Baianidade nas letras de Caetano Veloso e Gilberto Gil



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7.2. Festas


O tema da alegria e dança é intimamente ligado com as festas. Festa é uma forte expressão do espírito baiano, mas a maioria das festas, tendo a origem religiosa, é também ligada com outro pilar da baianidade, com a religiosidade.58 Essa ligação podemos observar já na letra anterior de Gil onde ele menciona a Iemanjá, a divindade afro-brasileira, e Senhor do Bonfim dos católicos.

Com maior freqüência, Caetano e Gilberto encantam a maior e a mais caótica de todas as festas: o carnaval. O carnaval de Salvador é um dos maiores no Brasil e por muitos é considerado o carnaval mais tradicional e o mais democrático onde celebram pessoas de todas as classes sem restrições. Um específico de Salvador é a procissão dos trios elétricos pela cidade. Cada trio tem seu grupo de músicos ou um cantor de destaque e considera-se grande prestígio cantar para a multidão de milhões de pessoas. Caetano Veloso e Gilberto Gil participavam do evento desde os anos 60 e em sua obra dedicaram muitas músicas ao carnaval de Salvador; Caetano Veloso até gravou um disco inteiro com as músicas carnavalescas. Sobre elas ele diz: “Eu ainda não fiz um samba que fosse muito legal pra carnaval, porque as marchas-frevo são mais constantes e importantes no carnaval da Bahia do que o samba. Eu faço mais é no estilo do trio elétrico. Fiz “Atrás de Trio Elétrico”, “Deixa sangrar”, “Chuva, suor e cerveja”, “La barca”, com Moacir, e “Qual é a baiana?”. “Você não entende nada” também fiz para o carnaval.”59 Por exemplo, numa letra dele chamada “Muitos carnavais”, o carnaval deixa de ser um simples substantivo, para tornar-se uma expressão com um sentido mais amplo, assumindo as funções de adjetivo, advérbio e verbo, anunciando um modo de ser e agir: “Somos muitos carnavais / Nossos clarins / Sempre a soar / Na noite, no dia / Bahia / Vamos viver / Vamos ver / Vamos ter / Vamos ser / Vamos desentender / Do que não / Carnavalizar a vida coração”.

Para os baianos a festa precisa ter a qualidade, mas o folião também é avaliado em sua capacidade de entrega a esta celebração coletiva ou talvez em sua coragem de deixar-se contagiar. Assim, como na argumentação dos compositores mais antigos, onde os críticos do samba eram taxados de “ruim da cabeça ou doente do pé”, quem não participa do carnaval hoje em dia recebe qualificativos também pouco elogiosos, como os de Veloso: “Atrás do trio elétrico / Só não vai quem já morreu” (“Atrás do trio elétrico”).

O trio elétrico da Bahia é mesmo tão auténtico que se tornou o tema principal de muitas músicas. No início, apenas a fonte de som, depois também gerador de luz, o trio chega a ser definido como sol, elemento central da festa, ao redor do qual tudo orbita: “Nem quero saber se o diabo nasceu / Foi na Bahia, foi na Bahia / O trio eletro-sol rompeu no meio-dia / No meio-dia“(Veloso). O mesmo autor continua celebrando o trio elétrico e, usando as repetições dos finais das palavras, faz os jogos da palavra que ainda aumentam a sensação da riqueza e da alegria da festa baiana: “No trio elétrico rico / Rico, rico, rico, rico, rico deseendoidecer / De alegria, ria, ria, ria, ria / Que a luz se irradia dia, dia, dia, dia / Dia de sol na Bahia” (“Cara a cara”). Como num cortejo ou procissão, os foliões definem sua participação na festividade freqüentemente em função do modo de relacionar-se com o trio. Seguir, correr ou dançar atrás dele é a opção preferida pelos seus fiéis adoradores. Assim faz, como já vimos, Caetano Veloso e faz também Gilberto Gil: “Tou atrás do trio / Tou atrás do fio pra ligar” (“Atrás do trio”). Em outra canção intitulada “Iniciática” ele refere-se a um enorme sucesso da autoria de Caetano, da música “Chuva, suor e cerveja”: “Quando toda aquela gente / Reparou que de repente chovia / Trio elétrico tocando Chuva, suor e cerveja / Bahia”. O trio elétrico é mesmo um fenômeno do carnaval baiano e seu poder é mais uma vez afirmado nos versos seguintes: “Toda a eletricidade / Trio elétrico é o seu gerador / Toda energia que magnetiza a cidade” (Veloso – “O bater do tambor”).

