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(27) Ibid.

(28) Struktura khudozestvennogo teksta, Issku.sstvô, Moscovo, 1970;

trad portuguesa (a partir do textofrancês de Éditions Socíales) de

Maria do Carmo Vieira Raposo e Alberto Raposo, Editorial Es-

tampa, 1978.

(29) Struktura..., loc. cit.

(30) AAVV, 1Introducción al estudio estructural de los sistemas de

signosn, in Los sistemas..., loc. cit.

(31) V. Ivanóv, aLafunción de la semiótica en la investigación ci-

bernética del hombre y de la colectividad=, irc Los sistemas..., loc.

Ctt.


(32) Cf. Prieto, Pertinence et pratique, Minuit, Paris, 1975.

(33) Haveria, aqui, que distinguir entre cornunicação e significação,

no sentido em que um texto comunica não só o que explicitamente

emite o emissor, mas o que o próprio texto, no seu desenvolvi-

mento, vai produzindo como sentido incorporado.

(34) Pertirzence et pratique, ed. cit., pp. 74 e 75.

(35) =Éléments d'une théorie socíologique de la perception artisfi-

ques Revue internationale des sciences sociales, vol. XX, pp.

640-664.

(36) Não poucas vezes esta dominação assume asformas de uma

arte esquerdizante.

(37) Cf. Prieto, Études de linguistique et de sémiologíe générales,

Librairie Droz, Genève, 1975.

(38) Crítica bajo control, Planeta, Barcelona, í970.

(39) De acordo com a terminologia de &nveniste, Cf. Émile Ben-

veniste, Principes de linguistique générale, Minuit, Paris, 1969.

(40) Cf. Jean-Pierre Voyer, Introduction a la science de la publicité,

Champs Libre, Paris, 1975. Ou Baudrillard, L'échange symbolique

et la mort, Gallimard, Paris, 1976.

(41) La struttura assettte, Bompiani, Milano, 1968.

I

TEORIA DA SEMIÓTICA DA CULTURA



QUE NOS TRAZ UMA ABORDAGEM SEMIÓTICA?

(1980)


I ÚRI M. LÓTMAN

A questão da relação entre ciência e arte merece a

nossa atenção. É suficiente para o mostrar referir os te-

mores que suscita no homem culto médio a simples colo-

cação do problema das influências recíprocas entre arte e

ciência, entre artes e técnicas. Ora, a cultura tem por vo-

cação, nomeadamente, analisar e dissipar os temores. A

apreensão que sefaz sentir em relação a uma cientificação

e a uma tecnicização da cultura remonta bem longe e tem

raízes profundas. O homem mecânico, o robot, a boneca

viva, a dominação dos autómatos, são pesadelos tradicio-

nais da cultura dos tempos modernos.

Mas é preciso sublinhar que, em primeiro lugar, esta

ideia quase mitológica tem porfundamento uma metáfora:

na realidade, o mundo das máquinas inumanas que aterro-

rizava osfilósofos e os românticos não tinha nada a ver

com o progresso real da ciência e da técnica. 1Quando Hoff-

mann imaginava bonecas insensíveis e autómatos cruéis

tinha diante dos olhos a enorme máquina social da aristo-

cracia prussiana onde o progresso da técnica e da ciência

exacta pouco tinha de espectacular. Em a Rússia de hIi-

colau I que V. Odoiévski conheceu nem a reacção russa

que influenciava pelo seu automatismo Saltykov-Chtche-

drineforam épocas em que a técnica transformasse a vida,

mas acordaram na consciência dos artistasfantasmas de

automatização de tudo que tivesse vida. A máquina é aqui,

portanto, apenas uma imagem metafórica de um movi-

mento inerte, de uma pseudovida, e não a causa real da

necrose.

Ensaios de Semiótica Soviética 28

O desenvolvimento actual da teoria da comunicação

mostra, em segundo lugar, que a interacção é o contrário

do nivelamento. A comunicação entre dispositivos idênticos

é inútil. 1 precisamente o nivelamento dos homens que

determina a paragem da comunicação. Esta torna-se de-

masiadofácil e,funcionalmente, inútil de todo. Pelo con-

trário, a especialização das diversas esferas da cultura,fa-

zendo da comunicação um problema semiótico complexo,

determina simultaneamente a sua necessidade recíproca.

Portanto, não se trata de transformar a ciência em cultura,

ou vice-versa. Quanto mais a artefor arte e a ciência ciên-

cia, tanto mais específicas serão as suasfunções culturais

e tanto mais o diálogo entre elas será possível efecundo.

