Mário júlio de almeida costa



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CE, in "An. da Hist. dei Der. Esp.", cit., tomos XXVII-XXVIII, págs. 1164 e

seg., e Juan García Gonzalez, Consideraciones sobre la fecha dei Código de Eurico, in

"An. de Hist. dei Der.'Esp.", cit., tomo XXVI, págs. 701 e segs.

(3) Cfr., supra, pág. 127.

(4) Cfr., supra, págs. 111 e seg.

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HISTÓRIA DO DIREITO PORTUGUÊS


Consiste numa selecção de fontes romanas, quer dizer, de

"iura" e de "leges". Estas últimas encontram-se representadas pelo

Código Teodosiano (438) e por novelas pós-teodosianas. A parte de

"iura" é constituída, sobretudo, por duas obras de carácter elemen-

tar: o Epítome de Gaio — resumo das Instituições deste mesmo

jurista — e as Sentenças atribuídas a Paulo, outro notável juriscon-

sulto da época clássica. Há, ainda, disposições dos Códigos Grego-

riano e Hermogeniano, incluídas nos "iura" por serem constituições

imperiais mais antigas, e um fragmento de Papiniano, talvez porque

gozava de um prestígio tão grande que um texto seu não pudesse

faltar numa colectânea desta natureza.

Tem importância a interpretação ("interpretado") do Breviário.

Na verdade, sempre que se entendeu necessário, os excertos dos

"iura" e das "leges" foram acompanhados de interpretações

("interpretationes"). Constituem pequenos comentários destinados

a esclarecer o conteúdo dos fragmentos transcritos, mas que, algu-

mas vezes, chegam a modificar completamente o preceito

interpretado.

III — Código Revisto de Leovigildo
Posteriormente ao Breviário de Alarico, conhece-se o

diploma promulgado pelo rei Teudis, em 546, a chamada Lei de

Teudis, que se destinou a reprimir abusos cometidos na cobrança das

custas judiciais. Todavia, o Código Revisto ("Codex Revisus") de

Leovigildo representa a grande colectânea que se segue ao

Breviário.

Parece de admitir, com efeito, que o Código de Eurico foi

refundido e actualizado, entre os anos de 572 e 586, ou, mais con-

cretamente, cerca de 580(1), por iniciativa do rei Leovigildo.

( ) Cfr. Álvaro D'Ors, La territorialidad dei derecho de los visigodos, in "Estú-

dios Visigóticos", cit., vol. I, pág. 122.

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PERÍODO GERMÂNICO OU VISIGÓTICO

Desconhece-se o texto original deste Código Revisto. Só podemos

reconstituí-lo através dos preceitos que dele passaram ao Código

Visigótico de 654, sob a epígrafe de leis antigas ("antiquae").

IV — Código Visigótico
A legislação avulsa dos monarcas visigodos, desde o reinado

de Leovigildo até ao de Recesvindo, não é abundante, mas toda ela

se apresenta, inequivocamente, de aplicação indistinta ao conjunto

da população. Chindasvindo (642/653) incrementou essa actividade

legislativa, promulgando, pelo menos, oitenta e nove leis(1), com

que introduziu reformas relevantes nos mais variados sectores da

vida jurídica: orgânica do Estado, sistema judiciário, processo,

direito privado e direito penal.

Procurava Chindasvindo abrir caminho para uma projectada

obra codificadora que substituísse o Código de Leovigildo. Con-

tudo, esse objectivo só foi Concretizado — também.após uma legis-

lação abundante—-no tempo de seu filho e sucessor Recesvindo

(649/672).

Assim surgiu o Código Visigótico por antonomásia, também

designado "Lex Visigothorum Recesvindiana", "Liber Iudicio-

rum", "Liber Iudicum" e "Fórum Iudicum"(2). A sua promulgação

ocorreu em 654. Deve observar-se que, depois desta primeira ver-

são, a chamada forma recesvindiana, o Código Visigótico teve outras

duas: a forma ervigiana, ainda com carácter oficial, de 681, devida ao

rei Ervígio; e a. forma vulgata, de iniciativa particular.

