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ratorskom obtehestvé istorü i drevnostej rossüskich pri Moskovs-

kom universitete,fasc. 3, tradução do árabe de G. Muros, Mos-

covo, 1898, pp. 20-21.

(19) Veja-se 'ABeAcpóTn.e, Grammatika dobroglagolívago elino-slovens-

kago jazyka, L'vov, 1951.

(20) [«Adaptação» russa do 1

leaeslavo5,, o idioma búlgaro-macedónico, difundido pelos primeiros

evangelizadores e tradutores de textos sagrados,foi influenciado

pela cultura linguística greco-bizantina. N. T.]

(21) Para este efeito, vejam-se as observações sobre a influên-

cia das concepções estéticas de Galileu sobre a sua actividade

científica no ensaio: E. Panofsky «Galilei: nauka i iskusstvo (este-

ticeskie vzgljady i naucnaja mysil), em U istokov klasiceskoi nauki,

Moscovo, 1968, pp. 26-28. Cf. E. Panofsky, Galileo as a Critic of

Arts, The Hague 1954. Vejam-se também as considerações à volta

do significado daforma artístíca na exposição galileiana das de-

duçôes científicas, em L. Olschkü Galílei i ego vremia. Istorija

naucnoj literatury na novych jazykach, vol. II. Moscovo-Leníne-

grado, 1933, p. 132. [Edição soviética de L. Olschki, Gegischichte

der wisenschaftlichen neusprachlichen Literatur, 3 Band, Galilei

und siene Zeit Halle (Saale), 1927. N. T.] (Olschki escreve: «Através

da adaptação da expressão ao conteúdo dos pensamentos, estes últi-

mos assumem a suaforma apropriada, necessária e, portanto, ar-

tística. Poesia e ciência são para Galileu os reinos do 'pôr em

forma'. Nele, o problema do conteúdo e o daforma coincrdem.,>)

(22) Veja-se N. Wiener, Kibernetika i obtchestvo, Moscovo,

1958, pp. 47-48. (Ed. russa de N. Wiener, The Human Use of Human

Beings, Boston, 1950. Tradução castelhana, Cibernética, Madrid,

Guadíana, 1960. N. T.]

(23) Veja-se D. A. Uspenskü, aSemioticeskie problemy stilja v

lingvisticeskom osvescenü», em Trudy po znakavym sistemam, IV,

cit., cit., p. 499. [Deste ensaio existe uma versão emfrancês: «Les

problèmes sémiotiques du style à la lumière de la Iinguistique>,,

Information sur les sciences sociales, VII, l, 1968. N. T.]

(24) Perepiska Mody, Moscovo, 1971, 235.

(25) Satiry i drugie stichotvorceskie socinenija knjazje Antiocha

Kantemira, São Petersburgo, 1762, p. 32.

(26) Veja-se M. Bakhtine, Tvorcestvo Fransua Rable i narodnja

lcul'tt.1ra Scrednevekov, ja i Renessansa, Moscovo, 1965. [Tradu-

ção castelhana, Ga cultura popular en la Edad Media y en el

Renacimiento. El concepto de F. Rabelais, Barcelona, Barral,

1974. N. T. ]

(27) Anticnyefilosofy. Svidetel-stva,fragmenty, teksty, a cargo

de A. Avitsian, Kiev, 1955, p. 27.

UM MODELO DINÂMICO DO SISTEMA SEMIÓTICO

( 1974)


I ÚRI LÓTMAN

Mostra-me a pedra que os construtores rejeitaram!

É a pedra angular.

Extracto dos Manuscritos de Neg-Harnmandi (1)

1.0. A generalização da experiência derivada do de-

senvolvimento dos princípios da teoria semiótica durante

todos os anos transcorridos desde que Saussureformulou

os seus pressupostos iniciais leva a uma conclusão parado-

xal: a revisão dos princípios essenciais desta teoria acabou

definitivamente por convencer da sua estabilidade, en-

quanto o esforço realizado com o objectivo de estabi-

lizar a metodologia semiótica implicavafatalmente uma

revisão dos seus princípios maisfundamentais. Os traba-

lhos de R. Jákobson e, em particular, a sua conferência

de encerramento no IX Congresso de Linguística, mostrou

brilhantemente que a teoria linguística actual logra per-

manecerfiel a si própria, mesmo quando se transforma

no seu próprio contrário. Melhor ainda, é precisamente

nesta combinação de homeostase e dinamismo que Jákob-

son vê, com razão, uma prova da organicidade, tanto a sua

organização interna como o seu sistema de inter-relações

com outras disciplinas:

Recorrendo à terminologia hegeliana, pode di-

zer-se que a antítese das teses tradicionaisfoi subs-

tituída por uma negação da negação, a saber, uma

síntese do passado próximo e do passado longín-

quo (z)

Estafrase aplica-se plenamente ao problema do esta-



tismo e do dinamismo nos sistemas semióticos. Um novo

exame dalgumas concepções bem arreigadas neste domínio

não pode senão corroborar o bomfundamento dos prin-

66 Ensaios de Semiótica Soviética

cípios mais profundos da descrição estrutural dos siste-

mas semióticos.

