Práticas Discursivas ao Olhar Notas sobre a vidência e a cegueira na formação do pedagogo


Comunidades de Sentido e Redes Sociais



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Comunidades de Sentido e Redes Sociais

Kossoy considera que as pesquisas históricas com o recurso à fotografia como fonte necessitam para sua compreensão de investir na "trama histórica particular do contexto cultural a que se referem":30 Para além dos determinantes que influíram decisivamente na difusão de artefatos fotográficos e da mensagem imediata - analógica, voltada à cena, ao objeto referente, ao icônico

a imagem existe como signo simbólico, voltado à comunidade que a frui. Como observa Leite, sem a compreensão da utilização e do significado dos fenômenos aparentes, pouco se adianta a respeito daquilo que constitui a imagem, mesmo em caso de aparências semelhantes ou idênticas, sendo necessário portanto construir relações entre os elementos presentes na imagem e sua significação no contexto da sociedade existente.31

Em outra abordagem, Mírian Moreira Leite afirma que o processo de conhecimento que as fotografias podem gerar "é uma questão de meios de comunicação, ou seja, de sistemas de signos ou símbolos que transmitem significado do testemunho ao leitor



Notas de rodapé:

28. Para Kossoy, "É óbvio que a representação fotográfica reflete e documenta em seu conteúdo não apenas uma estética inerente à sua expressão mas também uma estética de vida ideologicamente preponderante num particular contexto social e geográfico, num momento preciso da história". KOSSOY, op.cit.p. 53.

29. Em suas pesquisas Mírian Moreira Leite conclui: "A fotografia reproduz diferentes partes da cultura que é vivida como um todo. Sua leitura fragmenta essa unidade, mas não pode esquecê-la para não destruir a inserção dos aspectos isolados em seu contexto". LEITE, op. cit, p. 44;

30. Afirma o autor: "São os componentes econômico, estéticos, tecnológicos e religiosos que direcionam e influíram decisivamente para que a fotografia desde seu advento e, em suas diferentes manifestações, tivesse uma evolução determinada em cada espaço específico". KOSSOY, op. cit, p. 91.

31. LEITE, op. cit, p.45.

Fim das notas de rodapé.

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A fotografia deixa, então, de ser uma descrição, para ser uma narrativa interrompida, imobilizada num quadro único".32 Kossoy afirma de forma semelhante:



Ao contrário de apreciações estetizantes, é na interpretação da "finalidade" a que se destinavam as imagens que se encontrará um rico veio para a compreensão da estética fotográfica nos diferentes períodos de sua história. É de se pensar desde logo na produção fotográfica, profissional e comercial, que abrange os vários tipos de comissionamento que garantiram- e garantem - a subsistência dos fotógrafos e seus estabelecimentos, incluindo-se no passado, por exemplo, os que eram proporcionados:pelos inúmeros indivíduos que compareciam aos estúdios, pelos governos, pelos editores fotográficos, pelas expedições científicas etc.33

Em sua obra, "A câmara clara", Roland Barthes observa que as relações fotográficas envolveriam o operator - aquele que fotografa

o spectator - aquele que contempla as imagens em jornais, livros, álbuns, arquivos, coleções

o spectrum - o que é fotografado, o "alvo", o "referente".34 Para o autor, o investimento das fotografias em "informar", "representar", "surpreender", "dar significado", "provocar desejo", envolvem uma educação que articula "saber e delicadeza" e que possibilita a identificação das intenções do operator e da lógica constitutiva da imagem: "viver os pontos de vista que criam e animam as suas práticas, mas, de certo modo, vivê-los inversamente, segundo meu querer de spectator".35

As possibilidades de significação são consideradas por Mirian Moreira Leite no âmbito das relações do observador para a imagem; da imagem ao observador; de uma imagem para outra, dos retratados para o observador. Para além da mensagem imediata, analógica, existe um sentido simbólico nas fotografias e para sua apreensão torna-se necessária a articulação entre sua forma compositiva e figurativa, resultado da construção técnica, e a apreensão do contexto social em que ela foi gerada, reconstituindo-se os elos entre a figuração significante (presente visualmente na composição fotográfica) e sua significação (expressa no contexto cultural da sociedade que a produz).36

Notas de rodapé:

32. LEITE, op. cit, p.28. A socióloga ainda observa que: "Só se pode ler adequadamente amensagem de campos que já se conheça anteriormente pois a falta de código partilhado o levará a múltiplos equívocos". Ibid., p. 50.1

33. KOSSOY. op.Cit., p.86

34. BARTHES, Roland. A câmara clara. Lisboa, Edições 70, 1980, p.23.

35. Ainda segundo Barthes, o historiador em suas pesquisas com imagens seria obrigado a um movimento duplo pesquisador: de identificação das intenções do fotógrafo e de distanciamento, "como se eu tivesse de ler na fotografia os mitos do fotógrafo, confraternizando com eles, mas sem acreditar neles". BARTHES, op. cit., p.48.

36. LEITE, op. cit, p. 50. Para a autora, só assim é possível recuperar-se o sentido das imagens enquanto conotação, mensagem, ideologia: Sem a compreensão da utilização e do significado dos fenômenos aparentes, pouco se adianta a respeito daquilo que constitui a mensagem, mesmo em caso de aparências semelhantes ou idênticas. Ibid., p.46.

Fim das notas de rodapé.

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Recuperar a trama social que funda conjuntos fotográficos nos leva ao contexto econômico, estético, tecnológico, político da sociedade que a produziu, reintegrando a totalidade "fragmentariamente congelada no conteúdo da imagem". Distinto, todavia, do investimento em uma "história da tecnologia fotográfica" ou, de forma reduzida, da trajetória do fotógrafo ou da instituição contratante, a noção de "circuito social" preocupa-se com uma rede de práticas referentes não apenas à produção da fotografia - inovações técnicas, fotógrafos, contratantes - como também à recepção da mensagem entre remetentes, destinatários, colecionadores. Governos, gráficas, editoras e escolas privadas, confessionais ou laicas, exerceram um papel determinante nas temáticas e composições de séries fotográficas voltadas para um público consumidor (cartões-postais, álbuns fotográficos, exposições oficiais), contaminando opções de enquadramento e figuração adotadas pelos fotógrafos.37



Bibliografia

BARROS, Armando Martins de. Da Pedagogia da Imagem às Práticas do Olhar: uma busca de caminhos analíticos. Rio de Janeiro, Universidade Federal do Rio de Janeiro, Programa de Pós Graduação em Educação, 1997.

BARTHES, Roland. O óbvio e o obtuso. Lisboa, Edições 70, 1980.

—. A câmara clara. Lisboa, edições 70, 1980.

BORIS, Kossoy. Fotografia e História. São Paulo, Ed. Ática, 1989.

—. Origens e expansão da fotografia no Brasil: século XIX. Rio de Janeiro, Funarte, 1980.

FABRIS, Annateresa. Fotografia: usos e funções no século XIX. São Paulo, EDUSP, 1991.

LEITE, Miriam Moreira. Retratos de família: leitura da fotografia histórica. São Paulo, EDUSP, Ed. Universidade São Paulo, 1993.

MACHADO, Arlindo. A Ilusão Especular. São Paulo, Ed. Brasiliense, 1982.

VOUVELLE, Michael. Ideologias eMentalidades. São Paulo, Ed.Brasiliense, 1991.



Nota de rodapé:

37. KOSSOY, op. cit., p.139. Segundo o autor, ”a representação fotográfica reflete e documenta em seu conteúdo não apenas uma estética inerente à sua expressão mas também uma estética de vida ideologicamente preponderante num particular contexto social e geográfico, num momento preciso da história. Estética e ideologia são componentes fluidos e indivisíveis, implícitos na representação fotográfica". Ibid., p. 86.