Na verdade, dá-se o nome de forma vulgata do Código Visi-

gótico a um conjunto de manuscritos de épocas muito diversas,

(') Tantas são as que no Código Visigótico contêm o nome deste

monarca.


(2) Existe uma versão bilingue sob a epígrafe Fuero Juzgo en Latin y Cas-

tellano, Madrid, 1815 (ed. de "La Real Academia Esparbla").

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HISTÓRIA DO DIREITO PORTUGUÊS



que vão desde a última fase da dominação visigótica até à Recon-

quista. Trata-se de revisões não oficiais, mas de origem privada,

que tomam por base a forma ervigiana, introduzindo-lhe modifica-

ções e acrescentos diversos (!).

Quanto à natureza intrínseca das suas disposições, o Código

Visigótico pode considerar-se um produto do cruzamento de três

correntes jurídicas: romana, germânica e canónica. A que maior

influência exerceu foi a romana. E não admira que assim tenha

sucedido, pois a romanização oferecida pelo Código de Eurico foi

incrementada no Código de Leovigildo e na legislação que poste-

riormente se publicou.

Discute-se sobre se os juristas e legisladores visigodos conhe-

ceram e utilizaram as fontes justinianeias. Ainda que se responda de

modo afirmativo, nunca se poderá encontrar no Código Visigótico

mais do que uma influência muito diminuta do direito justinianeu.

O direito romano que o influenciou foi o antejustinianeu, quer

dizer, o contido nas "leges" e nos "iura" anteriores às colectâneas

do Corpus Iuris Civilis.

O Código Visigótico está sistematizado em doze livros — tal

como o Código de Justiniano—, que se subdividem em títulos,

integrados por leis. Aproximadamente, três quintas partes destas

leis são encimadas pelas palavras "antiqua" ou "antiqua emen-

data"(2). As restantes, em vez disso, apresentam-se com o nome do

monarca que as estabeleceu ou, inclusive, tão-só alterou. Não é

pacífico que todas as leis "antigas" ou "antigas emendadas" proce-

dam do Código de Leovigildo, embora algumas delas tenham uma

origem anterior.

(') Sobre a existência, em Lisboa, de um códice da forma vulgata, cuja

letra parece ser dos séculos XII ou xm, veja-se Paulo Merêa, Um códice da "Lex

Visigothorum" existente em Lisboa, in "Boi. da Fac. de Dir.", cit., vol. VI, págs. 789

e seg., e vol. VII, págs. 300 e.seg.

(') Observe-se que algumas leis, embora levem apenas a indicação de

"antiquae", mostram alterações da sua versão originária.

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PERÍODO GERMÂNICO OU VISIGÓTICO

22.2. O problema da personalidade ou territorialidade da legislação

visigótica
Conforme observámos(l), em certos Estados germânicos

vigorou o princípio da personalidade ou da nacionalidade do direito, o

que significa que havia um ordenamento jurídico para a população

germânica e outro para a população romana. Diverso é o princípio

da territorialidade do direito, segundo o qual se aplica em todo o Estado

um único ordenamento jurídico. Ora, que sistema se adoptou entre

os Visigodos?

Deve esclarecer-se, liminarmente, que o problema se põe

apenas em relação a uma primeira fase. Mesmo os defensores da

tese da personalidade estão de acordo em que no Código de Leovi-

gildo existiu já uma certa tendência para a aplicação territorial. Ao

menos alguns dos seus preceitos, por exemplo, o que autorizava os

casamentos mistos entre Visigodos e Hispano ou Galo-Romanos,

eram de aplicação a toda a população. E concorda-se que a legisla-

ção avulsa posterior a Leovigildo, consoante acima salientámos (2),

se apresenta de carácter territorial, assim como não surgem dúvidas

a tal respeito em relação ao Código Visigótico de Recesvindo.

O problema levanta-se, portanto, a propósito do período ante-

rior. Analisemos as teses em confronto, embora não se entre nas

minúcias da controvérsia (3).

(') Cfr., supra, págs. 106 e segs.

(2) Cfr., supra, pág. 131.

