Vítima de sua própria armadilha, ela teria de renunciar ao amor



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VÍTIMA DE SUA PRÓPRIA ARMADILHA, ELA TERIA DE RENUNCIAR AO AMOR...

Presa de extrema inquietação, Jéssica viu que não tinha alternativa: precisava arranjar um marido rico, caso contrário sua família perderia as terras que administrava! Ao conhecer Matthew, seu coração inocente bateu mais forte. Parecia que o destino queria ajudá-la, colocando em seu caminho esse cavalheiro que, além de herdeiro de uma grande fortuna, era também encantador... Foi então que uma terrível angústia assaltou Jéssica: seria mesmo capaz de transformar o amor que começou a sentir por Matthew num jogo de interesses?



CAPÍTULO I
Não é possível! — gritou Jéssica, atirando . sua pena de escrever ao chão, desesperada. — Mesmo sem o surto de sarna no outono ou a nevasca na época da tosa das ovelhas, não conseguiríamos efetuar o paga­mento!

Ela não podia estragar o retorno do irmão. Depois de dois anos com­batendo na América, sir Nathan Franklin, tenente, merecia calorosas boas vindas, e não a terrível notícia que ela lhe reservava. Levantou-se da pe­quena escrivaninha onde estivera analisando a situação pela centésima vez e caminhou, agitada, até a janela.

— Quando a senhora acha que ele vai chegar, tia Tibby?

A srta. Tibbet abaixou o livro e olhou por cima dos óculos para a ex-pupila de cabelos da cor de trigo maduro.

— Vai depender do estado da estrada de Darlington — respondeu ela, não pela primeira vez.

Jéssica observou os campos verdes do condado de Durham. Há me­nos de quinze dias eles se apresentavam brancos, cobertos pela neve que caíra fora de estação. Agora, sob o sol de final de maio, não se via um único resquício da nevada.

Ela afastou a cortina, para observar melhor a estrada e, de repente, lá estava a tão esperada figura, montada em um garanhão cinza.

— Ele chegou! — Erguendo as saias, Jéssica correu em direção ao hall e abriu a porta no momento em que o irmão desmontava. — Nathan!


Até que enfim você chegou!

Sem se preocupar com as lágrimas de alegria que escorriam por suas faces, ela desceu a escada e o abraçou com vigor. Nathan Franklin cor­respondeu ao abraço, caloroso.

— Jess... — Um nó lhe fechava a garganta. — Há quanto tempo!
Tad, um dos cavalariços, encarregou-se do garanhão.

— Eu levarei seu cavalo para a estrebaria, sir Nathan. Seja bem-vindo ao lar.

Nathan trocou um aperto de mão com o criado. Enquanto eles con­versavam, Jéssica examinou o irmão. Ele deixara Langdale ainda garoto, aos dezenove anos. Agora, aos vinte e dois, já estava transformado num homem marcado pela guerra. Ainda mantinha a postura orgulhosamente ereta que assumira ao notar que, além de mais velha, sua irmã tam­bém era mais alta que ele. Jéssica deu-lhe o braço.

— Vamos entrar, querido. Você deve estar cansado.

O mordomo, Hayes, aguardava o jovem patrão à porta de entrada, o rosto enrugado coberto de lágrimas. Atrás do mordomo estavam todos os outros serviçais da casa, alinhados para dar as boas-vindas a Nathan Franklin.

Jéssica adivinhou que o irmão conversaria com todos, um a um. Deixando-os, retornou à sala de estar, onde a srta. Tibbet aguardava, im­passível.



  • Como vai sir Nathan? — perguntou a idosa senhora, deixando seu livro de lado por um momento.

  • Parece bem. Está mais bonito que nunca! — Jéssica franziu o cenho. — Não posso estragar a alegria dele, hoje. A notícia ruim pode es­perar até amanhã.

Com a ajuda de Tibby, Jéssica conseguiu distrair Nathan a tarde intei­ra, pedindo-lhe que contasse suas aventuras na América. À noite, ela mal conseguiu dormir, tentando encontrar uma saída para a situação difícil em que se encontravam.

