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livres. O poema épico tailandês Khun Chang Khun Paen refere-se a soldados que usavam tatuagens como proteção para enfrentar as batalhas. No festival anual de Nakorn Pathom, os tatuados entram em transe, se contorcem e tremem, seus corpos e espíritos são tomados pelo animal ou pelos outros poderes que as tatuagens representam. Agora esse evento anual se transformou num grande atrativo turístico, coisa que não agrada a Sulak Sivaraksa. Ele foi citado exigindo reformas ao Conselho Sangha, o corpo governamental nacional dos monges, que ele disse que jamais devia ter permitido que a situação chegasse a esse ponto.
- O budismo transformou-se em uma forma apenas — declarou ele. - O budismo para os tailandeses hoje em dia tornou-se uma espécie de superstição.
Mas será que ele estava analisando de modo realista a história do budismo no próprio país?
Depois de passar a vez de um jovem, pedi para falar com ele. Meio desconfiado, ele concordou. Disse que vai lá todos os dias, na hora do almoço. Como pagamento para o monge ofereceu dois maços de cigarros, algumas flores e uma pequena doação para o templo - equivalente a mais ou menos dois dólares.
- Isso me dá poder, tenho certeza - disse ele, movendo os olhos muito rápido de um lado para outro, como se estivesse procurando alguém, ou procurando alguém que o estivesse procurando. - Eu sei que estarei protegido contra o perigo. Nenhum mal me atingirá. Sofrerei menos.
Dado o sofrimento que acabava de ver o rapaz suportar, achei que ele já tinha feito valer o seu dinheiro.
A criatividade com que o povo tailandês interpretou o budismo tem paralelo no mundo artístico tailandês. Uma comunidade artística contemporânea vibrante está inventando novas formas para expressar sua sensibilidade budista em uma variedade de veículos misturados. Os exemplos são infinitos. Um deles ocorre no teatro ao ar livre em Bangcoc da mundialmente conhecida diretora e coreógrafa Patravadi Mejudhon em que ela produzia uma peça de noventa minutos com nove atos, dança, música, drama, mora-
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lidade, entrelaçando as tradições de dança tailandesas com as japonesas, intensa percussão e música neoclássica com a filosofia budista. É um teatro altamente simbólico. O palco escuro, por exemplo, que reflete a batalha da humanidade para superar o desejo e o medo.
- O budismo não é apenas uma cerimônia - ela me disse quando nos encontramos para beber e conversar. - O budismo é liberdade... liberdade de pensamento. Mas usamos essa liberdade com disciplina.
Em Chiang Mai essa liberdade de expressão ficou descontrolada, como fui descobrir ao chegar a esse eixo do norte da Tailândia, lugar muito procurado. Prasong tinha escolhido três artistas que ele achou que podiam representar o espectro. O primeiro era um artista famoso chamado Kamin Lertchaiprasert, que fazia sucesso comercialmente e junto à crítica. Tinha 40 anos de idade e já trabalhou por todo o mundo. Seu estúdio num bairro residencial da cidade era a Grande Estação Central dos artistas modernos da Tailândia; uma espécie de mentor para a próxima geração, ele cede seu espaço para o trabalho deles. Estudioso de meditação vipassana — cujo mestre era Goenka -, tirou um ano de férias em 1990 para praticar meditação seriamente.
- Creio que o processo de criar arte nos dá capacidade para entender nossa natureza, assim como o processo de praticar o Dhamma budista - disse ele em meio ao caos de um pequeno quarto que reserva só para si.
Estávamos cercados por pequenos budas de papel mâché que eram a continuação de uma série que ele chamava de Sabedoria-Problema, que havia apresentado de 1993 a 1995. Mas aparentemente ele não conseguia parar. A Sabedoria-Problema em excursão era uma grande instalação que consistia em 366 esculturas feitas com papel mâché. Lertchaiprasert esculpia cada objeto como reação a um problema que afetava a sociedade tailandesa contemporânea. Todos os dias, durante um ano, ele selecionou um artigo em um jornal tailandês, formou uma polpa com o papel e esculpiu um pequeno objeto que respondia ao problema mencionado. No ano seguinte analisou de novo sistematicamente cada objeto e meditou sobre uma solução. A solução (ou sabedoria) era escrita
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