É ainda necessário referir, em terceiro lugar, que as

nossas reflexões sobre o papel da máquina na cultura são

influenciadas sem nós o sabermos pela imagem das máqui-

nas que conhecemos. E se se tem em vista que à escala

das possibilidades potenciais da ciência todas as técnicas

modernas são rudimentares e pouco eficazes, ver-se-á que a

ideia do papel da técnica na cultura é inevitavelmente su-

plantada por uma outra que é a das possibilidades de acção

dasformas primitivas da técnica sobre as esferasfunda-

mentalmente complexas da cultura. A concepção mecânica

da máquina, que remonta à cultura do século XVII, se bem

que excluída da técnica moderna, permanece na cons-

ciência do homem civilízado dos nossos dias, travando não

somente o desenvolvimento das técnicas, mas também a

evolução geral da cultura.

A questão do impacte da técnica sobre a arte mos-

tra-se-nos, se não hipertrofiada, pelo menos desprovida de

interesse. A influência da arte sobre a técnica é bem

mais substancial. Ao longo dos séculos, o pensamento

científico e técnico orientou-se para a ideia de que o

mundo da Natureza está organizado de maneira ineficaz

e deve ser aperfeiçoado, que é preciso inventar o que a

Natureza não possui e racionalizar o que existe nela. Para

a consciência científica moderna, o mundo da Natureza é

um mecanismo extremamente complexo e racional de que

não podemos aproveitar a lição apenas porque estamos,

nesse campo, mal preparados. É precisamente isso que

limita as possibilidades da biónica. Ora, é exactamente a

Natureza que nos oferece os exemplos ideais de máquina

de auto-evolução ou pensamento, de máquina-personali-

Teoria da Semiótica da Cultura 29

dade, organismo único cooperando com outros organismos

únicos (como estamos longe das máquinas ideais desperso-

nalizadasfabricadas em série!). A complexidade dos orga-

nismos bioquímicos da Vida mostra todavia ser uma bar-

reira que ainda não conseguimos ultrapassar. Vem agora a

propósito evocar um outro objecto que, por um lado, pos-

sui traços de biossimilitude (por exemplo, a capacidade de

desenvolvimento autónomo, de armazenamento de infor-

mação no decurso deste processo e de abaixamento cor-

respondente da entropia no seu ambiente) e, por outro, é

um artefacto, e por isso sujeito a modelização. Pensamos

na Arte. Pode-se afirmar com certeza que uma obra de arte

é o que existe de mais complexo e defuncionamento mais

eficaz entre todas as coisas que o homem criou até ao

momento. Sob certos aspectos, a obra de arte é o protótipo

ideal da máquina dofuturo (tendo assimílado certos prin-

cípios estruturais da obra de arte, ofuturo objecto técnico

não a substituirá e não se lhe identificará; pelo contrário,

será então que a oposição funcional entre arte e técnica

aparecerá em estado "puro"1).

Tomemos um exemplo. Qualquer pessoa que se tenha

preocupado com o problema moderno do intelecto artificial

sabe que os progressos neste domínio estão bastante

aquém do que seria de esperar. Pensamos que uma das ra-

zões disso reside nofacto de os esforços realizados esta-

rem concentrados emfunções intelectuais relativamente

primitivas com as quais se esperava construir um todo

pensante, como se constrói uma casa com tijolos. Ora, o

próprio conceito de actividade intelectual está ainda mar-

cado pelofacto de o pensamento individual do homem ser

sempre um objecto único que recusa qualquer compara-

ção. 1 por isso impossível definir o que pertence a todo o

intelecto e o que é apanágio de uma das suasformas, o

pensamento humano.

A semiótica da arte e a semiótica da cultura permitem

actualmente, por um lado, ver na obra de arte criada pelo

homem um dispositivo pensante e, por outro, considerar a

cultura como um mecanismo natural historicamentefor-

mado de inteligência colectiva, possuindo uma memória

colectiva e capaz de realizar operações intelectuais. Isto

arranca o intelecto humano do seu estado de unidade, o

que nos parece ser um passo científico substancial.

30 Ensaios de Semiótica Soviética

Para 1compreender o que isso pode significar para

a técnica dofuturo, citemos um exemplo. Todos sabem o

lugar enorme que a memória ocupa na teoria moderna das

máquinas. Mas desde que o homem sentiu necessidade de

criar um dispositivo de memorização pensou em disposi-

tivos de armazenamento tradicionais (bibliotecas, livros,

todo o tipo de memória supra-individual nascido na época

do grafismo), em células repletas de textos. O livro é uma

muito velha e muito primitiva máquina de memorização.

