Sam bourne o código dos justos



Yüklə 2,48 Mb.
səhifə23/26
tarix01.11.2017
ölçüsü2,48 Mb.
#25483
1   ...   18   19   20   21   22   23   24   25   26

CINQÜENTA E SEIS
SEGUNDA-FEIRA, 14H25, BROOKLYN
Will se mantinha junto à janela, o tempo todo puxando a cortina para olhar a rua. Sabia que era uma tolice. Se alguém o estivesse seguindo, dificilmente haveria uma forma melhor de chamar a atenção. Abria e fechava a cortina com tanta freqüência que parecia enviar uma men­sagem por códigos.

Despedira-se do pai apenas minutos depois de terem se encon­trado. O Sr. Monroe olhara-o sem expressão quando ele baixara a matéria sobre Bitensky no BlackBerry, como se todo aquele negócio fosse demasiado louco para ser levado a sério. Fizera um gesto com o rosto e as mãos — vamos pôr de lado toda essa maluquice — e pedira-lhe que voltasse para casa com ele. Lá, poderia tomar um banho, dor­mir e acalmar-se. Linda cuidaria dele. De sua parte, tinha um importante caso para preparar aquela manhã, mas estaria de volta à noite. Então pai e filho poderiam pôr a cabeça para trabalhar jun­tos e decidir como iriam trazer Beth de volta. Era uma proposta ten­tadora, mas Will recusou-a. Já tinha desperdiçado tempo demais. Agradecido, levou o pai de volta ao carro — e mandou uma mensa­gem de texto para TC.

Para seu grande alívio, ela ligou de volta. Fora solta às nove horas daquela manhã. A polícia tinha acabado de ver as fitas do circuito in­terno de TV do seu prédio. A gravação de sábado à noite incluía uma seqüência filmada pela câmera acima da entrada dos fundos: mostra­va Pugachov ajudando TC e um homem não identificado a entrar numa grande lata de lixo e empurrando-os para fora do alcance da câmera. Em seguida, mostrava-o tornando a entrar no prédio alguns minutos depois. Não apenas confirmava a história reconhecidamente estranha que ela contara aos detetives, mas também mostrava que quando dei­xara o Sr. Pugachov ele estava vivo e bem.

Também haviam encontrado algo na calça do morto que acabou ajudando. No bolso direito, estava a chave sobressalente do apartamen­to de TC. Com certeza, o zelador só precisaria usá-la se a moradora não estivesse em casa e a porta estivesse trancada. Com esse segundo álibi, a polícia soltou-a. Chegaram a agradecer-lhe o tempo que ficou lá — sem dúvida, pensou Will, segundo as normas do manual de tratamen­to ao cidadão do Departamento de Polícia de Nova York.

Tinha sido idéia dele encontrarem-se no apartamento de Tom, uma idéia calculada. Tanto seu apartamento quanto o de TC estavam sendo vigiados; ali, teriam ao menos uma chance de se encontrar sem ser detectados.

Além disso, TC tinha um plano — apenas um palpite, disse — que exigia grande ajuda do computador. Agora, olhava por cima do ombro de Tom, enquanto ele teclava.

— Então tem certeza do nome do domínio? — perguntou ele.


  • Tudo o que sei é o que está escrito no cartão que peguei. Rabino.Freilich@Moshiachvive.com.

  • Certo, certo, é o que vou tentar. Soletre Mosh... mais uma vez para mim?

— Pela terceira vez: M-O-S-H-I-A-C-H.

Will olhou de novo pela janela. Tom adorava Beth na mesma pro­porção em que não suportava TC. Em Columbia, Will sempre atribuíra isso ao ciúme, às dificuldades de serem um trio. Agora reconhecia que era mais como combustão orgânica: Tom e TC eram fósforo e enxofre. Não podiam se encontrar sem soltar faíscas.

Numa estratégia para lidar com ela, Tom optou por nem sequer falar com TC. Falava, em vez disso, consigo mesmo.

Muito bem, então o que precisamos fazer é saber quem é o dono dessa conta no servidor.

Colocou as últimas palavras no "prompt", a janela vazia na tela. Alguns segundos depois, surgiu uma série de números. 192.0.2.233

— Muito bem, Whois 192.0.2.233?

Disse as palavras em voz alta enquanto as digitava.