Quando Jéssica desceu na manhã seguinte, para tomar café, Nathan já estava à mesa. A srta. Tibbet chegou logo depois, no instante em que Nathan perguntava:

— Você me acompanhará em uma volta pela propriedade esta manhã, Jess? Não imagina como lhe sou grato por tomar conta de Langdale desde a morte de papai.

Jéssica resolveu que não adiantava esperar mais.

—- Tenho uma notícia ruim para lhe dar, meu irmão.

Ele franziu o cenho e depositou faca e garfo sobre a mesa.



  • Que notícia?

  • Acho que precisaremos deixar Langdale.

  • Deixar Langdale? Você deve estar brincando, Jess! A família Frank­lin está aqui há duzentos anos.

  • Cento e noventa e oito anos, para ser mais precisa. E o segundo contrato de aluguel de noventa e nove anos está expirando.

  • Qual o problema? Lorde Darlington não irá renová-lo? — Nathan estava incrédulo. — Nós sempre nos relacionamos tão bem com ele!

  • Langdale não pertence mais a lorde Darlington. A propriedade foi vendida a um homem de Yorkshire, chamado Scunthwaite, que estipulou um valor altíssimo para a renovação do aluguel.

Olhando para o rosto de Nathan, que empalidecera de repente, Jéssica desejou ter conseguido encontrar uma outra maneira menos brusca de dar a notícia. Tentou segurar a mão do irmão, mas ele não deixou.

— Deve existir algo que possamos fazer... — resmungou o rapaz, contrariado.

— Casamento! — exclamou a srta. Tibbet, de repente.

Ambos viraram-se para encará-la. Os olhos da idosa senhora brilha­vam, demonstrando uma excitação normalmente reservada à aquisição de algum novo livro de história sobre a presença dos romanos na Ingla­terra, seu assunto preferido. Ela balançou a cabeça e seus óculos, presos no alto, escorregaram, enroscando-se em alguns fios de cabelo grisalhos e na fita da touca.



  • Casamento! — repetiu a srta. Tibbet. — É claro! Não sei como não pensei nisso antes.

  • Tia Tibby, estamos discutindo um assunto sério. Não temos tempo para frivolidades.

Enquanto falava, Jéssica ficou de pé e foi ajudar a idosa senhora a desenroscar os óculos, gesto que já se tornara um hábito.

A srta. Tibbet agradeceu a gentileza e esperou que Jéssica voltasse a sentar-se, antes de declarar:

— Um de vocês dois precisa encontrar um cônjuge rico. Esta é a úni­ca solução para o problema!

Desanimado, Nathan permaneceu calado.



  • A ideia não me agrada, embora não seja de todo ruim — argumentou Jéssica. — Apesar de eu não querer me gabar, quase todos os cava­lheiros do condado já foram meus admiradores. O problema é que os mais ricos dentre eles já estão casados.

  • O condado de Durham é um deserto. Precisamos ir para Aquae Sulis!

  • Para Bath? As heroínas dos romances vivem encontrando maridos em Bath... É por isso que está sugerindo que devemos ir para lá?

A srta. Tibbet hesitou.

  • Devo dizer que há outro motivo — confessou ela, por fim, com expressão culpada. — Sempre desejei conhecer as ruínas romanas que existem em Bath. Mas a cidade também possui outras vantagens. A Tem­porada londrina já está quase no fim e, além do mais, em Londres nós gastaríamos muito mais dinheiro.

  • Acredito que não seja difícil ganhar acesso à sociedade de Bath...
    — Jéssica estava começando a levar a sugestão a sério. — Eu posso ven­der os brilhantes que herdei de tia Matilda, assim teremos dinheiro sufi­ciente para chegar lá com estilo e atrair a atenção das pessoas certas.

  • Não! — explodiu Nathan. — Não posso permitir que você venda suas jóias mais valiosas por minha causa, Jess!

  • Elas já estão fora de moda — argumentou Jéssica. — Além do mais, irei vendê-las por minha causa, também. Eu não tenho nada contra en­contrar um marido rico, desde que o cavalheiro seja jovem e simpático.
    Na pior das hipóteses, mesmo que nosso plano fracasse, será uma aven­tura e tanto!

O rapaz fez um gesto de impaciência, indagando:

  • Se você está disposta a vender os brilhantes, Jess, por que não usa o dinheiro para pagarmos o aluguel de Langdale?

