Por que uma idéia de dois mil e quinhentos anos atrás pareceria hoje mais relevante do que nunca? Como os ensinamentos do Buda podem nos ajudar a resolver muitos problemas do mundo



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O Buda de Leshan,

o maior Buda

Maitreya de pedra

do mundo, perto de

Chengdu.

Fu Ching,

o mediador

de Chengdu,

extremamente

parecido com

o Buda.
uma foto do perfil de Fu Ching, um cara com as maças do rosto salientes, de 30 e poucos anos, com a cabeça quase toda raspada, de modo que o rosto dele ficasse lado a lado com o do Buda. Estudando a foto mais tarde em casa, vi a extraordinária semelhança da estrutura óssea de Fu Ching com a do Buda. Vi claramente que o modelo daquele Buda era um rosto chinês clássico. Também vi claramente que essa estátua podia ter sido um perfil do Mickey Mouse, para algumas pessoas que estavam lá. Elas se empolgavam muito mais com o feito de engenharia da construção daquela estrutura monstruosamente grande.

Aquela era um pouco da cultura chinesa, uma verdadeira "atração" turística. O homem que deu-lhes um meio para amenizar o sofrimento era a última coisa em que pensavam. Pelo menos foi isso que pensei.

Da beirada as pessoas foram andando em fila única e desceram uma escada íngreme escavada na face da montanha que data de quando a estátua foi feita. Agora os degraus estão protegidos por gradis nos quais as pessoas se apoiam para não cair. As minhas mãos estavam doendo quando cheguei à base de concreto lá embaixo, onde as pessoas se juntaram e tiraram mais fotos. De lá olhei para cima e vi as narinas do Buda a 71 metros de altura. Andando pelo meio das pessoas que tiravam fotos avistei duas adolescentes que também olhavam para cima maravilhadas, e isso indicava que talvez elas estivessem vendo o que eu também via: uma homenagem a um grande homem. Primeiro pensei que estavam atônitas com o tamanho do Buda que se avolumava sobre as nossas cabeças. Mas enquanto as observava, vi que pareciam ignorar completamente o mundo à sua volta, hipnotizadas, como se envoltas por uma bolha do outro mundo. Elas ficaram olhando para cima um tempo enorme e até inadequado, com sorrisos embevecidos ocupando seus rostos maravilhosamente redondos. Percebi que os chineses vão ver lugares históricos e culturais como aquele, maravilhas da construção, mas que saem com uma curiosidade: Quem era aquele cara? Há algo de universalmente atraente na imagem simples do Buda, grande ou pequena. Depois ela nos chama para algo mais profundo. Observando aquelas mulheres

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descobri que ali, um dos países em que a religião foi mais reprimida no mundo, o budismo ia renascer.

Tive outra dessas miniepifanias na província de Shaanxi quando observei um grupo de cerca de vinte mulheres andando de uma estátua de Buda para outra no templo Fa Men, que abriga o que nos disseram ser uma relíquia autêntica do dedo de Buda. A relíquia foi encontrada só em 1987, no porão de um pagode depois que a construção ruiu. Desde então os ônibus de turismo levam mais de seis mil pessoas por dia para visitar o admirado dedo, que fica numa caixa de ouro enfeitada, protegida por uma caixa de vidro. As mulheres, por volta dos 50, 60 anos de idade, seguiam uma outra mulher em torno das paredes do templo, copiando escrupulosamente os movimentos dela, enquanto ela dava instruções sobre os rituais mais básicos do budismo, onde pôr os pés, como juntar as palmas das mãos, como se curvar e acender o incenso, que palavras recitar e a resposta para alguns porquês. Mais tarde, quando me apresentei, elas disseram que eram vizinhas que viajavam juntas com freqüência para lugares budistas importantes. Alguns meses antes tinham ido de trem para uma montanha sagrada budista. Elas poderiam ser o grupo que jogava majong com a minha mãe num passeio até o museu.

