Língua Portuguesa volume 1



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Seja um herói das florestas

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Juntos podemos levar para o Congresso uma lei popular pelo fim da destruição das florestas. Assine pelo Desmatamento Zero.


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Décadas atrás, a Amazônia era uma paisagem plena de fartura e beleza. Aos poucos, ela foi sendo invadida por personagens que a transformaram radicalmente. Avançaram sobre a floresta o gado e a soja, os maiores vetores de devastação na região. Atividades muitas vezes ilegais, elas trouxeram a reboque mazelas como o trabalho escravo, a invasão de Terras Indígenas e a exploração madeireira.[…]

É um cenário desolador. Mas a gente ainda pode reescrever essa história. Em parceria com outras organizações, o Greenpeace lançou um projeto de lei de iniciativa popular para acabar com a destruição de nossas florestas. Preservar as matas nativas é caminhar para um desenvolvimento verde e sustentável. A lei do desmatamento zero é o primeiro passo para o Brasil do futuro.

Essas não são apenas fases de um jogo, são fatos de uma dura realidade que pode virar permanente se não fizermos nada para mudá-la. Proteger as florestas é mais do que uma responsabilidade dos brasileiros — é um direito. Para engrossar esse coro, a Liga das Florestas precisa de mais heróis. Entre na disputa e ajude a salvar o que o nosso país tem de mais precioso.

Ao assinar a petição no site, compartilhar e estimular seus amigos a fazerem o mesmo, você acumula pontos, ajuda a proteger nossa herança florestal e ainda ganha recompensas. Brincando, a gente exercita a cidadania e aprende um pouco mais sobre a maior riqueza do nosso país. Participe!

Disponível em: . Acesso em: 19 abr. 2016.

Com a ajuda dos itens a seguir, identifique os mecanismos persuasivos do texto “Seja um herói das florestas”.

a) Identifique os recursos linguísticos (expressões e pontuação) que colaboram para convencer o leitor a assinar a petição.

b) Identifique a quem ou a que grupo se dirige a petição.

c) A petição é proposta na modalidade on-line. De que modo a pessoa que a lê e deseja participar pode assinar?

d) Além da carta, o site disponibiliza a leitura e a impressão da petição em si a ser assinada. Onde é preciso dar um clique para acessar o texto da petição?


Comparando textos

Em textos publicitários, petições, artigos de opinião, crônicas, cartas, sermões, conversas, discursos, romances, reportagens, poemas, enfim, toda sorte de gênero textual, encontramos recursos argumentativos com a clara finalidade de persuadir o interlocutor a aderir a determinadas ideias. Convencer alguém de alguma coisa significa convidar o outro a olhar o mundo ou a própria condição de uma nova forma, refletir sobre o próprio comportamento, avaliar os riscos que corre ao efetuar escolhas.

Os linguistas consideram que todo texto, independentemente da estrutura, é argumentativo. Segundo eles, mesmo uma narrativa que aparentemente não tem a intenção de convencer ninguém — como uma fábula, um conto, uma lenda, um romance ou uma novela — apresenta conteúdos que mobilizam reflexões, expressam ideias que procuram provocar determinados efeitos no leitor. Nosso foco neste estudo recai sobre textos argumentativos que têm uma característica particular: aqueles em que o interlocutor está identificado e a argumentação é dirigida diretamente a ele.

Selecionamos para este capítulo três textos: uma crônica, um sermão religioso e uma carta escrita por um poeta, todos com estrutura argumentativa, voltados para interlocutores identificados no próprio texto. A proposta é que você acompanhe os diferentes caminhos adotados pelos autores citados para atingir as pessoas às quais dirigem seus argumentos.

A crônica transcrita aqui como Texto 1 foi produzida pelo escritor Paulo Mendes Campos supostamente para uma adolescente que completaria 15 anos. Partindo de elementos da narrativa Alice no país das maravilhas, de Lewis Carroll, o cronista formula um conjunto de recomendações para que a menina encontre seu caminho na vida adulta. Leia sobre o livro de Carroll e, depois, a crônica de Paulo Mendes Campos.

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Alice no país das maravilhas

O escritor e matemático inglês Lewis Carroll (1832--1898) é o autor de Alice no país das maravilhas, um curioso livro em que a menina Alice, ao decidir seguir um coelho que se dizia atrasado, entrou na toca dele, caindo então em um enorme buraco. Depois da queda ela descobre que esse é o caminho para o país das maravilhas, um lugar repleto de seres com características humanas e fantásticas, como o Gato, o Chapeleiro e a Rainha de Copas.

Os personagens dessa realidade fantasiosa sempre apresentam enigmas à menina Alice, brincadeiras que têm como base observações linguísticas e/ou matemáticas. A narrativa também é repleta de paródias de poemas infantis populares conhecidos na Inglaterra do século XIX.

Por sugestão de um amigo, o livro foi publicado em 1865 sem ser especificado se era para adultos ou crianças. Fez muito sucesso e, em 1871, ganhou uma sequência denominada Alice no país do espelho.

A obra Alice no país das maravilhas foi adaptada para o cinema diversas vezes; por exemplo, há a versão dos estúdios Disney produzida em 1951, sob a direção de Clyde Geronimi, Hamilton Luske, Wilfred Jackson, e há o filme dirigido por Tim Burton, em 2010.

Cena de Alice no país das maravilhas, filme de Tim Burton, 2010, inspirado no livro de mesmo nome, escrito por Lewis Carroll.

Texto 1

Walter Vasconcelos/Arquivo da editora



Para Maria da Graça

Paulo Mendes Campos

Quando ela chegou à idade avançada de quinze anos eu lhe dei de presente o livro Alice no país das maravilhas.

Este livro é doido, Maria. Isto é: o sentido dele está em ti.

Escuta: se não descobrires um sentido na loucura acabarás louca. Aprende, pois, logo de saída para a grande vida, a ler este livro como um simples manual do sentido evidente de todas as coisas, inclusive as loucas. Aprende isso a teu modo, pois te dou apenas umas poucas chaves entre milhares que abrem as portas da realidade. A realidade, Maria, é louca.