A seguir uma resposta. No meio de diversas informações sobre "con­tatos administrativos", estava o endereço da sede dos hassídicos em Crown Heights. O mesmo prédio em que Will e TC haviam estado na noite anterior.



  • Ótimo, agora vamos falar com Arin.

  • Arin? Quem diabo é Arin?

  • ARIN é o American Registry for Internet Numbers, a organiza­ção responsável pela distribuição de endereços de DP, você sabe, a série de números a que chegamos antes.

  • Mas achei que você já tinha o número desse, como você disse, domínio.

  • Eu cheguei a um dos números. ARIN vai nos dar todos os números que pertencem aos hassídicos. Obteremos o número para cada máquina que eles tenham. Assim que obtivermos isso, podemos começar a trabalhar.

Logo a tela se encheu de números, dezenas deles. Aquilo, percebeu TC, era toda a rede de computadores hassídica, expressa em forma numérica.

— Muito bem, são esses números que iremos varrer.



  • O que quer dizer com "varrer"?

  • Achei que você não queria que eu fosse técnico demais. "Poupe o papo técnico, Tom." Lembra?

  • Então que fazemos agora?

  • Esperamos.

Ela foi para o sofá e, deitando-se de imediato, usou o sobretudo dele como manta, antes de adormecer exausta. Tom trabalhava afastado num outro computador, martelando as teclas. Will alternava-se entre olhar a rua pela janela e uma fotografia na parede; um retrato dele, Tom e Beth, agasalhados até o pescoço usando grossas luvas de inverno, cachecóis e casacos, no que parecia uma estação de esqui. De fato era o centro de Manhattan, cedo numa manhã de domingo, após uma nevasca que du­rara toda a noite. O sorriso no rosto de Beth parecia mostrar mais alguma coisa além do próprio sorriso: qual era a palavra... apreciação, pelo fato de que a vida, apesar de tudo, podia ser maravilhosa.

Uma hora e meia depois, o computador emitiu um bip: não o sinal de um novo e-mail, mas um ruído mais simples. Will deu meia-volta e viu Tom correndo de volta para a máquina que deixara funcionando.

— Entramos.

Agora se reuniam em volta da mesa, os três fitando uma tela que só fazia sentido para um deles.

— O que é isso, Tom?

Era Will, decidindo fazer a pergunta primeiro e pronunciá-la com delicadeza, antes que TC tivesse qualquer chance de perguntar.

— Esses são os logs do sistema da máquina que acabamos de inva­dir. Assim conseguiremos saber quem a tem acessado.

TC roía as unhas, desejando que tudo acontecesse mais rápido. Will examinava não a tela, mas o rosto de Tom, à procura de algum sinal de progresso. Não gostou do que viu: Tom parecia desnorteado. Compri­mia os lábios; quando estava à beira de uma descoberta, eles se separa­vam, prontos para um sorriso.



  • Nada. Droga.

  • Olhe de novo — disse TC. — Talvez tenha perdido alguma coi­sa. Olhe de novo.

Mas Tom não precisava que lhe dissessem isso. Aproximou-se mais da tela, agora passando os olhos linha por linha que aparecia diante dele.

  • Espere — disse. — Isso pode ser alguma coisa.

  • O quê? O quê?

  • Veja, aquela linha no log. Ali. O relógio do sistema caiu à 1h58 desta manhã. Talvez não seja nada de mais. Os programas muitas vezes caem e reiniciam automaticamente. Nada de tão importante.

  • Mas?

  • Poderia indicar outra coisa também.

  • O quê?

Tom não estava se saindo bem sob o interrogatório de TC. Will in­trometeu-se.

  • Desculpe, Tom. Para um ignorante total como eu: o que é um relógio do sistema?

  • É simplesmente uma parte da configuração da rede que as pes­soas esquecem. Elas não desligam, então isso fica apenas ali, registran­do a hora.

  • E?

  • O importante é que as pessoas esquecem que está ali. Assim não dão a devida atenção que dão ao resto do sistema. Velhos problemas de segurança que talvez tenham sido contornados em outros lugares no sistema às vezes são deixados na parte do relógio.

  • Quer dizer, é como um buraco na cerca do jardim, na parte de trás, onde ninguém nota?

  • Exatamente. O que quero saber é se esse relógio parou de cau­sas naturais ou se alguém o estourou para invadir. Se você sabe o que está fazendo, pode enviar um buffer overflow, um imenso banco de dados numa seqüência específica, que ferra totalmente o serviço. Se você realmente sabe o que está fazendo, pode não apenas pará-lo, como tam­bém controlá-lo.

