridades não perm itiram que entrassem , vindo ele a m orrer
privado de assistência dos am igos?


Fedão - De form a algum a; vários estiveram presentes; em grande núm ero,
m esm o.
Equécrates - Então, procura contar-nos com a m aior exatidão possível com o
tudo se passou, no caso de dispores de folga.
Fedão - Disponho, sim , e vou tentar expor-vos o que se deu. Para m im , nada
é tão agradável com o recordar- m e de Sócrates, ou sej a quando falo nele, ou
quando ouço alguém falar a seu respeito.
Equécrates - Pois podes ter a certeza, Fedão, de que teus ouvintes estão nessas
m esm as condições. Esforça-te, portanto, para contar o caso com todas as
m inúcias.
Fedão - Era por dem ais estranho o que eu sentia j unto dele. Não podia
lastim á-lo, com o o faria perto de um ente querido no transe derradeiro. O
hom em m e parecia felicíssim o, Equécrates, tanto nos gestos com o nas palavras,
reflexo exato da intrepidez e da nobreza com que se despedia da vida. Minha
im pressão naquele instante foi que sua passagem para o Hades não se dava sem
disposição divina, e que, um a vez lá chegando, sentir-se-ia tão venturoso com os
que m ais o foram . Por isso m esm o, não m e dom inou nenhum sentim ento de
piedade, o que seria natural na presença de um m oribundo. Tam bém não m e
sentia alegre, com o costum ava ficar em nossa práticas sobre filosofia. Sim ,
porque toda nossa conversa girou em torno de tem as filosóficos. Era um estado
difícil de definir, m isto insólito de alegria e tristeza, por lem brar-m e de que ele
iria m orrer dentro de pouco. As m ais pessoas presentes se encontravam em
condições quase idênticas, um as rindo, outras chorando, principalm ente
Apolodoro. Conheces o hom em e sabes com o ele é.
Equécrates - Sem dúvida.
Fedão - Pois desse j eito se com portou o tem po todo. Eu tam bém , fiquei m uito
abalado, a m esm a coisa passando-se com os outros.
Equécrates - E quem se achava lá, Fedão?
Fedão - Além do m encionado Apolodoro, seus conterrâneos Critobulo e o pai,
Herm ógenes, Epígenes, Ésquines e Antístenes. Ctesipo de Peânia tam bém esteve
presente, Menéxeno e m ais alguns da m esm a região. Se não m e engano, Platão
se achava doente.
Equécrates - E havia tam bém estrangeiros?
Fedão - Sim , os Tebanos Sím ias, Cebete e Fedondes; e de Mégara, Euclides e
Térpsio.
Equécrates - Nesse caso, Aristipo e Cleôm broto tam bém estiveram com ele?
Fedão - Não; falaram que se encontravam em Egina.
Equécrates - Havia m ais alguém ?
Fedão - Creio que eram só esses.
Equécrates - E depois? Quais foram os discursos a que te referiste?
III - Fedão - Vou esforçar- m e para contar tudo do com eço. Tal com o na
véspera, todos os dias visitávam os Sócrates, e desde a m anhãzinha íam os


encontrar- nos no tribunal em que se deu o j ulgam ento. Fica perto da cadeia. Ali
esperávam os conversando até que a cadeia abrisse, pois não costum am abri-la
m uito cedo. Porém logo que isso se dava, corríam os para j unto de Sócrates e
quase sem pre passávam os com ele o dia todo. Nessa m anhã reunim o-nos m ais
cedo, porque na tarde anterior, ao nos retirarm os da prisão, soubem os que o
navio chegara de Delo. Por isso, com binam os encontrar- nos o m ais cedo
possível no lugar habitual. Ao chegarm os, o porteiro que costum ava receber-nos
veio ao nosso encontro para dizer que esperássem os fora e não entrássem os sem
que ele nos avisasse. Neste m om ento, nos disse, os Onze estão tirando os ferros
de Sócrates e lhe com unicam que hoj e ele terá de m orrer. Depois de algum
tem po, voltou para dizer que entrássem os. Ao penetrarm os no recinto,
encontram os Sócrates, que acabava de ser aliviado dos ferros, e Xantipa -
conhece-Ia decerto - com o filho pequeno, sentada j unto do m arido. Ao ver-nos,
com eçou Xantipa a lastim ar-se e clam ar com o de hábito nas m ulheres, dizendo:
Pela últim a vez, Sócrates, teus am igos conversarão contigo, e tu com eles.