  • Eu já mandei avaliar as jóias em Durham. O dinheiro da venda não seria suficiente para pagar o aluguel, mas daria para fazermos uma viagem de algumas semanas a Bath, em grande estilo.

Os olhos castanhos de Jéssica iluminaram-se diante de tal perspectiva.

  • Não posso apoiar um plano desses! — Nathan exasperou-se. —Montar uma farsa para enganar pessoas inocentes seria altamente de­sonroso. Prefiro viver na pobreza, mas com a consciência limpa!

  • De jeito nenhum! — O olhar de Jéssica tornou-se belicoso. — Não estou sugerindo que você fuja com uma rica herdeira sem a autorização dos pais dela, meu irmão. E se a sorte permitir que um cavalheiro afortunado se interesse por mim, pode estar certo de que eu jamais o aceitaria como marido sem revelar nossa verdadeira condição financeira. Mas pense em Langdale, Nathan. Você é capaz de deixar esse lugar, onde nossa família mora há quase dois séculos, sem fazer o possível para salvá-lo?

  • É claro que não — disse o rapaz, triste. — Se houvesse algum outro jeito... Com certeza bastaria que um de nós dois se casasse, não é mesmo?

  • Sim, mas ambos precisamos tentar, assim dobramos as chances. Se eu conseguir antes, você pode desistir.

No final Nathan deixou-se persuadir a ir até Bath. Com sua energia costumeira, Jéssica logo se pôs a organizar a viagem. Entre a doença que dera cabo de seu pai, o longo período de luto e a ausência de Nathan, ela assumira uma boa carga de responsabilidade durante os últimos anos. Era sua obrigação tentar salvar Langdale. E quem poderia condená-la por querer divertir-se durante a tentativa?

Duas semanas mais tarde, em uma tarde chuvosa de junho, uma car­ruagem de aluguel parou em frente à White Hart, em Bath. Um portei­ro, segurando um enorme guarda-chuva preto, correu para abrir a porta do veículo. Jéssica desceu, seguida pela srta. Tibbet, Nathan e uma cria­da que fazia as vezes de dama de companhia. Tad pulou do banco de trás e o grupo entrou na hospedaria, sendo cumprimentado pelo pro­prietário em pessoa.



  • Sir Nathan Franklin? — disse o homem, fazendo uma mesura e esfregando as mãos. — conforme o solicitado, reservamos uma suíte.
    No primeiro andar, de frente, com vista para a Pump Room. Espero que seja satisfatório.

  • É mais que satisfatório! — disse a srta. Tibbet, com os olhos bri­lhando.

  • Posso mandar servirem o jantar dentro de meia hora, sir? — o proprietário perguntou, enquanto os acompanhava até o andar de cima.

Como Nathan permanecesse calado, Jéssica respondeu:

Está ótimo, obrigada.

Assim que a porta se fechou atrás deles, a srta. Tibbet correu até a janela da saleta privativa.


  • A Pump Room! — exclamou, enlevada. — Construída no mesmo local onde os romanos costumavam tomar as águas medicinais da fonte sagrada de Sulis Minerva...

  • Como alguém se atreveu a cometer o sacrilégio de erguer uma construção sobre a fonte de água medicinal? — brincou Jéssica, tirando as luvas enquanto se aproximava da janela. — Teremos uma vista esplêndi­da se parar de chover.

  • Eu diria que esta é a melhor suíte da casa. Deve ser caríssima —Nathan comentou.

  • Não se preocupe, não ficaremos aqui por muito tempo, já que a primeira coisa que pretendo fazer amanhã é procurar uma casa para alu­gar. Reservar um quarto comum arruinaria nossa reputação logp de início — argumentou Jéssica.

  • Assim como chegar em uma diligência — acrescentou a srta. Tib­bet. — Foi uma ideia muito inteligente alugarmos uma carruagem parti­cular em Chippenham, apenas para a última etapa da viagem.

  • E Nathan foi esperto ao sugerir que vendêssemos os brilhantes em Londres. — Jéssica viu o rosto do irmão se iluminar. — Eles pagaram o dobro da quantia oferecida pelos joalheiros de Durham. Com isso po­deremos realizar algumas extravagâncias, sem comprometer o orçamento.