— Como assim? — perguntou Will.

— Pode fazê-lo executar seus comandos, o que efetivamente lhe dá acesso ao servidor.

— Foi isso que aconteceu aí?

— Eu não sei. Preciso ver o log de acesso do próprio relógio. É o que estou esperando agora... opa, espere. Isso é bom. Vê aquilo, bem ali?

Apontava uma série de números, à 1h58.

— Olá, estranho.

Era um novo endereço de IP, uma série de números diferente de todas as atribuídas aos hassídicos e sua rede. Era a assinatura de al­guém estranho.

— Você consegue ver quem é?

— É o que estou perguntando agora mesmo. — Digitou: Whois 89.23.325.09? — Eeisa nossa resposta.

Tom apontava a linha na tela. Will levou um segundo para concen­trar-se nas palavras. Mas ali estavam elas, palavras que mudavam tudo. Nem ele nem TC conseguiram emitir um único som. Os três ficaram mudos olhando o endereço diante deles.

A organização que invadira o computador dos hassídicos — lendo tudo que eles liam, olhando por cima dos ombros virtuais deles para ver cada um de seus cálculos, inclusive os que revelavam a localização exata dos homens justos — estava sediada em Richmond, Virgínia, e ali, na tela, via-se seu nome completo.

A Igreja do Cristo Renascido.


CINQÜENTA E SETE
SEGUNDA-FEIRA, 17H13, DARFUR, SUDÃO
A noite do trigésimo quinto assassinato estava praticamente silencio­sa. Naquele calor, e com tão pouca comida, as pessoas achavam-se letár­gicas demais para fazer muito barulho. O chamado às preces era o único som que se ouvira o dia todo; o resto eram gemidos e sussurros.

Mohammed Omar viu a onda de calor tremeluzir no horizonte e percebeu que o pôr-do-sol seria dali a apenas alguns minutos. Em Darfur era assim: o sol aparecia sem aviso ao amanhecer e desaparecia igualmente rápido à noite. Talvez fosse assim em todo lugar no Sudão, em todo lugar na África. Mohammed não sabia, nunca viajara além daquele deserto rochoso.

Era a hora de sua visita noturna pelo campo de refugiados. Ia visi­tar primeiro Hawa, a menina de 13 anos que, mesmo tão jovem, se tor­nara uma mãe para as seis irmãs. Haviam fugido para o acampamento duas semanas atrás, depois que os milicianos de Janjaweed incendia­ram toda a sua aldeia. As meninas mais moças estavam muito assusta­das para falar, mas Hawa contou a Mohammed o que acontecera. No meio da noite, homens apavorantes haviam chegado montados a cavalo, brandindo tochas, e ateando fogo em toda a aldeia. Hawa pegara as irmãs e pusera-se a correr. Só quando se haviam afastado, perceberam que os pais tinham sido deixados para trás e estavam mortos.

Agora, no canto de uma choupana feita de palha e ripas de ma­deira, ela segurava a irmã de três anos nos braços. Perto do vão da porta, no chão, havia uma panela velha. Dentro, uma magra ração de mingau.

Mohammed entrou, depois seguiu para a parada seguinte na ron­da: a "clínica", na verdade outra frágil choupana. A enfermeira Kosar estava lá, e seu rosto lhe disse o que ele não queria ouvir.


  • Quantas? — perguntou.

  • Três. E talvez mais uma esta noite.

Vinham perdendo três crianças por dia fazia semanas. Sem medi­camento nem comida, ele não sabia como poderia impedir a mortan­dade.

Olhou em volta. Um canto de deserto vazio, abrigado por algumas árvores ressequidas. Não pretendera abrir um campo de refugiados ali. O que entendia dessas coisas? Era alfaiate. Não era médico nem auto­ridade pública, mas via o que estava acontecendo. Hordas de pessoas desesperadas, muitas vezes crianças, atravessavam o deserto em bus­ca de comida e abrigo. Falavam de uma aldeia após a outra destruídas pelos Janjaweed, os homens que ateavam fogo, matavam e estupravam, enquanto os aviões do governo sobrevoavam em círculos. Alguém ti­nha de fazer alguma coisa — e, sem pensar verdadeiramente a fundo, esse alguém tinha sido ele.