Os compositores baianos costumam definir como pioneiro, inventivo e de uma relevância perene o trabalho de Dodô e Osmar, indissociavelmente ligado ao carnaval da Bahia. Dodô e Osmar são considerados os pais ou inventores do trio elétrico e até os dias de hoje um dos trios traz o nome deles. Caetano presta sua homenagem a esses músicos, nomeando-os entre outras personagens da cultura baiana na canção “Bahia, minha preta”: “Te chamo Menininha do Gantois / Candolina, Marta, Didi, Dodô e Osmar”.

Todas as características do carnaval – a alegria, a euforia, o caos estão presentes nas lembranças de Gilberto Gil: “A primeira vez que pai me trouxe / Pra que eu fosse batizado / Na religião pagã do carnaval... Eu tive uma febre aquele dia / De alegria, de euforia, de prazer de viver...Nunca mais perdi o bloco que desce do Candeal / Fui batizado com doce / Doce no lugar do sal / Papapai cedo me trouxe / Pra brincar o carnaval”. Estas lembranças musicadas são com propriedade intituladas “Doce carnaval” e Gil cita nelas a cidade do interior onde passou alguns anos de sua infância, o Candeal.

Numerosas são na obra de Veloso e Gil as referências a “Filhos de Gandhi” o que é o nome de um dos mais famosos grupos de afoxé do carnaval baiano. O afoxé é um cortejo que sai pelas ruas de Salvador, celebrando os orixás, sendo por isso conhecido como candomblé de rua. Aqui temos mais um exemplo de ligação das festas com a religiosidade baiana. Gil chega até ao sincretismo, chamando não só os orixás, mais também Senhor do Bonfim: “Filhos de Obá / Manda descer / Pra ver Filhos de Gandhi / Senhor do Bonfim / Faz um favor pra mi / Chama o pessoal / Manda descer / Pra ver Filhos de Gandhi / Oh! Meu Deus do céu / Na terra é carnaval”.

O Senhor do Bonfim e a festa em sua louvação – Lavagem, organizada em Salvador cada ano em meados de janeiro, é uma referência frequente na obra de Gilberto Gil. Ele até dedicou uma música a esse evento importante e na letra faz quase uma reportagem jornalística da Lavagem, descrevendo o caminho do cortejo, a comida servida durante a festa ou a típica roupa branca num dia quente do verão baiano: “Lavagem do Bonfim, quinta-feira / Sai da Conceição da Praia a primeira / Talagada de batida na Praça Cairu / Levanta a pista ao alto o Lacerda ”.

Dia 2 de fevereiro, todos os anos, milhares de baianos e turistas lotam as praias do bairro soteropolitano Rio Vermelho para reverenciar Iemanjá, a Mãe D´Água. Também esta festa não passou sem que ficasse adaptada nas letras dos compositores baianos. Gilberto Gil canta: “Aqui estamos reunidos / À beira-mar / Nesta noite de ano-novo / Nesta festa de Iemanjá / Pra prestar nossa homenagem / De coração” (“De ouro e marfim”). Na canção “Onde o Rio é mais baiano” Caetano faz certa comparação da Bahia e do Rio de Janeiro (isso podemos ver já no trocadilho no título da canção) e lembra a festa famosa do bairro do Rio Vermelho, da qual não pode estar presente: ”Pensando em Jamelão no Rio Vermelho / Todo ano, todo ano / Na festa de Iemanjá / Presente no dois de fevereiro / Nós aqui e ele lá / Isso é a confirmação de que a Mangueira / É onde o Rio é mais baiano”.


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