Virando-se para Critão, Sócrates lhe disse: Critão, leva-a para casa. A isso, alguns
dos hom ens de Critão a retiraram , não cessando ela de gritar e debater-se.
Sócrates, de seu lado, sentado no catre, dobrou a perna sobre a coxa e com eçou a
friccioná-la duro com a m ão, ao m esm o tem po que dizia: Com o é extraordinário,
senhores, o que os hom ens denom inam prazer, e com o se associa
adm iravelm ente com o sofrim ento, que passa, aliás, por ser o seu contrário. Não
gostam de ficar j untos no hom em ; m al alguém persegue e alcança um deles, de
regra é obrigado a apanhar o outro, com o se am bos, com serem dois, estivessem
ligados pela cabeça. Quer parecer-m e, continuou, que se Esopo houvesse feito
essa observação, não deixaria de com por um a fábula: Resolvendo Zeus pôr
term o as suas dissensões contínuas, e não o conseguindo, uniu- os pela
extrem idade. Por isso, sem pre que alguém alcança um deles, o outro lhe vem no
rastro. Meu caso é parecido: após o incôm odo da perna causada pelos ferros,
segue-se-lhe o prazer.
IV - Nesta altura, falou Cebete: Por Zeus, Sócrates, disse, foi bom que m o
lem brasses. Diversas pessoas j á m e têm falado a respeito dos poem as que
escreveste, aproveitando as fábulas de Esopo, e do hino em louvor de Apolo.
Anteontem m esm o, o poeta Eveno m e interpelou sobre a razão de com pores
verso desde que te encontras aqui, o que antes nunca fizeras. Se te im porta
deixar-m e em condições de responder a Eveno quando ele voltar a falar- m e a
esse respeito - e tenho certeza de que o fará - instrui- m e sobre o que deverei
dizer-lhe.
Então dize-lhe a verdade, Cebete, replicou: que não m e m ovia o desej o de
fazer-lhe concorrência nem aos seus poem as, quando com pus os m eus, o que,
aliás, tentativa para rastrear o significado de uns sonhos e cum prir, assim , m inha
obrigação, no sentido de saber se era essa a m odalidade de m úsica que m e
recom endavam com insistência. É o seguinte: Muitas e m uitas vezes em m inha
vida pregressa, sob form as diferentes m e apareceu um sonho, porém dizendo
sem pre a m esm a coisa: Sócrates, m e falava, com põe m úsica e a executa. Até
agora eu estava convencido de ser j ustam ente o que eu fizera a vida toda o que o


sonho m e insinuava e concitava a fazer, à m aneira de com o costum am os
estim ular os corredores: desse m esm o m odo, o sonho m e exortava a prosseguir
em m inha prática habitual, a com por m úsica, por ser a Filosofia a m úsica m ais
nobre e a ela eu dedicar-m e. Agora, porém , depois do j ulgam ento e por haver o
festival do deus adiado m inha m orte, perguntei a m im m esm o se a m úsica que
com tanta insistência o sonho m e m andava com por não seria essa espécie
popular, tendo concluído que o que im portava não era desobedecer ao sonho,
porém fazer o que ele m e ordenava. Seria m ais seguro cum prir essa obrigação
antes de partir, e com por poem as em obediência ao sonho. Assim , com ecei por
escrever um hino em louvor à divindade cuj a festa então se celebrava. Depois da
divindade, considerando que quem quiser ser poeta de verdade terá de com por
m itos e não palavras, por saber- m e incapaz de criar no dom ínio da m itologia,
recorri às fabulas de Esopo que eu sabia de cor e tinha m ais à m ão, havendo
versificado as que m e ocorreram prim eiro.