Mohammed começara com algumas tendas, duas delas costuradas em sua velha máquina Singer. Havia conseguido alguns machados e os dera aos homens para pegarem lenha. Eles tentaram. Um deles, Abdul, embora desesperado por ajudar, tinha queimaduras tão sérias nas mãos que não podia segurar o machado. Mohammed presenciou a cena, o homem tinha as mãos tão debilitadas que não podia nem enxu­gar as próprias lágrimas.

Ainda assim, serraram madeira suficiente para armar uma foguei­ra que, uma vez acesa, passou a funcionar como um farol. Mais refugia­dos chegaram.

Agora eram milhares de pessoas; não havia tempo para contá-las com precisão. Elas juntavam os parcos recursos que tinham. A maioria era de camponeses; o pouco que se podia tirar da terra, eles de algum modo tiravam. Mas não era o bastante.

Mohammed sabia que precisava de ajuda externa. Nas poucas ho­ras de sono que tirava toda noite, sonhava com um comboio de veícu­los brancos chegando numa luminosa manhã, cada um carregado de caixotes de grãos e caixas de medicamentos. Mesmo com apenas cinco veículos — ou apenas um — poderia salvar muitas vidas.

Foi então que ele viu os faróis brilhando no crepúsculo. Fortes e amarelos, vinham em sua direção, a luz oscilando na quente cerração. Não pôde evitar. Pôs-se a pular, acenando os braços como um louco.

— Aqui! — gritava. — Aqui! Estamos aqui!

O caminhão reduziu a velocidade até Mohammed ter uma visão melhor. Não era uma equipe de socorro, mas apenas dois homens.


  • Venho em nome do Nosso Senhor Jesus Cristo — começou o primeiro homem em inglês, logo traduzido pelo segundo.

  • Bem-vindos, bem-vindos — disse Mohammed, agarrando os visitantes, agradecido. — Bem-vindos, bem-vindos.

  • Trouxemos alguma comida e medicamentos. Você tem pessoal para descarregar?

Uma multidão já se formara em volta. Depois que o intérprete fa­lou, Mohammed designou os dois adolescentes mais fortes, um rapaz e uma moça, para retirarem as caixas do caminhão. Então convocou dois homens de sua confiança para montar guarda: a última coisa que que­ria era um distúrbio causado por comida, pois a fome e o desespero desencadeariam uma corrida desenfreada.

— Acha que poderíamos conversar? — perguntou o visitante.

Mohammed respondeu com um gesto e conduziu os convidados até um barraco vazio. O homem seguiu-o, levando uma maleta escura.


  • Levei muito tempo para encontrar o senhor. Com certeza é o responsável, não é? Este é o campo de refugiados que o senhor co­meçou?

  • Sim — respondeu Mohammed, sem saber se olhava para o tra­dutor ou seu chefe.

  • E fez tudo isso sozinho? Ninguém lhe paga para fazer esse tra­balho? O senhor não trabalha para nenhuma organização? Fez isso apenas pela bondade de seu coração?

  • Sim, mas isso não é importante — respondeu Mohammed por meio do tradutor. — Eu não sou importante.

A isso, o visitante sorriu e disse:

— Bom.


— As pessoas estão morrendo aqui — continuou Mohammed. — Que ajuda pode dar a elas? Com a maior urgência! O visitante sorriu mais uma vez.

— Oh, prometo-lhes a maior ajuda de todas. E não será necessário esperar muito tempo. Não vai demorar nada mesmo.

Então clicou os dois fechos laterais da maleta e retirou uma seringa.


  • Primeiro, quero lhe dizer que é uma honra conhecê-lo. É uma honra saber que um homem verdadeiramente justo vive entre nós.

  • Obrigado, mas não estou entendendo.

  • Receio que preciso aplicar isto. É importante que um homem como o senhor não sinta dor nem sofrimento. Nenhuma dor nem sofri­mento mesmo.

De repente, o intérprete agarrou o braço de Mohammed, forçando-o a deitar-se no chão. Ele tentou escapar, mas estava fraco demais e a mão do homem era demasiado forte. Agora, assomando ameaçador acima dele, surgia o visitante, com a seringa erguida para a luz. Falava em inglês, abaixando-se mais para perto de Mohammed. Ao fazê-lo, o in­térprete sussurrava-lhe diretamente no ouvido.

O Senhor ama os justos e não desampara os seus santos. Eles serão preservados para sempre, mas a descendência dos ímpios será exterminada.