Nem o Papa, ninguém no mundo, pode responder sem pestanejar à pergunta que Alice faz à gatinha: “Fala a verdade, Dinah, já comeste um morcego?”

Não te espantes quando o mundo amanhecer irreconhecível. Para melhor ou pior, isso acontece muitas vezes por ano. “Quem sou eu no mundo?” Essa indagação perplexa é lugar-comum de cada história de gente. Quantas vezes mais decifrares essa charada, tão entranhada em ti mesma como os teus ossos, mais forte ficarás. Não importa qual seja a resposta; o importante é dar ou inventar uma resposta. Ainda que seja mentira.

A sozinhez (esquece essa palavra que inventei agora sem querer) é inevitável. Foi o que Alice falou no fundo do poço: “Estou tão cansada de estar aqui sozinha!” O importante é que ela conseguiu sair de lá, abrindo a porta. A porta do poço! Só as criaturas humanas (nem mesmo os grandes macacos e os cães amestrados) conseguem abrir uma porta bem fechada ou vice-versa, isto é, fechar uma porta bem aberta.

Somos todos tão bobos, Maria. Praticamos uma ação trivial, e temos a presunção petulante de esperar dela grandes consequências. Quando Alice comeu o bolo e não cresceu de tamanho, ficou no maior dos espantos. Apesar de ser isso o que acontece, geralmente, às pessoas que comem bolo.

Maria, há uma sabedoria social ou de bolso; nem toda sabedoria tem de ser grave.

A gente vive errando em relação ao próximo e o jeito é pedir desculpas sete vezes por dia: “Oh, I beg your pardon” Pois viver é falar de corda em casa de enforcado. Por isso te digo, para tua sabedoria de bolso: se gostas de gato, experimenta o ponto de vista do rato. Foi o que o rato perguntou à Alice: “Gostarias de gato se fosses eu?”

Os homens vivem apostando corrida, Maria. Nos escritórios, nos negócios, na política, nacional e internacional, nos clubes, nos bares, nas artes, na literatura, até amigos, até irmãos, até marido e mulher, até namorados todos vivem apostando corrida. São competições tão confusas, tão cheias de truques, tão desnecessárias, tão fingindo que não é, tão ridículas muitas vezes, por caminhos tão escondidos, que, quando os atletas chegam exaustos a um ponto, costumam perguntar: “A corrida terminou! mas quem ganhou?” É bobice, Maria da Graça, disputar uma corrida se a gente não irá saber quem venceu. Se tiveres de ir a algum lugar, não te preocupes com a vaidade fatigante de ser a primeira a chegar. Se chegares sempre onde quiseres, ganhaste.

Disse o ratinho: “A minha história é longa e triste!” Ouvirás isso milhares de vezes. Como ouvirás a terrível variante: “Minha vida daria um romance”.

sabedoria social ou de bolso: sabedoria popular.

“I beg your pardon”: em inglês, expressão que significa “Desculpe”,


“Perdoe-me”.

Ora, como todas as vidas vividas até o fim são longas e tristes, e como todas as vidas dariam romances, pois o romance só é o jeito de contar uma vida, foge, polida, mas energeticamente, dos homens e das mulheres que suspiram e dizem: “Minha vida daria um romance!” Sobretudo dos homens. Uns chatos irremediáveis, Maria.

Os milagres sempre acontecem na vida de cada um e na vida de todos. Mas, ao contrário do que se pensa, os melhores e mais fundos milagres não acontecem de repente, mas devagar, muito devagar. Quero dizer o seguinte: a palavra depressão cairá de moda mais cedo ou mais tarde. Como talvez seja mais tarde, prepara-te para a visita do monstro, e não te desesperes ao triste pensamento de Alice: “Devo estar diminuindo de novo”. Em algum lugar há cogumelos que nos fazem crescer novamente.

E escuta esta parábola perfeita: Alice tinha diminuído tanto de tamanho que tomou um camundongo por um hipopótamo. Isso acontece muito, Mariazinha. Mas não sejamos ingênuos, pois o contrário também acontece. E é outro escritor inglês que nos fala mais ou menos assim: o camundongo que expulsamos ontem passou a ser hoje um terrível rinoceronte. É isso mesmo. A alma da gente é uma máquina complicada que produz durante a vida uma quantidade imensa de camundongos que parecem hipopótamos e rinocerontes que parecem camundongos. O jeito é rir no caso da primeira confusão e ficar bem disposto para enfrentar o rinoceronte que entrou em nossos domínios disfarçado de camundongo. E como tomar o pequeno por grande e grande por pequeno é sempre meio cômico, nunca devemos perder o bom humor. Toda pessoa deve ter três caixas para guardar humor: uma caixa grande para o humor mais ou menos barato que a gente gasta na rua com os outros; uma caixa média para o humor que a gente precisa ter quando está sozinho, para perdoares a ti mesma, para rires de ti mesma; por fim, uma caixinha preciosa, muito escondida, para grandes ocasiões. Chamo de grandes ocasiões os momentos perigosos em que estamos cheios de dor ou de vaidade, em que sofremos a tentação de achar que fracassamos ou triunfamos, em que nos sentimos umas drogas ou muito bacanas. Cuidado, Maria, com as grandes ocasiões.

Por fim, mais uma palavra de bolso: às vezes uma pessoa se abandona de tal forma ao sofrimento, com uma tal complacência, que tem medo de não poder sair de lá. A dor também tem o seu feitiço, e este se vira contra o enfeitiçado. Por isso Alice, depois de ter chorado um lago, pensava: “Agora serei castigada, afogando-me em minhas próprias lágrimas”.

Conclusão: a própria dor deve ter a sua medida: É feio, é imodesto, é vão, é perigoso ultrapassar a fronteira de nossa dor, Maria da Graça.

complacência: disposição para ceder ao desejo do outro, atitude de quem cede para agradar a alguém.

Walter Vasconcelos/Arquivo da editora

CAMPOS, Paulo Mendes. Primeiras leituras — Crônicas. São Paulo: Companhia das Letras, 2012. p. 85-88.