Fim da nota de rodapé.

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Atividades Complementares



Vídeo Educativo: Seminário Eletrônico: Fotografia na Pesquisa Historiográfica

Concepção BARROS, Armando M. Direção Nadja Vargas Neto. Niterói, Universidade Federal Fluminense, Núcleo de Vídeo, Departamento de Fundamentos Pedagógicos. 1992. Apoio CNPq

O vídeo reúne diferentes historiadores apresentando suas abordagens frente à fotografia e seus estatutos epistêmicos. O vídeo é dividido em três partes: 1) discussões teóricas historiográficas (com Maurício Lissovisky, Ana Maria Essus, Antônio Oliveira Jr., Ciro Flamarion Cardoso; 2) discussões na historiografia educacional: Clarice Nunes; 3) Instrumentos de pesquisa: Armando Martins de Barros, Sônia Câmara. Cópia do vídeo pode ser solicitada a seu autor.

Filme: O Exterminador do Passado

Timestalkers. EUA, 1987. Direção de Michael Schultz. com Willian Derque. Duração 83 min. Distribuição: América

Professor de História tem sua esposa e filho mortos em um acidente de trânsito, seu hobby é a coleção de souvenir sobre o faroeste. Em um leilão de objetos antigos, compra um baú onde encontram-se fotografias do século XIX. Estudioso da história da fotografia, o professor observa que em uma das fotos um pistoleiro utiliza-se de uma arma que foi concebida apenas em 1950! Ao investigar a autenticidade da fotografia, o professor consulta músicas e jornais do século XIX, realizando o que chamamos de crítica documental e indiciando o verdadeiro trabalho que o historiador deve realizar no trato com a iconografia. No filme, a análise das fotografias atravessa sua condição como ícone, índice e símbolo.

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Os Álbuns Fotográficos com Motivos Escolares: Veredas ao Olhar

Armando M. Barros

O retrato não me responde. Ele me fita e se contempla

nos meus olhos empoeirados.

e no cristal se multiplicam

os parentes mortos e vivos.

? Já não distingüo os que se foram

dos que restaram.

Percebo apenas a estranha idéia de família

viajando através da carne.

Na última estrofe de seu poema "Retrato de Família", Carlos Drummond de Andrade expõe sua sensibilidade e seu êxtase pela fotografia de seus familiares. A imagem teria essa capacidade de construir, no "lusco fusco da memória", uma estranha composição sugerindo mais do que informando. O poeta confessa-se fascinado pela fotografia, a um só tempo concreta e abstrata, pois é um olhar do presente que "visita" o passado e uma imagem do passado que é "clandestina" no presente. A magia de suas palavras remete-nos à generosidade de outras, vindas do mundo da ciência, ligando o poeta à reflexão de André Bazin, esta dirigida à ontologia da fotografia e aos mistérios dos álbuns de família:

Essas sombras, cinza ou sépia, fantasmáticas, quase ilegíveis, não são mais os retratos tradicionais de família. São a presença pertubadora de vidas detidas em sua duração, libertadas de seu destino, não pelos prestígios da arte, mas pela virtude de uma mecânica impassível.

Como quase todas as famílias, também a minha transformou momentos de sua vivência em retratos. Somos de um tempo no qual, além do cafezinho generoso para o olfato e o paladar das "visitas", aos seus olhos

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eram também "servidas" as memórias fotográficas presentes no álbum de família. À cada página folheada pelo visitante nós, crianças, olhávamos seu olhar tentando descobrir sua curiosidade ou enfado por cumprir aquele ritual cerimonioso. A mim, moleque ainda em alfabetização, as imagens ao mesmo tempo eram silenciosas e falantes. Olhava orgulhoso as páginas dos álbuns pois neles encontrava minha condição de ator figurante e de escritor, narrando às visitas histórias onde era sempre o herói imaginado. Para meu deleite de guri, inexistiam nos retratos silêncios enigmáticos, nenhuma imagem necessitava decifrar: bastava usufruir o jogo de espelhos que com meus olhos as fotografias cumpliciavam remetendo, cada uma, a um sem número de outras, em um estranho dialeto que minha memória fabulava.



Os anos passaram e, como docente, minha geração incorporou em seu fazer o uso da fotografia como estratégia didática no ensino fundamental. Então, recuperávamos as fotografias escolares produzidas na esfera do privado e as analisávamos com os alunos sob as "lentes" de uma "sociologia do fotográfico", considerando-as "objetos de veneração" cujo altar encontra-se nos álbuns de família..

Cuidado, cultivado, conservado (como uma múmia, guardado numa caixinha(como os primeiros dentes de bebê ou como a mecha de cabelos da vovó). Só se abre com emoção, numa espécie de cerimonial vagamente religioso, como se tratasse de convocar os espíritos. Com toda certeza, o que se confere tamanho valora esses álbuns, é suadimensão pragmática, seu estatuto de índice, seu peso irredutível de referência, o fato de se tratar de verdadeiros traços físicos de pessoas singulares que estiveram ali e que tem relações particulares com aqueles que olham as fotos.

No caminho, cada passo foi um vagaroso processo de descobertas. Supúnhamos ainda a fotografia como documento, pleno de objetividade e informações. Seduzia-nos a possibilidade de apreender o real chancelado pela tecnologia fotográfica a qual, pensávamos, "congelava" por inteiro personagens e paisagens garantindo todas as informações em sua bidimensionalidade.

Se, na infância, por um lado, os figurantes das fotografias pareciam ser personagens de um teatro, de outro, seus observadores ao verem os álbuns, tornavam-se autores de emocionados scriptis, Todavia, essa ilusão pouco durou. Explico. Educados para ver a fotografia como objetiva e imparcial na fixação do visível, a presença no suporte fotográfico de um tempo "não mais aqui e agora" sempre nos convidou a partilhar de viagens ficcionais sugeridas pelas paisagens que as imagens registravam. Com nosso ingresso em estudos sistematizados da teoria da imagem, a apropriação de um estatuto epistêmico

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significou o sepultamento das derradeiras ilusões quanto à nossa condição como "autores das tramas fotográficas".



Com o paradigma adotado, articulamos "imagem" ao "olhar" enquanto instâncias integradas, permitindo-nos analisar as fotografias como materialidades que indiciam "práticas sociais". A visualidade, restrita ao "ver" imediatamente figuras dispostas em planos fundados na perspectiva renascentista, não era mais suficiente, importando contextualizá-lanagnose do olhar, em "colocar em ordem o visível", "organizar simbolicamente a experiência visual", remetendo-nos à compreensão dos processos cognitivos mais amplos, envolvendo o que Arlindo Machado denomina de processos gnoseológicos em contextos sociais historicamente determinados. Em decorrência, historiar a educação com o recurso de imagens fotográficas obrigou-nos refletir sobre a "produção social do olhar", encontrando-se as imagens na especificidade de um "circuito social", de um "campo semântico", de uma "comunidade de sentido".

