A voz do passado



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O experimento de Dallcnbach com figuras, 1913"
Quinze estudantes convidados a examinar detalhadamente a figura e a responder a sessenta questões a respeito de detalhes dela.
Número de dias desde que viu a figura O 5 15 45

Número de perguntas respondidas (média) 59 57 57 57

Número de respostas erradas (média) 8 10 12 133
Há resultados, comparáveis a esses, de pesquisas noruegue-sas e norte-americanas mais recentes sobre padrões de criação de filhos, para as quais as mães foram reentrevistadas durante períodos de até seis anos. Em cada um desses estudos, a memória mostrou-se o menos fidedigna na recordação de atitudes passa-das, e o mais fidedigna no que diz respeito a questões práticas, tais como métodos de alimentação (95% de precisão após três anos). Mesmo após poucos meses, a descrição feita por uma mãe sobre o parto e os primeiros tempos do bebê será um pouco dife-rente do relato que fez inicialmente. Mas quando se aumenta o período de tempo para seis anos, as imprecisões não mostram aumento significativo. Analogamente, para um estágio mais avançado na vida, é possível agora justapor informações que uma mesma pessoa deu a historiadores orais com intervalo de até vinte anos e, embora possa haver diferenças de ênfase, o grau de consistência constitui o traço mais notável.12 Mais significativa, porém, é a conclusão de um experimento recente projetado para

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testar, após um período de quase cinqüenta anos, a memória de 392 norte-americanos, formados numa escola secundária, relativa a nomes e fisionomias de seus contemporâneos em classes de noventa ou mais alunos. Em primeiro lugar, foram dados oito minutos para que listassem, "de pura memória", sem ajuda, os nomes de todos os que pertenciam a suas classes. A seguir, foi-lhes solicitado que escolhessem, num prazo de oito segundos a cada vez, primeiro, de entre uma série de nomes, aqueles de cole-gas seus; e, depois, do mesmo modo, fotografias de seus rostos; e a seguir, também com limite de tempo, que fizessem correspon-der nomes a fotografias e fotografias a nomes. Os resultados estão na tabela a seguir.
Nomes e rostos de colegas dc classe lembrados: porcentagem'3
Anos desde Lembrança Reconheci Reconheci- Correspon- Correspona formatura livre mento de mento de dência com dencia com

nome retrato nome retrato

3 meses 52 91 90 89 94

9 meses 46 91 88 93 88

14 28 87 91 83 83

34 24 82 90 83 799

47 21 69 71 56 58
Fica evidente que, tudo considerado, a perda de memória no decorrer dos primeiros nove meses é tão grande quanto a que se observa durante os 34 anos seguintes. Apenas além desse ponto é que os testes indicam uma queda mais rápida da memória média; e mesmo isso pode ser devido mais a velocidades decrescentes na execução de testes com duração de segundos, como também ao efeito, sobre o desempenho médio, de "alterações degenerativas" entre alguns daqueles com mais de 70 anos. Igualmente impor-tante é o resultado em relação aos colegas considerados amigos: não se identifica nenhum decréscimo de precisão na lembrança, nem mesmo depois de um intervalo de mais de cinqüenta anos. Quanto mais significativo um nome ou um rosto, maior a probabilidade de

