Silvia Maria de Araújo · Maria Aparecida Bridi · Benilde Lenzi Motim



Yüklə 2,32 Mb.
səhifə34/42
tarix06.09.2018
ölçüsü2,32 Mb.
#77870
1   ...   30   31   32   33   34   35   36   37   ...   42

327

Também à juventude se atribui a condição de ser precursora da contracultura, fenômeno contemporâneo que congrega manifestações de grupos que questionam e rejeitam valores e práticas de uma cultura dominante. Exemplo marcante de mobilização nesse sentido foram as manifestações estudantis de maio de 1968, na França, que deflagraram uma série de protestos e revoltas. Surgido em reação à política educacional do governo francês, o movimento acabou questionando todas as demais esferas da ordem instituída na época.

LEGENDA: Estudantes entoam cantos de protesto durante manifestação em Paris, França, em maio de 1968.

FONTE: Reg Lancaster/Daily Express/Hulton Archive/Getty Images



De fato, o Maio francês significará uma crítica radical à fusão do indivíduo na totalidade, quer seja esta entendida como partido ou Estado. [...] De onde a luta contra o "individualismo pequeno-burguês", a negação dos direitos individuais e a ética da abnegação e do sacrifício.

Em 1968 - essa "segunda Revolução Francesa" - constitui-se um princípio de realidade outro, diferente do industrial-produtivista, no qual o poder [...] do capital impõe formas determinadas de pensar e agir. Em 1968, o próprio movimento de jovens operários e estudantes praticou a espontaneidade consciente e criadora. Não se considerou o sistema de partidos ou grupos de pressão a qualquer nível; não se participou nem do sistema nem de seus métodos. Desde o início o movimento não tem dirigentes, nem hierarquia, nem disciplina partidária ou outra; ele contesta os profissionais da contestação, viola as regras do jogo que as oposições dominam. [...] Com a crítica ao mundo burocratizado e desencantado, colocou como lema a verdade triunfante do desejo.

MATOS, Olgária C. F. Paris 1968: as barricadas do desejo. São Paulo: Brasiliense, 1981. p. 12-13.

Apesar de sua repercussão - que chegou ao Brasil, influenciando jovens que contestavam o regime militar então vigente -, o movimento de maio de 1968 foi efêmero, sufocado pela repressão aos protestos. Movimentos contraculturais posteriores trouxeram novos métodos para garantir sua longevidade, criando uma identidade forte no campo da expressão e, de modo geral, evitando partir para um enfrentamento físico e direto às instituições. Exemplos disso são os movimentos punk e hip-hop, formados a partir da segunda metade dos anos 1970.

O movimento punk desenvolveu-se nos Estados Unidos e na Inglaterra, contrapondo-se não só a um tipo de cultura dominante, mas também à ideia de não violência e ao otimismo hippie, outro movimento de contracultura, surgido alguns anos antes. Os jovens punks acreditavam que o sistema estava, em geral, errado, e era preciso não depender dele. O enfrentamento a tudo o que era visto como estabelecido aparecia também na imagem, com cortes de cabelo como o moicano, tatuagens e piercings. O mote "faça você mesmo" se expressava na música, com letras sucintas e impactantes acompanhadas de melodia e harmonia extremamente simples, que poderiam ser tocadas e cantadas por qualquer um.

No Brasil, esse movimento chegou por meio de jovens da periferia das grandes cidades, sobretudo São Paulo e Brasília, tornando-se também uma forma de expressão e luta contra a ditadura militar, que ainda vigorava no país na década de 1970 e na primeira metade da década de 1980.

328

LEGENDA: A banda punk Inocentes, durante o festival Começo do Fim do Mundo, realizado em 1982 em São Paulo (SP).

FONTE: Cícero de O. Neto/Folhapress

LEGENDA: Jovens punks participam de parada em memória de Sid Vicious (1957-1979), baixista do grupo Sex Pistols, em Londres, capital do Reino Unido, em 1979.

FONTE: Janette Beckman/Getty Images

Enquanto ao punk aderiam principalmente jovens brancos de classe média e média baixa, formava-se na mesma época, entre jovens afrodescendentes nos Estados Unidos, o hip-hop. O movimento hip-hop fundava-se no rap como expressão musical, no break como dança e no grafite como expressão visual. Sentindo-se excluídos da cidade, discriminados e pouco representados, os membros desse movimento tinham, por meio dessas expressões artísticas, o objetivo de se apropriar da cidade: o rap pode ser feito em qualquer espaço e frequentemente era feito nas ruas; o break é uma dança de rua; o grafite é uma marca de existência e visibilidade em meio a uma cidade que marginaliza e exclui os jovens negros e de baixa renda.