Ao olharmos em perspectiva nossa infância e, nela, a imaginação imaginante sobre a fotografia, compreendemos então que nunca possuíramos a liberdade ficcional sobre o sentido de cada imagem ou, dos papéis interpretados por cada figurante na cena registrada. Descobrimos que, latente na materialidade da fotografia, encontrava-se subjacente à composição um personagem oculto: o fotógrafo, este sim o sujeito autoral. Descobrimos então que o "outro", o verdadeiro "sujeito" que permitia a gênese da imagem, era o fotógrafo e seu contratante, negando com sua existência a autonomia radical de nosso encantamento. Percebemos que nosso olhar estava subordinado ao do fotógrafo. Nosso olhar espectador era parcialmente "ditado" pela competência do fotógrafo, tornando a nós, em nossa condição de observadores "objetos do olhar do Outro".38

Com o acesso à literatura historiográfica francesa, a fotografia alcançava um novo paradigma, tornando-se mediação entre a memória e a história. Para além da simples figuração, tornavam-se teoricamente mais claras as relações entre fotógrafo, fotografado e aqueles que a difundiam, a preservavam ou a contemplavam. No novo estatuto, redefinimos a condição da fotografia, deixando sua condição de fonte ilustrativa para um novo patamar: a de "objeto historiográfico". A imagem, em sua relação com o olhar, estabelecia doravante uma relação entre duas subjetividades: a do autor (o fotógrafo e fotografado) e do co-autor (o observador).

Nota de rodapé:

38. Para Aumont, o espectador é aquele que utiliza o olho frente à uma imagem. Segundo ele, o espectador é parceiro ativo da imagem, emocional e cognitivamente: "ver e reconhecer na imagem uma propriedade do real e que emprega as propriedades do visual. É a comparação constante entre o que vemos e o que já vimos, a partir de bordas visuais, cores, gradientes de diferentes tamanhos e texturas". AUMONT, Jacques. A Imagem. Campinas, Editora da Unicamp, 1993, pp. 82.

Fim da nota de rodapé.

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A existência de um "discurso" emanando do fotográfico passava a ser considerado subjacente à relação social que o suporte implicava. Nesse processo, a crença de ser a figuração o eixo informativo fundamental foi superada.



Descobrimos o que Arlindo Machado denominou de "transferência de subjetividade entre fotógrafo e espectador": o olhar de quem vê a cena coincide com o lugar de onde o sujeito (fotógrafo) enuncia a representação, ocorrendo um "assujeitamento" do observador.39 Para ele, a perspectiva renascentista, com seu afunilamento de planos, funciona como matéria sig-nificante da inscrição do sujeito no discurso figurativo, tornando-se, em suas palavras, o "espelho" que reflete, no plano simbólico, a ordem egocêntrica que instaura a representação.

As coisas não são como elas se mostram ao olhar desprevenido; para compreendê-las é preciso fazer um desvio, dar um salto por trás da miragem do visível, destruir a aparência familiar, natural e reificada com que elas aparecem aos nossos olhos, como se fossem originárias em si mesmas e independentes do sujeito que as opera e modifica. A realidade não é essa coisa que nos é dada pronta e predestinada, impressa de forma imutável nos objetos do mundo: é uma verdade que advém e como tal precisa ser construída, analisada e produzida.40

Toda a intencionalidade do fotógrafo é camuflada por uma aparente autonomia dos figurantes que, presentes na imagem, oculta a diretividade compositiva do fotógrafo quanto à pose, ao tratamento da luz, à construção estudada dos planos. Desmontando as armadilhas compositivas que seduzem a visão, percebemos que as imagens produzem um discurso não verbal, fundado em campos discursivos que constróem uma inteligibilidade envolvendo fotógrafo e observador. Tendo clara a sedução e não neutralidade da imagem, tornava-se possível a superação de nossa condição passiva para uma nova qualidade: a de "leitores" que vêem em séries fotográficas a presença de um "discurso" construído não apenas pelos sentidos forjados pelo autor-fotógrafo, como pelas ressignificações imposta pelo espectador enquanto co-autor.

1. As fotografias da esfera do público

O mundo escolar produz imagens? A resposta não é difícil. É possível diante da pergunta, rapidamente lembrarmo-nos das gravuras, dos desenhos, das fotografias que ilustravam os textos escritos em nossos livros didáticos.



Notas de rodapé:

39. MACHADO, Arlindo. A ilusão especular. São Paulo, Brasiliense, 1983, p. 92.

40. MACHADO, op. cit., p.94.

Fim das notas de rodapé.

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Ainda recordamos os mapas que serviram às aulas expositivas e cartazes em seminários ou, ainda, lembrar dos livros infantis, com ilustrações que nossos olhares não cansavam de rever quando as "tias" reuniam-nos para a magia do "contar história".



As fotografias produzidas pelas instituições "falam" de uma "história oficial", produzida para o governo, no caso das escolas federais, estaduais ou municipais, ou para mantenedoras religiosas ou laicas, no caso das instituições particulares. As fotos são principalmente construídas por fotógrafos profissionais, associando uma estética apurada no tratamento formal (com planos bem construídos e distribuição da figuração), com um conteúdo fundado em signos que remetem à tradição humanista secular e à disciplina e moral religiosa.

Desde a segunda metade do século XIX, transita pelo universo das imagens o que podemos denominar de "cartões-postais escolares", focalizando escolas de todos os níveis. Nelas, em sua maioria, encontramos imagens das fachadas dos prédios escolares e, no verso, propagandas sobre a excelência do ensino, da disciplina, da competência "moralizadora" e conteudística de seus professores. Como um recurso muito presente nessa longa duração da fotografia escolar, nos postais escolares as imagens associam a arquitetura à modernidade das propostas pedagógicas. Mesmo na atualidade do século XXI, permanece o recurso das fotografias como propaganda institucional, associando a modernidade dos prédios dos CIEPs e dos CIACs à proposta democrática de ensino formulada pelo Estado.

Ao início do século XX, o foco das fotografias envolvia momentos que remetiam aos conteúdos curriculares e suas práticas de ensino - exposições de trabalhos manuais, apresentações de educação física, oficinas. Figurava também um cotidiano de atividades extraclasse ordenado, índice de uma "boa pedagogia: refeições disciplinadas, formações diárias para o hasteamento da bandeira e canto do hino nacional etc. As imagens transmitiam aos olhos do espectador instantes de uma educação senão para o silêncio, ao menos para o silenciamento dos alunos. A aparente concentração dos discentes em si mesmos, disciplinados e ordeiros, indiciava a competência da instituição em sua pedagogia exemplificadora.

As fotos oficiais também remetiam a eventos solenes - desfiles, homenagens, formaturas, visitas de personalidades, datas cívicas. Todavia, entre essas imagens há uma que tem grande apelo às nossas memórias: nelas sempre estamos sozinhos, sentados em carteiras, tendo à frente o nome da escola, cercados por signos símbolos da educação escolar. De um lado, a

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figura do globo terrestre, expressando a universalidade do saber. Nas canetas, depositadas sobre a mesa, a afirmação da escrita e, por ela, da literatura e da oratória. No outro extremo da mesa, o saber acumulado sob a forma de livro e a modernidade de um telefone, decorada eventualmente por um pequeno arranjo de flores plásticas. Ao fundo, a bandeira do Brasil ou um mapa, signos que comprometem o aluno à uma lealdade para a vida e no caso de escola religiosa, inevitavelmente um crucifixo ou pequena escultura.



Os registros fotográficos produzidos pelas instituições escolares variaram em sua composição e mensagem ao longo de todo o século XX. Exemplos das diferenças apresentam-se entre os signos valorizados nas fotos encomendadas pelo governo, nas escolas públicas e aquelas realizadas por mantenedoras particulares. Embora as escolas privadas valorizassem as formaturas, as festas solenes, os recursos pedagógicos existentes nos laboratórios, os desfiles, as evoluções das aulas de ginástica ou da banda escolar, observamos nuances, em razão da origem confessional ou laica ou, em razão do grupo social, etário ou de gênero que as freqüentava.41

As fotografias da esfera do privado: os álbuns das famílias.

Nem só das imagens "oficiais", produzidas pelas instituições escolares, é feita a iconografia disponível para o historiador. Existem as fotografias produzidas pela esfera do privado: em nossos álbuns de família encontraremos os retratos que testemunham nosso singular percurso escolar. Ao vê-los, torna-se mais fácil entender porque a educação é produzida socialmente: as fotos não apenas sinalizam para os valores da instituição como apresenta a rede afetos que o passado não encerra: fotos com as "tias", com colegas, com inspetoras, porteiros.