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que seja lembrado;- os outros é que são gradualmente descartados da memória por um "processo muito lento de esquecimento".
O processo da memória depende, pois não só da capaci-dade de compreensão do indivíduo mas também de seu interesse. Assim, é muito mais provável que uma lembrança seja precisa quando corresponde a um interesse e necessidade social. Demonstrou-se que os suazis analfabetos, que se poderia pensar ti-vessem memória particularmente boa por não poderem escrever nada, não são mais capazes de se lembrar de recados para os europeus do que os próprios europeus; porém, se indagados sobre a descrição exata e o preço dos bois que venderam no ano ante-rior, são capazes de relacioná-los, enquanto o europeu que com-prou os bois e anotou os preços em seus livros não consegue fazê-lo. Analogamente, em 1960, foi pedido a um galês de 80 anos que desse os nomes dos que, em 1900, ocupavam as 108 propriedades de seu distrito; e, quando suas respostas foram con-feridas com a lista eleitoral do distrito, viu-se que 106 dos nomes estavam corretos. A fidedignidade depende em parte inte-reresse intrínseco é o invalida muitos dos primei-ros experimentos com memória em laboratório - bem como al-guns fora dele. Por exemplo, Ian Hunter relata um experimento em que uma reunião da Sociedade de Psicologia de Cambridge foi secretamente gravada em fita. Quinze dias depois, pediu-se a todos os participantes que escrevessem o que se lembravam de ter acontecido. Na média, lembraram-se de uma entre cada dez das decisões tomadas e, das que se lembraram, perto da metade estava incorreta. Incluíam decisões de outras reuniões e ocasiões em outros Lugares. Porém, o experimento demonstra não tanto a não-confíabilidade normal da memória, quanto o fato de que esse grupo de estudiosos, que para seu progresso científico se baseava em material escrito, reunia-se principalmente em função dos be-nefícios sociais do debate, da interação e da auto-exibição.14
Recordar é um processo ativo. Bartlett escreveu, talvez com algum exagero: "Num mundo em que o meio ambiente está em

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constante mudança, a lembrança literal é extraordinariamente de-simportante. Dá-se com a lembrança o mesmo que com o lance num jogo de destreza. Cada vez que o fazemos ele tem suas ca-racterísticas peculiares" ~ O que tinha em mente, particularmente, era como urna história pode ser contada de novo de ma-neira diferente a públicos diversos em situações diferentes, e como a lembrança dela pode ser estimulada pelo reencontro de um velho conhecido, ou por urna nova visita ao cenário de algum acontecimento passado. Essencial, também, é que haja urna dis-posição para lembrar: esse traço da memória é especialmente im-portante para o processo de entrevista. Inversamente, a lem-brança pode ser inibida pela relutância: quer uma fuga consciente a fatos desagradáveis, quer uma repressão inconsciente. Natural-mente, é de especial interesse da psicologia fazer reviver essas lembranças reprimidas mediante a entrevista terapêutica.
Muito embora os experimentos de laboratório tenham sido bem-sucedidos em estabelecer os elementos principais do pro-cesso da memória, eles oferecem urna orientação insuficiente quanto a sua fidedignidade, porque têm lugar mim vazio social isolado das necessidades e interesses que normalmente estimu-lam o ato de lembrar e recordar. Um dos experimentos clássicos de Bartlett, por exemplo, foi pedir a um grupo de dez estudantes de Cambridge que repetissem um para o outro, em seqúência, uma lenda indígena, "A guerra dos fantasmas". A versão final não continha mais do que alguns fragmentos do original. Porém, esses estudantes não tinham nenhum interesse especial numa nar-rativa de outra cultura; para eles, tratava-se apenas de um experi-mento, cujo resultado mostrou-se mais interessante, como acon-teceu, devido exatamente à falta de precisão deles. Porém, há narrativas épicas entre os povos iletrados da África que têm pas-sado de geração para geração, oralmente, por pelo menos seis-centos anos. Essas narrativas estão sujeitas a variações quando mudam as necessidades sociais de seus narradores ou ouvintes, mas são consistentes o bastante para que se possa identificar os elementos originais mediante o estudo da estrutura das diferentes