Tad entrou com a bagagem e as damas se retiraram para seus aposen­tos, a fim de se aprontarem para o jantar. O quarto de Jéssica era peque­no, porém confortável. Ela tirou o chapéu e colocou-o com cuidado so­bre a penteadeira. Era o melhor que pudera comprar em Durham, mas sabia que estava fora de moda. Precisaria renovar todo seu guarda-roupa nas elegantes lojas de Milsom Street, logo que fosse possível.

A criada, Sukey, bateu à porta e entrou.

— Posso ajudá-la, senhorita? — ela ofereceu.
Jéssica fitou-a, confusa.

Em casa, sempre se arrumara muito bem sem uma criada particular, mas agora era necessário manter as aparências. Tad com certeza estaria com Nathan, em sua nova função de criado de quarto.

Sim, enquanto estivessem em Bath, seria muito importante manter as aparências.

CAPÍTULO II
Sinto informar que meu irmão está muito zangado, Matthew. A srta. Caroline Stone observou, preocupada, o sobrinho preferido aproximar-se para beijar-lhe o rosto. Ele sorriu, piscando os olhos cinzentos.


  • Se a senhora diz que tio Horace está zangado, é porque ele deve estar a ponto de explodir de raiva!

  • Eu o aconselho a agir com prudência, Matthew.

  • Não se preocupe, tia Caroline, eu me entenderei com ele. Acho que o melhor a fazer é enfrentar logo a fera.

A srta. Stone observou-o afastar-se, alto, de ombros largos, vestido na última moda. Apesar de mancar um pouco, movia-se com extrema ele­gância. Aos vinte e sete anos ainda possuía cabelos negros, herdados da mãe, sem um vestígio do grisalho precoce tão comum na família. Pegan­do o bordado que deixara sobre o sofá, Caroline Stone suspirou. Horace havia tomado uma decisão séria, e não iria mudar de ideia com faci­lidade...

Matthew fez uma pausa no vestíbulo para verificar sua aparência. Seu tio, o visconde Horace Stone, era muito exigente nesse aspecto; melhor não provocá-lo à toa.

Satisfeito, olhou-se ao espelho. O fraque azul-escuro, novo, não tinha um vinco. O lenço no pescoço era elegante, sem ostentação. Ele olhou, pensativo, para o alfinete de safira que decorava o lenço. Será que tio Horace iria considerá-lo extravagante? Com certeza não; a mesada que o visconde lhe dava permitia certos luxos ocasionais.

Matthew continuou a inspeção: colete simples de cetim azul-claro; bo­tas brilhantes, mas não a ponto de sugerir o caro hábito de limpá-las com champanhe. Apesar de possuir grande fortuna, Horace Stone estava longe de ser perdulário.

Enquanto cruzava o vasto hall em estilo Tudor, Matthew percebeu que conduzir o cabriole por cento e cinquenta quilómetros, através da estra­da movimentada que ligava Londres a Bath, o havia fatigado mais do que imaginara. O cansaço sempre fazia o ferimento adquirido na Penín­sula doer demais. Tentaria, contudo, não mancar muito diante do vis­conde para não demonstrar fraqueza.

Depois de bater à porta da biblioteca, ele entrou no aposento e aproximou-se com passos firmes do homem grisalho atrás da grande mesa de mogno.



  • Como vai, titio? — perguntou, alegre.

  • Nada bem, após as notícias que recebi — resmungou lorde Stone.
    — Não fique de pé à minha frente, Walsingham.

Matthew ficou contente por poder sentar-se, mas o fato de ser chama­do pelo sobrenome o preocupou.

  • Vim o mais rápido que pude, titio, depois de receber sua carta.

  • Cansando aqueles dois puros-sangues, dos quais tanto se orgulha?

  • Não, senhor, eu os deixei com Hanson, para que ele os trouxesse sem pressa.

  • Era melhor nem ter mandado que os trouxesse, já que não vai fi­car aqui por muito tempo. Já estou cansado dos seus maus modos, Wal­singham! Empurrar sua chère amie, só de lingeríe, pela St. James's Street, em um carrinho de mão... É vergonhoso!

Matthew precisou reprimir um sorriso ao lembrar-se de Lulu gritando de alegria no meio da rua.

  • Foi uma corrida, tio Horace. Por causa de uma aposta.