— Lembro-me dessas coisas de quando eu era pequena — uma das mulheres explicou com tradução do meu mediador. - Só que... - Ela deixou a frase incompleta e eu vi uma tristeza arrependida nos seus olhos. Sabia que ela estava se referindo ao período da Revolução Cultural quando o governo fechou os mosteiros e proibiu as práticas religiosas, e ela sabia que eu sabia. - Ficamos felizes de aprender de novo essas tradições dos nossos antepassados.

Erik Zürcher, historiador holandês, expressou melhor no título do seu livro de 1959 The Buddhist Conquest of China: The Spread and Adaptation ofBuddhism in Early Medieval China (A conquista budista da China: expansão e adaptação do budismo nos primórdios da China medieval). Será que esse título foi humor irônico de holandês? Budistas chamados de conquistadores? O que,

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brandindo seus palitos de incenso como espadas? Tropeçando em seus mantos, dizimando os inimigos com caules de lótus, quebrando seus votos de não violência? Certamente que não! Mas o budismo "conquistou" a China do mesmo modo que "conquistou" os países que eu já tinha visitado. Segundo ele: "Desde o início, o corpo da doutrina estrangeira foi reduzido aos elementos sujeitos à adaptação e incorporação, por terem real ou suposta congruência com idéias e práticas chinesas preexistentes. O resultado desse processo intenso e contínuo de seleção e hibridização é amplamente divergente do conteúdo das escrituras importadas que foram copiadas com tanta fidelidade, memorizadas e recitadas pelos devotos chineses."



Essas "idéias e práticas chinesas preexistentes" eram o confucionismo e o taoísmo, introduzidos pelos outros heróis da Era Axial, Confúcio e Lao-Tzu. As "religiões tradicionais chinesas" de hoje misturam essas duas, e somam também o animismo, tote-mismo, adoração de deuses locais e, agora, o budismo. (A religião tradicional chinesa conta com 405 milhões de seguidores e é a quarta maior religião do mundo, atrás do cristianismo com 2,1 bilhões, islamismo, com 1,3 bilhão e o hinduísmo, com 870 milhões.) Em alguns círculos chineses o budismo ainda é considerado produto estrangeiro importado, dois mil anos depois da chegada dele aqui.

Essa hibridização parece que atingiu seu apogeu na China, criando uma espécie robusta e resistente, e isso talvez explique de que modo o budismo sobreviveu a tantas tentativas de matá-lo aqui na China. Pensei nessa analogia quando espiava pela janela de um ônibus de turismo que subia uma das quatro montanhas chinesas que são sagradas para os budistas, o monte Emei, não muito distante do Buda de Leshan. No meio de um nevoeiro cada vez mais denso, eu olhava para as espessas touceiras de bambu balançando aos rodopios do vento, um dragão que ondulava em muitos tons de verde. O budismo é como o bambu, pensei. O grupo mais diverso da família das gramíneas, o bambu se curva com os ventos, em vez de resistir e se partir. É uma das plantas que mais rápido crescem no planeta, alguns tipos chegam a crescer um

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metro por dia, enquanto espalha quilômetros de raízes subterrâneas. A árvore das tradições judaico-cristas seria o carvalho, considerado sagrado pelos gregos, venerado pelos druidas, dedicado ao deus Júpiter pelos romanos. As antigas culturas eslava e nórdi-ca consideravam o carvalho o deus do trovão, já que costumava ser alvo dos raios com maior freqüência do que outras árvores. O carvalho cresce lentamente e, apesar de muito robusto, seus galhos se quebram com facilidade com uma ventania forte de nordeste. Os bordos e as castanheiras com as quais cresci definiam não só solidez, mas rigidez, invencibilidade e imobilidade, como os dogmas do cristianismo, do catolicismo e do judaísmo.



Quando cheguei ao topo, ao pico Jinding, 3.077 metros acima do nível do mar, do qual me disseram que se tinha a vista mais magnífica de toda a China, o nevoeiro era o mais denso que eu já tinha visto, e eu tinha morado em San Francisco. De uma plataforma que, não posso relatar, dava para uma paisagem de tirar o fôlego, eu não via nada além de um metro do nariz.


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