No Brasil, o hip-hop ganhou força nos anos 1980, sobretudo na cidade de São Paulo. Enquanto nos Estados Unidos o rap foi em grande parte incorporado pela indústria cultural a partir do final dos anos 1990, até hoje o rap nacional mantém-se associado às letras de protesto e à denúncia de desigualdades sociais, tendo dificuldades de inserção nos meios de comunicação de massa.

O ato de reagir às condições dadas faz da juventude uma potencial pioneira de qualquer mudança social.

LEGENDA: Jovem faz grafite no viaduto Santa Tereza, em Belo Horizonte (MG). Foto de 2012.

FONTE: Casa Fora do Eixo Minas/Creative Commons

LEGENDA: Reunião do grupo de street dance Sob Humanos em Brasília (DF). Foto de 2011.

FONTE: Daniel Ferreira/CB/D.A Press



329

Pausa para refletir

O pesquisador de estudos culturais Micael Herschmann (1964-) vê no funk do Rio de Janeiro a explicitação de uma divisão social e da opressão histórica e cotidiana:

[...] não se pretende afirmar aqui que os funkeiros não sejam violentos, mas repensar de que forma suas falas e atitudes se diferenciam daquelas produzidas por outros jovens aparentemente mais "integrados na estrutura social", ao ponto de a opinião pública carioca inseri-los na galeria dos principais "inimigos públicos" da cidade.

[...] os sentidos veiculados nos meios de comunicação de massa têm não só reforçado e legitimado um quadro autoritário marcado pela exclusão social, mas também delineado novas possibilidades de identificações e de construção de subjetividades, corroborando para a instauração de novas formas de solidariedade social e novas relações de poder. [...]



Ao invés de reforçarem a imagem de um "país libertário/malandro", as representações promovidas pelos funkeiros sugerem um Brasil hierarquizado e autoritário. Revelam assim os conflitos diários enfrentados pelas camadas menos privilegiadas da população, como: a repressão e os massacres policiais, a dura realidade dos morros, favelas e subúrbios, a precariedade e ineficiência dos meios de transporte coletivo, o racismo e assim por diante. [...] É como se, de certa forma, a antiga imagem que tínhamos do Brasil cedesse espaço, no imaginário social, a um novo retrato mais fragmentário e plural da "nação".

HERSCHMANN, Micael. As imagens das galeras funk na imprensa. In: HERSCHMANN, Micael. et al. (Org.). Linguagens da violência. Rio de Janeiro: Rocco, 2000. p. 163-165.



1. Para o autor, qual é a consequência positiva da imagem do funk construída pelos meios de comunicação? Justifique.

2. Identifique de que forma integrantes e simpatizantes de movimentos como o do funk estão sujeitos à violência simbólica, conceito que vimos no Capítulo 10.

O conceito de geração

A juventude é parte da sociedade, que a produz e é por ela produzida. Por isso, os seus movimentos devem ser compreendidos levando-se em conta o contexto em que se realizam e suas múltiplas dimensões - política, social, econômica e cultural. Ao tomar por objeto de estudo a juventude, a Sociologia considera a questão geracional e o contexto social - os acontecimentos, os valores e as condições presentes em um espaço e um tempo determinados - de uma dada cultura.

Para um grupo se constituir como geração, não é suficiente ser de uma mesma época. O que define uma unidade entre os que nasceram em um mesmo período é a possibilidade de presenciar os mesmos acontecimentos, de vivenciar experiências semelhantes e de processar tudo isso de forma similar, porque vivem ou viveram o mesmo contexto. No entanto, segundo o pensamento do cientista social português José Machado Pais (1953-), há maneiras diferentes de olhar a juventude fazendo uso da Sociologia (ver boxe na próxima página).

Para a socióloga Marialice Foracchi (1929-1972), o conceito de geração tem uma dimensão relacional, pois se refere a grupos sociais em mútua aprendizagem, que repassam e recebem costumes e hábitos, mas também compartilham experiências. Mesmo assim, é possível falar em "conflitos de gerações", fenômeno presente nos comportamentos que se diferenciam, nas atitudes de oposição e recusa, na afirmação de estilos de vida que se redefinem pela convivência entre jovens e adultos, nos planos individual, institucional e social.