  • Foi o que me disseram. Uma aposta de duzentos guinéus!

  • Mas, titio, eu...

  • Duzentos guinéus! — o visconde repetiu, irado. — O problema é que você não dá valor ao dinheiro. Mas ainda poderá aprender a dar, vivendo com o pouco que seu pai lhe deixou. Meu advogado virá amanhã, para alterar meu testamento em favor de seu primo Archibald.

Matthew ficou consternado. Perder a mesada agora, e Stone Gables no futuro, só por causa de uma brincadeira, de uma simples aposta? Mas quando lorde Stone enfiava uma coisa na cabeça, qualquer tentativa de dissuadi-lo apenas reforçava a decisão.

Dando a conversa por encerrada, o visconde ordenou:

— Agora saia e diga a Caroline para mandar servir meu jantar aqui, em uma bandeja.

Matthew apoiou as duas mãos sobre a mesa para levantar-se. Sua per­na doía. A caminhada através da grande biblioteca parecia interminável. Ao fechar a porta atrás de si ele percebeu a presença do mordomo. En­saiou um sorriso.

— Meu tio deseja jantar na biblioteca, Bristow.

Matthew retornou à sala de estar. Caroline Stone havia subido para se aprontar para o jantar, e ele precisou esperar até encontrá-la, à mesa de refeições, para expor o problema.

— E claro que não morrerei de fome — disse, sombrio, servindo-se de outro prato de vitela refogada com ervilhas. — Os títulos que meu pai deixou rendem cerca de quatrocentos e cinquenta ao ano. Mas eu precisarei escolher entre viver à margem da sociedade ou abdicar de vez do convívio social.

— Você poderia também exercer alguma profissão respeitável — su­geriu a srta. Stone.

O rosto de Matthew se iluminou.


  • Interesso-me por arquitetura, apesar de sempre tê-la considerado um simples hobby. O problema é que eu demoraria algum tempo até fazer nome... — Ele suspirou. — As palavras de tio Horace foram um golpe e tanto para mim, titia.

  • Seu tio recebeu a notícia da aposta na hora errada, quando estava de mau humor. Se fosse em outra oportunidade, acredito que ele iria até se divertir.

  • O mais irónico foi que eu já havia desistido dessas brincadeiras.
    Afinal, não pretendia passar o resto da vida na farra!

Caroline Stone acariciou-lhe o braço.

— Eu sempre achei que seu entusiasmo exacerbado pelas diversões da cidade era uma tentativa de esquecer os horrores da guerra.

Matthew beijou a mão da tia. Deixara muitos amigos mortos na Pe­nínsula, e ele próprio ficara acamado por quase um ano, sem saber se voltaria a andar algum dia. Sim, os horrores da guerra...


  • Querida tia Caroline, a senhora tem,razão. No entanto, já é hora de eu me tornar um cidadão produtivo.

  • Esta me parece uma ideia sensata — disse ela, rindo. — A não ser que você encontre uma rica herdeira para desposar.

  • Excelente sugestão! — exclamou Matthew, subitamente interessado. — Já que demorarei um pouco para me firmar como arquiteto, pos­so muito bem procurar por uma noiva rica nesse meio tempo.

  • Por que não? Bath era reconhecidamente um território fértil para caça-dotes, na época da minha juventude.

Caroline Stone estava brincando, mas quanto mais Matthew pensava, mais se sentia atraído pela sugestão.

  • Sim... Bath fica aqui perto, de forma que não precisarei fazer uma longa viagem...

  • Querido, você levou a ideia a sério?

  • Não se preocupe, titia. Não pretendo iludir nenhuma rica herdeira, se por acaso encontrar alguma. Serei sincero com ela.

"Ou quase", pensou. Afinal, se fosse totalmente sincero, sequer che­garia perto de uma herdeira.

— Será que eu poderia me hospedar na casa de tio Horace, em Bath?

— indagou ele, a seguir.


  • Suponho que sim. Seu tio nunca vai até lá, diz que a água arruina a digestão dele.

  • A senhora poderia ser boazinha e escrever uma carta para a caseira —pediu Matthew. — Ainda é a mesma mulher que cuida da casa?

  • Sim. E ela nunca deixa de perguntar por você... Oh, está bem Mat­thew, irei ajudá-lo com esse plano sórdido.