(3) Ver, por todos, Álvaro D'Ors, La territorialidad dei derecho de los visigo-

dos, eit., in "Estúdios Visigóticos", vol. I, págs. 91 e segs., que historia a questão

e fornece amplas indicações bibliográficas, Também faz uma síntese do problema

Paulo Merèa, Para uma crítica de conjunto da tese de Garcia Gallo: 1 — Breve noticia

acerca da tese, in "Est. de Dir. Vis.", cit., págs. 199 e segs. Ver, ainda, as exposi-

ções resumidas de Braga da Cruz, Aditamentos de Direito Português — O problema

da personalidade ou territorialidade da legislação visigótica, anteriormente a Recesvindo (lições

policopiadas, coligidas por Daniel Gonçalves), Coimbra, 1958, e Nuno Espi-

nosa Gomes da Silva, Hist. do Dir. Port., cit., vol. I, págs. 44 e segs.

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HISTÓRIA DO DIREITO PORTUGUÊS

a) Tese da personalidade


Até à segunda metade do séc. XIX, aceitava-se unanimemente

que a legislação visigótica tivesse sido de aplicação territorial. Não

havia, porém , investigações históricas capazes de fundamentar esta

opinião.


Em 1843, o historiador alemão Eichhorn(1) sustentou, pela

primeira vez, a tese da personalidade. Partiu de uma suposta exis-

tência de dois juízes entre os Visigodos: o thiuphadus para julgar as

causas em que interviessem Visigodos; e o iudex ou defensor para

julgar as questões entre Romanos.

A ideia encontrou logo o melhor acolhimento entre outros

germanistas consagrados. Mas foi Zeumer quem, nos fins do século

XIX, através de uma série de estudos, alicerçou cientificamente a

doutrina da personalidade (2), aceita a partir de então, durante mais

de trinta anos, pelo comum dos historiadores.

De harmonia com esse ponto de vista, o Código de Eurico e o

Código de Leovigildo aplicavam-se somente aos Visigodos, ao

passo que o Breviário de Alarico se destinava apenas aos Romanos.

O historiador espanhol Urena, não obstante a sua aceitação da tese

da personalidade, defendia que o Código Revisto de Leovigildo

tinha já vigência territorial.

Onde os partidários da personalidade estavam em desacordo

era na solução do problema dos assuntos mistos, para que não

(l) Record e-se que este autor foi um dos pioneiros da Escola Histórica do

Direito, que teve em Savigny o seu maior expoente (ver, por ex., F. Wieacker,

História do Direito Privado Moderno, Lisboa, 1980, especialmente págs. 405, 443, e 460 e seg.;

trad. de A. M. Botelho Hespanha com base na 2.a ed. de Privatrechtsgeschichte der

Neuzeit unter besonderer Beriicksichtigung der deutschen Entwicklung, Góttingen, 1967).

( ) Ver Karl Zeumer, Historia de la legislación visigoda (trad. para castelhano

de Carlos Claveria), Barcelona, 1944. Sobre o cuidado com que deve ser utili-

zada esta tradução, consultar Paulo Merèa, in "Boi. da Fac. de Dir.", cit., vol.

XX, págs. 640 e seg.

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PERÍODO GERMÂNICO OU VISIGÓTICO

encontravam resposta satisfatória. Qual seria a lei aplicável aos lití-

gios que surgissem entre Visigodos e Romanos?

Segundo Dahn, este conflito de legislações solucionava-se

dando aos litigantes a faculdade de eleger um dos dois ordenamen-

tos: o romano ou o visigótico. Todavia, a opinião era inaceitável,

pois não apresentava em sua defesa qualquer argumento válido. E

quando não existisse acordo das partes?

Para Bethmann-Hollweg, tinha prevalência o "fórum rei".

Isto é, aplicava-se a lei do tribunal que devia dirimir o pleito.

Brunner e Zeumer, por sua vez, propenderam para a supre-

macia da lei visigótica, havendo conflito entre as duas legislações.