Tornou-se o modelo da memória das máquinas.

Ora, se pudermos explicar em termos traduzíveis em

lingua científica porquê, quando lemos uma obra literária,

nos «lembramos» do que ignorávamos e que nãofigurava

claramente mas estava colocado pelo autor na memória

implicita do romance ou do poema, porquê um único e

mesmo textofornece informações diferentes aos diferen-

tes leitores e,formando em cada um destes um só todo

estruturado complexo, lhesfornece aquilo que necessitam,

comunicando a cada um «o que pode conter», os nossos

modelos de memórias artificiais seriam sem dúvida menos

incómodos (refiramos a densidade de, um texto artístico,

fora do alcance da técnica moderna, e a simplicidade apa-

rente da sua estrutura!) e bastante mais eficazes.

Evitando ao leitor detalhes especiais poder-se-á dizer

que a ciência actualmente emformação sob o nome de ci-

bernética do texto artístico abre possibilidades não apenas

científico-teóricas mas também de técnica aplicada. Esta

asserção baseia-se não em considerações, mas na experiên-

cia de longos anos de colaboração entre a cadeira de Lite-

ratura Russa da Universidade de Tártu e os cibernetas do

Instituto de Mecânica de Precisão para a Aeronáutica de

Leninegrado (grupo do professor B. Egorov do Instituto

Pedagógico A. Herzen de Leninegrado).

Pode-se ter esperança de que chegará o momento em

que o estudo atento dosfenómenos artísticos e dos meca-

nismos da cultura se tornará corrente tanto para o ciber-

neta teórico como para o criador de novasformas de

técnica.

SOBRE A SEMIÕTICA DA ARTE

(1962)

BORIS A. USPENSKII



1. A obra de arte pode ser considerada como um texto

composto de símbolos a que cada um atribui por sua conta

e risco um conteúdo (deste ponto de vista, a arte é análoga

à predição, à pregação religiosa, etc.). Portanto, o condi-

cionamento social na configuração do conteúdo é neste

caso notavelmente menor que no caso da linguagem; em

resumo, a polissemia (a possibilidade, em princípio, de

admitir muitas interpretações) constitui um aspecto subs-

tancial na obra de arte. Podemos entender por significado

uma série de associações e representações ligadas a um

ou outro símbolo. Num sentido mais geral, o significado

determina-se como invariante nas operações de interpreta-

ção (C. Shannon). Neste caso há que traduzir os símbolos

da arte numa série ,de associações e representações abs-

tractas. Esta tradução é especialmente evidente na repro-

dução estática do movimento mediante afixação de está-

dios, imagens separadas e sucessivas do objecto em movi-

mento (mediantefotografias ou também nos quadros dos

futuristas), que se traduzem num movimento do olhar do

espectador (a invariante é, neste caso, o conceito abstracto

do movimento); chega-se à mesma conclusão através do

exemplo do Laokoon, de Lessing (observe-se como o som

se traduz em movimentos de articulação nalgumas imita-

ções onomatopaicas, em que a invariante está representada

pela sensação que corresponde à articulação em questão).

Ao mesmo tempo, se a arte cumpre a suafinalidade, esta

operação pode inverter-se na medida em que o espectador

associa naturalmente uma determinada representação a

uma determinada imagem. Assim, produz-se a passagem

32 Ensaios de Semiótica Soviética

dos símbolos artísticos do plano da expressão para o plano

do conteúdo.

Se bem que o processo científico tenda, em conjunto,

para a criação de uma nova metalinguagem que inclua e

explique uma determinada linguagem, i. e., para a criação

de uma teoria (por outras palavras, tende a examinar uma

determinada teoria a partir de um ponto de vista mais

amplo, considerando-a como objecto de uma teoria nova

e de maior amplitude), afinalidade da arte é, todavia,

completamente oposta e consiste em converter as nossas

representações habituais em metalinguagem de umfenó-

meno mais restrito e evidente (em examinar umfenómeno

determinado de uma maneira nova, ainda que nos termos

já existentes, dentro dos vínculos já convencionalmente

aceites - cf. o conceito de ostranenie ou «estranhamento»

nos trabalhos dosformalistas russos).