O autor

Paulo Mendes Campos (1922-1991), cronista, poeta e tradutor, natural de Belo Horizonte (MG). Com amigos escritores — Otto Lara Resende (1922-1992), Fernando Sabino (1923-2004) e Hélio Pellegrino (1924-1988) — fundou um grupo literário na capital mineira que marcou a produção da literatura brasileira da época. Em 1945, mudou-se para o Rio de Janeiro, onde trabalhou como jornalista e cronista. Fotografia de 1960.

D.A Press/EM/O Cruzeiro/Badaró Braga

1. Esse texto lembra-nos, pela organização, que gênero textual? Com que intenção, portanto, parece ter sido escrito?

2. O ensinamento que o cronista busca passar para Maria da Graça está relacionado ao livro Alice no país das maravilhas. Segundo a discussão apresentada na crônica, o que se procura ensinar a Maria da Graça?

3. Explique o trecho: “[...] se gostas de gato, experimenta o ponto de vista do rato”.

4. Entre as várias lições do cronista, destacamos algumas:

a) “Se tiveres de ir a algum lugar, não te preocupes com a vaidade fatigante de ser a primeira a chegar. Se chegares sempre onde quiseres, ganhaste.”

b) “Mas, ao contrário do que se pensa, os melhores e mais fundos milagres não acontecem de repente, mas devagar, muito devagar.”

c) “A alma da gente é uma máquina complicada que produz durante a vida uma quantidade imensa de camundongos que parecem hipopótamos e rinocerontes que parecem camundongos.”

Dê exemplos, como em uma conversa entre amigos, que ilustrem cada uma dessas lições.
5. Essa crônica em forma de carta foi publicada há mais de 40 anos, supostamente para uma menina de 15 anos. Você a considera convincente para um jovem dessa idade da sua geração? Pessoas de outras gerações poderiam se identificar com as ideias apresentadas nessa carta? Justifique sua resposta comentando passagens do texto.
Texto 2

Em 1655, diante de cortesãos e altos dignitários da corte portuguesa, um padre jesuíta proferiu um sermão que, por seu conteúdo, desagradou às camadas sociais economicamente privilegiadas daquele tempo. Esse homem era Antônio Vieira, um jesuíta que viveu entre Brasil e Portugal, como pregador da Corte.

Nessa condição, não havia um modo de Antônio Vieira ficar alheio a questões caras para Portugal e Brasil, tais como as necessidades de crescimento de um Reino ainda marcado pelos privilégios da fidalguia mas, por ora, sustentada por uma burguesia em ascensão. Assim, ao pregar o sermão a seguir, ele fala para um grupo que pretende influenciar tornando-o favorável ao projeto de reconstrução do Reino, e para isso lança mão de recursos de linguagem que estimulem o ouvinte a fazer uma verdadeira reestruturação de suas crenças, valores, convicções.

O Sermão do bom ladrão (ou da audácia), cujo fragmento é transcrito a seguir, parte de uma ideia cristalizada sobre o que seria um ladrão para, em seguida, reconstruí-la e apresentar o que, na opinião de Vieira, deveria ser caracterizado como verdadeiro ladrão. Leia um trecho do sermão e acompanhe esse raciocínio.



Sermão do bom ladrão (ou da audácia)

Padre Antônio Vieira
Este sermão, que hoje se prega na Misericórdia de Lisboa, e não se prega na Capela Real, parecia-me, a mim, que lá se havia de pregar e não aqui. Daquela pauta havia de ser e não desta. E por quê? Porque o texto em que se funda o mesmo sermão, todo pertence à majestade daquele lugar, e nada à piedade deste.

[...]
Suponho finalmente que os ladrões de que falo não são aqueles miseráveis, a quem a pobreza e vileza de sua fortuna condenou a este gênero de vida, porque a mesma sua miséria, ou escusa, ou alivia o seu pecado, como diz Salomão: Non grandis est culpa, cum quis furatus fuerit: furatur enim ut esurientem impleat animam1. O ladrão que furta para comer, não vai nem leva ao inferno; os que não só vão, mas levam, de que eu trato, são os ladrões de maior calibre e de mais alta esfera, os quais, debaixo do mesmo nome e do mesmo predicamento, distingue muito bem S. Basílio Magno: Non est intelligendum fures esse solum bursarum incisores, vel latrocinantes in balneis; sed et qui duces legionum statuti, vel qui commisso sibi regimine civitatum, aut gentium, hoc quidem furtim tollunt, hoc vero vi et publice exigunt: Não são só ladrões, diz o Santo, os que cortam bolsas ou espreitam os que se vão banhar, para lhes colher a roupa: os ladrões que mais própria e dignamente merecem este título são aqueles a quem os reis encomendam os exércitos e legiões, ou o governo das províncias, ou a administração das cidades, os quais já com manha, já com força, roubam e despojam os povos. Os outros ladrões roubam um homem, estes roubam cidades e reinos; os outros furtam debaixo do seu risco, estes sem temor, nem perigo; os outros, se furtam, são enforcados: estes furtam e enforcam.

Diógenes, que tudo via com mais aguda vista que os outros homens, viu que uma grande tropa de varas e ministros de justiça levavam a enforcar uns ladrões, e começou a bradar: “Lá vão os ladrões grandes a enforcar os pequenos”. Ditosa Grécia, que tinha tal pregador! E mais ditosas as outras nações, se nelas não padecera a justiça às mesmas afrontas. Quantas vezes se viu em Roma ir a enforcar um ladrão, por ter furtado um carneiro, e no mesmo dia ser levado em triunfo um cônsul, ou ditador, por ter roubado uma província! E quantos ladrões teriam enforcado estes mesmos ladrões triunfantes? De um chamado Seronato disse com discreta contraposição Sidônio Apolinar: Nou cessat simul furta, vel punire, vel facere. Seronato está sempre ocupado em duas coisas: em castigar furtos, e em os fazer. Isto não era zelo de justiça, senão inveja. Queria tirar os ladrões do mundo, para roubar ele só. [...]