Mohammed se contorcia, lutando para se libertar. E ainda assim a voz falava, podia sentir o hálito quente.

Os ímpios se põem em emboscadas contra os justos, e as suas próprias vidas espreitam; o Senhor deu-se a conhecer, executou o juízo; enlaçado ficou o ímpio nos seus próprios feitos. Mas a salvação dos justos vem do Senhor; ele é a sua fortaleza no tempo da angústia.

Por fim, Mohammed sentiu a agulha romper a pele do braço e, en­quanto o céu escurecia, ouviu uma prece, até a voz ficar distante e tudo silenciar.
CINQÜENTA E OITO
SEGUNDA-FEIRA, 14H50, BROOKLYN
Agora era a vez de Will assumir o computador. Quase derrubou Tom da cadeira e na mesma hora retomou ao "acampamento-base" do jornalismo do século XXI: o Google.

"Igreja do Cristo Renascido" apresentou uma página com links, mas eram poucos. Para sua surpresa, o grupo não tinha uma página própria.

Clicou no primeiro resultado da pesquisa, um link para um traba­lho apresentado numa conferência na Universidade de Nebrasca.
Embora não tenha muitos fiéis, a Igreja do Cristo Renascido con­quistou grande influência em seu apogeu há 25 anos, sobretudo en­tre jovens intelectuais cristãos. Fundamental para seu ensinamento foi um tipo radical de teologia da substituição, a crença em que os cristãos haviam substituído os judeus como o povo escolhido por Deus...
De uma forma irritante, o artigo nada mais dizia, divagando numa discussão mais ampla do cristianismo nos campi universitários na dé­cada de 1970. Mas Will ficou agitadíssimo. Viu que TC o entendera, embora os dois soubessem, intuitivamente, que não havia tempo a per­der em discussão. Foi direto para a Wikipedia, a enciclopédia on-line, e digitou "teologia da substituição".

A busca levou alguns segundos, durante os quais Will sentiu o pé direito latejando — em parte por ansiedade, em parte por excitação. Uma vaga lembrança o atormentava. A Igreja do Cristo Renascido: tinha visto esse nome antes, em algum lugar na redação...

Então apareceu uma página, com o título Supersessionismo. De­finido como "a crença tradicional cristã na qual o cristianismo é a re­alização do judaísmo bíblico e, portanto, que os judeus que negam ser Jesus o Messias não cumprem seu chamado como o povo escolhido de Deus".

Will foi para o parágrafo seguinte. "Argumenta que Israel foi subs­tituído... no sentido de que se confiou à Igreja a realização das promes­sas das quais o Israel judeu é o fiduciário."

A página observava que, embora vários grupos protestantes liberais houvessem renunciado ao supersessionismo, decretando que os judeus e "talvez" outros não-cristãos poderiam encontrar Deus através de sua própria fé, "outros grupos cristãos conservadores e fundamentalistas defendem o supersessionismo como válido... o debate continua."

E aposto que sei onde continua, pensou Will. Retornou ao Google, agora estreitando a busca para "Igreja do Cristo Renascido e teologia da subs­tituição". Três referências, a primeira um artigo da The Christian Review.
... a teologia da substituição caiu cada vez mais em desuso nesse período, desacreditada pelo grupo politicamente correto, diziam seus defensores. Alguns anos antes, desfrutara de vigorosa revivificação através de um grupo de intelectuais conhecido como a Igreja do Cristo Renascido. Se­gundo esse grupo, os cristãos haviam não apenas herdado o status dos judeus como os escolhidos, mas herdado o próprio judaísmo. Os judeus haviam, afirma o movimento do Cristo Renascido, ignorado os desejos diretos de Deus e, portanto, desistido de tudo que haviam aprendido Dele. Deserdaram-se do papel de povo eleito, mas — e isto é o que distingue a Igreja do Cristo Renascido — os judeus também abandonaram suas pró­prias tradições, seus costumes e até mesmo seu folclore. De agora em diante, esses devem ser considerados posses de cristãos praticantes.


  • Pare. — Era TC, o rosto pálido. — Eis o ponto-chave, bem ali. Suas próprias tradições, seus costumes e até mesmo seu folclore. Esse grupo acredita que o judaísmo contém a verdade não apenas para os judeus, mas para os cristãos. Até mesmo o folclore. Não está vendo? Eles pega­ram tudo. O misticismo, a cabala, tudo.