Consequentemente, a semiótica da arte define-se pelo

facto de se dirigir para umfim, o que implica a necessi-

dade de procurar um conteúdo na obra de arte. 1 precisa-

mente na ausência dessa necessidade que se estriba a dife-

rença entre osfenómenos naturais e os produtos artísti-

cos; com efeito, os primeiros podem não ser (vistos impar-

cialmente) inferiores aos segundos, mas precisamente pelo

facto de serem naturais, sendo desnecessária uma interpre-

tação do seu conteúdo, não é possível a sua percepção es-

tética. Simultaneamente, do ponto de vista de uma concep-

ção religiosa do mundo, estesfenómenos podem receber

um significado preestabelecido. É interessante observar as

invocações dos sequazes de certas seitas, como exemplo de

situações em que «incompreensíveis1 combinações sonoras

chegam a ser concebidas como linguagem só pela suafina-

lidade deter minada.

2. Em definitivo, o desenvolvimento da arte é análogo

ao da linguagem. A partir de uma perspectiva temporal

(diacrónica), a arte, tal como a linguagem, pode ser con-

cebida como um sistema que tende continuamente para

uma situação de estabilidade. Quer a arte quer a lingua-

gem são caracterizadas em cada momento dado pela sua

tendência para se ajustarem a uma norma determinada,

juntamente com as variaçôes da mesma norma; quando

estas variações se tornamfrequentes dão lugar por si

mesmas a uma norma (neste sentido existe uma analogia

Teoria da Semiótica da Cultura

33

com os sistemas auto-reprodutores). A norma é determi-



' nada pela previsibilidade deste ou daquelefenómeno (com

, base nosfenómenos precedentes ou em informações ante-

riormente recebidas). Essa norma indica a existência de

nexos já constituídos entre símbolo e conteúdo (por exem-

, plo, a chuva vista através dos vidros de uma janela como

símbolo do estado de espírito melancólico do herói), mas

pode manifestar-se como limitações impostas à expressão

(por exemplo, a medida de um verso) ou ao conteúdo

(neste tipo podem enquadrar-se, por exemplo, os princí-

pios morais basicamente aceites pela sociedade no período

em que se produz a obra de arte). Os desvios parciais da

norma já estabelecida, dado que são dificilmente previsí-

veis, trazem uma informação estética e constituem a arte.

Portanto, o signo estético é-o somente em referência a

' uma norma dada, i. e., representa uma relação com um

, significado, não com ofacto denotado (o símbolo na arte,

como signo de um signo de um signo...).

Um texto real da linguagem artística é constituído

por uma sucessão de símbolos estéticos e comuns. A rela-

ção com a norma pode ser considerada como a interpre-

tação científica do grau de convencionalismo. De acordo

com este ponto de vista, todas as produções artísticas são

convencionais 1l1, uma vez que pressupõem alguma norma

em cujo círculo se acolhem; a ausência total de normas

- quer dizer, ausência de limitações nas possíveis combi-

nações de elementos expressivos e de conteúdo - repre-

senta um meroformalismo e não pode, por isso, ter con-

teúdo algum 12>. Não é legítimo tentar avaliar a veracidade

e a legitimidade de tais limitações. (Sair-se-ia dasfrontei-

, ras da teoria da arte.)

Quando um espectador assiste a uma peça de teatro,

além de limitações de espaço, tempo e acção, encontra-se

normalmente perante limitações valorativas (princípios

morais); pode não estar de acordo com elas (na vida, não

artisticamente), mas se as aceita como ponto de partida

estará em condições de receber uma satisfação estética. As

declaraçôes dos pedantes representam um exemplo de

norma pura (e por isso não podem conter informação es-

tética).

As relações entre norma e desvios da norma podem

ser consideradas como as relações sintácticas da arte. Es-

tas relações são análogas às existentes entre língua e pa-

Ensaios de Semiótica Soviética

31

lavra. A arte sem reconstrução da norma não constitui



um sistema (assim como não o é a palavra sem a recons-

trução da língua). Assim, estas relações caracterizam a

arte numa perspectiva tanto sincrónica como diacrónica.

A norma está, portanto, presente em qualquer sistema se-

miótico em desenvolvimento e é por isso uma categoria

semiótica.

3. É legítimo supor, portanto, que a ontogenia da arte

é análoga à ontogenia da linguagem. A afinidadefonética

obriga também o poeta a procurar nexos semânticos entre

as palavras - desta maneira afonética gera o pensamento

(este processo é análogo ao que se verifica noutrasformas

de arte).