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versões. E mais próximos de nós, lona e Peter Opie descobriram cadeias de transmissão muito notáveis em seu estudo sobre The Lore and Language of School Children. Devido à rápida rotativi-dade das crianças na escola, os elos das cadeias de transmissão são muito mais curtos do que se dá com as tradições orais adul-tas, de modo que uma cantiga escolar, em 130 anos, terá sido transmitida através de vinte gerações de crianças, talvez trezentos narradores - o que equivale a mais de quinhentos anos entre adultos. Em vista disso, é extraordinário o quanto ela sobrevive. Por exemplo, em seu London Street Games in 1916, Norman Douglas registrou 137 canções infantis; quarenta anos depois, os Opie encontraram 108 delas que ainda eram cantadas. E entre as expressões de pedido de trégua usadas pelas crianças - cuja pre-cisão é supostamente de particular importância para elas - há palavras como barley e fain que remontam à Idade Média. Elas se originaram do vocabulário adulto, mas só foram preservadas entre as crianças. "Tiddly Winks the Barber" é um poema que as crianças ainda recitam do modo como foi composto original-mente, em 1878. Os Opie apresentam muitos exemplos excelen-tes tanto de sobrevivência quanto de mudança.
Em raras ocasiões, pode-se mostrar numa história de vida comum de que modo uma frase de efeito foi preservada. Uma das primeiras entrevistas que fizemos foi com Bob Jaggard, um tra-balhador rural de Essex, nascido em 1882, que começou a traba-lliar numa fazenda em 1894, cuidando de cavalos. Logo no início da entrevista, ele disse:
Os homens ganhavam treze shillings por semana e quando come-cei a trabalhar eu ia sete dias por semana por três shillings.

Você se lembra se, naquele tempo, você achava que isso era pouco ou muito dinheiro?

Eu sabia que era pouco dinheiro. Sim, eles enganavam a gente.

Você achava, naquele tempo, que havia alguma coisa que você pudesse fazer quanto a isso para ganhar mais dinheiro?

Não, a gente não podia, era aquilo mesmo. Posso repetir para você, o velho fazendeiro para quem eu trabalhava, ele dizia que um homem leva um saco de trigo para casa todo sábado à noite, eram treze shillings...

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Mais tarde, em Rural England de Rider Haggard, descobri que ele havia visitado a aldeia de Bob Jaggard, Ardleigh, em 1901. Nessa data, o salário semanal havia subido dezoito pence. Em Ardleigh, ele visitou um certo sr. T. Smith, que arrendava 240 acres, morador ali há 51 anos. "Como é que os fazendeiros podem ir bem", perguntou ele a Ridder Haggard, "se um homem ganha o valor de uma saca de trigo; ou seja, quatorze shillings e seis pence por semana?"t~ Setenta anos depois da visita de Haggard, ainda era possível registrar a queixa do fazendeiro de Ardleigh, gravada na cabeça de Bob Jaggard.


Claro que se pode contrapor, aos exemplos de recordação, casos de esquecimento; e não há dúvida de que os indivíduos diferem entre si quanto à capacidade de lembrar. Mas voltemos ao processo normal da memória. Em que medida a memória, de modo geral, é afetada pelo avanço da idade? As crianças peque-nas, do nascimento até os 4 anos, têm muito pouca memória de longo prazo.. A isso se segue um estágio de transição até os 11 anos. Muitas crianças - mais da metade delas - conservam um tipo de memória fotográfica, e também grande capacidade para decorar de espécie muito incomum em anos posteriores, muito embora haja urna minoria de adultos que ainda mantém essa capacidade. Alguns psicólogos afirmam que o desaparecimento da memória fotográfica está ligado ao surgimento do raciocínio "lógico", embora seja difícil demonstrar que isso acontece. Contudo, depois dos 11 anos, mais ou menos, e especialmente depois dos 30, a memória imediata começa a decair progressivamente de modo que se torna cada vez mais difícil, por exemplo, reter n mente todo um conjunto de numerais complexos. Por outro lado o armazenamento total de lembranças está crescendo; é como s cada urna delas expulsasse as outras. Estudos sobre retenção d vocabulário têm demonstrado que, enquanto para os grupos mais inteligentes quase não há declínio algum, para a média do grupo testado um declínio da memória se instala por volta dos 30 ano e prossegue muito lentamente, mas não chega a ser drástico antes que se atinja uma doença terminal ou a senilidade. Assim, o