  • Obrigado, tia Caroline! Acho que não há nada melhor para provar a tio Horace meu respeito pelo dinheiro do que aparecer aqui com uma noiva abastada.

  • É possível. E para ajudá-lo nesse início, vou lhe dar vinte libras.

  • Agradeço a oferta, mas posso me aguentar até o final do mês, quando receberei o dinheiro que meus amigos ficaram me devendo. E essa é a parte mais irónica da história... — acrescentou ele, com um sorriso pesaroso. — Tio Horace ficou furioso por causa da tal aposta, mas eu a ganhei!


CAPÍTULO III

Na sua primeira manhã em Bath, Jéssica pediu a Na-than que saísse para conseguir assinaturas para a Pump Room e as Assembly Rooms, tanto a Upper quanto a Lower. Queria estar livre do irmão quando fosse alugar a casa, senão ele esco­lheria uma mal localizada só por causa do aluguel mais baixo.

Ela obteve com o proprietário da hospedaria o nome e o endereço de um corretor respeitável e partiu com a srta. Tibbet para a Old Bond Street. A pedra pálida, cor de âmbar, que estava presente em todas as casas da cidade, parecia captar e refletir a luz do sol. Jéssiea segurou com força o braço de sua acompanhante e puxou-a, pois tia Tibby lançava olhares ansiosos em direção à Pump Room.

— A senhora poderá explorar o local até se fartar, assim que estiver­mos instaladas — prometeu ela.

Jéssica achou difícil resistir ao apelo das vitrinas, mas continuou, de­terminada, seu caminho. O corretor explicou que havia várias residên­cias para alugar em todas as áreas da cidade.


  • A parte superior é considerada mais salubre — explicou o homem—, e por isso também é mais cara.

  • Preço não é problema — disse Jéssica, com um gesto de menos­prezo. — No entanto, minha tia deseja ficar perto das fontes, de forma que ficaremos na parte baixa da cidade.

Ela sabia que qualquer informação que desse seria motivo de comen­tários, e decidiu que uma tia era uma companhia mais adequada que uma ex-governanta e tutora, que acabara sendo "adotada" pela família.

— Deixe-me ver o que posso fazer pela senhorita... — O corretor correu o dedo por uma lista. — Há um local simpático em Pulteney Street. Não fica muito perto das fontes, mas o caminho é plano. Depois há a North Parade, que é mais próxima, mas a casa é a última da rua, ao lado do rio. Há várias pessoas que temem a névoa do rio, por isso o aluguel é um pouco mais barato.

Jéssica bateu as mãos, entusiasmada.


  • Ao lado do rio? Que encantador! Eu adoro desenhar rios. Vamos ficar com essa.

Acho que vai gostar muito, srta. Franklin. Das janelas de cima pode-se ver a ponte Pulteney. Se quiser, posso contratar alguns criados.

— Obrigada, mas trarei minha própria criadagem — disse ela, com ar de grandeza. — Eles chegarão amanhã da propriedade de meu irmão, no norte.

Jéssica esperava que o corretor imaginasse uma enorme carruagem tra­zendo no mínimo doze serviçais, e não Hayes e a sra. Ancaster, a cozi­nheira, descendo da diligência.

— Como Langdale fica meio isolada, temo estarmos fora de moda.


Talvez o senhor pudesse nos indicar algumas lojas elegantes — pediu ela, em seguida.

Armadas com informações sobre as lojas, e também com as chaves da casa em North Parade, Jéssica e a srta. Tibbet foram buscar Nathan no White Hart antes de irem inspecionar a residência.

Quando cruzavam a Pierrepont Street, em direção a North Parade, um pequeno cabriole passou por eles. Azul-escuro, o veículo era puxado por dois garanhões que arrancaram um assdbio de admiração de Nathan. Com a atenção atraída pelo barulho, o condutor sorriu e fez um gesto de cum­primento. Nathan virou-se para acompanhar o cabriole com o olhar. Se­gurando o braço do irmão, Jéssica também olhou para trás, descobrindo que o condutor fazia a mesma coisa, sorrindo. Ela corou, confusa, divi­dida entre o desejo de já ter comprado um chapéu novo e a esperança de que o cavalheiro não a considerasse atrevida.


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