V - Isso, Cebete, é o que deverás dizer a Eveno. Apresenta-lhe, tam bém ,
saudações de m inha parte, acrescentando que, se ele for sábio, deverá seguir-
m e quanto antes. Parto, ao que parece, hoj e m esm o; assim os determ inam os
Atenienses.
Sím ias exclam ou: Que conselho, Sócrates, m andas dar a Eveno! Tenho
estado bastantes vezes com o hom em , e por tudo o que sei dele, não terá grande
desej o de aceitar- te a indicação.
Com o assim ? Perguntou; Eveno não é filósofo?
Penso que é, retrucou Sím ias.
Nesse caso, terá de aceitá-la, tanto Eveno com o quem quer que se aplique
dignam ente a esse estudo. O que é preciso é não em pregar violência contra si
próprio. Dizem que isso não é perm itido.
Assim falando, sentou-se e apoiou no chão os pés, perm anecendo nessa
posição, daí por diante, durante todo o tem po da conversa.
Nessa altura Cebete o interpelou: Por que disseste, Sócrates, que não é
perm itido a ninguém em pregar violência contra si próprio, se, ao m esm o tem po,
afirm as que o filósofo desej a ir após de quem m orre?
Com o, Cebete, nunca ouvistes nada a esse respeito, tu e Sím ias, quando
convivestes com Filolau?
Ouvi, Sócrates, porém m uito pela ram a.
Sobre isso eu tam bém só posso falar de outiva; porém nada m e im pede de
com unicarvos o que sei. Talvez, m esm o, sej a a quem se encontra no ponto de
im igrar para o outro m undo que com pete investigar acerca dessa viagem e dizer
com o será preciso im aginá-la. Que m elhor coisa se poderá fazer para passar o
tem po até sol baixar?
VI - Qual o m otivo, então, Sócrates, de dizerem que a ninguém é perm itido
suicidar- se? De fato, sobre o que m e perguntaste, ouvi Filolau afirm ar, quando
esteve entre nós, e tam bém outras pessoas, que não devem os fazer isso. Porém
nunca ouvi de ninguém m aiores particularidades.


Então, o que im porta é não desanim ares, disse; é possível que ainda venhas a
ouvilas. Talvez te pareça estranho que entre todos os casos sej a este o único
sim ples e que não com porte com o os dem ais, decisões arbitrárias, segundo as
circunstãncias, a saber: que é m elhor estar m orto do que vivo. E havendo pessoas
para quem a m orte, de fato, é preferível, não saberás dar a razão de ser vedado
aos hom ens procurarem para si m esm os sem elhante benefício, m as precisarem
esperar por benfeitor estranho.
Itto Zeus, disses Cebete em seu dialeto, esboçando um sorriso: Deus o saberá.
Aparentem ente, continuou Sócrates, isso carece de lógica; m as o fato é que
tem a sua razão de ser. Aquilo dos m istérios, de que nós, hom ens, nos
encontram os num a espécie de cárcere que nos é vedado abrir para escapar,
afigura- m e de peso e anda fácil de entender. Um a coisa, pelo m enos, Cebete,
m e parece bem enunciada: que os deuses são nossos guardiães, e nós, hom ens,
propriedade deles. Aceitas esse ponto?
Perfeitam ente, respondeu Cebete.
Tu tam bém , continuou, na hipótese de algum dos teus escravos põr term o à
vida, sem que lhes houvesse dado a entender que estavas de acordo em que se
m atasse, não te aborrecerias com ele, e se fosse possível, não o punirias?
Sem dúvida, respondeu.
Por conseguinte, não acho absurdo ninguém poder m atar-se sem que a
divindade o coloque nessa contingência, com o é o nosso caso agora.