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blema do poder da memória não é muito mais grave para entre-vistas com pessoas idosas gozando de boa saúde do que com adultos mais jovens.
Com esse processo de decadência da memória em todos os adultos, a que é atingida em primeiro lugar é a memória recente. Hunter escreve: "Se, na pessoa de mais idade, houver uma debili-tação do funcionamento nervoso central, isso favorece a recorda-ção de acontecimentos mais antigos em oposição a acontecunen-tos mais recentes. Com danos progressivos de tipo neurológico geral, as atividades de recordar sofrem uma desorganização pro-gressiva. Ou seja, a recordação de acontecimentos recentes é pre-judicada primeiro". Na verdade, houve testes estatísticos de me-mória que, ainda que duvidosos sob alguns aspectos, de fato indicam que, se se estudarem associações de palavras, quase me-tade delas remontam à infância ou juventude, e somente uma proporção mínima é recente.
A etapa final do desenvolvimento da memória segue-se, em geral, à aposentadoria, ou a algum outro processo traumático, como a viuvez. Esse é o fenômeno que os psicólogos identificam como "revisão de vida": súbito surgimento de lembranças e do desejo de lembrar, e uma franqueza toda especial que acompanha uma sensação de que a vida ativa terminou, que o que era para ser feito já se completou. Assim, nessa etapa final, há uma com-pensação importante para o intervalo mais longo e para a seletivi-dade do processo da memória, com um aumento da disposição de lembrar e também, em geral, uma menor preocupação em adequar a nastativa às normas sociais de quem escuta. Desse modo, o viés proveniente da repressão e da distorção passa a ser uma dificuldade menos inibidora, tanto para o narrador como para o historiador.
Em suma, a entrevista com pessoas idosas não suscita ques-tôes metodológicas fundamentais que não se apliquem também àentrevista em geral - e conseqüentemente a toda uma série de fontes históricas familiares, tanto quanto às do historiador oral. Para essas questões é que devemos agora nos voltar. Em capítulo posterior, examinaremos de maneira mais completa as aborda157

gens da atividade de entrevistar. Aqui, nossa preocupação é o grau de influência que a entrevista, como relação social, inevitavelmente, sobre o material colhido por seu intermédio.


A minimização da variância de respostas devida a difeiças de estilo entre entrevistadores tem sido, há muito temp alvo do método social. Nos manuais de sociologia, essa pre pação muitas vezes chega a extremos que levam ao próprio casso. Ken Plummer, após catalogar todos os possíveis erros rolados, conclui que "expurgar a pesquisa de todas essas fontes de viés' significa expurgar a pesquisa da vida humana". O verdadeiro objetivo dos sociólogos da história de vida, ou do historiador oral, deve ser revelar as fontes de viés, mais do que pretende que elas possam ser eliminadas, por exemplo, com "um pesqu dor sem um rosto que exprima sentimentos".18 Porém, exatamente nesse sentido, temos muito que aprender com a experiência pesquisa por levantamento. A questão básica é como introduzir padronização suficiente, sem romper a relação da entrevista inibição da expressão pessoal. Urna das abordagens tem sido meçar com urna forma mais livre de entrevista, a fim de investigar a variedade de respostas que se pode obter e, a seguir, prosseguir com um levantamento padronizado, em que as palavras exatas e a seqüência das perguntas sejam predeterminadas. Urna alternativa é mesclar os dois métodos em cada entrevista, estimulando informante a expressar-se livremente, mas introduzindo gradativamente um conjunto padronizado de perguntas na medida que não tenham ainda sido respondidas. Isso preserva a relação entrevista, mas toma o material menos rigorosamente comparável.
Uma vez que, em contraposição à história oral, muito poucas dessas entrevistas de levantamento social são gravadas, é difícil saber com que exatidão os entrevistadores normalmente seguem esse tipo de instruções do levantamento. Os raros te que têm sido relatados indicam que um terço das perguntas pode ser habitualmente modificado de modo inaceitável. É certamente óbvio que os entrevistadores levam para a entrevista tanto expectativas quanto um estilo social que afeta suas descobertas