Fotos de desfiles, fotos de formaturas, festas juninas, com a professora, com a turma. Tantas são as imagens que produzimos sobre momentos de alguma forma significativos a nossa história escolar Instantes "congelados" de várias passagens de nossas vidas como alunos, como professores. De certa forma, os retratos trazem uma proximidade com outros instantes, com outros tempos, como se as fotos fossem "relíquias" ou dispusessem de uma "força misteriosa" como sugere um apaixonado e surpreendente Kafka.

Nota de rodapé:

41. Diferente das escolas públicas, especialmente dirigidas para crianças originadas das classes populares, as escolas particulares primárias praticamente silenciavam sobre a existência de um ensino profissional stricto sensu, inexistindo fotografias de atividades pedagógicas, curriculares ou complementares, preparatórias para uma terminalidade que implicasse em umahabilitação profissional.

Fim da nota de rodapé.

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Quando olho sua pequena foto, sempre me surpreendo com a força que nos une. Atrás de tudo o que há para contemplar, atrás do rosto querido, dos olhos serenos, do sorriso, dos ombros que se gostaria de abraçar o mais depressa possível, atrás de tudo isso, agem forças que me são próximas e tão indispensáveis. Tudo isso é um mistério.42



Embora polissêmicas, podemos investigar representações que remetem aos olhares sociais sobre a educação escolar e, identificar os atores que os produzem- o aluno, o professor, a família, a escola. Na representação fotográfica, a ideologia apresenta-se através de uma figuração que pode ser delimitada e analisada em suas "unidades significantes"-o livro, o mapa, aformatura, o prédio no segundo plano, o capelo, o anel de formatura etc. Essas unidades são detentoras de significados que remetem a uma visão de escola voltada para a ordem, para a disciplina, para o reconhecimento do poder da escola, do professor, da autoridade educadora da família, do patriotismo.

Em sua obra clássica, "Un art moyen - essai sur les usages sociaux de la photographie" (1965), Pierre Bourdieu estudou as práticas fotográficas em grupos médios franceses, identificando sua utilização como um "totem": as fotografias serviriam para uma uniformização do sistema ético e estético daquele grupo social. As fotografias familiares estariam envoltas em um culto doméstico, "reunindo cerimônias institucionais como os casamentos, os aniversários, as bodas, o batismo, a comunhão cristã, a viagem de férias ou de núpcias", inscrevendo-as na instância do ritual, com a função de "sancionar" e "consagrar a união familiar".

Em suas cerimônias, as pessoas se fazem fotografar porque a fotografia realiza a imagem que o grupo faz de si mesmo; o que ela registra em seu suporte foto sensível não são propriamente os indivíduos enquanto tais, mas os papéis sociais que cada um desempenha: pai, mãe, avó, marido, debutante, militar, turista.

A maior parte das vezes, a fotografia só existe e subsiste por sua função familiar, ou melhor, para a função que lhe confere o grupo familiar, que éade solenizar e eternizar os grandes momentos da vida familiar e de reforçar a integração do grupo, reafirmando o sentimento que ele tem de si mesmo e de sua unidade.43

As fotografias presentes nos álbuns fotográficos privados, construídos ao longo de décadas pelas famílias, falam de uma história não oficial no sentido de que a "agência" que as produz não se vincula imediatamente à compromissos para além do próprio grupo. Enquanto uma forma de "história pelas imagens", sua autoria, função e mensagem remete apenas de forma mediata ao Estado ou à instituições.

Notas de rodapé:

42. Kafka, carta dirigida à sua companheira.

43. BOURDIEU, apud MACHADO, 1983.P.55.

Fim das notas de rodapé.

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Seu foco volta-se para seus membros e seu conteúdo dialoga com a cultura familiar que atualiza a identidade e laços entre seus pares, seja através do registro fotográfico, seja em sua conservação, seja em sua fruição em outras ocasiões. Todavia, embora exista essa relativa autonomia, os valores ideológicos hegemônicos exercem sua influência tanto na oportunidade do registro, quanto em sua composição, ou na forma de preservação e exposição como valor de culto, uma vez que seu campo discursivo tem ampla intersecção com aquele institucional.



Ao observarmos as fotografias feitas por amadores, após os anos setenta- quando difundiu-se a câmera automática, de baixo custo, as imagens remetem a campos discursivos imagéticos, onde os signos não surpreendem. Para além do foco principal dessas fotos, dirigidas ao aluno e à família, as imagens recuperam a edificação escolar, a sala de aula, a presença da professora, firmando sobre a escola um "dizível" que pré existe àqueles que participam da construção da imagem. A linguagem e a "memória" discursiva e compositiva constróem o sujeito, estruturando a expressão de seu pensamento imagético.

Quando produzidas por um olhar "adulto", dos pais, dos tios, as fotografias tem uma forte influência compositiva e sígnica do campo discursivo institucional. Em outras palavras, os signos privilegiados pelo mundo adulto, privado, reiteram de forma geral as representações do mundo oficial. Enquanto estudantes ou professores participamos como figurantes em imagens fotográficas registradas por parentes e amigos. Podemos mesmo estabelecer alguns momentos em que esses registros foram quase obrigatórios, documentando cenas que são recorrentes no universo da escola.

Eventos? Encontraremos as fotos de festas juninas, as festas "do índio", da "árvore", do "Soldado", da "Bandeira", de "fim de ano". À cada uma, na origem desse cotidiano "festivo", a possibilidade de identificarmos o fio ordenador de uma pedagogia preocupada em provocar a socialização da criança pela ludicidade de atividades festivas, congregadoras do educando junto aos demais e a temas sociais, a partir de um envolvimento lúdico, socializando-a para a ecologia, a cultura, diferentes costumes, a pátria. Modernamente, as imagens dessas festas indiciam uma intensa socialização. Nas imagens estamos sempre cercados de amigos, de colegas, de professoras, numa palavra, de afetos - e da apropriação de uma temporalidade - as fotos sempre remetem à festas recorrentes - envolvendo o crescimento do aluno e associando sua figura a outros personagens.

Nas imagens produzidas pelas famílias, existem aquelas que remetem a eventos mais solenes, como as formaturas. Nelas, a escola reafirma o ritual,

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impregnando na comunidade (e em nosso olhar) sua autoridade e competência na formação dos indivíduos. Nas imagens das formaturas, a comunidade "se curva" e aceita o poder social da escola. Nas fotos desses eventos encontram-se signos da escola como veículo promotor de ascensão social. O assujeitamento a esses valores inicia-se muito cedo, nas formaturas de pré-escolar para a Classe de Alfabetização, das quartas para as quintas séries, na passagem do Ensino Fundamental e no do Ensino Médio.



Nas imagens, a escola como socialização, exercício de afetos e de valores presentes na sociedade: a "tia" abraçada com as crianças, a presença do livro, do "canudo", a beca, o capelo, o anel de formatura, solenizando esses momentos de passagem, o palco - símbolo de uma exposição social favorável, além da presença, como testemunhas, de figurantes familiares.

Um momento fotográfico nas fotos familiares é inevitável: os desfiles escolares. Deles não escapam as crianças do CA - para delírio das mães e desespero das professoras - fotografadas intensamente, presença garantida nos álbuns familiares. Nessas fotos solenes, a escola como que readquire símbolos de uma "nobreza": as luvas brancas, o uniforme engomado, de "gala" muitas vezes - ainda que mantendo-se o sapato, desconfortável e pouco elegante, no entendimento das adolescentes.