330

Boxe complementar:



A juventude do ponto de vista das correntes geracional e classista

A corrente geracional adota a noção de juventude referida a uma fase de vida, e enfatiza o seu aspecto unitário. Para esta corrente, em qualquer sociedade há várias culturas, que se desenvolvem no sistema dominante de valores. Ela discute a continuidade e descontinuidade dos valores intergeracionais, bem como as relações entre as gerações, tendo por central, na análise da juventude, a problemática da reprodução social.

Para a corrente classista, a reprodução social é fundamentalmente vista em termos da reprodução das classes sociais. Seus trabalhos são críticos em relação ao conceito de juventude como uma "fase de vida" e entendem-na por uma categoria social que, em última instância, acabaria dominada por "relações de classe". Mesmo as culturas juvenis seriam "soluções de classe" a problemas compartilhados por jovens de determinada classe, e os estilos mais exóticos de alguns seriam uma "forma de resistência" a contradições de classe. O "cabelo à punk", os "lábios pintados de roxo", os "medalhões" ou os "remendos nas calças" seriam, nesta ordem de ideias, signos de "cultura juvenil" utilizados para desafiar a ideologia dominante. As culturas juvenis teriam sempre um significado "político". As distinções simbólicas entre os jovens (de vestuário, hábitos linguísticos, práticas de consumo) são vistas como diferenças entre as classes e raramente como diferenças dentro das classes.

Adaptado de: PAIS, José Machado. A construção sociológica da juventude - alguns contributos. Análise Social, v. XXV, 1990. p. 157-159. Disponível em: www.ics.ul.pt/rdonweb-docs/Jos%C3%A9%20Machado%20Pais%20-%20Publica%C3%A7%C3%B5es%201990,%20n%C2%BA2.pdf. Acesso em: 20 jul. 2015.

FONTE: Filipe Rocha/Arquivo da editora

Fim do complemento.



Jovens e identidade nos grupos sociais

Entre alegrias, conflitos e angústias, o jovem na sociedade ocidental vive um período no qual se questiona e busca sua própria identidade, construída mediante relações familiares ou com integrantes de outros segmentos sociais, como colegas de escola, de trabalho e de lazer.

Parte importante da identidade é construída na interação do indivíduo com o meio social, ao definir traços comuns de conduta que implicam a ideia de pertencimento a um coletivo. Numa sociedade globalizada como a atual, a interação entre realidades locais e global marca os processos identitários.

A identidade da juventude se relaciona com cada época e contexto sociocultural e pode ser percebida pelo comportamento, pela forma de se vestir ou pelo consumo musical, entre muitos outros aspectos.



331

As representações sociais da juventude ora trazem atributos juvenis positivos, relacionados à mudança social, ora acentuam uma dimensão negativa, acarretada pelos problemas de emprego e pela falta de perspectivas. A socióloga brasileira Helena Abramo exemplifica: se, nos anos 1960, a juventude era um "problema" por protagonizar uma crise de valores e um conflito de gerações situado principalmente no terreno ético e cultural, a partir da década de 1970 os "problemas" do emprego e da entrada do jovem na vida produtiva praticamente transformaram a juventude em categoria econômica. Nesse sentido, a juventude atual vê-se incentivada, especialmente pela publicidade, ao individualismo e ao consumismo - comportamento caracterizado pelo consumo em larga escala de bens materiais e simbólicos, ainda que estes não apresentem utilidade prática.

LEGENDA: Três momentos da história da China: ao fundo, uma das edificações da Cidade Proibida, sede do poder imperial chinês até 1912; no muro, o retrato de Mao Tsé-tung (1893-1976), líder do movimento que implantou o socialismo no país em 1949; em primeiro plano, jovem com penteado e trajes da moda de influência ocidental contemporânea. Foto de 2011.

FONTE: Louis Quail/In Pictures/Corbis/Latinstock

LEGENDA: Jovem observa vitrine em shopping center no Rio de Janeiro (RJ), em 2015. Como a juventude também se tornou categoria econômica, empresas criam estratégias de venda direcionadas a esse público.