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Por exemplo, num levantamento por questionário, as entrevista-doras indagavam das mulheres se seus maridos ajudavam a fazer as compras da casa. Os resultados foram diferentes dependendo de se o marido da própria entrevistadora a ajudasse ou não. As que eram ajudadas por seus maridos verificaram que isso tam-bém se dava com 60% de suas informantes, enquanto as do outro grupo, cujos maridos não ajudavam, verificaram que aquilo se dava com apenas 45%o19 Algumas das pressões e dos erros de interpretação que integravam esses resultados teriam sido revela-dos em entrevistas gravadas. Não parece haver muita dúvida de que grande parte da fidedignidade "preditiva" do levantamento social contemporâneo baseia-se nas manipulações informais de entrevistadores e de analistas, que buscam ajustar os resultados que encontram ao que eles próprios percebem como conclusões verossímeis. Quando quase todos erram de maneira semelhante em suas expectativas, como no célebre caso da vitória eleitoral de Truman, em 1948, o que ocasiona o erro de predição são essas manipulações informais, mais do que defeitos do próprio método.
A gravação pode auxiliar a desmascarar e a avaliar essa es-pécie de viés social. Contudo, o entrevistador tem uma presença social, mesmo quando não demonstre nenhuma opinião explícita que possa influenciar o informante. Há uma imagem amplamente aceita da entrevistadora como urna mulher de classe média; e a maioria dos informantes têm alguma idéia de quais serão prova-velmente suas opiniões. Isso tem alguma vantagem, porque se pode mais facilmente dar o desconto do viés resultante nas res-postas; e também pode ser facilmente contrabalançado pela de-monstração de respeito pelas opiniões dos informantes. Mas há conseqüências interessantes quando a imagem é alterada de ma-neira inequívoca. Por exemplo, um levantamento norte-ameri-cano verificou que os informantes negros davam respostas consi-deravelmente diferentes a algumas questões, quando perguntados por entrevistadores negros ao invés de por brancos.20

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Levantamento NORC 1942 - 1000 entrevistas com respondentes negros; metade dos entrevistadores negros, metade brancos
Pergunta Resposta % quando
o entrevistador negro branco
É suficiente o que tem sido feito em seu bairro

para proteção das pessoas em caso de ataque Sim 21 40

aéreo?

A quem recorre um negro para reclamar seus Á justiça 2 15



direitos? Á polícia 3 12

Que jornal negro você lê habitualmente? Nenhum 35 51

Quem você acha que devia comandar Oficiais

os soldados negros? negros 43 222


Cautela análoga entre raças foi assinalada na África, onde, conta-nos Vansina, a expectativa é de que os missionários bran-cos se interessem por tradições. Porém, não se deve contar-lhes as tradições que contrariem seus ensinamentos, porque aí eles as criticarão, o que prejudicará o prestígio dos narradores, e lutarão contra elas, o que prejudicará toda a comunidade.21 Na Europa, um entrevistador com maneira de falar acentuadamente de classe operária, ou um homem em vez de uma mulher, pode ter a expec-tativa de alterar o efeito social de um modo menos violento -espera-se - porém comparável.
Deve-se salientar que não é necessariamente verdade que um entrevistador do mesmo sexo, classe ou raça obtenha infor-mações mais precisas. Se a relação social numa entrevista é, desde o inicio, ou passa a ser um vínculo social, aumenta o pe-rigo na direção da conformidade social das respostas. Como tam-bém maior intimidade nem sempre acarreta menos inibição. Énotável, por exemplo, como muitas pessoas, quando abordadas anonimamente na rua por pesquisadores de opinião e perguntadas