Os desfiles, embora de curta duração e representando um tempo ínfimo daquele que vivemos na escola, dispõem de um número desproporcional de fotos ao longo de nossa vida escolar. Porque das ênfases nesses desfiles: para a comunidade? É possível identificar na materialidade das fotografias registrando a marcha, as bandas, a homogeneidade das formações em ordem unida o esforço da escola em ser representada como ordem, disciplina.

Podemos afirmar que as fotos privadas servem à novas abordagens historiográficas. Em pesquisas de história oral, o recurso à fotografia é uma excelente estratégia porque detona nos entrevistados sentimento vivo sobre um tempo passado ainda presente, compondo vivamente sua identidade - detonando as imagens uma rede de lembranças. Em muitas ocasiões, quando observando fotografias que remetem à um tempo investigado, o depoente emociona-se e fala com cumplicidade. Em pesquisas iconográficas, as fotografias dos álbuns de família indiciam um olhar de grupos privados, de famílias, cujas imagens "ecoam" o campo discursivo institucional. Finalmente, as fotografias quando produzidas pelo olhar do adolescente remetem a outros compromissos, descentradas da escola "oficial", descomprometída da liturgia diretiva, remetendo a composições interdiscursivas que falam a partir de um novo lugar.

A partir dos anos setenta, com o advento da câmera automática kodak, adolescentes dos segmentos sociais médios tornaram-se mais "sujeitos do

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olhar", possibilitando o surgimento de fotografias produzidas a partir de "outros lugares". As fotografias indiciam um "olhar" que se libera dos símbolos hegemônicos alterando-se a lógica da figuração quanto à postura corporal, as roupas, ambientações e paisagens. Essas fotos, de extrema riqueza, falam de uma escola menos comprometida com os conteúdos e mais socializadora, afetiva, lúdica: surgem imagens dos alunos abraçados, alegres, reapropriados de seu corpo e de sua liberdade, numa perspectiva que se opõem aos horários, as aulas, as provas, a disciplina que caracterizam o tempo escolar oficial.

Recordo-me do filme "Cidade de Deus" onde o personagem principal, "Buscapé" aprende-se sujeito, numa rede de sociabilidade materializada nos registros que faz com sua máquina fotográfica: neles figuram o "matar a aula" com a "turma", a praia e os namoros. De fato, quando acessamos acervos particulares de antigas normalistas dos anos setenta e oitenta é possível identificarmos, mesmo em momentos e espaços ordenados pelo protocolo da direção escolar, as fotografias feitas pelas alunas com perspectivas próprias: as saias discretamente elevadas, as blusas fora da ordem dos cintos, as meias rebaixadas ou, na rica oportunidade do último dia de aula, o uniforme literalmente escrito com as saudações dos amigos mais queridos, produção de textos que torna o corpo um livro. Para qual lugar, na ordem dos discursos, deslocam- se essas imagens? Seguramente, para um espaço fora do campo do sagrado, interditadas dos álbuns familiares, permanecendo nas gavetas ou caixas, materialidade de uma memória silenciada, testemunha anônima de uma escola cotidiana, densa em sua rede de cumplicidades e resistências.

3. Caminhos da fotografia na educação

A imagem pode ser fiel, deformada, descolorida, sem valor documentário, procede por sua gênese da ontologia do modelo; é o modelo. Daí o encanto dessas fotografias de álbuns. Essas sombras cinza ou sépia, fantasmáticas, quase ilegíveis, não são mais os retratos tradicionais de família, são a presença pertubadora de vidas detidas em sua duração, libertas de seu destino, não pelos prestígios da arte, mas pela virtude de uma mecânica impassível.

A fotografia não cria, como a arte, a eternidade, não embalsama o tempo, apenas o subtrai de sua primeira corrupção; afotografia beneficia-se de uma transferência de realidade da coisa para sua superprodução.44

Nota de rodapé:

44. Para André Bazin, seria preciso introduzir aqui uma psicologia da relíquia e dalembrança que se beneficia igualmente de uma transferência de realidade que procede do complexo de múmia Assinalemos apenas que o Santo Sudário de Turim realiza a síntese da relíquia e da fotografia. BAZIN, André, apud, DUBOIS, p.80.

Fim da nota de rodapé.

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As fotografias podem servir à uma melhor compreensão do universo da escola? Responderíamos afirmativamente. Primeiro, como signos simultaneamente icônicos, indiciados, simbólicos, informando sobre instâncias da cultura escolar. As fotografias permitem indiciar os sujeitos que dela participam, relacionando-se - professores, inspetores, alunos, pais. As fotografias enfim confirmam um definido instante e lugar, um espaço tempo. A imagem diz, sempre, um "ali" e um "agora" sobre a escola.



As fotografias portanto podem transformar-se em fontes históricas iconográficas, possibilitando a pesquisa sobre o mundo escolar em determinada época e espaço, remetendo ao vestuário, aos tipos étnicos, à composição sexual, à arquitetura escolar, aos materiais e recursos pedagógicos, desde que relacionados à fontes de outras naturezas (escritas, orais etc), quando organizadas em séries temáticas - agrupadas por períodos, por fotógrafos, por contratantes, por comunidade ledora - podem sugerir discursos não verbais, indiciando campos discursivos nos quais estão presentes ideologias, estéticas, enfim, uma gnose que organiza e dá sentido à visualidade.

As imagens fotográficas podem servir como recursos didáticos ao tratamento de conteúdos curriculares? Responderíamos afirmativamente pois é possível utilizá-las como "motivadores", como "estratégia", sem cair na tentação "ilustrativa". A fotografia, como linguagem, é objetivo transversal, permitindo a discussão de assuntos nas mais variadas disciplinas, possibilitando a abordagem de questões sociais amplas a partir, inclusive, da comparação entre a produção fotográfica privada e aquela produzida pelo Estado ou sociedade civil.

Quando de sua utilização na educação formal, a fotografia realiza uma intensa mediação na construção das subjetividades, principalmente quando optamos em nos utilizar das fotografias familiares, permitindo a emergência da experiência pessoal, familiar. Nesses casos, a fotografia indiciando histórias familiares melhor viabiliza a compreensão da escola como "produção social", de conhecimentos, de hábitos, de ideologias, de práticas.

Em uma situação fica expressa a importância das fotografias: o desabamento do prédio residencial Palace II, na Barra daTijuca, na cidade do Rio de Janeiro. Os jornais no trato com a tragédia abordaram uma situação significativa: moradores choraram a perda não do imóvel em si mas de documentos que remetiam à história de suas vidas: fotografias de infância, das famílias reunidas, chapas em raio-X dos filhos ainda no ventre das mães. O jornal registrava o fato de que um dos ex-moradores ficara feliz por ter encontrado entre os escombros seus álbuns de infância. Tudo isso emociona

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no sentido de que ali há um tempo, um aí temporal cindido do aqui, do agora, em estranhamento com o espaço e tempo do presente que torna a foto nos álbuns familiares mediadoras da construção dos sujeitos.



A foto, literalmente, como objeto parcial (no sentido freudiano), oscilando entre a relíquia e ofetiche, levando da "Revelação"até o milagre. Num modo mais trivial, toda a prática do álbum de família vai no mesmo sentido: além das poses congeladas, dos estereótipos, dos clichês, dos códigos fora de moda, além dos rituais de organização cronológica e da inevitável escansão dos eventos familiares.

O álbum de família não cessa de ser um objeto de veneração, cuidado, cultivado, conservado como umamúmia guardado numa caixinha (com os primeiros dentes de bebê, ou com a mecha de cabelos da vovó); só se abre com emoção, numa espécie de cerimonial vagamente religioso, como se tratasse de convocar os espíritos.