FONTE: Ana Branco/Agência O Globo

Entre 2013 e 2014, houve em grandes cidades brasileiras um fenômeno que ficou conhecido como "rolezinho". Jovens, em geral moradores das periferias, organizavam pelas redes sociais grandes encontros em shopping centers para passear, namorar, cantar, entre outras coisas. Isso gerou uma reação tanto de frequentadores e consumidores quanto dos gerentes desses estabelecimentos, que buscaram impedir esses jovens de frequentarem, em grupos, tais espaços. Desse contexto surgiram debates não apenas sobre os próprios rolezinhos, como também sobre os motivos para a reação a eles.

Um elemento central em muitas das análises é que a tensão entre organizadores e frequentadores dos rolezinhos, de um lado, e consumidores e comerciantes dos shopping centers, de outro, decorreria da segregação social presente na sociedade brasileira. Fenômenos como o do rolezinho estão diretamente ligados ao estímulo ao consumo promovido pelos criadores desses centros de consumo, que acabam se tornando também espaços de lazer com usos não previstos por seus criadores.



332

Veja a seguir uma interpretação sociológica para tais fenômenos, alinhada com a análise do sociólogo polonês Zygmunt Bauman (1925-) de que a satisfação dos consumidores é a maior ameaça para a sociedade de consumo:



Rolezinhos: marcas, consumo e segregação no Brasil

Existem diversos outros exemplos desse tipo de fenômeno que ocorre nas periferias dos países desenvolvidos ou em desenvolvimento. Ainda que manifestações sejam muito diversas, respondendo a contextos plurais, é possível pensar para além da esfera local e nacional. Em comum, encontra-se o fato de que grupos das camadas menos privilegiadas se apropriam dos símbolos de poder e riqueza do capitalismo global. Destaca-se igualmente uma hegemonia masculina na presença nos rituais públicos. E as marcas são símbolos dessa desigualdade. [...] Esse fenômeno estrutural das periferias globais, nuançado por contextos locais e nacionais, provoca angústia das elites e desespero do setor de marketing das grandes corporações, que hoje precisam responder a um problema que eles mesmos criaram: a produção do sonho e do amor às marcas. Como disse publicamente um CEO [gestor de uma marca famosa]: "encontramos o nosso inimigo, somos nós mesmos". Ou como anunciou um dos maiores produtores de pirataria, então preso nos Estados Unidos: "Vocês (as marcas) criaram um sonho, agora aguentem". Fica evidente aqui o papel subversivo desses jovens ao desafiarem a racionalidade do marketing e atuarem em um campo não previsto pelos gestores das grandes marcas. O marketing do amor, assim, revela algumas contradições da modernidade: ele é dirigido às elites, mas acaba atingindo as populações mais desprovidas de capitais, as quais, ao se apropriarem do símbolo dos outros, reinventam a sua própria condição de pobreza, ressignificando a carência em abundância.

PINHEIRO-MACHADO, Rosana; SALCO, Lucia Muri. Rolezinhos: marcas, consumo e segregação no Brasil. Revista Estudos Culturais, n. 1, 2015. Disponível em: www.each.usp.br/revistaec/?q=revista/1/rolezinhos-marcas-consumo-e-segrega%C3%A7%C3%A3o-no-brasil. Acesso em: 20 dez. 2015.

LEGENDA: MC Gui durante uma apresentação em São Paulo (SP), em 2016. Popular entre os frequentadores dos rolezinhos, o funk ostentação ganhou projeção nacional com a repercussão do conflito entre comerciantes e os jovens consumidores.

FONTE: Darcio Nunciatelli/Brazil Photo Press/Folhapress

Boxe complementar:

Intelectuais leem o mundo social

As reflexões do sociólogo inglês Anthony Giddens (1938-) enfocam as transformações ocorridas na modernidade. No trecho a seguir, extraído do livro Modernidade e identidade, ele nos faz pensar sobre como, por meio da aparência, é construída uma identidade.