1.1. Desde o início, a atitude adoptada em relação à

inter-relação da sincronia e da diacronia nos sistemas se-

mióticos esteve marcada por umaforte ambiguidade. A

discriminação destes dois aspectos na descrição da língua

foi uma grande conquista da Escola de Genebra. E, con-

tudo, desde a redacção das suas Teses, assim como nos seus

trabalhos posteriores, os membros do Círculo Linguístico

de Praga apontaram o perigo que poderia haver em abso-

lutizar este aspecto, o carácter mais heurístico do que real

desta oposição. R. Jákobson escrevia:

Seria um grave erro considerar estática e sin-

cronia como sinónimos. O corte estático é uma

ficção. É apenas um procedimento científico de

apoio, não um modo particular do ser. Podemos

considerar a percepção dumfilme não apenas dia-

cronicamente, mas também sincronicamente e, con-

tudo, o seu aspecto sincrónico não é idêntico a uma

imagem isolada tirada dessefilme. A percepção do

movimento está presente também no aspecto sin-

crónico. E o mesmo sucede com a língua 131.

Uma série de trabalhos da Escola de Praga mostrava,

por um lado, que, sendo a diacronia a evolução do sistema,

isso não nega a realidade da organização sincrónica, antes

a esclarece. Por outro lado, chamava a atenção sobre a

possibilidade de passar duma a outra destas categorias 141

não obstante, as críticas deste tipo não puseram

nunca em dúvida o valor metodológico, mesmo aquando

da oposição inicial, destas duas abordagens para a descri-

ção dos sistemas semióticos.

As reflexões abaixo propostas têm por meta desenvol-

ver mais adiante estas considerações já antigas, assim

como as ideias de Y. Tynianov e M. Bakhtine a propósito

do dinamismo dos modelos semiótico-culturais 151.

1.2. Há motivos para supor que o estatismo que con-

tinua a impregnar uma série de descrições semióticas não

é o resultado dumafalta de esforço deste ou daquele es-

tudioso, mas de certas características radicais da metodolo-

Teoria da Semiótica da Cultura 69

gia utilizada. Sem uma análise minuciosa da razão pela

qual um objecto dinâmico se transforma num modelo está-

tico pelo própriofacto da sua descrição, e sem uma cor-

recção adequada dos métodos de análise científica, toda a

tentativa de produzir modelos dinâmicos corre o risco de

ficar em estado de louvável intenção.

2.0. Sistémico-extra-sistémico. - A descrição estrutural

baseia-se numa delimitação, no seio do objecto a descrever,

daqueles elementos e daquelas relaçôes do sistema que se

mantêm invariáveis através de todas as transformações

homomorfas do objecto. É precisamente esta estrutura in-

variante que constitui, para uma descrição deste tipo, a

única realidade 161. Opõem-se-lhe elementos extra-sistémicos

reconhecíveis pela sua instabilidade, a sua irregularidade,

que são afastados no decorrer da descrição. Esta necessi-

dade defazer abstracção de certas marcas «desprezíveis»

no estudo do objecto semiótico já é tida em conta por

Saussure quandofala da importância que tem o despren-

der-se das alterações diacrónicas «pouco importantes» nos

limites da descrição dum estado sincrónico da língua:

Um estado absoluto define-se pela ausência de

alterações e como, apesar de tudo, a língua se trans-

forma, por pouco que seja, estudar um estado de

língua conduz praticamente a desprezar as altera-

ções pouco importantes, da mesma maneira que os

matemáticos desprezam as quantidades infinitesi-

mais em certas operações, tais como o cálculo de

logaritmos 1.

Esta simplificação do objecto descrito pelo método

estrutural não pode, em princípio, suscitar objecções visto

que caracteriza de maneira geral a ciência como tal. Mas

convém não esquecer que através deste processo de des-

crição o objecto certamente se simplifica, mas de novo se

sobreorganiza; a sua organização torna-se mais rígida do

que é na realidade.