Com toda certeza, o que confere tamanho valor a esses álbuns, é sua dimensão pragmática, seu estatuto de índice, seu peso irredutível de referência, o fato de se tratar de verdadeiros traços físicos de pessoas singulares que estiveram alie que tem relações particulares com aqueles que olham as fotos.45

As imagens fotográficas podem servir a uma "educação do olhar"? Como Proust, a humanidade ainda realiza no século XXI um movimento de busca de suas lembranças, esse esforço realiza-se por mediações também imagéticas, marcadas por práticas midiáticas: o vídeo, a fotografia digital, o blogger, o site, o portal. Definir os fundamentos que dão sentido à essa apropriação é tarefa dos profissionais que atuam na educação, renunciando à magia que emana da fotografia mas não ao exercício de sua fabulação narrativa. À medida que a sociedade é saturada por imagens construídas na lógica da mercadoria, a escola, entre outras atribuições, deve sistematizar conhecimentos voltados à historicização desse recurso como forma de garantir o exercício das experiências narrativas pelo indivíduo, reafirmando sua subjetividade e o direito à partilha do que o mundo produziu como humanos sentidos.



Nota de rodapé:

45. DUBOIS, Philippe. O Ato Fotográfico e Outros Ensaios. São Paulo: Ed. Papirus, 1994. p. 80.

Fim da nota de rodapé.

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Bibliografia

AUMONT, lacques. A Imagem. São Paulo, Campinas, Editora da Universidade de Campinas, 1993.

BARROS, Armando Martins de. Da Pedagogia da Imagem às Práticas do Olhar: uma busca de caminhos analíticos. Rio de Janeiro, Universidade Federal do Rio de Janeiro, Pós Graduação em Educação. Tese de Doutoramento, 1997.

—. Práticas discursivas ao olhar. Da vidência e da cegueira na formação do pedagogo. Rio de Janeiro: Ed.E-Papers, 2003.

CHARTIER, Roger. A História Cultural entre Práticas e Representações. Lisboa: Ed.Difel, 1990.

DEBRAY, Regis. Vida e Morte da Imagem. Rio de Janeiro, Petrópolis, Ed. Vozes, 1994.

DUBOIS, Philippe. O Ato Fotográfico e Outros Ensaios. Campinas, São Paulo, Ed. Papirus, 1994.

MACHADO, Arlindo. A Ilusão Especular. São Paulo: Ed. Brasiliense, 1983.

NUNES, Clarice. "História da Educação Brasileira: novas abordagens de velhos objetos". In: Revista Teoria e Educação. Porto Alegre. Ed. Panorâmica, n. 6, 1992.

SAMAIN, Etienne. Revista Imagens. São Paulo, Campinas: Universidade de Campinas, n. 3, 1995.

SILVA, Carlos Eduardo L. "Blade Runner - O caçador de andróides". In: LABAKI, Amir (org.). O cinema dos anos 80. São Paulo: Editora Brasiliense, 1991.

VOUVELLE, Michael. Ideologias e Mentalidades. São Paulo, Ed. Brasiliense, 1991.

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Atividades Complementares

Leitura: Retratos de Família

Carlos Drummond de Andrade

A moldura desse retrato em vão prende personagens, Estão ali voluntariamente, sabendo, se preciso voar.

Os parentes mortos e vivos, já não distingo os que foram dos que restaram. Percebo apenas a memória, viajando através da carne.

Os meninos, como estão mudados. O rosto de Pedro é tranqüilo, usou os melhores sonhos, E João não é mais mentiroso.

Vinte anos é um grande tempo, Modela qualquer imagem. Se uma figura vai murchando, outra sorrindo, se sobrepõe.

Esses estranhos assentados, meus parentes? Não acredito, são visitas se divertindo, numa sala que se abre pouco.

O jardim tornou-se fantástico. As flores são placas cinzentas. E a areia sob pés extintos, É um Oceano de névoa.

Ficaram traços de família perdidos no jeito dos corpos. Bastante para sugerir que um corpo é cheio de surpresas

No semi círculo das cadeiras, nota-se certo movimento. As crianças trocam de lugar Mas sem barulho; é um retrato.



Leitura: Retratos

Cecília Meirelles

Não há quem não se espante, quando mostro o retrato desta sala, que o dia inteiro está mirando, e à meia-noite em ponto fala.

Na outra noite me disse: "A morte leva a gente. Mas os retratos são de natureza mais forte, além de serem mais exatos. Quem tiver tentado destruí-los, por mais que os reduza a pedaços, encontra os seus olhos tranqüilos mesmo rotos, sobre os seus passos.

Minha família anda longe, com trajos de circunstância; Minha família anda longe, - na Terra, na Lua, em Marte. Uns dançando pelos ares. Tão longe, a minha família! Tão dividida em pedaços! Um pedaço em cada parte

Pelas esquinas do tempo,

Pelas esquinas do tempo, brincam meus irmãos antigos: Seus vultos de labareda rompem-se como retratos feitos de papel de seda".

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Texto: A guisa de iniciação a uma magia: memórias das práticas fotográficas familiares

Armando Martins de Barros -

Esse retrato de família está um tanto empoeirado. Assim Carlos Drummond de Andrade inicia sua poesia "Retrato de Família" onde, de forma sensível, limpa o pó depositado sobre a memória que brota das fotografias. Minha família também se retrata. Muito, até, mas sem excesso. Buscamos o instante - eterno? - daquele sorriso gostoso, a agradável reunião familiar, o reencontro de parentes e amigos, tão distantes e, por vezes, tão perto. Assim nos fizemos, retratados viajantes: em campos, em praias, em montanhas. E simultaneamente, acomodados em espaços opostos: em molduras sobre cômodas, entre estantes: quietos, porém voando.

Mas a tradição familiar no uso da fotografia ainda é jovem, nem de diamante fez as bodas. São parte de usos e costumes de uma geração dos Martins de Barros recente, introna nos quarenta. Antes dela, eram as fotos raros eventos, associados às efemérides dos Barros em Poços de Calda ou a casamentos e batizados dos Martins, em Santa de Japuíba.

Talvez a próxima geração da família - a dos Martins "Gordotex" ou dos Martins Gioia - veja suas imagens de forma muito diversa: em cassetes, video-laser, na Web. sim, tudo é possível. Mas, não importa - azar o deles! - pois, nossa geração, cresceu e fez-se balzaquiana sob a fascinação dos álbuns. Neles estranhos porta retratos, verdadeiras biografias familiares foram construídas em imagens de diferentes tamanhos: às vezes, carreirinhas de 3x4, reunindo amigos e parentes; às vezes, ampliadas, imagens tão antigas que ainda eram coloridas em pinturas, em todas, porém, lá estamos - preto no branco! Importa pois é a magia que entre a névoa do tempo chama a memória do outrora.

Ormezita Martins de Barros. Filha de Alencar Ferreira e Izabel Martins. Viúva de Ivo Carreira de Barros, mãe deToni, Beth, Bel, Helô, Mando, Duda. Avó de Paula, Pedro, João, Laura, Beatriz. Zita é a transição de tempos imagéticos. Quando jovem, as fotos eram bissestas, com poses medidas e olhares para o eterno.

Quando Zita nasceu, eram as fotos nos anos trinta cobertas por domingueiras vestes, em sorrisos respeitosos e atmosfera prá lá de decente, sempre à espera de um "click" formal. Mas, depois de prontas, maturadas pelo passar da vida. ah! quantas disputas acaloradas pelo prazer de sua posse. Muitas fotos foram escondidas ou roubadas pelo desejo espontâneo e sincero daquela fatia do antigo ser comida por muitos olhos. Os retratos, muitas vezes,

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vergavam em estranhas viagens, reunindo um sem número de dedicatórias, como que transformadas em estranhos transatlânticos, partindo para um tempo longínguo e desconhecido, apinhadas em seus versos por afetos passageiros ou clandestinos amores.