Grande lástima, será naquele dia, senhores, ver como os ladrões levam consigo muitos reis ao inferno: e para que esta sorte se troque em uns e outros, vejamos agora como os mesmos reis, se quiserem, podem levar consigo os ladrões ao Paraíso. Parecerá a alguém, pelo que fica dito, que será coisa muito dificultosa, e que se não pode conseguir sem grandes despesas; mas eu vos afirmo e mostrarei brevemente que é coisa muito fácil, e que sem nenhuma despesa de sua fazenda, antes com muitos aumentos dela, o podem fazer os reis. E de que modo? Com uma palavra; mas palavra de rei. Mandando que os mesmos ladrões, os quais não costumam restituir, restituam efetivamente tudo o que roubaram. Executando assim, salvar-se-ão os ladrões, e salvar-se-ão os reis. Os ladrões salvar-se-ão porque restituirão o que têm roubado; e os reis salvar-se-ão também porque restituindo os ladrões, não terão eles obrigação de restituir. Pode haver ação mais justa, mais útil e mais necessária a todos? Só quem não tiver fé, nem consciência, nem juízo, o pode negar. [...]


1 “Não se recrimina o ladrão por ter roubado para se saciar, estando com fome.” (Prov. VI, 30)

VIEIRA, Antônio. Sermões escolhidos. São Paulo: Martin Claret, 2003.



A época de Antônio Vieira

No século XVI a Igreja católica enfrentou a Reforma Protestante, um movimento iniciado dentro da própria Igreja, apontando as incoerências dos sacerdotes católicos e de algumas das doutrinas da Igreja. Martinho Lutero, integrante do clero, produziu um documento por meio do qual apresentou críticas e propostas de mudanças em relação às práticas e aos valores da Igreja. Lançavam-se assim as bases para a formação de igrejas protestantes.

A Contrarreforma consistiu em um conjunto de medidas tomadas pela Igreja católica para promover mudanças estruturais das doutrinas e das práticas de seus sacerdotes para resgatar seus fiéis e seu prestígio. Entre essas medidas destacaram-se a criação da Companhia de Jesus, cujos sacerdotes (os jesuítas) deveriam expandir o catolicismo ao redor do mundo conquistando novos fiéis; e o desenvolvimento da Inquisição, que tinha o dever de castigar o desvio dos fiéis católicos e impedir a expansão de outras correntes religiosas.

A Inquisição combateu e perseguiu protestantes e devotos de outras religiões, considerados pecadores e infiéis. O próprio padre Antônio Vieira


foi preso pela Inquisição.

Entre 1580 e 1640, Portugal ficou sob o domínio da Espanha formando um só reino, a União Ibérica. Essa fusão ocorreu em razão do fim da linha sucessória da dinastia de Avis, reinante desde 1383.

Em 1640, a Espanha, em guerra com outros países, estava debilitada financeiramente. Ao enfrentar a oposição lusitana comandada pelo duque de Bragança, não resistiu ao confronto. Com a expulsão dos espanhóis, restaurou-se a independência de Portugal, e o duque de Bragança foi coroado rei, tornando-se dom João IV.

Quando ainda pertencia à União Ibérica, Portugal viu o Nordeste brasileiro ser invadido pela Holanda, em busca de açúcar, por meio da Companhia das Índias Ocidentais, entre 1630 e 1654. Mas também observou a expansão de fronteiras do Brasil, já que os bandeirantes avançaram para além dos limites do Tratado de Tordesilhas.

Durante seu domínio no Nordeste, a Holanda enviou Maurício de Nassau para governar as terras conquistadas e formar uma colônia holandesa no Brasil. Nassau dominou boa parte do território nordestino. Entretanto, em 1654, após muitos confrontos, os colonos portugueses expulsaram os holandeses do território brasileiro.

O autor

Antônio Vieira (1608-1697), escritor, filósofo, orador e sacerdote ligado à Companhia de Jesus. Nascido em Lisboa, viveu entre Portugal e Brasil. Vieira entrou para a Companhia de Jesus em 1623.

Influente personalidade do século XVII, destacou-se como missionário em terras brasileiras. Defendeu os indígenas, pois era contra a escravização e a exploração, e os judeus, perseguidos pela Inquisição.

Biblioteca Nacional de Portugal, lisboa, portugal



Padre Geraldo. Retrato do padre Antônio Vieira, [s.d.].

1. Nesse trecho do sermão, o padre Antônio Vieira distingue dois tipos de ladrão.

a) Quais são esses tipos? Descreva-os brevemente.


b) De qual tipo de ladrão ele trata em seu sermão? Ilustre sua resposta com um trecho do texto.
2. Após citar São Basílio Magno (em latim e traduzido), Vieira aponta as diferenças entre os tipos de ladrão. Copie no caderno o trecho que torna essas diferenças evidentes.

“Os outros ladrões roubam um homem, estes roubam cidades e reinos; os outros furtam debaixo do seu risco, estes sem temor, nem perigo; os outros, se furtam, são enforcados: estes furtam e enforcam.”



3. No trecho estudado, logo de início, Vieira afirma que, existindo dois tipos de ladrão, ele falará de um deles: do que vai para o inferno e leva os reis com ele. Para provar a seu ouvinte a existência dos dois tipos e mostrar que apenas um deles merece ser chamado de ladrão, Vieira faz citações e dá exemplos que garantem coerência ao texto. Releia a parte em que ele cita Diógenes e responda: no contexto, o que significam os adjetivos grandes e pequenos?
4. Releia também este exemplo:

"[...] Quantas vezes se viu em Roma ir a enforcar um ladrão, por ter furtado um carneiro, e no mesmo dia ser levado em triunfo um cônsul, ou ditador, por ter roubado uma província! [...]"

a) Por que o roubo de uma província é visto como triunfo e o de um carneiro é considerado motivo para a forca?
b) Há motivo para que apenas uma dessas atitudes seja condenada? Qual?

O ator Luís Miguel Cintra em cena do filme Palavra e utopia, de Manoel de Oliveira, 2005. O filme recria momentos da vida de Antônio Vieira.