Certos tipos de aparência e postura corporal simplesmente se tornam particularmente importantes com o advento da modernidade. Em muitas situações em culturas pré-modernas, a aparência era, em geral, padronizada em termos de critérios tradicionais. Modos de adorno facial ou de vestir, por exemplo, sempre foram até certo ponto meios de individualização; mas a medida que isso era possível ou desejável era em geral muito limitada. A aparência denotava principalmente a identidade social, mais que a identidade pessoal. A roupa e a identidade social não estão hoje inteiramente dissociadas, e a primeira continua sendo um instrumento de sinalização do gênero, da posição de classe e do status ocupacional. Modos de vestir são influenciados por pressões de grupo, propaganda, recursos socioeconômicos e outros fatores que muitas vezes promovem a padronização mais que a diferença individual. Mas o fato de que tenhamos uma palavra especial, o "uniforme", para referir estilos de vestir que são padronizados em relação a determinadas posições sociais indica que em outras situações a escolha da roupa é relativamente livre. A aparência para dizê-lo claramente [...] vira um elemento central do projeto reflexivo do eu.

GIDDENS, Anthony. Modernidade e identidade. Rio de Janeiro: Jorge Zahar, 2002. p. 95-96.

· O autor insinua em sua análise um complexo de ações e comportamento social muito próprio da juventude de hoje. Complete esse pensamento com exemplos concretos, contrastando identidade pessoal e identidade social.

Fim do complemento.



333

O jovem no Brasil: movimentos e discriminação

LEGENDA: A chamada "Passeata dos Cem Mil", realizada em junho de 1968, no Rio de Janeiro (RJ), sob a liderança de estudantes, contou com a presença de personalidades públicas, intelectuais e artistas. A manifestação se posicionava contra as ações do governo militar e a repressão da época.

FONTE: Arquivo/Agência O Globo

Os movimentos estudantis de maio de 1968, na França, a necessidade de resistir à ditadura militar e a atividade de outros movimentos sociais na América Latina inspiraram setores da juventude brasileira - principalmente nos grandes centros urbanos - a se engajar politicamente. Muitos atuaram em manifestações e greves e, em alguns casos, aderiram à luta armada.

A ideia de "juventude" nessa época, reforçada pela historiografia e pelos meios de comunicação de massa, se ligava aos jovens da classe média. Os jovens que participavam do movimento operário, por exemplo, não eram reconhecidos como uma categoria específica em termos geracionais, mas incluídos na categoria "operários". Assim narram alguns historiadores:

A participação dos jovens universitários da classe média na década de 1960 foi fundamental. Fora dos teatros, onde ocorriam os festivais, a mobilização estudantil era intensa. Assim, ao lado dos "rebeldes sem causa" dos anos 1950, pintaram os "rebeldes com causas", ansiosos por participar da política, por fazer uma revolução no Brasil, em mexer com as velhas estruturas que sustentavam (e sustentam) os grupos que controlam o Poder.

MACEDO, José Rivair; OLIVEIRA, Mariley W. Uma história em construção. São Paulo: Editora do Brasil, 1996. p. 175.

Com a mudança da conjuntura política na transição dos anos 1960 para os 1970, época marcada pela intensa e violenta repressão, as formas de luta se modificaram e as grandes mobilizações passaram a ser menos frequentes. Somente no período democrático, no início dos anos 1990, os jovens voltaram a ser identificados como principais protagonistas de uma grande mobilização: a dos estudantes apelidados "caras-pintadas", incentivados pelos meios de comunicação de massa e pela União Nacional dos Estudantes (UNE) a se mobilizar pelo impeachment do presidente do país, Fernando Collor de Mello. A UNE, fundada oficialmente em 1938, representa a organização dos estudantes universitários do Brasil e participou ativamente de diversos movimentos pela democracia e por direitos sociais.

334

Outros segmentos jovens se mobilizaram, e ainda o fazem, ao longo da história do Brasil. Nas periferias das cidades, a juventude se expressa de diversas formas: ocupa novos espaços, difunde suas manifestações a outros setores da sociedade e expressa valores sociais e atitudes de não adesão à cultura dominante. Alguns exemplos dessas ações são os bailes funk e os de hip-hop nas periferias do Rio de Janeiro e de São Paulo e os de tecnobrega em Belém, cada vez mais presentes em outros espaços.

No entanto, os jovens de menor renda, especialmente os que vivem nas periferias das grandes cidades e são negros ou pardos, costumam ser vítimas da estigmatização. Ou seja, a violência e as adversidades presentes nos meios em que esses jovens vivem acabam sendo incorporadas às representações que a sociedade constrói a respeito deles e de suas formas de sociabilidade e lazer, como exposto nesta análise:

LEGENDA: Ato público dos caras-pintadas em Porto Alegre (RS) em agosto de 1992, pedindo o impeachment do presidente Collor. A mobilização da juventude teve grande repercussão pela pressão social que exerceu.