Folheando os álbuns de família sempre encontro imagens representativas das muitas trajetórias dessa mulher que foi e é ora companheira, ora mãe, ora avó. distinguo as várias trajetórias por que todas as fotografias calam quando uma outra misteriosamente fala. O olhar é um aprendiz de feiticeiro: há magia nas imagens que como a Lua, oculta fases, faces e poses.

A cada uma das imagens que revisito nos álbuns, que profusão de sentimentos! Quantas esperanças e expectativas suspensas por um flash eterno. O futuro inteiro brilha em sorrisos que como olho d'água não mingua. Para comentar essas fotos, explicando o incognicível, somente com outra magia, bem vinda de um feiticeiro. Quem fala é a poesia, que ora tem nome de Drummond:

A moldura desse retrato

Em vão prende personagens.

Os parentes mortos e vivos,

já não distingo os que se foram.

Os meninos, como estão mudados.

No semi circulo das cadeiras,

nota-se certo movimento.

As crianças trocam de lugar

Mas sem barulho: é um retrato.

Programa de TV: Brasil Legal: Fotografia

Com Regina Casé, TV Globo.

Perpassando todo o vídeo, a compreensão de que as imagens técnicas não apenas mediam através da fotografia, vídeo, infografia, informações produzidas em diferentes campos disciplinares, mas também produzem conhecimentos referentes ao tratamento verbo-visual.


  1. O Programa Brasil Legal

Com direção de Pantoja e apresentado pela atriz Regina Casé, o programa tematizou a fotografia, apresentando-a como "produção social", isto é, envolvendo práticas em torno de diferentes agentes que produzem o registro (fotógrafos), fazem as encomendas (contratantes), são objeto do registro

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(fotografados) ou o preservam e usufruem (observadores), conservando ou re-inventando suas significações originais. Assim, a fotografia como produção social envolve preliminarmente "práticas sociais" que a produzem mediante diferentes agentes, construindo uma relação intrínseca entre "imagem" e "olhar".



1.1. O Fotógrafo

No tratamento do "agente fotógrafo", o programa acompanhou fotógrafos profissionais de diferentes classes sociais, sejam aqueles que se dirigem aos consumidores mais populares em jipes que alcançam os mais distantes distritos e recebem o pagamento em animais e alimentos, sejam aqueles que se voltam aos grupos médios, realizando seu trabalho em pequenos estúdios onde realizam imagens construídas em cenários previamente montados, sejam aqueles que corrigem fotografias já existentes através de restaurações, seja o fotógrafo de grupos dominantes, especializado em casamentos, festas de debutantes, bodas, sejam, finalmente, os fotógrafos propriamente artísticos, no caso, a fotógrafa de fachadas de casas e o assistente de fotografia de Orson Well

Observando a fotografia amadora, o programa acompanhou, a partir do contato em uma loja de revelação - bela estratégia não? - alguns desses fotógrafos de fim de semana. Nesse caso, observamos uma senhora, empregada doméstica, recentemente alfabetizada; uma cearense que tem como hobbie posar em nu artístico; uma recifense que fotografa os namorados para fugir da solidão eventual.

1.2. O Contratante

A dimensão simbólica, presente em todo o processo fotográfico, pode ser melhor apreendida ao observarmos as razões que movem os "contratantes" a fazer as fotos, restaurá-las ou detê-las em suas paredes ou álbuns fotográficos. Vejamos algumas seqüências do programa:

Em uma praça de Fortaleza, tendo como cenário de fundo um lençol estampado, um homem simples apresenta sucessivamente, como uma história linear, a biografia de sua família: a sua foto sozinho, a que registra seu casamento, seguida da que registra o batizado do desejado filho e, a mais recente, onde aponta orgulhoso o filho já crescido. Seria a fotografia nesse caso, como o da maioria da população brasileira, uma forma das pessoas recuperarem sua memória, transformando-a em uma espécie de biografia oficial e que lhe permite seu enraizamento no tempo?

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O programa registra também o processo de registro fotográfico de uma festa de 15 anos no círculo das classes dominantes, onde um casal de gêmeos encomenda as imagens buscando em todas as tomadas e situações, apresentar ícones que indiciem seu status: o vestido importado da menina (com citação do estilo grego, próprio das classes em permanente ócio), o local da festa, o ritual seguido.



Uma mãe que, como contratante de fotografia, busca registrar os primeiros ferimentos do filho, indiciando uma característica de comportamento ambígua (teria presente uma perversão?).

Um rapaz que, com 18 anos, é obrigado a se deixar fotografar com um falso paletó e de gravata por que o exército exige esse vestuário. O adolescente entende a imagem como uma "foto decente" e com baixa estima, entende sua imagem tão ruim quanto na vida real.

Um adulto que desejoso de imigrar para a Itália, encomenda fotografias de nu, supostamente artístico, que lhe permita apresentar em agências de modelo. Suas imagens, especialmente a deitada na areia da praia, sugerem fotos realizadas com bebês nas mesmas posições.

Teria nosso senso estético um crescimento, uma educação, podendo amadurecer ou, mesmo regredir, a partir de informações?

Há uma mulher grávida, próxima do parto, pertencente à classe média, que se deixa fotografar em closes da barriga para registrar o corpo grávido. Em seu caso, mãe solteira, a imagem não é motivo de vergonha, mas afirmação de uma representação que tem de si - diz ela: eu nasci para ser mãe.

Finalmente, um adolescente que tolhido em seu comportamento homossexual pela moral de Fortaleza, vê como solução fazer fotografias em estúdio, onde pode, afirma, "ser finalmente como pensa que é".

Uma representação presente para além do figurativo na foto - podemos dizer que a fotografia teria assim uma dimensão sígnica, expressando e substituindo um objeto real que ali é semelhante (signo icônico); sugerindo uma ação, um lugar, uma situação que se realiza durante o registro (signo indiciário); expressando valores morais, ideológicos, religiosos do contratante (signo simbólico). Vejamos dois casos que de alguma forma envolvem a moral e religiosidade:

Regina Casé acompanha as fotos em estúdio de uma criança prestes a realizar sua primeira comunhão (rito católico). No processo de registro o fotógrafo define as posições em que a criança deve ficar para indiciar uma ação (mão levantada com cálice simbolizando a cerimônia de divisão do pão e do vinho na última ceia); um olhar cândido (simbolizando a pureza e santidade);

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A entrevista com um operário onde a apresentadora consegue reconhecer na carteira do entrevistado diferentes imagens. Juntos, lado a lado, um calendário com uma mulher nua no verso e um santinho, com a figura de Nossa Senhora. Convivem, sincreticamente? Expressam, simbolizam elementos do universo de representação daquele indivíduo?



1.3. Observador

Entre as práticas da fotografia, o agente "observador" é um elemento significativo. É ele quem, privadamente, preserva os acervos, mantém a significação original das fotos ou, reinventa sua significação em função de seus próprios valores ou intenções, transformando a simbologia original presente no momento do registro em uma nova. Isto acontece em grande parte com as fotos que detemos de nossos avós ou bisavós e que mandamos (como o fizeram clientes no interior do Ceará) restaurar fotografias com 50, 60 anos. Para nossos parentes, quando do registro, o importante era o status, a possibilidade da existência de sua imagem em fotografia. Para nós, vale a existência da imagem da família em um outrora, quase que o registro da própria história.

No programa, Casé entrevista uma mulher, mãe, solteira, que abre seu álbum com fotografias de namorados quando em solidão. As fotos confirmam uma identidade em crise e, portanto, como hipótese, de alguma forma simbólica, muito poderosa, exerceria uma função cultural?