De maneira que, por exemplo, se nos aplicarmos a des-

crever estruturalmente o sistema de condecorações russas

do século XVIII e princípios do XIX (um objecto cómodo

sob muitos aspectos, comofacto culturológico de natureza

plenamente semiótica, nascido artificialmente da activi-

Ensaios de Semiótica Soviética

70

dade de sistematização consciente dos seusfundadores),



teremos evidentemente perante nós uma hierarquia de con-

decorações a par duma hierarquia de marcas diferenciais

significativas. Se queremos apresentar no seu conjunto

cada condecoração particular e o seu sistema como uma

espécie de organização invariante, perderemos natural-

mente de vista a variabilidade sem ordenação sensível de

certas marcas. Assim, uma vez que os que tinham recebido

ordem do tsar para se galardoarem com uma cruz ou uma

estrela se encarregavam delas eles próprios, durante muito

tempo, a espessura e o grau de ornamentação das pedras

que levavam incrustadas dependiam da imaginação e da

riqueza do eleito, sem que isso revestisse um significado

semiótico imanente.

Todavia, mesmo se se desprezarem estas variantes, o

simplesfacto de descrever esta organização contribuirá

para a sistematizar em excesso, não apenas porque os ele-

mentos estranhos ao sistema serão eliminados como ine-

xistentes, mas além disso por uma outra razão: um dos

problemas principais da descrição será a definição duma

hierarquia. Uma questão tanto mais legítima, por outro

lado, quanto se inscrevia, na prática, nofuncionamento do

sistema, na medida em que se punha todos os dias o pro-

blema da imposição mútua destas insígnias sobre o uni-

forme. Lembrar-se-á igualmente a tentativafeita por

Paulo I para transformar todas as condecorações do Im-

pério Russo numa ordem de cavalaria única que as teria

levado a converterem-se em `denominações ou classes.

Da mesma maneira, uma descrição hierarquizada do

sistema das ordens russas suprimirá estes aspectos de dú-

vida constantes, de indecisão quanto ao valor hierárquico

de elementos isolados. Por outro lado, estas dúvidas eram

em si uma marca estrutural de importância e uma carac-

terística significativa das condecorações russas. A descri-

ção será necessariamente mais organizada áo que o ob-

jecto.

2.1. Este procedimento - próprio de todo o método



científico - não pode, em princípio, sofrer objecções, visto

que parece legítimo deformar deste modo o objecto ao des-

crevê-lo. Gostaríamos de chamar a atenção para um outro

tipo - muito mais sério - de consequências: se a descri-

ção que elimina do objecto todos os seus elementos extra-
Teoria da Semiótica da Cultura 71

-sistémicos se justifica plenamente durante a construção

de modelos estáticos - não requerendo então mais do que

alguns coeficientes correctivos - acarreta, em princípio,

dificuldades no caso dos modelos dinâmicos: uma dasfon-

tesfundamentais do dinamismo das estruturas semióticas

é a atracção permanente que exercem sobre certos elemen-

tos extra-sistémicos atraídos à órbita do sistema, assim

como, simultaneamente, a expulsão do sistémico do domí-

nio do extra-sistémico. A repulsa em descrever o extra-sis-

témico, a sua expulsão para além dos limites da ciência,

suprime uma reserva dinâmica e tem como efeito apresen-

tar o sistema estudado sob um aspecto que exclui, por

princípio, todo o jogo entre homeostase e evolução. A pe-

dra que os construtores dum sistema já realizado e esta-

bilizado rejeitam por inútil ou supérflua parece ser a

pedra angular do sistema seguinte.

Toda a diferença por pouco estável e sensível que

seja no material extra-sistémico pode-se converter em es-

trutural na etapa seguinte dum processo dinâmico. Para

voltar ao exemplo citado mais acima a propósito do embe-

lezamento arbitrário das condecorações, há que lembrar

que este costumefoi abolido em 1797 e que os adornos de

pedras preciosas se converteram, em toda uma série de

casos, na marca legítima duma distinção de alto nível so-

cial. É evidente, por outro lado, que nãoforam introdu-

zidas porque havia que expressar este caso duma ou outra

maneira; é, pelo contrário, uma divisão constituídafora

dos limites do sistema que a introduziu dotando-a de sen-

tido. A acumulação progressiva de elementos de variabili-

dade alheios ao sistema na esfera do plano da expressão

estimulou afundação duma diferença sistemática no plano

do conteúdo.