Mas o apoio aduzido foi a analogia com o que se passava relativa-

mente à "Lex Burgundionum", a qual — depois de declarar no

prefácio que apenas se aplica a Burgúndios e que os Romanos

continuam com o privilégio de se regularem pelo seu direito —

determina que nos conflitos mistos vigorasse a lei burgúndia de

preferência à lei romana. Esta analogia não possui, contudo, fun-

damento convincente. De facto, a tese da personalidade nunca ofe-

receu para o problema dos assuntos mistos uma resposta que assen-

tasse em dados históricos seguros, limitando-se a meras conjecturas.

b) Tese da territorialidade


Estavam as coisas neste pé, quando, em 1941, Garda-Gallo

ressuscitou com bases científicas a velha doutrina da territoriali-

dade (*). Segundo o ilustre historiador, já as leis teodoricianas

( ) Ver García-Gallo, Nacionalidad y territorialidade dei Derecho en la época

visigoda e La territorialidad de la legíslación visigoda, in "An. de Hist. dei Der. Esp.",

cit., respectivamente, tomo XIII, págs. 168 e segs., e tomo XIV, págs. 593 e segs.

(também in "Boi. da Fac. de Dir.", cit., vol. XIX, págs. 194 e segs.). Ver, ainda,

o seu estudo Consideración critica de los estúdios, cit., in "An. de Hist. dei Der. Esp.",

tomo XLIV, págs. 343 e segs.

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HISTÓRIA DO DIREITO PORTUGUÊS

foram de aplicação conjunta à população goda e romana; e o

mesmo se verificou com todas as restantes leis avulsas e codifica-

ções visigóticas.

Assim, o Código de Eurico teria sido substituído pelo Breviá-

rio de Alarico. Este, por seu turno, cederia o lugar ao Código de

Leovigildo, também revogado depois pelo Código de Recesvindo.

c) Posição actual do problema


Acabamos de descrever, sucintamente, as duas orientações

básicas que têm sido apresentadas a respeito da natureza da legisla-

ção visigótica. Abstrai-se de algumas controvérsias secundárias tra-

zidas à colação. Consideremos, portanto, o estado actual do

problema.

Devem distinguir-se dois aspectos: um deles consiste na terri-

torialidade das várias codificações e leis avulsas visigóticas nossas

conhecidas; o outro é o da revogação do Código de Eurico pelo

Breviário de Alarico e deste pelo Código Revisto de Leovigildo.

García-Gallo não os separou ao formular a sua tese. Para o

referido historiador esses aspectos confundem-se. Torna-se necessá-

rio, porém, dissociá-los, autonomizá-los, porque, enquanto o pri-

meiro vem concitando a adesão dos autores, o segundo não parece

encontrar confirmação satisfatória.

Foi Paulo Merêa que chamou a atenção para os dois referidos

ângulos do problema e para a possibilidade de harmonizá-los. As

suas conclusões constituem uma terceira posição — uma solução

conciliatória —, a que estudos ulteriores acrescentaram novos e valio-

sos créditos (*).

(') Ver Paulo Mf.rka, Uma tese revolucionária (A propósito do artigo de Garcia

Gallo publicado no tomo XIII do A.H.D.E.), Ainda sobre a tese de Garcia Gallo, Sobre a

tese de Garcia Gallo (opiniões várias), Para uma critica de conjunto da tese de Garcia Gallo:

I— O capítulo 321 do Código Euriciano e a tese da territorialidade. II— O capítulo 312 do

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PERÍODO GERMÂNICO OU VISIGÓTICO

Após uma ponderação dos argumentos que militam a favor da

tese da territorialidade e da tese da personalidade, reconheceu

Merêa que esta última se encontra, no mínimo, bastante abalada.

Inclinou-se, portanto, para uma territorialidade do direito visigó-

tico. Mas daí não terá necessariamente de inferir-se a revogação do

Código de Eurico pelo Breviário de Alarico e deste pelo Código

de Leovigildo. Trata-se do aspecto que em especial choca na tese

de García-Gallo.

É a esse propósito que surge a contribuição original de Paulo

Merêa. Segundo o eminente professor, haverá que considerar o

Breviário de Alarico fora da sequência da legislação visigótica;

quer dizer, importa vê-lo como uma compilação subsidiária, que

nem substituiu o Código de Eurico nem foi substituída pelo Código

de Leovigildo. Este é que, de facto, revogou o Código de Eurico,

cuja vigência ininterrupta se manteve até então.