FONTE: Carlos Rodrigues/Agência Estado

A violência caminha pelas ruas, avenidas, residências e pelos becos e bairros do Rio; não é assunto exclusivo dos pobres. No entanto, destaca-se a manipulação enviesada da representação da violência como se esta fosse terreno exclusivo dos favelados. As ações dos grupos proscritos tendem a ser unilateralizadas, estigmatizadas, estereotipadas [...]. Nessa lógica, falar de jovens funkeiros é falar de violência, de perigo, de assaltos, de arrastão, de morte.

ARCE, José. Vida de barro duro: cultura popular e grafite. Rio de Janeiro: Ed. da UFRJ, 1999. p. 96.

Essa imagem caricatural se difunde, entre outras razões, porque amplos segmentos da população jovem vivem em condições que limitam suas expectativas de vida. As estatísticas revelam o grande volume de casos de mortes violentas e prematuras, antes concentradas nas periferias das grandes cidades, mas cada vez mais presentes em cidades pequenas e médias. Elas se relacionam a problemas que afetam diretamente os jovens: falta de oportunidades para permanecer na escola, dificuldade em obter emprego no mercado formal, entre outros. Segundo o Mapa da Violência de 2015, organizado pelo sociólogo Julio Jacobo Waiselfisz (1941-), a cada grupo de mil jovens brasileiros, 47,6 foram mortos por armas de fogo em 2012 - índice comparável ao de países em guerra. Chamam a atenção a alta taxa de homicídio de jovens negros e de suicídio entre jovens indígenas.

LEGENDA: Charge do artista Junião.

FONTE: Junião/Acervo do artista

335

Alguns dos graves problemas que afetam parcela significativa dos jovens brasileiros são: o aliciamento e a coerção para o trabalho infantil, inclusive em atividades insalubres e em redes organizadas de prostituição e tráfico de drogas; a evasão escolar; a violência doméstica; a falta de conhecimento e orientação acerca do corpo e da sexualidade, que resulta em gravidez precoce e contaminação por doenças sexualmente transmissíveis; a assistência precária à saúde; as poucas oportunidades de emprego e de formação adequadas; o contato com as drogas; e o abuso de autoridade e da força por parte de policiais, que muitas vezes resultam em mortes disfarçadas nos registros oficiais como "autos de resistência".

A elasticidade da concepção de condição juvenil na realidade brasileira fica clara quando é possível associá-la a situações de preconceito. Essas levam a comportamentos de discriminação ou exclusão em razão da não aceitação do diferente, seja em relação à maioria, seja em relação ao padrão dominante.

No Brasil, e pelo mundo afora, existem hoje jovens que são vistos com preconceito por morarem em áreas pobres classificadas como violentas. Com diversos nomes, topografias e histórias, as periferias são, via de regra, marcadas pela presença das armas de fogo. São elas que sustentam tanto a tirania do narcotráfico quanto a truculência policial. A resposta à pergunta "onde você mora?" pode ser decisiva na trajetória de vida de um jovem. A "discriminação por endereço" restringe o acesso à educação, ao trabalho e ao lazer dos jovens que vivem nas favelas e comunidades caracterizadas pela precária presença (ou ausência) do poder público. Além disso, a vivência da condição juvenil é também diferenciada em função de desigualdades de gênero, de preconceitos e discriminações que atingem as diversas etnias. Mas isso ainda não é tudo. Os jovens de hoje também se diferenciam em termos de orientação sexual, gosto musical, pertencimentos associativos, religiosos, políticos, de galeras, de turmas, de grupos e de torcidas organizadas. Esses demarcadores de identidades podem aproximar jovens socialmente separados ou separar jovens socialmente próximos.

NOVAES, Regina. Juventude e sociedade: jogos de espelhos. Sociologia Especial Ciência & Vida, ano I, n. 2, 2007, p. 8.

A desigualdade social marca também as condições de vida da juventude.

Glossário:



Yüklə 2,32 Mb.

Dostları ilə paylaş:
1   ...   30   31   32   33   34   35   36   37   ...   42




Verilənlər bazası müəlliflik hüququ ilə müdafiə olunur ©muhaz.org 2024
rəhbərliyinə müraciət

gir | qeydiyyatdan keç
    Ana səhifə


yükləyin