2. A Fotografia como Trabalho e Cultura

É possível pensarmos a dimensão de "Trabalho" presente na ação do fotógrafo? Creio precariamente que sim. Mais do que o exercício de uma profissão, rentável e voltada para sua subsistência, o tratamento da natureza e sua transformação, considerando sua re-significação e humanização transforma essa prática numa produção humanizada de conhecimentos e firma como postulado "o trabalho como princípio educativo".

O próprio fotógrafo se aprende aprendendo na prática, quando a teoria se refunda em prática e a prática se re-inventa como teoria. Vejamos alguns casos presentes no programa:

o fotógrafo que trabalhou com OrsonWells reconhece como foi importante o aprendizado de um novo enquadramento, não mais necessariamente centrado, o jogo de diferentes planos, uso do primeiro, segundo e terceiro plano, a importância da luz;

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o fotógrafo de estúdio, voltado para as classes médias, descobre novas posições, seja fotografando o "aparelho reprodutor" de um velho, seja fotografando a fronte de uma menina de forma que seus seios estejam realçados sem que o observador os veja, seja criando soluções para que um bebê mantenha sua atenção voltada para a câmera no momento do registro.



3. A Fotografia no Contexto da Escola e da Produção de Conhecimentos

Se o Trabalho deve ser considerado um princípio educativo, educando o homem e fazendo com que produza conhecimentos que o humanize assim como ao grupo social a que pertence, como pensarmos esse processo no interior da escola? Como incorporar em termos de metodologias a fotografia e seus agentes (fotógrafo, fotografado, contratante, observador) como informação de análise, viabilizando a transmissão de conteúdos em pesquisas didáticas para alunos do primeiro e segundo Graus? Como código de significação, por deter um campo semântico próprio, como viabilizar a produção de conhecimentos voltados à própria imagem fotográfica, videográfica, infográfica para trabalhos monográficos, de fim de curso, na Universidade?

A empregada que se alfabetizou tem latente nas fotografias o orgulho de ser diferente do que foi, pois agora não é mais analfabeta. Em sua temporalidade própria, os netos não farão com ela o que os filhos fizeram: mangar de sua ignorância com a escrita);

Importa observar que a mesma personagem faz questão de mostrar um livro dado pela professora com dedicatória. A dedicatória é tão importante quanto o livro e encontra-se no livro. O que isto significa? Que o livro foi ressignificado, isto é, sua significação original, como apenas um livro para ler, foi re-inventado pela professora, lembre-se do título: "Você é insubstituível") quando escolheu o título e escreveu uma dedicatória que o torna pessoal e intransferível;

Quando Casé ingressa em uma livraria com a personagem, em busca de um livro de Paulo Freire, podemos lembrar que as fotos daquela mulher, alfabetizada e trabalhadora tica detém uma organicidade com as imagens feitas pelo educador para alfabetizar os grupos populares;

As fotos podem servir para indiciar comportamentos sociais, valores simbólicos, uma ideologia e práticas de grupos sociais. Senão vejamos, a mesma adolescente que realiza grandes gastos com fotógrafo profissional, festa em tradicional clube de Fortaleza, vestidos importados é a mesma que estuda em colégio de Natal voltado apenas para a educação doméstica e sua preparação para o papel de esposa de dona de casa.

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Aprendemos melhor os códigos da fotografia, enquanto técnicas de tomadas e conteúdo informativo, se nos for possível discuti-los na escola. Essa "educação do olhar" enquanto síntese, que nos aparelha a melhor entender os sentidos das imagens, sua estética e intenções encontra-se latente em todos os indivíduos, faltando-lhes apenas a oportunidade.



O fotógrafo que aprendeu a profissão aos seis anos quando um fotógrafo passou por ali

A fotógrafa que aprendeu fotografia no dia que alguém lhe deu uma máquina em um aeroporto



Oficina: Análise de Séries Fotográficas sobre Educação Escolar a partir de álbuns privados

O trabalho com as imagens tem grandes implicações cognitivas: aumenta a intensidade do olhar, mas também a qualidade da imaginação, reveladora da realidade semi- imaginária do homem. A descoberta do significado da imagem não existe independente do espectador e a cautelosa tarefa do professor consiste em não impor interpretações, mas favorecer comparações e diálogos.

1. Recolher um número suficiente de fotografias familiares enfocando as escolas, obrigatoriamente identificadas quanto ao local e data de registro, através de pesquisa junto aos seus proprietários;

2. Construir seqüências temáticas: EVENTOS (desfiles e formaturas); POSTAIS (quando sozinho ou em grupo;

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3. Após identificar o LOCAL e o ANO, identificar as figuras SIGNIFICANTES, que poderiam traduzir, em sua figuração, valores, representações, ideologias (em suas imagens, por exemplo, o vestuário, personagens, mobiliário, arquitetura, ações dos figurantes, traduziriam novos SIGNIFICADOS?);



4. Após as identificações realizar a primeira leitura: na disposição das figuras a cada fotografia, à luz do texto estudado, quais os elementos enquanto interpretação, seriam possíveis de serem retirados da imagem?

5. Não deixe de colocar o trabalho com uma capa na qual apresente no cabeçalho as seguintes informações: nome da universidade, faculdade de educação, atividade "pedagogia da imagem", professor, nome do aluno, título do trabalho, período do curso, mês e ano.

6. Na folha seguinte coloque o índice das fotos

Caso utilize citações ou consulta a literatura, utilize na última folha, "bibliografia".

4. Algumas observações que podem ajudá-lo na realização do trabalho

Como observa Mirian Moreira Leite, "a iniciação às mensagens visuais não pode se limitar a um aprendizado terminológico de leitura, pressupõe exercícios constantes de olhar.

A decifração de uma mensagem visual é uma tarefa sem fim, que pode ser iniciada pelo conteúdo manifesto, uma unanimidade de compreensão, mas que precisa também levar em conta o conteúdo e as interpretações possíveis".

Não esperamos que você faça nenhum "tratado" sobre as imagens, o que está em questão é a possibilidade de recorrermos às fotografias como fonte informativa e objeto de interpretação. Isto significa reconhecermos que o nosso olhar quando observamos as fotos encontra-se subordinado ao olhar de um sujeito oculto pela imagem: o fotógrafo. O quê esse personagem, presente no contra-campo da imagem (o contra-campo é onde encontra-se o fotógrafo, ou seja, em um lugar de onde a foto é realizada) desejava realçar? O que deixou de focar? Por quê ele optou por um determinado instante para registro e não outro? Essas são algumas de nossas questões.

É importante que você tenha em mente que esta Unidade é quase introdutória e trabalha com objetivos limitados. Buscamos apenas sensibilizá-lo, mediante trabalhos da natureza deste para a importância da imagem fotográfica como fonte histórica relevante quando da análise do universo escolar.

O objetivo do trabalho é de compreendermos que as fotografias remetem a uma história não apenas pessoal e familiar mas também à uma cultura

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determinada, enfim, defendemos a convicção de que as imagens fotográficas são portadoras de signos que, por sua vez, expressam um imaginário, valores, ideologias.



Finalmente, saiba que neste exercício de interpretação, não existem respostas prontas. A cada vez que nos determos sobre as fotografias, a cada vez que compararmos seus figurantes, analisando a disposição dos objetos que os circundam, mais informações podemos extrair.

A medida que nos debruçamos sobre nossas fotografias as imagens serão as mesmas? A resposta é afirmativa: lá estarão os mesmos recortes de papel, iluminados por nossa imagem. Todavia, nosso olhar estará permanentemente mudando, desde que estejamos atentos e educando nossa observação e qualificando nossa visão.

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