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A persuasão dos discursos de Vieira

No trecho a seguir, o professor Alfredo Bosi comenta a estratégia de Vieira em seus sermões. Considere que o sacerdote falava para as camadas privilegiadas e deveria apontar os preconceitos e os desvios cometidos por essas pessoas sem atingi-las diretamente. Tinha ainda a intenção de estimular a participação de seu auditório na reconstrução de Portugal. Leia:

Como pregador da Corte, o jesuíta tem acesso aos estratos do privilégio. Mas a sua máquina oratória deve, paradoxal e temerária, investir precisamente contra as regalias e as isenções de que gozavam os nobres e os religiosos nessa fase de reerguimento do Império [português] duplamente ameaçado: pela Espanha, no xadrez europeu; pela Holanda, na estratégia atlântica e colonial.

O seu problema retórico fundamental é este: como compor um discurso persuasivo, isto é, suficientemente universal nos argumentos para mover particularmente a fidalguia e o clero a colaborar na reconstrução do Reino, até então escorada sobretudo pela burguesia e pelos cristãos-novos?

Em termos ideológicos: como pôr em xeque os preconceitos antimercantis e antissemitas que, como se sabe, já afloravam [...].

É preciso considerar o óbvio e lembrar que a ação de Vieira se deu em pleno Antigo Regime, antes que a crítica das Luzes começasse a arranhar a metafísica social incrustada nos estamentos. Vieira falava para um auditório para o qual o nobre era ontologicamente nobre; o clero, clero in aeternum; o vilão, vilão; o cristão, cristão; o judeu, judeu. Assim o quisera a vontade divina, assim o estabelecia a natureza das coisas.

O seu empenho político o obrigava a induzir os ouvintes a uma reestruturação conceitual de valores. [...]

BOSI, Alfredo. Dialética da colonização. São Paulo: Companhia das Letras, 1992. p. 123-124.

isenção: desobrigação de responsabilidades.

escorado: amparado.

antissemita: aquele que se opõe aos judeus.

Antigo Regime (ou Absolutismo): sistema político dominante em vários países da Europa entre os séculos XV e XVIII. Caracterizou-se por centralizar


as decisões nas
mãos do rei.

Luzes (ou Iluminismo): movimento intelectual do século XVIII, caracterizado pela confiança no desenvolvimento da ciência e da racionalidade crítica.

incrustado: amparado, inserido.

estamento: grupo de indivíduos com o mesmo status jurídico.



5. Em 2006, os deputados federais e os senadores brasileiros votaram uma lei que aumentaria seus salários em quase 91%. Nesse período, o arcebispo de Brasília, dom João Braz de Aviz, rezou uma missa para parlamentares e, no sermão, disse o seguinte:

Como aceitar que um parlamentar brasileiro receba mais de 800 reais por dia quando uma boa parte das pessoas que representa é obrigada a viver com 12 reais por dia?



O Estado de S. Paulo. São Paulo, 21 dez. 2006. Política.
Qual pode ser a importância desse questionamento numa missa para os parlamentares? Compare esse posicionamento com o engajamento social do padre Antônio Vieira.

6. Compare:
Trecho 1 — "Para Maria da Graça"

"Este livro é doido, Maria. Isto é: o sentido dele está em ti.

Escuta: se não descobrires um sentido na loucura acabarás louca. Aprende, pois, logo de saída para a grande vida, a ler este livro como um simples manual do sentido evidente de todas as coisas, inclusive as loucas. Aprende isso a teu modo, pois te dou apenas umas poucas chaves entre milhares que abrem as portas da realidade. A realidade, Maria, é louca."

Mary Cagnin/Arquivo da editora

Trecho 2 — "Sermão do bom ladrão"

"Grande lástima, será naquele dia, senhores, ver como os ladrões levam consigo muitos reis ao inferno: e para que esta sorte se troque em uns e outros, vejamos agora como os mesmos reis, se quiserem, podem levar consigo os ladrões ao Paraíso. [...] Mandando que os mesmos ladrões, os quais não costumam restituir, restituam efetivamente tudo o que roubaram. Executando assim, salvar-se-


-ão
os ladrões, e salvar-se-ão os reis."

a) Observe as formas verbais destacadas e verifique se elas se referem ao enunciador (cronista, no trecho 1 /Antônio Vieira, no trecho 2), ao(s) interlocutor(es) (Maria da Graça, no trecho 1 / pessoas presentes na missa, no trecho 2) ou a uma terceira pessoa.

b) Por que, no trecho 1, as formas verbais se encontram na segunda pessoa?

c) Antônio Vieira, em seu sermão, dirige-se aos presentes, usando o pronome de tratamento senhores. Por que, ao informar, ao aconselhar e ao julgar certos comportamentos, ele não usa verbos dirigidos diretamente a seus interlocutores?


Texto 3

Em 1902, Franz Xaver Kappus, um jovem estudante, lia os poemas do poeta tcheco Rainer Maria Rilke quando um de seus professores, que também fora professor de Rilke, decidiu falar um pouco de seu antigo aluno, fazendo um breve comentário sobre o poeta: um aluno “calado, prendado e sério que gostava de apartar-se dos outros e suportava com paciência o constrangimento da vida do internato”. Encantado com os poemas e com os comentários do professor, Kappus enviou ao poeta uma carta pedindo uma avaliação de suas tentativas poéticas.

Após semanas, chegou uma resposta. A partir de então, iniciou-se uma correspondência entre eles, que se estenderia até 1908. As cartas tratam de literatura e de poesia, mas sobretudo trazem aspectos da formação humana, além de um conjunto de aconselhamentos que pretendem voltar a atenção do jovem para a vida interior.

Três anos após a morte de Rilke, Kappus publicou as cartas que recebeu dele sob o título Cartas a um jovem poeta. Leia uma delas a seguir.



Carta a um jovem poeta

Rainer Maria Rilke

Roma, 23 de dezembro de 1903

Meu caro Sr. Kappus,

Não quero que fique sem uma saudação minha pelo Natal, quando, no meio da festa carregar sua solidão mais dificilmente do que nunca. Mas se verificar, nesse momento, que a sua solidão é grande, alegre-se com isto. Que seria, com efeito, uma solidão (faça esta pergunta a si mesmo) que não tivesse grandeza?