VII - Essa parte, observou Cebete, tam bém m e parece razoável. Porém o
que afirm aste antes, sobre a disposição do filósofo para m orrer, é um verdadeiro
contra-senso, Sócrates, se estiver certo o que dissem os há pouco, que Deus cuida
de nós e que som os propriedades dele. Que os indivíduos m ais sábios se insurj am
contra sem elhante tutela e procurem evitá-la, quando a exercem , precisam ente,
os deuses, os m elhores dirigentes, é o que não chego a com preender. Pois
ninguém ousará dizer que saberá cuidar m elhor de si m esm o, um a vez em
liberdade. Um indivíduo insensato poderia raciocinar dessa m aneira, por achar
bom fugir do am o, sem considerar que não se deve fugir do bem , m as ficar j unto
dele o m aior tem po possível. Foge por carecer de senso. 0 indivíduo inteligente,
pelo contrário, só desej a continuar j unto de quem lhe sej a superior. Por isso,
Sócrates, o certo é, precisam ente, o oposto do que foi dito há pouco: aos sábios é
que fica bem insurgir-se contra a idéia da m orte, e aos insensatos, exultar ante
essa perspectiva.
Ao ouvi-lo assim falar, quis parecer-m e que Sócrates se alegrava com a
agudeza de Cebete; depois, voltando-se para nosso lado, falou: Cebete anda
sem pre à cata de argum entos, sem aceitar de pronto a opinião dos outros.
Ao que Sím ias observou: Porém quer parecer-m e, Sócrates, que há bastante
senso nas palavras de Cebete. Não se com preende, de fato, que indivíduos
verdadeiram ente sábios fuj am de am os m elhores do que eles e se alegrem com
essa liberdade. A m eu ver, o argum ento de Cebete vai dirigido contra ti, por
aceitares à ligeira a idéia de deixar-nos, e tam bém aos am os cuj a superioridade
és o prim eiro a proclam ar.


Tens razão, observou. Pelo que vej o, sois de parecer que preciso defender-
m e dessa acusação, com o o fiz no tribunal.
Perfeitam ente, respondeu Sím ias.
VIII - Pois que sej a, disse. Vej am os se diante de vós outros m inha defesa
saíra m ais convincente do que a feita na frente dos j uízes. O fato, Sím ias e
Cebete, prosseguiu, é que se eu não acreditasse, prim eiro, que vou para j unto de
outros deuses, sábios e bons, e, depois, para o lugar de hom ens falecidos m uito
m elhores do que os daqui, com eteria um a grande erro por não m e insurgir contra
a m orte. Porém podes fiar que espero j untar-m e a hom ens de bem . Sobre esse
ponto não m e m anifesto com m uita segurança; m as no que entende com m inha
transferência para j unto de deuses que são excelentes am os: se há o que eu
defenda com convicção é precisam ente isso. Esse m otivo de não m e revoltar a
idéia da m orte. Pelo contrário, tenho esperança de que algum a coisa há para os
m ortos, e, de acordo com antiga tradição, m uito m elhor para os bons do que para
os m aus.
Com o assim , Sócrates, perguntou Sím ias; com sem elhante convicção queres
deixarnos sem no-la dar a conhecer? Eu, pelo m enos, acho que se trata de algo
de grande relevância para nós todos. Ao m esm o tem po, com isso farás a tu a
defesa, se com o que disseres conseguires convencer-nos.
É o que vou tentar, continuou; porém prim eiro vej am os o que o nosso Critão
há tanto tem po quer dizer-m e.
Trata-se apenas do seguinte, Sócrates, falou Critão: é que há m uito vem
insistido com igo a pessoa encarregada de dar-te o veneno, para avisar-te de que
deves conversar o m enos possível. Conversa m uito anim ada esquenta, é o que ele
afirm a, e isso prej udica a ação da droga. Do contrário, j á tem acontecido
precisar tom ar duas ou três doses quem se com porta desse j eito.
É Sócrates: Manda-o passear! disse. E que prepare dose dupla, e até tripla, se
for preciso.
Eu j á sabia m ais ou m enos o que irias responder, observou Critão; m as o
hom em não m e dava sossego.
Deixa- o, disse. E agora, j uízes, pretendo expor-vos as razões de estar
convencido de que o indivíduo que se dedicou a vida inteira à Filosofia, terá de
m ostrar-se confiante na hora da m orte, pela esperança de vir a participar, depois
de m orto, dos m ais valiosos bens. Com o poderá ser dessa m aneira, Sím ias e
Cebete, é o que tentarei explicar-vos.