  • A história dos justos — concordou Will.

  • Sim. Não acham que se trata de uma tradição hassídica bizarra. Acham que pertence a eles. Acreditam que é verdade.

Ele clicou no resultado seguinte do Google. Era um link para um grupo de discussão evangélica. Pessoas que se autodenominavam Novo Amanhecer21 haviam escrito um longo texto em resposta a uma pergunta sobre as origens da Igreja do Cristo Renascido.
Em sua época teve grande impacto — tendo se originado nos aficiona­dos movimentos que louvavam Jesus, em que as pessoas usavam sandá­lias. Liderados por um pregador carismático que era então capelão em Yale, reverendo Jim Johnson.
Will ergueu os olhos para TC

— Eu conheço esse nome — disse. — Ele fundou um movimento evangélico na década de 1970. Morreu há poucos anos.

Mas TC continuou lendo.
Aparentemente, o Rev. Johnson influenciou toda uma geração de cris­tãos da elite, que o chamavam de Flautista de Hamelin no campus, por­que atraiu um grupo de seguidores muito dedicado.
A entrada a seguir dizia:

Posso testemunhar. Eu estava em Yale naquele período e Johnson era um fenômeno. Só se interessava pelos melhores, os alunos mais desta­cados — editores da Law Review, presidentes de classe, esse tipo de gente. Nós os chamávamos de Apóstolos, que gravitavam em torno de Johnson como se ele fosse o Messias ou coisa assim. Para quem estiver interessado, escaneei aqui uma foto do Yale Daily News que mostra Johnson e seus seguidores. Clique aqui.
Will clicou e esperou a foto carregar. Era granulada, na típica cor desbotada da década de 1970, e levou algum tempo para encher a tela. Aos poucos foi se tornando visível. No centro, exibindo um sorriso ra­diante, como o capitão de um time de futebol americano da faculdade, via-se um homem de 30 e tantos anos, vestindo uma camisa de gola aberta, óculos grandes com armação retangular, à época considerados super-modernos. Não usava colarinho próprio dos cléricos nem terno escuro. Era, ele concluiu, o que os vitorianos teriam chamado de um cristão muito convincente.

À sua volta, viam-se jovens de aparência séria, transmitindo aquela confiança de quem nasceu para governar que emanava dos anuários de Yale ou Harvard. Os cabelos eram longos ou volumosos, os colarinhos das camkas e as lapelas dos paletós, largos. Os rostos pareciam brilhar de potencial. Aqueles jovens não iam apenas governar o mundo. Mas estava claro que eles acreditavam que iam fazê-lo com a bênção de Jesus.

— Acho que você precisa se apressar — disse Tom, agora ocupan­do a posição anterior de Will junto à cortina. — Tem um carro lá fora. Dois sujeitos acabaram de saltar e estão entrando no prédio.

Mas Will mal ouvia. Em vez disso, recostou-se rápido na cadeira, surpreso: reconhecera um dos rostos na fotografia. Só conseguiu fazê-lo porque vira recentemente outra foto diferente do mesmo homem quando jovem. O jornal a publicara quando ele foi nomeado. Ali, ao lado de Jim Johnson, estava ninguém menos que Townsend McDougal — o futuro editor do New York Times.



  • Eu não acredito — disse Will.

  • É ele, não é?

Will ficou confuso. Como TC poderia reconhecer McDougal?

— Eu não quis dizer porque não tinha certeza. Mas realmente não podia ser ninguém mais.

Will ergueu os olhos para ela, franzindo as sobrancelhas para re­gistrar seu espanto.

— De quem está falando?



  • Will! — insistiu Tom. — Eles estão subindo. Vocês têm de se mandar!

  • Veja — disse TC, mostrando, à extrema esquerda da fila de trás na fotografia, uma área que ele mal examinara. Ela apontou um jovem bonito, magro, com uma vasta cabeleira. Posava sem sorrir.

— Talvez eu esteja enganada, Will, mas acho que esse aí é o seu pai.

Yüklə 2,48 Mb.

Dostları ilə paylaş:
1   ...   18   19   20   21   22   23   24   25   26




Verilənlər bazası müəlliflik hüququ ilə müdafiə olunur ©muhaz.org 2024
rəhbərliyinə müraciət

gir | qeydiyyatdan keç
    Ana səhifə


yükləyin