Há uma solidão só: é grande e difícil de se carregar. Quase todos, em certas horas, gostariam de trocá-la por uma comunhão qualquer, por mais banal e barata que fosse; por uma aparência de acordo insignificante com quem quer que seja; com a pessoa mais indigna. Mas, talvez, sejam estas, justamente, as horas em que ela cresce, pois o seu crescimento é doloroso como o de um menino e triste como o começo das primaveras. Mas tudo isto não o deve desorientar. O que se torna preciso é, no entanto, isto: solidão, uma grande solidão interior. Entrar em si mesmo, não encontrar ninguém durante horas — eis o que se deve saber alcançar. Estar sozinho como se estava quando criança, enquanto os adultos iam e vinham, ligados a coisas que pareciam importantes e grandes porque esses adultos tinham um ar tão ocupado e porque nada se entendia de suas ações. [...]

Pense, caro senhor, no mundo que leva em si e chame o seu pensamento como quiser: reminiscência da sua própria infância ou saudade do futuro — o que importa apenas é prestar atenção ao que nasce dentro de si e colocá-lo acima de tudo o que observar em redor. Os seus acontecimentos interiores merecem todo o seu amor; neles de certa maneira deve trabalhar e não perder demasiado tempo e coragem em esclarecer suas relações com os homens. Aliás, quem lhe diz que as tem? Sua profissão, bem o sei, é dura, cheia de contradições para si; previ a sua queixa e sabia que ela havia de vir. Agora que chegou não o posso tranquilizar, mas apenas aconselhar--lhe que examine se todas as profissões não são assim cheias de exigências, de hostilidade contra o indivíduo, como que ensopadas do ódio daqueles que, mudos, resmungando, se tiveram de conformar com o simples dever. A posição que agora deve viver não é mais carregada de convenções, preconceitos e erros do que todas as outras. Se há algumas que exigem bem uma liberdade maior, não existe uma que seja larga e ampla em si, relacionada com as grandes coisas de que se compõe a verdadeira vida. [...] O que agora deve experimentar Sr. Kappus, em sua qualidade de oficial, tê-lo-ia sentido em qualquer das profissões existentes. Mesmo que, fora de qualquer posto, tivesse procurado apenas contatos leves e independentes com a sociedade, este sentimento constrangedor não lhe seria poupado. — Por toda parte as coisas são assim.

RILKE, Rainer Maria. Cartas a um jovem poeta. Rio de Janeiro: Globo, 1986. p. 48-51.
Panorama do início do século XX

No fim do século XIX o crescimento dos parques industriais e o acúmulo de capitais fizeram com que as grandes potências econômicas europeias buscassem a ampliação de seus mercados e procurassem outras fontes de matéria-prima a baixo custo. A solução encontrada por elas foi explorar sobretudo os continentes africano e asiático. Isso provocou o chamado neocolonialismo: algumas nações europeias partilharam entre elas esses continentes para explorá-los, sem respeitar a divisão geográfica


nem cultural dos povos dessas regiões.

Essa divisão, considerada injusta por países como a Itália e a Alemanha, gerou descontentamento entre as nações europeias, o qual provocou a Primeira Guerra Mundial, ocorrida entre 1914 e 1918. O conflito terminou com a vitória da França e seus aliados e com a derrota da Itália e da Alemanha.

Em consequência da guerra, a
Europa teve de enfrentar uma de suas piores crises econômicas, pois estava arrasada, sem condições de produzir o necessário. Uma das saídas para a crise seria aceitar a ajuda econômica dos Estados Unidos. Mas esta nação logo enfrentou uma grande crise, sobretudo a partir de 1929, o que inviabilizou a colaboração.

Nesse cenário, as doutrinas liberais e capitalistas vigentes enfrentavam o descrédito das populações, ao passo que a Revolução Russa, de 1917, favoreceu a tentativa de se mobilizar a classe trabalhadora em diversos países em prol das correntes socialistas e comunistas. Novos partidos políticos — afastados do ideário liberal e contrários aos ideais de esquerda — ganharam força política então ao defenderem uma solução para a crise conquistada por meio da instalação de um governo forte, centralizado e apoiado por um sentimento nacionalista exacerbado.

Alguns desses partidos conquistaram parte da população com suas promessas, possibilitando a ascensão de regimes totalitários sobretudo na Itália e na Alemanha. Nesses países profundamente afetados pela crise, o fascismo e o nazismo fortaleceram-se e levaram ao poder Benito Mussolini (1883-1945) e Adolf Hitler (1889-1945), respectivamente.

Esse contexto levaria as nações a mais um conflito: a Segunda Guerra Mundial, ocorrida entre 1939 e 1945.



O autor

Rainer Maria Rilke (1875-1926), poeta e novelista natural de Praga, capital da República Tcheca. Sua obra costuma refletir a ideia de que o ser humano e o mundo podem experimentar uma união transcendental. Seus poemas convidam o leitor a refletir sobre o desencanto experimentado por muitos durante a primeira metade do século XX, além de levar o leitor à reflexão sobre a existência. Fotografia de 1906.

IMAGNO/Austrian Archives

1. Que situação do destinatário, provavelmente já expressa em cartas anteriores, parece motivar a resposta de Rilke, na carta do dia 23 de dezembro? Justifique sua resposta.
2. Diante dessa situação, qual é o aconselhamento dado por Rilke ao jovem poeta?
3. O texto sugere haver outro tipo de reclamação na carta.

a) Identifique qual foi a provável queixa.

b) Qual é o conselho de Rilke nesse caso?
4. De que modo Rilke se dirige ao seu interlocutor? Comente o tom da carta.
5. O tom adotado nessa carta se diferencia do tom adotado no texto “Para Maria da Graça” e no “Sermão do bom ladrão”.

a) Em que esses tons se diferenciam?

b) A que você atribui essa diferença?

c) Destaque, em cada um dos três textos, ao menos dois trechos que evidenciem o tom identificado nas questões anteriores.