IX - Em bora os hom ens não o percebam , é possível que todos os que se
dedicam verdadeiram ente à Filosofia, a nada m ais aspirem do que a m orrer e
estarem m ortos. Sendo isso um fato, seria absurdo, não fazendo outra coisa o
filósofo toda a vida, ao chegar esse m om ento, insurgir-se contra o que ele
m esm o pedira com tal em penho e em pós do que sem pre se afanara.
Sím ias, então, rindo, Por Zeus, Sócrates, interrom peu-o; fizeste-m e rir, em
que pese à m inha falta de disposição para isso. O que penso é que, se os hom ens
te ouvissem discorrer dessa m aneira, achariam certo o que se diz dos filósofos - e


nesse ponto contariam com a aprovação de nossa gente - que em verdade eles
vivem a m orrer, sabendo perfeitam ente que outra coisa não m erecem .
E só diriam a verdade, Sím ias, com o exceção do que se refere a estarem
cientes desse ponto, pois, de fato, não sabem de que m odo o verdadeiro filósofo
desej a a m orte, nem com o pode vir a alcançá-la. Porém deixem os essa gente de
lado e perguntem os a nós m esm os se acreditam os que a m orte sej a algum a
coisa?
Sem dúvida, respondeu Sím ias.
Que não será senão a separação entre a alm a e o corpo? Morrer, então,
consistirá em apartar-se da alm a o corpo, ficando este reduzido a si m esm o e,
por outro lado, em libertar- se do corpo a alm a e isolar-se em si m esm a? Ou será
a m orte outra coisa?
Não; é isso, precisam ente, respondeu.
Considera agora, m eu caro, se pensas com o eu. Estou certo de que desse
m odo ficarem os conhecendo m elhor o que nos propom os investigar. És de
opinião que sej a próprio do filósofo esforçar-se para a aquisição dos pretensos
prazeres, tal com o com er e beber?
De form a algum a, Sócrates, replicou Sím ias.
E com o relação aos prazeres do am or?
A m esm a coisa.
E os dem ais prazeres, que entendem com os cuidados do corpo? És de
parecer que lhes atribua algum valor? A posse de roupas vistosas, ou de calçados
e toda a sorte de ornam entos do corpo, que tal achas? Eles os aprecia ou os
despreza no que não for de estrita necessidade?
Eu, pelo m enos, respondeu, sou de parecer que o verdadeiro filósofo os
despreza.
Sendo assim , continuou, não achas que, de m odo geral, as preocupações
dessa pessoa, não visam ao corpo, porém tendem , na m edida do possível, a
afastar-se dele para aproxim ar-se da alm a?
É tam bém o que eu penso.
Nisto, por conseguinte, antes de m ais nada, é que o filósofo se diferencia dos
dem ais hom ens: no em penho de retirar quanto possível a alm a na com panhia do
corpo.
Evidentem ente.
Essa é a razão, Sím ias, de, na opinião da m aioria dos hom ens, não m erecer
viver o indivíduo a quem nada disso é agradável e que não se im porta com tais
práticas, por achar- se m uito m ais perto da condição de m orto e por não dar a
m enor im portãncia aos prazeres alcançados por interm édio do corpo.
Tens razão.
X - E com o referência à aquisição do conhecim ento? O corpo constitui ou
não constitui obstáculo, quando cham ado para participar da pesquisa? O que digo
é o seguinte: a vista e o ouvido asseguram aos hom ens algum a verdade? Ou será


certo o que os poetas não se cansam de afirm ar, que nada vem os nem ouvim os
com exatidão? Ora, se esses dois sentidos corpóreos não são nem exatos nem de
confiança, que direm os dos dem ais, em tudo inferiores aos prim eiros? Não
pensas desse m odo?
Perfeitam ente, respondeu.
Então, perguntou, quando é que a alm a atinge a verdade? É fora de dúvida
que, desde o m om ento em que tenta investigar algo na com panhia do corpo, vê
se lograda por ele.
Tens razão.
E não é no pensam ento - se tiver de ser de algum m odo - que algo da
realidade se lhe patenteia?