O Código de Eurico terá continuado como lei geral. A seu

lado, o Breviário constituiu uma compilação organizada com o

objectivo de limitar os "iura" e as "leges" que podiam invocar-se

em juízo. Visto que a população romana, sobretudo, continuava

arreigada a esse direito, convinha impedir os inconvenientes da sua

alegação discricionária.

Código FMriciano e a pretensa onerosidade da doação visigótica, Sobre os casamentos mistos na

legislação visigótica (Nova contribuição para uma crítica de conjunto da tese de Garcia Gallo)

e Ainda a tese de Garcia Gallo (Estado da questão), in "Boi. da Fac. de Dir.", cit.,

respectivamente, vol. XVIII, págs. 417 e segs. (também in "An. de Hist. dei Der.

Esp.", cit., tomo XIV, págs. 593 e segs.), vol. XX, págs. 259 e segs., vol. XXI,

págs. 358 e seg., vol. XXII, págs. 426 e segs. (também in "Est.. de Dir. Vis.",

cit., págs. 209 e segs.), vol. XXXIII, págs. 56 e segs. (também in "Est. de Dir.

Vis.", cit., págs. 231 e segs.), e vol. XXIV, págs. 202 e segs. Consultar, ainda,

Para uma crítica de conjunto da tese de Garcia Gallo: 1 — Breve notícia acerca da tese, cit., in

"Est. de Dir. Vis.", págs. 199 e segs., e a recensão ao estudo de Álvaro D'Ors, La

territorialidad dei derecho de los visigodos, in "Boi. da Fac. de Dir.", cit., vol. XXXI,

págs. 433 e segs.


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HISTÓRIA DO DIREITO PORTUGUÊS

Assim, a ordem por que se sucederam e sucessivamente revo-

garam as várias colectâneas visigóticas seria a seguinte: Código de

Eurico (+_475), Código de Leovigildo (^580) e Código de Reces-

vindo (654). Mas o Código de Rescevindo não se limitou a substi-

tuir o Código de Leovigildo, pois revogou também o Breviário de

Alarico (506).

A solução de Paulo Merêa afigura-se convincente e recebeu

adesões. Na sua linha se encontra a conclusão de Álvaro d'Ors ao

sugerir que o Breviário de Alarico possuía natureza didascálica. Ou

seja: não representou uma nova lei que substituiu o Código de

Eurico, mas uma colectânea de carácter geral, para formação dos

juízes e ajuda dos mesmos nos casos naquele não previstos ( ).

Estará, assim, o problema encerrado? Pensa-se que não.

Argumentos poderosos, é preciso reconhecê-lo, militam a favor das

diversas conjecturas. Constitui, em suma, um dos enigmas do

direito visigótico que subsistem (2).

(') Ver Álvaro D'Ors, La territorialidad dei derecho de los visigodos, cit., in

"Estúdios Visigóticos", vol. I, págs. 91 e segs., especialmente pág. 121.

(2) Posteriormente, ver, por ex., Paulo Merêa, recensão ao estudo de

Álvaro d'Ors, cit., in "Boi. da Fac. de Dir.", vol. XXXI, págs. 433 e segs., C.

Sánchez-Albornoz, Tradición y derecho visigodos de Léon y Castilla, in "Cuadernos

de História de Espana", n.os XXIX-XXX, Buenos Aires, 1959, págs. 244 e segs.,

e Pervivencia y crisis de la tradición jurídica romana en la Espana goda, in "Settimane di

Studio dei Centro Italiano di Studi sull'alto Medioevo", IV — "11 passagio dallAn-

tichità ai Medioevo in Occidente", Spoleto, 1962, págs. 128 e segs. (também

in "Estúdios sobre las Instituciones medievales espanolas", México, 1965, págs.

547 e segs.), García-Gallo, Consideración crítica de los estúdios, cit., in "An. de Hist.

dei Der. Esp.", tomo XLIV, págs. 343 e segs., maxime págs. 445 e segs., Giulio

Vismara, Lefonti dei diritto romano nelValto medioevo, cit., in "Stud. et Doe. Hist. et

lur.", vol. XLVII, págs. 15 e segs., e NunoJ. Espinosa Gomes da Silva, Hist. do

Dir. Port., cit., vol. I, págs. 44 e segs.