Sobre as cartas escritas pelo poeta Rilke

[...] As considerações e os conselhos ponderados, em resposta às inquietações do jovem que ambicionava ser poeta, vão muito além da dimensão pessoal, de modo que os textos fazem sentido sem a necessidade de ler as cartas a que eles respondem. Nas palavras de Rilke, escritas há aproximadamente cem anos, brilha e salta a atenção dedicada do poeta observador, seu universo de questões e experiências, a “luz do olhar”, que faz de seu texto uma invocação [...].

SÜSSEKIND, Pedro. In: RILKE, Rainer Maria. Cartas a um jovem poeta. Porto Alegre: L&PM, 2016.

Para afetar o outro

Ao longo deste capítulo, você teve a oportunidade de ler três textos motivados inicialmente por seus potenciais interlocutores. Em função deles, os autores produziram cartas e sermões apontando características de certos comportamentos, ilustrando ações e sensações humanas para, fundamentados nisso, sugerir ou enunciar claramente uma série de conselhos, que deveriam conduzir tais interlocutores à reflexão.

Levando em conta cada texto, suas condições de produção e o suposto interlocutor, foi possível observar variação de objetivo, do tom, do tratamento e da construção argumentativa. Essa diferença fica bastante evidente na comparação do “Sermão do bom ladrão, de Antônio Vieira, com os outros textos, em forma de carta. O sermão é dirigido a muitas pessoas e pretende a adesão da maioria às ideias pregadas e, discursado por um sacerdote, tem como intenção propor uma mudança de comportamento dos mais diretamente ligados ao tema desenvolvido em sua fala — no caso, aqueles que, sendo poderosos, roubavam o reino. Como se dirige a diversos públicos, reunidos em função de uma crença religiosa, Vieira ilustra seu ponto de vista com citações de autores consagrados, que, tratando do mesmo tema, apresentavam imagens concretas, fáceis de serem visualizadas pelos ouvintes da época e do local. O tema do sermão, tendo em vista o espaço de seu pronunciamento, a situação, o contexto como um todo, envolve questões que afetam diretamente a vida pública. Ao contrário das duas cartas (Textos 1 e 3), que trazem, aliadas ao tom mais pessoal, as questões humanas, interiores e privadas como tema.

Ao se comparar o tom dessas cartas — mesmo uma delas sendo uma crônica em forma de carta —, observa-se mais formalidade na linguagem da carta de Rainer Maria Rilke do que na carta de Paulo Mendes Campos, o que se dá provavelmente pela época de sua produção e pelo grau de intimidade entre o remetente e seu destinatário: o poeta do início do século XX escreve a um jovem escritor que o admira, o narrador da crônica de meados desse século dirige-se a uma suposta interlocutora de 15 anos.

Pode-se apontar essas e outras diferenças entre os textos, porém, nos três casos, observa-se que os autores defendem algumas ideias, expõem uma perspectiva fundamentada em sua visão de mundo. E, de um modo extraordinário, ao orientar cada um de seus interlocutores, levam em conta seu conhecimento desse interlocutor. Cada um desses autores, ao escrever, revela sua observação aguda de quem supostamente está do outro lado do texto: quem é esse ser, como age, como se sente. Tanto é assim que o cronista procura mostrar que conhece a adolescente em seu passado (cita uma história muito conhecida pelas crianças, a da menina Alice), seu presente de mudanças e seu futuro ao falar de possíveis inquietações como o sentimento de solidão. Por sua vez, o sacerdote, em seu discurso, ou seja, nesse texto escrito para ser pregado, deixa claro seu profundo conhecimento dos ladrões que o cercam e de suas atitudes: tanto dos mais simples quanto dos mais sofisticados e poderosos, nada lhe escapa. E, na carta do poeta a um aspirante a escritor, a escrita nos revela seu domínio dos sentimentos, certamente comentados anteriormente pelo jovem, e procura animá-lo justamente mostrando, de um sentimento difícil de enfrentar como a solidão, seu aspecto nobre, capaz de fortalecer tanto o caráter como a escrita, o que, para um aspirante a poeta, não é pouca coisa.

Se esses textos encontram leitores entusiasmados até hoje é porque esses interlocutores tão particulares de cada autor também têm pontos de contato com pessoas reais e de inúmeras épocas e contextos. Isso talvez aconteça porque sempre haverá adolescentes no limiar da vida adulta, ouvintes que se se reconhecem nos equívocos apontados pelo sacerdote ou que se sentem aliviados por ouvir da boca dele o que gostariam eles mesmos de dizer, jovens artistas em busca de orientação e de alguém para compartilhar suas dificuldades ou ainda pessoas com outras grandes e pequenas questões, sensíveis também para reconhecer e admirar a abrangência temática e a beleza da forma literária.

Procure um anúncio, uma petição, um manifesto, uma crônica ou uma fábula e identifique a ideia defendida, o interlocutor potencial e os recursos linguísticos de convencimento. Compartilhe sua análise com os colegas.

Bruna Assis Brasil/Arquivo da editora



Para ler outras linguagens
Pintura e provérbios

A pintura — e outras produções fundamentadas na linguagem visual — também pode ser usada como meio de reflexão sobre uma ideia. Comparáveis a um sermão ou a uma carta de aconselhamento, certas imagens podem chamar a atenção para comportamentos humanos e levar o interlocutor à reflexão. Dependendo do momento histórico em que é veiculada e dos observadores em potencial, ela pode ter caráter instrutivo ou até mesmo moralizante.

A pintura que você observa a seguir foi produzida em 1559 pelo artista holandês (ou flamengo, em sua época) Pieter Bruegel, o Velho.

provérbio: frase curta de origem popular, muitas vezes com ritmo, que sintetiza um conceito a respeito da realidade ou uma regra social ou moral (exemplo: água mole em pedra dura tanto bate até que fura).

flamengo: que ou aquele que é natural ou habitante de Flandres, região localizada parte na França, parte na Holanda e na Bélgica.

Pieter Bruegel, o Velho (1525 ou 1530-1569), pintor e arquiteto flamengo, natural de uma região que hoje faz parte da Bélgica. É chamado de “o Velho” para não ser confundido com um de seus filhos, também pintor. Começou a se dedicar à pintura ainda em sua região, depois viajou pela Itália com o intuito de aprender a forma de pintar dos renascentistas.