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a respeito de sexo, se dispõem a responder com uma franqueza que não é comum na entrevista mais reservada feita em casa.
A presença de outras pessoas numa entrevista também pos-sui efeito marcante. A jactância e o exagero podem reduzir-se, mas aumentará em muito a tendência á conformidade. Ao entre-vistar grupos de estudantes de medicina norte-americanos, Ho-ward Becker verificou que o cinismo era a norma; privadamente, porém, a maioria dos estudantes expressaram sentimentos idea-listas.22 Às vezes, um encontro em grupo pode ser útil, por exemplo, para fazer aparecer os conflitos quanto à tradição a res-peito de determinadas figuras do passado de urna comunidade, segundo informantes com pontos de vista diversos. E numa en-trevista mais pessoal, o marido, ou a esposa, pode estimular a memória do outro, ou corrigir um engano, ou oferecer uma interpretação diferente. Numa situação como essa, porém, um relato sobre a divisão das responsabilidades domésticas seria em geral, por parte de cada um deles, muito menos crítico a respeito do outro. Pode-se observar, também, que um grupo de pessoas ido-sas muitas vezes enfatizará uma opinião comum sobre o passado, mas se, em seguida, são contatadas separadamente, é possível que surjam descrições muito mais individualizadas.

Mesmo quando outras pessoas não estejam presentes à en-trevista propriamente dita, sua presença exterior invisível pode ter influência. Isso é particularmente importante em toda comuni-dade em que os vínculos são muito estreitos. Nela, os de dentro, os íntimos, e os de fora, os estranhos, enfrentam dificuldades de tipo diferente. O íntimo sabe corno são as coisas, é enganado menos facilmente, compreende as nuances, e começa com conta-tos muito mais úteis e, é de se esperar, como alguém considerado de boa-fé. Tudo isso tem que ser aprendido e construído pelo estranho que, no caso extremo de um estudante europeu de histó-ria da África, pode, inicialmente, não conhecer a língua, a etno-grafia ou a geografia da comunidade. Nisto, porém, pode haver também um benefício, pois o estranho pode pedir que lhe seja explicado o óbvio; enquanto o íntimo, que na verdade pode se

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equivocar ao presumir a resposta, não pergunta por temer ser to-mado por tolo. O estranho também tem a vantagem de estar de fora da teia de relações sociais local e de manter uma posição de neutralidade e, assim, podem falar-lhe de maneira realmente re-servada, com menos ansiedade subseqüente. A situação social do íntimo é revelada pela experiência de um estudante coletando informações em sua própria aldeia em Suffolk. Um tratador de ca-valos aposentado, explicando como as coisas eram difíceis na-quele tempo", contou como, ao morrer um filho seu de poucos dias de idade, carregou sozinho o caixão até o cemitério, bem cedo de manhã, mas teve que pagar a um homem para que enter-rasse a criança, pois tinha que começar a trabalhar às seis horas. Devido à caminhada extra que fez, chegou ao serviço às seis e meia,


e em seu pagamento, no fim da semana, fora descontado o dinheiro por causa da meia hora que estivera ausente. O filho do fazendeiro que des-contou esse dinheiro de seu pagamento trabalha ainda hoje na mesma fazenda na aldeia e, alguns dias depois da entrevista com o cavalariço, mandou-me um recado dizendo que esperava que ele não me tivesse deixado com uma impressão desfavorável do atual fazendeiro, pois "Os tempos eram difíceis naquela época, logo após a (Primeira Grande) guerra, não havia na verdade nada que ele pudesse fazer, não se podia esperar que pagasse a alguém por um trabalho que não havia feito".23
Andrew Roberts salientou as desvantagens paralelas de per-tencer a uma comunidade africana:
As relações com as pessoas do lugar podem ser mais difíceis do que as de um estudante branco. Na medida em que os estudantes africa-nos tiverem mantido vínculos com a terra de seus pais, voltam para lá como uma personalidade social plena, muito mais sujeitos, do que um estrangeiro, às coerções morais da sociedade. Se desconsideram os cos-tumes locais em razão da pesquisa, eles (ou seus parentes) terão que arcar com as consequências. Por meio da rede de parentesco, podem ser envolvidos em conflitos que levam as pessoas a sonegar informações que forneceriam prontamente a um visitante branco de passagem. Além disso, da independência para cá, é mais provável que se suspeite q~1e estudantes africanos, e não brancos, sejam agentes do governo central.

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