Perfeitam ente.
Ora, a alm a pensa m elhor quando não tem nada disso a perturbá-la, nem a
vista nem o ouvido, nem dor nem prazer de espécie algum a, e concentrada ao
m áxim o em si m esm a, dispensa a com panhia do corpo, evitando tanto quanto
possível qualquer com ércio com ele, e esforça-se por apreender a verdade.
Certo.
E não é nesse estado que a alm a do filósofo despreza o corpo e dele foge,
trabalhando por concentrar-se em si própria?
Evidentem ente.
E com relação ao seguinte, Sím ias: afirm arem os ou não que o j usto em si
m esm o sej a algum a coisa?
Afirm arem os, sem dúvida, por Zeus.
E tam bém o belo em si e o bem ?
Tam bém .
E algum dia j á percebeste com os olhos qualquer deles?
Nunca, respondeu.
Ou por interm édio de outro sentido corpóreo? Refiro-m e a tudo: grandeza,
saúde, força e o m ais que for, num a palavra: à essência de tudo o que existe,
conform e a natureza de cada coisa. É por interm édio do corpo que percebem os o
que neles há de verdadeiro, ou tudo se passará da seguinte m aneira: quem de nós
ficar em m elhores condições de pensar em si m esm o o m ais exatam ente
possível o que se propõe exam inar, não é esse que estará m ais perto do
conhecim ento de cada coisa? Ou não?
Perfeitam ente.
E não alcançará sem elhante obj etivo da m aneira m ais pura quem se
aproxim ar de cada coisa só com o pensam ento, sem arrastar para a reflexão a
vista ou qualquer outro sentido, nem associá-los a seu raciocínio, porém valendo-
se do pensam ento puro, esforçarse por apreender a realidade de cada coisa em
sua m aior pureza, apartado, quanto possível, da vista e do ouvido, e, por assim
dizer, de todo o corpo, por ser o corpo fator de perturbação para a alm a e
im pedi-la de alcançar a verdade e o pensam ento, sem pre que a ele se associa?


Não será, Sím ias, esse indivíduo, se houver alguém em tais condições, que
alcançara o conhecim ento do Ser?
Tens toda a razão, Sócrates, respondeu Sím ias.
XI - Por tudo isso, continuou, é natural nascer no espírito dos filósofos
autênticos certa convicção que os leva a discorrer entre eles m ais ou m enos nos
seguintes term os: Há de haver para nós outros algum atalho direto, quando o
raciocínio nos acom panha na pesquisa; porque enquanto tiverm os corpo e nossa
alm a se encontrar atolada em sua corrupção, j am ais poderem os alcançar o que
alm ej am os. E o que querem os, declarem o-lo de um a vez por todas, é a verdade.
Não têm conta os em baraços que o corpo nos apresta, pela necessidade de
alim entar-se, sem falarm os nas doenças intercorrentes, que são outros
em pecilhos na caça da verdade. Com am ores, receios, cupidez, im aginações de
toda a espécie e um sem núm ero de banalidades, a tal ponto ele nos satura, que,
de fato, com o se diz, por sua causa j am ais conseguirem os alcançar o
conhecim ento do quer que sej a. Mais, ainda: guerras, batalhas, dissensões,
suscita-as exclusivam ente o corpo com seus apetites. Outra causa não têm as
guerras senão o am or do dinheiro e dos bens que nos vem os forçados a adquirir
por causa do corpo, visto serm os obrigados a servi-lo. Se carecerm os de vagar
para nos dedicarm os à Filosofia, a causa é tudo isso que enum eram os. O pior é
que, m al conseguim os algum a trégua e nos dispom os a refletir sobre
determ inado ponto, na m esm a hora o corpo intervém para perturbar-nos de m il
m odos, causando tum ulto e inquietude em nossa investigação, até deixar-nos
inteiram ente incapazes de perceber a verdade. Por outro lado, ensina-nos a
experiência que, se quiserm os alcançar o conhecim ento puro de algum a coisa,
terem os de separar-nos do corpo e considerar apenas com a alm a com o as
coisas são em si m esm as. Só nessas condições, ao que parece, é que