2.2. Esta exigência de descrever o extra-sistémico

choca com importantes dificuldades metodológicas. Dum

lado, o extra-sistémico subtrai-se, em princípio, ao pensa-

mento analítico; doutro, o próprio processo da descrição

transforma-o necessariamente emfacto de sistema. Parece,

então, que, aoformular-se a exigência de incluir no domínio

das descriçôes estruturais o material extra-sistémico que

rodeia o sistema, estamos a tentar o impossível. Esta ques-

tão aparecerá, contudo, sob um novo aspecto se recordar-

mos que «extra-sistémico» não é em absoluto sinónimo de

72 Ensaios de Semiótica Soviética

«caótico». «Extra-sistémico» é um conceito complementar

de sistémico. Cada um deles não reveste a totalidade dos

seus significados, salvo numa correspondência mútua com

o outro, e nunca como dado isolado.

2.3. Queformas de extra-sistémico podem mencio-

nar-se neste meio?

2.3.1. Na medida em que a descrição implica, como

notámos, um realce do grau de organização do sistema, a

descrição dum ou outro sistema semiótico por si próprio,

a elaboração duma gramática pessoal, são meios podero-

sos de auto-organização. Em certo momento da existência

histórica duma língua dada e - num sentido mais am-

plo - duma cultura em geral, vê-se destacar no seio do

sistema semiótico uma sublinguagem (e um subgrupo de

textos) visto como metalinguagem para a sua própria des-

crição. É assim que se elaboram, na época do classicismo,

inumeráveis obras de arte que não são mais do que descri-

ções dos sistema das obras de arte. É essencial sublinhar

que a descrição é, neste caso, uma autodescrição; a sua

metalinguagem não está cingida a uma zona exterior ao

sistema mas constitui uma subclasse do mesmo.

O efeito essencial de tal processo de auto-organização

e de ordenação complementar é levar parafora do sistema

elementos que, de certaforma, deixam de existir através

do prisma da autodescrição em questão. O relevo do grau

de organização dum sistema semiótico vai acompanhado,

portanto, dum estreitamento que pode terminar em limi-

tação quando o metassistema se torna rígido ao ponto de

perder quase todo o contacto com os sistemas reais que

pretende descrever. Contudo, goza ainda nessas circuns-

tâncias da autoridade da sua «correcção» e da sua «exis-

tência real», enquanto as camadas reais da semiose social

passam inteiramente para o domínio do «incorrecto» e do

«inexistente».

Tanto é assim que, por exemplo, na óptica da utopia

militar-burocrática de Paulo I a única coisa existente era

o regulamento duma rigidez levada até ao extremo do des-

file da guarda. Aí estava o que era percebido como o ideal

da ordem do Estado. Enquanto a realidade política da

vida russa era percebida como «incorrecta».

Teoria da Semiótica da Cultura 73

2.3.2. A marca de «inexistência» (quer dizer, de extra-

-sistemicidade) parece ser simultaneamente a marca do

extra-sistémico dum ponto de vista interior do sistema e o

índice negativo das marcas estruturais do próprio sistema.

Assim, quando Griboiedovfaz o balanço político do De-

zembrismo nos primeiros esboços da sua tragédia Roda-

misto e Zenóbia, a marca estrutural que se destaca para

ele na atitude revolucionária da nobreza (visto que não há

dúvida que, mais do que a história da antiga Arménia em

tempos da ocupação romana, lhe interessa a actividade

dos conjurados russos de 1825) é a inexistência, para ela,

do povo comoforça política:

«Duma maneira geral - escreve - há quefazer notar

que o povo não toma parte nenhuma na sua acção; parece

não existir» 181.

Evocando Andreas Capellanus, autor dum célebre tra-

tado medieval sobre o amor cortês intitulado De amore,

o académico V. Chichmariev observava: Ante as campone-

sas, o autor cortês propõe ao amigo a quem dedica o seu

livro que não as trate comf inuras e que recorra mesmo à

violência 191. Esta recomendação explica-sefacilmente: se-

gundo Andreas Capellanus, o camponês tem acesso apenas

ao amor naturalis; no quadro do amor cortês -f in'

amors - «parece não existir». Em consequência, pensa-se

que os actos que dizem respeito a este género de pessoas

não existem.

2.3.3. O extra-sistémico pode vir doutra parte, quer

dizer, depender dum outro sistema. Na esfera da cultura

chocamos sem cessar com a tendência que leva a conside-

rar uma linguagem estrangeira como uma não-linguagem,

ou, em casos menos excessivos, a considerar a própria

lïnguagem como a correcta, a outra como incorrecta e a

fazer da sua diferença um motivo de «correcção», quer di-

zer, a medir a adequação. Tolstói cita o exemplo dum caso

em que alguém percebe asfrases pronunciadas numa lín-

gua estrangeira comofrases russas alteradas (`incorrectas')

em Guerra e Paz: A isto chamamf alarf rancês! diziam os

soldados. Pois bem, vê agora, Sidorov! Sidorov piscou o

olho e, dirigindo-se aosf ranceses, pôs-se a emitir palavras

incompreensíveis: Kari, mala, tafa, safi, mouter, kaska, ba-

74 Ensaios de Semiótica Soviética

ragouinait-il... 1l°>. Existem numerosos exemplos em que a

língua estrangeira é assimilada a uma não-língua - à mu-

dez. A língua dos Ugros é muda 1ll1, o mesmo que, em russo,

a etimologia da palavra «alemão» 1i2. Simultaneamente, o

sistema próprio pode ser percebído como «incorrecto».