Gostava de pintar multidões e cenas populares. Retratava o absurdo na vulgaridade, expondo as fraquezas e loucuras humanas, o que o tornou conhecido. Retratou a vida e os costumes dos camponeses, os rituais da aldeia, cenas ligadas à agricultura, à caça, às refeições, às festas.

A pintura de Bruegel reproduzida nesta seção intitula-se Provérbios flamengos. No cenário de uma aldeia como eram provavelmente as aldeias da região e da época do pintor, a obra representa visualmente diversos provérbios em circulação na sociedade daquele tempo. Todos eles mostram formas de viver “reprováveis” — ou seja, o que não fazer — de acordo com os costumes em vigor. Alguns deles ainda têm correspondentes hoje em dia, mesmo no Brasil. Veja:

Pieter Bruegel/Gemäldegalerie, Berlim, alemanha

Pieter Bruegel. Provérbios flamengos, 1559. Óleo sobre madeira de carvalho. Dimensões:

163 cm × 117 cm.



1. Observe a pintura. Identifique as cores que predominam, a forma de distribuição das cenas, a maior ou menor concentração de pessoas em uma das áreas da tela, os tipos humanos, as construções, e responda: que sensações o conjunto provoca? A que você atribui isso?

2. Escolha uma das cenas e a descreva. Que ideia, crítica, elogio ou ensinamento essa cena pode transmitir?

3. Observe alguns dos provérbios representados por Bruegel em sua pintura.

Pieter Bruegel/Gemäldegalerie, Berlim, alemanha



Ela veste o marido com uma capa azul, ideia que corresponde ao nosso provérbio "O marido é o último a saber" ou então "Não há bela sem senão". Esse ditado chama a atenção para o fato de a moça enganar o marido. Observe que o marido é um senhor, que usa uma bengala, em oposição à imagem da moça, vestida de vermelho, jovem, bonita e vistosa. O contraste acentua ainda mais a situação de engano representada.

Pieter Bruegel/Gemäldegalerie, Berlim, alemanha

Ele nada contra a corrente, provérbio que sugere a revolta contra a lei ou o costume, o que torna as coisas muito mais difíceis para quem assim age.

Pieter Bruegel/Gemäldegalerie, Berlim, alemanha

Ele bate com a cabeça na parede, o que corresponde mais ou menos ao nosso provérbio "Dar murro em ponta de faca". Esse provérbio se refere às pessoas que pretendem realizar o impossível por meio de atitudes inúteis ou perigosas. Observe que parte do traje sugere o preparo para a luta (a couraça e a espada); a perna, entretanto, traz uma atadura, sugerindo ferimento decorrente de outras tentativas inúteis.

Agora reveja a pintura com atenção procurando encontrar as cenas que representam os seguintes provérbios.

a) "Quem deixou entornar o mingau não pode apanhá-lo todo de volta" ou "Não se deve chorar sobre o leite derramado".

b) "Uma enfia o fuso e a outra fia", o que indica duas mulheres fofocando e espalhando calúnias.

O provérbio relaciona-se com as duas mulheres fiando atrás da moça de vermelho, que coloca a capa azul no marido.

c) "Ela tapa o fosso depois de o veado se afogar" ou "O que não tem remédio, remediado está".
4. Reveja a tela toda e observe que essa pintura representa diferentes situações (ou os diferentes provérbios) em um único cenário de aldeia. Note que os personagens não agem como se respeitassem a sabedoria popular: muito pelo contrário, agem como se não conhecessem esses aconselhamentos. Desse modo, o artista expressa seu ponto de vista sobre o comportamento em geral: são as tolices humanas que se destacam. Em sua opinião, esse quadro tem caráter aconselhador? Justifique sua resposta.
5. Pesquise alguns provérbios e eleja aqueles com os quais concorda. Junte-se a outros três colegas, façam uma seleção dos provérbios que representam comportamentos observáveis em sua região. Usando fotos recortadas de revistas ou jornais ou desenhos, produzam imagens que ilustrem esses comportamentos como se vocês estivessem fazendo um trabalho parecido com o de Bruegel, mas tomando como base a sociedade atual. Afixem as ilustrações em um painel da escola indicando o provérbio a que elas correspondem.

E por falar em...



Persuasão ou convencimento

Neste capítulo você leu textos em que se ressalta o aspecto persuasivo, a intenção de convencer o interlocutor a respeito de alguma ideia ou sentimento. Nesta seção convidamos você a refletir sobre a persuasão tendo em vista a participação social de maneira responsável e respeitosa. Leia as matérias jornalísticas a seguir para se inspirar.

Texto 1

https://nacoesunidas.org/unicef-adolescentes-e-jovens-discutem-propostas-para-suas-comunidades-em-manguinhos-rio/



Unicef: Adolescentes e jovens discutem propostas
para suas comunidades em Manguinhos, no Rio

Adolescentes e jovens moradores da comunidade de Manguinhos e outros bairros da Zona Norte do Rio de Janeiro participaram neste sábado (9) do Fórum Territorial de Participação Cidadã de Adolescentes e Jovens da Plataforma dos Centros Urbanos, ocasião em que debateram sobre o direito à educação, à saúde, à cultura e à segurança em suas comunidades.

O Fórum Territorial faz parte das atividades da Plataforma dos Centros Urbanos, uma iniciativa realizada pelo Fundo da ONU para a Infância (Unicef), a Prefeitura Municipal do Rio de Janeiro e o Conselho Municipal dos Direitos da Criança e do Adolescente para reduzir as desigualdades que afetam a vida de crianças e adolescentes na cidade.

Estimular e fortalecer a participação dos próprios adolescentes e jovens no debate e implementação das políticas públicas voltadas à infância e adolescência é uma das estratégias da Plataforma dos Centros Urbanos. “Precisamos conquistar espaços permanentes de escuta e diálogo a partir dos próprios jovens e adolescentes, nos territórios onde vivem, para encontrarmos soluções inclusivas e sustentáveis”, destaca Luciana Phebo, coordenadora do escritório do Unicef no Rio de Janeiro.

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