alcançarem os o que desej am os e do que nos declaram os am orosos, a sabedoria,
isto é, depois de m ortos, conform e nosso argum ento o indica, nunca enquanto
viverm os. Ora, se realm ente, na com panhia do corpo não é possível obter o
conhecim ento puro do que quer que sej a, de duas um a terá de ser: ou j am ais
conseguirem os adquirir esse conhecim ento, ou só o farem os depois de m ortos,
pois só então a alm a se recolherá em si m esm a, separada do corpo, nunca antes
disso. Ao que parece, enquanto viverm os, a única m aneira de ficarm os m ais
perto do pensam ento, é absterm o-nos o m ais possível da com panhia do corpo e
de qualquer com unicação com ele, salvo e estritam ente necessário, sem nos
deixarm os saturar de sua natureza sem perm itir que nos m acule, até que a
divindade nos venha libertar. Puros, assim , e livres da insanidade do corpo, com
toda a probalidade nos unirem os a seres iguais a nós e reconhecerem os por nós
m esm os o que for estrem e de im purezas. É nisso, provavelm ente, que consiste a
verdade. Não é perm itido ao im puro entrar em contato com o puro. - Eis aí, m eu
caro Sím ias, quero crer, o que necessariam ente pensam entre si e conversam uns
com os outros os verdadeiros am antes da sabedoria. Não é esse, tam bém , o teu
m odo de pensar?
Perfeitam ente, Sócrates.
XII - Por conseguinte, com panheiro, continuou Sócrates, se tudo isso estiver


certo, há m uita esperança de que som ente no ponto em que m e encontro, e m ais
em tem po algum , é que alguém poderá alcançar o que durante a vida constitui
nosso único obj etivo. Por isso, a viagem que m e foi agora im posta deve ser
iniciada com um a boa esperança, o que se dará tam bém com quantos tiverem
certeza de achar-se com a m ente preparada e, de algum m odo, pura.
Isso m esm o, observou Sím ias.
E purificação não vem a ser, precisam ente, o que dissem os antes: separar do
corpo, quanto possível, a alm a, e habituá-la a concentrar-se e a recolher-se a si
m esm a, a afastar-se de todas as partes do corpo e a viver, agora e no futuro,
isolada quanto possível e por si m esm a, e com o que libertada dos grilhões do
corpo?
É m uito certo, respondeu.
E o que denom inam os m orte, não será a liberação da alm a e seu
apartam ento do corpo?
Sem dúvida, tornou a falar.
E essa separação, com o dissem os, os que m ais se esforçam por alcançá-la e
os únicos a consegui-la não são os que se dedicam verdadeiram ente à Filosofia, e
não consiste toda a atividade dos filósofos na libertação da alm a e na sua
separação do corpo?
Exato.
Sendo assim , com o disse no com eço, não seria ridículo preparar-se alguém a
vida inteira para viver o m ais perto possível da m orte, e revoltar-se no instante
em que ela chega?
Ridículo, com o não?
Logo, Sím ias, continuou, os que praticam verdadeiram ente a Filosofia, de fato
se preparam para m orrer, sendo eles, de todos os hom ens, os que m enos tem or
revelam à idéia da m orte. Basta considerarm os o seguinte: se de todo o j eito eles
desprezam o corpo e desej am , acim a de tudo, ficar sós com a alm a, não seria o
cúm ulo do absurdo m ostrar m edo e revoltar-se no instante em que isso
acontecesse, em vez de partirem contentes para onde esperam alcançar o que a
vida inteira tanto am ara - sim , pois eram j ustam ente isso: am antes da sabedoria -
e ficar livres para sem pre da com panhia dos que os m olestavam ? Com o!
Am ores hum anos, ante a perda de am igos, esposas e filhos, têm levado tanta
gente a baixar voluntariam ente, ao Hades, m ovidos apenas da esperança de lá
reverem o obj eto de seus anelos e de com eles conviverem ; no entanto, quem
am a de verdade a sabedoria, e m ais: está firm em ente convencido de que em

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