Assim como os lábios austeros

Não gosto, semfaltas gramaticais,

Da língua russa.

(Puchkin, Eugénio Onéguin, cap. III, estrofe XXVIII.

Igualmente, os casos em que se assimila o próprio

idioma à mudez: deplorando o débilflorescimento da lín-

gua eslava, Y. Krijanitch escrevia na sua Política: «Como

consequência da dita beleza, da majestade, e da riqueza

das outras línguas e como consequência da insuficiência

do nosso idioma, nós, os Eslavos, ao lado dos outros povos,

somos como um mudo entre os quefestejam.» c13)

2.3.4. Neste caso, visto que se examinam o objecto a

descrever e o seu contexto extra-sistémico comofenóme-

nos, certamente afastados um do outro, mas estruturais,

é indispensável para descrevê-los dispor duma metalingua-

gem bastante distante para os tornar homogéneos.

Nesta perspectiva, há que reconhecer que é impossível

utilizar, a título de metalinguagem de investigação cientí-

fica, o aparelho de autodescrição elaborado, por exemplo,

pelas culturas do classicismo ou do romantismo. Do ponto

de vista da própria cultura clássica, as autodescrições do

tipo da Arte poética de Boileau ou das Instruções aos que

querem ser escritores de Soumarokov são textos de meta-

nível que: a) por um lado, realçam o grau de organização

da cultura empíríca da sua época; b) por outro, suprimem

dentre os estratos dos textos aqueles que podem ser tra-

duzidos em termos extra-sistéxnicos. O estudioso actual

incluirá esses textos no objecto de descrição e situá-los-á

ao mesmo nível que os outros textos culturais da época

estudada. Levando a um nível metalinguístico a linguagem

elaborada por tal época para autodescrever-se, excluirá

inevitavelmente do seu campo visual o que os homens da

época excluíam da sua composição por razões de ordem

polémica.

Teoria da Scmiótica da Cultura

2.3.5. Há que considerar uma outra coisa ainda: a

criação dum sistema preciso de autodescrição «sobreorga-

niza» e, simultaneamente, simplifica («poda») o estado

do objecto quer no plano diacrónico quer no sincrónico,

baseando assim a sua história segundo o seu próprio mo-

delo. A constituição duma nova situação cultural e dum

novo sistema de autodescrições reorganiza os seus estados

precedentes, ou até uma nova concepção da história, o que

cria dois tipos de efeitos: dum lado, redescobertos precur-

sores esquecidos, grandesfiguras da cultura, são os histo-

riadores do período anterior acusados de cegueira. Des-

critos nestes termos, osfactos anteriores a um determinado

sistema não podem naturalmente senão conduzir a este;

este apenas é apto para defini-los e dotá-los de uni-

dade. 1, assim que surgiram conceitos tais como «pré-ro-

mantismo» quando, dosfactos culturais da época prece-

dente, não se retém senão aquilo que conduz ao roman-

tismo e que não adquire unidade senão na sua estrutura.

Um traço característico deste processo será o de não en-

frentar o movimento da história como uma renovação de

estados estrLlturais, mas como passagem de um estado

amorfo provido de alguns «elementos de estrutura» para

uma estrutura constituída.

Por outro lado este processo implicará a asserção de

que a história em geral começa no momento em que apa-

rece esta autodescrição da cultura. Na Rússia, dada a reno-

vação extremamente rápida das escolas literárias e dos gos-

tos ao longo dofinal do século XVIII e do começo do XIX,

encontramo-nos com a tese avançada mais duma vez se-

gundo diversas ópticas: Não temos literatura. 1 tanto

assim que no princípio da sua carreira literária - no seu

poema «A Poesia» - Karamzine quer ignorar toda a litera-

tura russa anterior a ele e prediz a aparição para breve

duma poesia russa. Em 1801, numa reunião da Associação

dos Amigos da Literatura, Andrei Turguéniev, pensando

d.esta vez em Karamzine, declara que a Rússia não possui


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