É interessante comparar isto com a maneira defalar

das crianças, as quais pronunciam uma série de sons que

estão ligados a uma situação. Veja-se também a «máquina

poética» de N. S. Gumilev, a combinação experimental de

palavras por parte dos escolásticos para obter significados

novos, a interpretação talmúdica da Bíblia.

4. Deste modo, tanto aoformar-se como nos seus re-

sultados, a obra de arte pode constituir matéria de inves-

tigação semiótica. Uma determinada série de signos inspira

ao artista um conteúdo que ele organiza parcialmente se-

gundo regrasformais (segundo a norma e os desvios desta),

obtendo como resultado uma sucessão de símbolos que

o espectador preenche com um conteúdo próprio (que só

coincide parcialmente com o conteúdo dado pelo artista ou

por outro espectador); aqui é que se verifica essa trans-

missão do processo criador do artista para o espectador,

que é característica da arte.

Notas


(1) Seria interessante comparar os diferentes produtos artísti-

cos emfunção do seu grau de convencionalismo. Com essafina-

lidade parece ser necessário traduzir a informação estética da lin-

guagem artística numa linguagem normalizada (artificial) confron-

tando os textos assim obtidos segundo a sua extensão1 dado que

ofacto de recorrer à norma satura mais a informação transmitida

(cria um mínimo de superabundância), é evidente que o texto

Teoria da Semiótica da Cultura 35

(relativamente) mais longo dos que tenham sido traduzidos cor-

responderá aofragmento artístico mais convencional. Seria ainda

interessante, mas de extrema dificuldade, investigar qual será a

tendência geral do desenvolvimento histórico da arte, indicando se

tende para uma diminuição ou para um aumento de convenciona-

lismo.


(2) O valor estético do «abstruso» consiste provavelmente no

facto de propor algumas combinações experimentais sem nenhum

significado, sobre as quais se projecta uma norma já assimilada

(ao mesmo tempo, se o «abstruso» é dominado, a norma desapa-

rece, como nas obras de Krutsenü). As discussões sobre a arte

abstracta e o seu valor reduzem a possibilidade de individualizar

uma norma em referência à qual essa arte pode ser percebida

(mas também sobre a possibilidade de considerar a ausência de

uma norma como uma norma sui generis).

SOBRE O MECANISMO SEMIÓTICO DA CULTURA

(1971)

IÚRI LÓTMAN e BORfS A. USPENSKII



;

Existem numerosas definições de cultura 1'1. As dis-

crepâncias quando se trata de dar um conteúdo semântico

' ao conceito de «cultura», em idades históricas distintas e

' por parte de diferentes estudiosos do nosso tempo, não nos

desanimarão se recordarmos que o valor deste termo é

«

derivado» do tipo de cultura. Toda a cultura determinada



' historicamente gera um determinado modelo cultural pró-

prio. Portanto, o estudo comparado da semântica do termo

«cultura» ao longo dos séculos constitui um material

muito útil para construções tipológicas.

', Por outro lado ainda, dentro da multiplicidade de de-

finições, é possível determinar algo em comum que eviden-

temente responde a certas conotações susceptíveis de se-

rem adstritas intuitivamente à cultura, seja qualfor a

interpretação do termo.

` Limitemo-nos a assinalar duas. Em primeiro lugar na

' base de todas as definiçôes está o convencimento de que

; a cultura possui traços distintivos. 1Na sua aparente trivia-

lidade esta afirmação tem um conteúdo que não carece de

significado: dela deriva a afirmação de que a cultura nunca

representa um conjunto universal, mas apenas um subcon-

junto com uma determinada organização. Nunca engloba

' o todo, até ao ponto deformar um nível com consistência

, própria. A cultura só se concebe como uma parte, como

uma áreafechada sobre ofundo da não-cultura. O carácter

da contraposição variará: a não-cultura pode aparecer

' como uma coisa estranha a uma religião determinada, a

' um saber determinado, a um determinado tipo de vida e

, de comportamento. Mas a cultura precisará sempre de

38 Ensaios de Semiótica Soviética

uma contraposição semelhante. Ainda mais, será precisa-

mente a cultura a que intervirá como membro assinalado

da oposição. Em segundo lugar, toda a variedade das de-

marcações existentes entre cultura e não-cultura reduz-se

em essência a que, sobre ofundo da não-cultura, a cultura

intervém como um sistema de signos. Nomeadamente, cada

vez quefalarmos dos traços distintivos da cultura como


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