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PERÍODO GERMÂNICO OU VISIGÓTICO

22.3. Direito consuetudinário visigótico


Também se discute a eventual persistência de um antigo

direito consuetudinário visigótico ( ). Seria um sistema efectiva-

mente vivido, com diferenças marcadas em relação às normas do

direito oficial escrito. A vasta legislação promovida pelos monarcas

visigodos intentaria sobrepor-se a esses costumes de origem germâ-

nica. Chega-se ao ponto de aproximá-los do direito consuetudiná-

rio noruego-islandês.

Estamos, de novo, no domínio das conjecturas e da investiga-

ção histórica de base dedutiva. A querela envolve o estudo das

fontes da Reconquista. O que aconselha toda a prudência, em vez

das posições extremas, favoráveis ou desfavoráveis aos costumes

visigóticos, defendidas, respectivamente, pelos chamados "germa-

nistas" e "romanistas".

Parece arrojado, perante os elementos disponíveis, sustentar

que houve um abismo entre o direito oficial e a prática jurídica.

Seria estranho que uma minoria populacional germânica (2), tendo

assimilado a língua, a cultura, a religião e os hábitos de vida roma-

nos, ficasse isolada no seu direito originário, que, aliás, se desco-

nhece. Mas, em contrapartida, não há razões decisivas para negar a

possível manutenção de alguns costumes do antigo direito germâ-

nico, de procedência sueva ou visigoda, assim como de velhas

regras consuetudinárias pré-romanas e hispano-romanas. Isso

verificar-se-ia com maior probabilidade nas regiões periféricas,

afastadas dos centros políticos e legislativos.

Contudo, mesmo que se admita a existência desse direito con-

suetudinário germânico, terá de convir-se que no Estado Visigótico

(') Ver García-Gallo, Consideración crítica de los estúdios, cit., in "An. de

Hist. dei Der. Esp.", tomo XLIV, págs. 409 e segs., onde uma análise pormeno-

rizada da controvérsia é acompanhada de largas indicações bibliográficas. Con-

sultar, também, o estudo posterior de Carlos Petit, Consuetudo e Mos en la Lex

Visigothorum, in "An. de Hist. dei Der. Esp.", cit., tomo LIV, págs. 209 e segs.

(2) Cfr., supra, págs. 117 e 123 e segs.

139

HISTÓRIA DO DIREITO PORTUGUÊS



triunfou o direito escrito. Comprova-o a intensa actividade legisla-

tiva que conhecemos e que culminou, pelos meados do século vil,

com a elaboração do Código Visigótico recesvindiano.

22.4. Direito canónico. Os Concílios de Toledo


Não pode ignorar-se a importância considerável do direito

canónico, isto é, das normas jurídicas próprias da Igreja Católica,

no Reino Visigodo. Esse ordenamento disciplinava, para além

da estrutura da Igreja e dos assuntos espirituais, certos aspectos

seculares da vida dos fiéis. Estão neste caso o regime dos bens das

instituições religiosas e os actos temporais — como doações, testa-

mentos, contratos agrários — que lhes diziam respeito, as sanções

canónicas e o processo judicial seguido nos tribunais eclesiásticos.

Ora, após a conversão de Recaredo ('), tornou-se católica a genera-

lidade da população hispânica.

Vigoravam no Estado Visigótico, evidentemente, as normas

jurídico-canónicas comuns a toda a Igreja. Mas possuiu grande sig-

nificado o direito canónico nacional (2). Nesse período, mercê da

dificuldade das comunicações e de outros factores, a centralização

da Igreja Católica era menor do que na época moderna. Daí o

relevo dos concílios nacionais, que reuniam os altos dignitários ecle-

siásticos de cada Estado. Na monarquia visigótica, esses concílios

nacionais, os Concílios de Toledo, desempenharam um papel muito

activo relativamente à criação de preceitos jurídico-canónicos. E


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